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‘Cok moo entries: Andi Cusécto {IP-BRASIL.CATALOGACKO NA FONTE SINDICATO NACIONAL DOS EDITORES DE LIVROS, A) EROS SOTO DE LIU. Mataienda paris :prumensnade gues sem pens nocario/rans nner. Sa? Parte ooh snags de enero (rans ftuoeenina3nguigem sings Tose Ditetos reservados & PARABOLA EDTTORIAL sD. Mato Vier, 96 | pranga 04270000 Sia Pasa, SP ne (1) 5063-9262 [5061-8075 | (1) 2599-9063 ‘home page: worm parabolecitoia com br ‘mal psabolsporabolctoia come "eso dts rads Nenu pre deta db poco ‘es len cu manic una eters as) 5 argivade em quar Sse os tana ok ‘bo por eat te Prd Ftonl as ISBN 97885-85456.61-7 1 do texto: rande Antunes, 2007 © a ecto: Pardbol Elton, So Fou feverio de 2007 A Visteus & Axtowto, que vive as primeiras surpresas eo primeiro encantamento do mundo da linguagem. , Que“a poesia dese momento” Ihes“inunde a vida inteira’ MUTO ALB DA cRAMATiCn “No piano anénimo da praia ‘Tocam nenhuma melodia” “Pobre dia fora de miisica e de vor ‘Tio cheia de nio ser nada”, E, parafraseando Pessoa, nfo podiemos deixar de lamentar: Pobre lingua escolar! Tantas vezes fora de voz € to cheia de nio ser nada! CAPITULOM Que ramaticas existem? quando as pessoas falam em gramética, ¢m estar falando néio de uma coisa sé, mas de Essa falsa impresstio ¢ também decorrente "Bo que os fatos linguisticos tém sofrido. Na fordade, es fala em gramdtica, pode-se estar falando: ee as i cab Ropras qliedetinem o funcionamento de determinada Iin- gua, como em: “a gramética do portugués"; nessa acepgéo, a gramética carresponde ao saber intuitivo que todo falanie tem de sua prépria Iingua, a qual tem sido chamada de “gra- matica internalizada”, 1) dasregras que definem o funcionamento de determinada nor- ma, como em: ‘a gramética da norma culta’, por exemplo; ©) deuma perspectiva de estudo, como em: “a gramética gera- ‘iva’, ‘a gramética esiruturalista’, “a gramtica funcionalis- (Wu Aut BA Grane ‘a’; ou de uma tendéncia histérica de abordagem, como em: “a gramética tradicional’, por exemplo, 4) deuma disciplina escolar, como em: “aulas de gramética’; ©) deum livro, como em: “a Gramdtica de Celso Cunha”. Cada uma dessas acepgGes se refere a uma coisa diferente, To as, na verdade, coexistem sem problemas, mas precisam ser perce- bidas nas suas particularidades, nas suas fungées e nos seus limites. Vamos ver um pouquinho de cada uma, demorando-nos naquelas ‘que mais nos interessam neste momento. j; Gramanica 1: CoNsUNTO DE REGRAS QUE “<4: DEFINEM © FUNCIONAMENTO DE UMA LINGUA Nesse sentido, gramética abarca todas as regras de uso de uma lingua. Envolve desde os padrées de formagio das sflabas, passan- do por aqueles outros de formagio de palavras e de suas flexdes, até aqueles niveis mais complexos de distribuigéo e arranjo das unidades para a constituieao das frases e dos perfodos. Nada na ‘Aingua, em nenhuma lingua, escapa a essa gramética. Por isso é que se diz que nao existe lingua sem gramética, Nem existe gra- mética fora da lingua. Ou, ninguém aprende uma lingua para de- pois aprender a sua gramatica. Qualquer pessoa que fala uma lin- gua fala essa lingua porque sabe a sua gramatica, mesmo que no tenha conseiéncia disso, Como ilustracio, analisemos 0 seguinte fato. Uma crianga de 2 ‘anos € quatro meses, a0 ser interrogada se queria falar pelo telefone cam a av6, respondeu prontamente — Quero, Observemos que essa crianca néo disse “queremos", “quis”, “que- rem’, nem outra coisa qualquer que ndo fizesse sentido nessa situagio especifiea. Pelo contrério, usou 0 verbo nas flexdes de tempo, modo, pessoa e niimero adequadas, omitiu o pronome'sujeito, omitiu o com. (QUE Grandmas Beste plemento do verbo, uma ver. que esses elementos estavam contidos no contexto da interacéio. Certamente, se a pergunta tivesse sido: — Quem quer falar com a vové? — 0 garoto no teria omitido 0 pronome e teria respondido: — Eu quero! — ou, simplesmente: — Eu. © propésito dessa simples anélise 6 apenas tentar demonstrar como a gramatica da lingua, no sentido de “gramitica interiorize- da’, de conhecimento das particularidades da gramética da lingua nativa, faz parte do conjunto de saberes que as pessoas desenvolvem desde a mais tenra idade. Se uma crianga diz “minhas colegas e meus colegos”, “um algo- do” e “um algodinho”, é porque j domina as regras morfossints- ticas de indicagéo do masculino e do feminino, bem como as regras de indicagao do aumentativo e do diminutivo em portugués. Ou seja, jf sabe esses pontos da gramétics. Da gramética geral que regula 0 funcionamento da sua lingua: por exemplo, se a lingua tem artigos, se tem preposigies, se adota flexdes (de niimero, de genero, de grau, de tempo ete. e para que tipos de palavras), que posigGes as palavras podem ocupar na frase, que funcdes podem ser atribuidas a essas posigdes ete. Como lembra Scherre (2005, p. 9), “com 3 anos de idade, qualquer erianga de qualquer parte do mundo se comunica com e- trutures linguisticas complexas’. Mas existe a ideia simplista e ingénua de que apenas a norma culta segue uma gramética. As outras normas funcionam sem gra- métiea. Movem-se & deriva. Ora, toda lingua — em qualquer condi- ao de uso — 6 regulada por uma gramética. Quando um professor se queixa de que “os alunos chegam & 4 série endo conhecem as regras de gramtica”, evidentemente, esta se referindo a uma outra gramitica, fora dessa primeira acepcao, peis esta jé se encontra consolidada. B pelo resto da vida, Quando outro professor fala na “obrigatoriedade do uso da gramitica “também 7 |MUrTO ALE a caaMrica est falando de outra gramética. & que, nesse primeiro sentido, nio se trata de obrigatoriedade, A gramatica 6 constitutiva da lingua, quer dizer: faz a lingua ser o que é, Nunca pode ser uma questo de escolla, algo que pode ser ou deixar de ser obrigatério, Simplesmen- te, 6 faz parte, Nem requer ensino formal. ‘Também quando alguém fala em “regras gramaticais complica- das” tem em mente outra gramética. Nao eriste lingua complicada para os falantes nativos de qualquer lingua. Todos sabem dizer 0 ‘que querem dizer, o que precisam dizer. Quando um professor pergunta: “O que fazer para ajudar 0s alt hos a produzirem textos, quando eles ndo tém conhecimento de gra- ‘ética?”, demonstra que ainda nao entendeu que existe uma gramé- tica jé internalizada. Certamente, a essa altura, o que mais os alumos sabem 6a gramética da lingua, no sentido dos seus usos reais. Acredito que valeria a pena dizer essas coisas para os alunos; pelo menos, eles se sentiriam mais encorajados 2 empreender a ta. refa de ampliar suas habilidades comunicativas. Seria étimo se nés, brofessores, de vez. em quando disséssemos: “Voeés sabiam que jé sabem a gramética da noséa lingua?”, e demonstréssemos isso por meio de exemplos simples ¢ ricos! E eurioso pereeber que, ntre a populagio analfabeta ou pouey le= ‘nada, nfo se ouvea queixa de que a “ingua é dificil” ow a “gramética € complicada’ $6 na escola é que vao nos convencer de que “a Kingua diffe” e, pior ainda, de que “nfo sabemos empregé-la bem". ‘Me éspanta constatar que a ideia de que “ndo sabemos falar portugués; 56 ‘uns muito poucos é que sebem!” é uma das mais arraigadas, das mais inculeadas, que resiste a toda e qualquer argumentaedo em contrétio, (Funciona como um dogma: é intocével) Por outro lado, talvez, nem ‘me devesse espamtar, reconhecendo o lugar de crigem dessa cantilena, 1. Nala pena er olivro Oporcupués so doi... ea autri da protesora Rosa Vigi- le Mattos eS (ver ndicnges completas na biiiogra fa), ode, sob enfnquesdiverten, ‘#0 tratados problemas roistvos& diverse Linguistica do'portuyués ea seu engines (Que cémices exsren Vale a pena reffetir: um menino, em tenra idade, aprende fa- cilmente uma lingua. Um estudante, a0 contrario, tem dificuldade em aprender “a lingua” que Ihe ensinam. Por qué? Yale a pena perguntar-se. Em sintese, a gramética da lingua vai sendo aprendida natural- mente, quer dizer, na prdpria experiéneia de ir fazendo tentatives, ouvindo e falando. Nao hé um momento especial nem uma pessoa specifica destinados ao ensino dessa gramstica, Ela vai sendo ineor- porada ao conhecimento intuitivo, pelo simples fato de a pessoa estar exposta @ convivéncia com os outros, a atividades sociais de uso da lingua, das converses familiares ds atuagdes mais tensas e forms. Ouse, essa gramética est inerentementeligada & exposiego da pes- soa aos usos da lingua. A escola vird depois; para ampliar. eos ‘Todas essas consideragées nos fazem lembrat o poema de Drum- mond, Aula de portugués, no qual aparece expressa a perplexidade de quem, na escola, se encontra frente a frente com uma lingua que parece outra; bem diferente daquela que fala nas situagdes mais tri- viais do eotidiano, Uma pausa para 0 poema: Aula de portugués Alinguagem Na ponta da lingua Tao fel de falar Ede entender A linguagem na superficie estrelada das letras Sabe ld 0 que ela quer dizer? Professor Carlos Géis, ele 6 quem sabe Evvai desmatando O amazonas da minha ignoréncia. Figuras de gramética, esquipdticas Atropelam-me, aturdem-me, sequestram-me. 29 ‘MUO ALE DA GnawATICA Td esqueci a lingua em que comia Em que pedia para ir Ié fora, Em que levava e dava pontapé. A lingua, breve lingua entrecortada Do namoro com @ prima. O portugués sto dois; o outro, mistério, (© Daman’ de Andra, quce pars inbra. Ri deez: Reco 1670 Sem perder de todo o enleio do, segunda . poeta, pass. . 0 do termo gramética, a - 2.2. GramAnica 2: conrunto bE NORMAS QUE ©. REGULAM 0 USO DA NORMA CULTA Nesse segundo sentido, a gramética é parti - , particularizada, ou seja, fio abarca toda a realidade da lingua, pois contempla apenas aque. ies usos consideradas aceitveis na dtica da lingua socialmente pres. ih Enquadra-se, portanto, no dom{nio do normativo, 0 qual © 0 certo, 0 como deve ser da lingua e, por oposigéo, a errado, 0 como ndo deve ser dito, moropesinn Spent ‘Tals defluiydes nfo sto feitas por razdes propriamente lingufsti- 2s, quer dizer, por razdes internas & propria lingua, Séo feitas par ‘azbes histérieas, par convengdes sociais, que delerminam o que re, Dresenta ou nfo o falar social mais aceito. Daf por que nao existem ‘us0s linguisticamente melhores ou mais certos que outros; existem 1us0s que ganharam mais aceitagio, mais prestigio que outros, por ruz6es puramente sociais, advindas, inclusive, do poder econdmnico ¢ Politico da comunidade que adota esses usos. Dessa forma, nfo é por caso que a fala errada seja exatamente a fala da classe social ii le ndo tem. prestigio nem poder politico e econémico, “ Esse cruzamento de dominios torna, portanto, a questio da nor- ‘ma culta um saco de muitos gatos, um, ° um ponto bastante complexo, que exige estudo, andlise, reflex e debate consistentes, dentro © free ue Gravetnicns exsrene dda esecla, para que as intimeras incompreensées que rondam sua conceituacéo possam ser ultrapassadas. No pereurso deste livzo, o tema da norma culta e de seu ensino serd retomado no capitulo 7 e, de eerta forma, ao final de cada ca- pitulo, no tépico que intitulei de Implicagdes para o ensino, com a pretensdio de analisar as repercussdes que novas concepgdes de gra~ matica podem ter nas atividades de ensino. Portanto, intencionalmente, nfo me alongo aqui com a diseus- sfo sobre norma culta e suas relagées com a gramética e o ensino, uma vez que a esses t6picos dedico mais adiante capitulos e seg- mentos espeeiticos Uma terceira acepedo para o termo gramdtica pode ser vista a seguir, 238 GramAica 3: UMA PERSPECTIVA DE -_ ESTUDO DOS FATOS DA LINGUAGEM © termo gramdtica também é usado para designar uma pers- peetiva cientifica ou um método de investigaggo sobre as Iinguas. Ao longo dos estudos sobre a linguagem, diferentes perspectivas se sucederam, umas mais centradas na I{ngua como sistema em po- tencial, como conjunto de signos & disposic4o dos falantes, outras ‘mais voltadas para os us0s reais que os interiocutores fazem da lin- gua, nas diferentes situagdes sociais de interago verbal. & por es- sas perspectivas que se fala, por exemplo, em “gramitica estrutura- lista”, “gramitica gerativa”, “gramética funcionalista’, “gramitica tradicional” ete. Cada uma apresenta um corpo de teorias, que justificam um tipo de apreensio, observagdo e andlise do fendmeno linguistico. Repre- sentain, assim, visdes histéricas da percepgdo que se tem acerea da linguagem e da lingua, visdes que, em geral, retratam a ética comum a outros setores da vida humana. at ‘are ALBM OK GRAMATICA Ou seja, a ciéncia da linguagem também esté em sintonia com as, correntes de pensamento mais significativas em cada época, de mani. ra que se pode ver, por ts de qualquer estudo da linguagera, um apa- ‘ato tedrico que se conjuga com as visdes de muncio a partir das quais 8s coisas so observadas e, consequentemente, exploradas ¢ tratadas, Numa quarta acepedo, o termo gramética dimimui de aleance. bois corresponde a uma espectfiea matéria de ensino escolar fe GramArica 4: UMA DISCIPLINA DE ESTUDO ___Possivelmente, 0 termo gramética tem, ness acepgio, o maior indice de uso, pelo menos nos meios escolares. E ele. ‘que est por tras as famosas aulas de gramitica e que constitui,em goral, a grande dor de cabeca da comunidade eseclar, dos professores téonicos, da comnnidade extraescolar (pais, sobretudo) e, até mesmo, dos pre brios alunos mais adiantados, que “aprenderam muito bem as igdes de anos anteriores”, pois s6 acreditam que esto estudando a Yingua Se a disciplina gramética estiver no comego, no meio e no fim de to- dos os programas de estudo, E tal a énfase nessa disciplina que, de uns anos para &, até me- eceu ust eanga horéria especial, separada das aulas de redaao ¢ de literatura, como se redigir um texto ou ler literatura fossem coisa (Que se pudesse fazer sem gramética; ou como se saber gramitica fi ‘esse elguma serventia fora das atividades de comunieagao Essas inconsisténcias parecem pouco significativas, mas tém re- Pereussdes miltiplas nas concepgées sobre gramdtica e nas préticas de seu ensino, Todas pernicioses. Assim, é urgente discutir os pontos cruciais que sustentam sua improcedéncia teérica ou conceitual. Por is, cei ‘vamos voltar, muitas vezes, a esse né da gra- idtica como disciplina escolar — 6 i de celina escolar — 60 tema deste lvo. interes a Uma iltima acepedo de gramétion pode ser vista a seguir: ‘Que crawaricns Bese GramAtica 5: UM CoMPENDIO ©! DESCRITIVO-NORMATIVO SOBRE A LINGUA Em principio, a deserieo do funcionamento da lingua — da fo nética a estilistica — toma corpo em um livro, em umn compéndio que conhecemos como Gramatica. im geral, essa gramética pode adotar uma perspectiva mais descritiva ou mais prescritiva No primeiro caso, temos uma gramética que focaliza elementos da estrutura da lingua, descrevendo-os apenas ou apresentando-os em suas especificidades. No segundo caso, temos uma gramética que focaliza as hipsteses do uso considerado padrao, fixando-se, assim, no conjunto de regras que marcam 0 que se considera como uso correto da lingua Mas um compéndio de gramatica também pode focalizar a lin- gua como sistema em potencial, descontextualizado, como pode fo- calizar a lingua nos seus usos reais, testemunhados pelas situacdes da interacdo social. Pode ainda ressaltar os aspectos de flexibili- Gade, de heterogeneidade da lingua, como pode enfatizar a rigides de algumas de suas regras ou formas. Pode concentrar-se no escri- to como pode concentrar-se no oral ou em ambas as modalidades. De maneira geral, aqui no Brasil, as graméticas do portugués tem concedido uma énfase especial A modalidade escrita da lingua, so- bretudo da escrita literaria e, mais ultimamente, da escrita usada sna imprensa’. De qualquer forma, as graméticas munca so neutras, inocen- tes; nunca s4o apoliticas, portanto. Optar por uma delas é, sempre, optar por determinada visio de lingua. As graméticas também (6 bom lembrat) sio produtos intelectuais, sio livros escritos por seres hhumanos, sujeitos, portanto, a falhas, imprecisées, esquecimentos ‘8 Merece grande destoque x obra Crematiea de uone do portugnés, de Mavis Helena e Moure Neves, a qual tor como roferéncia "a ingua viva’, ou, concretamente, 08 wo atuals da lingua portnguesa no Brasil. A partir deses uso, a autora vai descrevends © analisando as regras que regem seu funcionamento, 33 além, ¢ claro, de vinculados a crencas ¢ ideologias, Por isso, nfo faz sentido reverenciar as gramaticas como se nelus houvesse alguma espécie de verdade absoluta e eterna sobre a lingua — sio produtos hhumanos, como outros quaisquer’, coms tins cones rama tambepoder ser visto no raha (986, en ‘pte as lage nize tls oncodn eo enn, gue propioua conlergio darts o linguistic esua impliagbes no mato do esino da lingua ater, ifs sone adientar quo evs obra de Trovglia eoutr publica em 2 efresen itines ake zadas em sai de sul edenciando-e, 8- CAPITULO A urgéncia de explorar a gramatica sem equivocos historia dos povos, asus esforgos de expansio e deminagao ter- titorial e politica, Alstins Iutas pela hegemonia cultural, a seus in- tents proselitistas'a suas necessidades retricas; enfim, as linguas foramecebenda tratamentos diversos, conforme as também diver- sas eondipies. gociais ¢ politieas dos grapos, que as tinham como marea de sita identidade. Nao estranha, portanto, que, historicamente, as questies lin- guisticas tenham servido a interesses muito diversos e, de acordo com esses interesses, tenham sido vistas em éticas bastante di- ferentes. “Toda Iingua so rastros de velhos mistérios”, lembra Guimaraes Rosa. Se isso é verdade, considerando-se a ingua como um todo, é mais verdade ainda entre nés, ocidentais, em relagio A gramétic (MUTO ALE On GRawdmien em geral. De fato, herdamos dos gregos a concepciio da gramética, em todas as acepedes, como uma forca controladora que preserva a lingua contra as possiveis ameagas de desaparecimento ou até mesmo de declinio, seja pela agio de invasores, seja pela acaio dos préprios membros da comunidade de felantes Na verdade, as pessoas sempre sentiram certa compulsdo para Gefender a integridade de sia lingua. Ou, de aeordo com certas vis6es, sua pureza ou seu poder de argumentaedo. Nada mais apropriado para esses intentos do que a compilacao de graméti- eas, que estabelecessem paradigmas, modelos, normas, eapazes de garantir a manutengfo da identidade linguistica, Noutras palavras, se fez necessdrio, para as comunidades de falantes, um instrumento de ‘controle — a gramética normativa — Que diseiplinasse o fluxo da prépria lingua, garantindo sua sobre- vivéncia ou aperfeigoando suas potencialidades de uso em fungi dos efeitos retéricos pretendidos, Nesse quadro, a criagdo de paradigmas e madelos em gramé- ticas foi assumindo feigdes priprias e constituindo uma gerantia de vida e de sucesso para as Iingues, sem munca se ter ausenta Go totalmente. Nem mesmo quando 4 niio eram to evidentes as ameagas de desaparecimento ou de descaracterizacao de seus usos mais modelares. Hm sums, foi sendo atribufdo aos compéndios de gramética ‘um papel de instrumento controlador de Iingua, ao qual caberia conduzir o comportamento verbal dos usuéirios, pela imposigao de modelos ou de padres. Essa visio de gramatica se consoli- dou to fortemente que chegou a abafar qualquer outra concep- $0 menos diretiva, como aquela da gramética internalizeda por todos 0s falantes. Mas ndo foi apenas a fungdo de controle atribuida & gramética que fez com que os estudiosos — fldsofos ¢ filélogos — se interes sassem por ela. Sob angulos bem diferentes, as pessoas sempre [AURCENIA DE EXRLORAR A GRAMATICA SeM EOUVOCDS se mostraram curiosas para entenderem a suprema prerrogativa Ga linguagem humana, e isso também motivou o interesse pelo aparecimento de graméticas, nas quais se tentasse explicitar os mecanismos subjacentes 4 atividade verbal. A encruzilhada de fatores tao complexos, historicamente sub- ‘metidos a interesses politicos, econdmicos e sociais diferentes, re- sultou numa série de concepgdes e, com o passar dos séculos, dea ensejo a formagio de alguns equévocos acerca do que é a gramd- tica e, consequentemente, daquilo que deve constituir seu ensino. Com uma formulago mais ou menos igual, muitos outros pes- quisadores tm reconhecido a existéncia desses equivocos, como Possenti (1996, pp. 3): No dia em que as escolas se dessem conta de que estio ensinando 08 alunos o que eles jé sabem, e que é em grande parte por isso que falta tempo para ensinar o que eles nfo sebem, poderia ocorrer uma verdadeira revoluglo, Para verificar o quanto ensinamos coisas que ‘os alunos jé sabem, poderfamos fazer o seguinte teste: ouvir 0 que os ‘alunos do primeiro ano dizem nos reereins (ou durante nossas aulas) para veifiear se jé sabem ou nio fazer Srases completas(eentdo nao precisariamos fazer exercicios de completa, se j dizem ou nfo pe- Hiodos compostos (¢ nfo precisariamos mais imaginar que temos que comegar a ensing-losa lex apenas com franes curls iia), xe eles sabem brincar na lingua do “pé" (talvez entio nfo seja necessério fazer tantos exereicios de divisdo silébica), se j4 fazem perguntas, afirmagées, negagdes e exclamagies (entdo, ndo precisamos mais en- sinar isso a eles), e assim quase ao infinito. Sobrariam apenas coisas inteligentes para fazer na aula, como ler ¢ eserever, discutir e rees- ‘rever, reler e reescrever mais, para eserever e ler de forma sempre mais sofisticada etc. De fato, os equivocos em torno das questdes gramaticais e de seu ensino so muitos. Mas seria muita pretensio de minha parte querer dar conta aqui de todos eles. Vou restringir-me, assim, aqueles que me parecem mais recor- rentes ¢ com repercussies mais sérias para as atividades de ensi- no, tais como as erengas de que: 7 Na intengdo de contribuir Ses equivocos e se possa, relevantes e consistentes, capitulos que se seguem, cardter de concepcao red Para que se desfagam alguns des- assim, definir objetivos de ensino mais asso a comentar cada um deles, nos € 8 apresentar razdes que justificam seu Ceimosamente ee reduionistaedeturpads, mesmo assim, a A cats ie tento destazer cada equivoco, focalizo o ensino espect ko da nga, a fim de mostrar como, de outras eoncepetes, even ante Aa Priticas pedagégicas bom mais rlevantes e produ, deck? % Ponto de vista do desenvolvimento das eapacidades cada um, como do Ponto de vista da insergac a c 10 do sujeito social onde ele exerve sua condigéo politi de pessoa : de cidade CAPITULOE Lingua e gramatica nao sdo a mesma coisa A cae de que lingua e gramética sao una coisa s6 de- ‘de, tigenuamente, se acreditar que a lingua é constituida co compdnente: a gramética. Por essa dtica, saber uma lin saber sua gramética; ou, por outro lado, saber a gra- mética de ume lingua equivale a dominar totalmente essa lingua. & o que sé revela, por exemplo, na fala das pessoas quando dizem que “alguém iio sabe falar”: Na verdade, essas pessoas esto querenco dizer que esse alguém “nao sabe falar de acordo com a gramética da suposta norma culta’, Para essas pessoas, Iingua e gramética se equivalem. Uma esgote totalmente a outra. Une preenche inteira- mente a outra, Nenhuma é mais que a outra. Na mesma linha de racioefnio, eansolida-se a crenga de que o estudo de uma lingua é 0 estudo de sua gramética. Cecilia Meireles descreve, numa crénica, toda a sua ansiedade por entrar em um curso de inglés, para logo poder ler as obras de ‘MUO ALBA A GRaNATiCA ‘Poetas ingleses a que gostaria de ter acesso. Fssa ansi . Essa ansiedade foi du- Plamente frustrada, conta Cecilia, quando, por duas vezes sucessi. ‘vas, a experiéncia que encontrou foram professoras solicitas em en- Sinat a0 grupo de alunos a conjugagao do verbo to be. Eo acesso & lingua para ler os poemas foi adiado, ee6 Ora, a lingua, por ser uma atividade indtien, todos, relevantes, caca um constitutivo & sua maneira ¢ am interagdo com os outros, De maneira que uma lingua éuma entidade complexa, um conjunto de subsistemas que se integram e interde. pendem irremediavelmente, Se néo, vejamos. ‘Uma lingua 6 constituida de dois componentes: = Ocorre que esses dois componentes esto em intima inter-re- lagio; estéo em permanente entrecruzamento; tanto que 0 com- Ponente da gramética inchui regras que especificam a eriagio de 2h unidades do léxico ou sua adaptagao as especificidades mor fologicas da lingua, pela mobilizagéo de seu esto ; ue de prefixos e sufixos, ae een ‘Mas ocorre, ainda, que uma lingua é i ainda, lingua é mais que um sistema em Potencil, em disponibilidade. Supée um uso, supde a atualizagiio conereta — datada esituada — em interagées complexas sariamente, compreendem: ain LUNG & GRAMATICA NAO SHO A MSHA COMA Loe st se aeons Dessa forma, 2 lingua apresenta mais de um componente (léxico e gramética) e seu uso esté sujeito a diferentes tipos de regras e nor- mas (regras de textualizagio e normas sociais de atuagéo). Restrin- gir-se, pois, A sua gramética é Limitar-se a um de seus componentes apenas, B perder de vista sua totalidade e falsear a compreenséio de suas miltiplas determinagies. Por esse conjunto de consideragées, fica claro que a gramética da lingua tem funcies. A ela cabe especificar, desde a formagao de palavras até a formagio de frases, determinando quais as combina- ‘ges de palavras impostas ou opcionais, qual a ordem possivel para cada fungdo dos termos, Enfim, toda a cadeia de itens que constréi uma frase ou um periodo esté prevista pelas regras da gramatica da Tingua (aquela gramética 1 de que falei no capitulo 2). ‘No entanto, se a gramética tem essa fungdo regularizadora, tem também limites, como se pode depreender do esquema apresentado cima, Quer dizer, a gramética regula muito, mas nao regula tudo. ‘Nem todas as prescrigdes cabem no seu dominio. Muitas das normas que definem 0 uso adequado e relevante da linguagem extrapolam seu conjunto de regras. Para ser eficaz comunicativamente, nfo basta, portanto, saber apenas as regras especificas da gramiétice, das diferentes classes de palavras, suas flaxdes, stuas combinagées possiveis, a ordem de sua colocagéo nas frases, seus casos-de concordaneia, entre outras. Tudo isso é necesstrio, mas néo ¢ suficiente. a Mum ALM DA cramérion Na verdade, esse equivoco ainda seto supde ' se torna mais sério, quandose supé ‘ve existe ura gramsétion apenas para a lingua toda, Numa perspecti. vada lingua como atvidade sociointeativa essa suposiio ¢ insucten Livel De cert forma e em muitos aspects, é preciso uma “gramitien” Portanto, que, se Lingua e gramética ndo se equivalem, muito menos so Satuvalem Lingua e gramnica normativa, ois esta caresponde apenas ‘uma parte daquela gramiética de base, internalizada por todo falante G Linava & Léxico 5 Na brite, nés nos esquecemos de que uma lingua, am de uma umitica, tem também wm lérico, i cay , quer dizer, am conjunt tivamente extenso de & disposigdo dao aie alavras, & disposi¢go dos falantes, constituem as unidades de base c ft mid de asin as "om que construimos o sentido de 7 Fundamental, tanto quanto a gramética de uma lingua, 6 seu les sa esto Brest, para cala poca, as mareas das visbes a ue 0s falantes alimentam, ou os tragos que indi Angulos de percepedo das coisas. Nao A toa a historia co ens ( toa a histéria do as ~einass de ae nga se confunde com a histéria do pereur. sa Ifmgua. Nenhuma palavra nova se forma ou é i aleatoriamente em qualquer lingua, — Dessa forma, ganha sentido afirmar , gana que 0 Iéxico é mais do uma lista de palavras a disposiego dos falantes, E mais ree a forsake ‘vé o mundo, as coisas que a cercam, o sentido de tudo, “sso é que oléxico expressa, magistralmente, afunedo da Lingua LUNCUR £ CRAMATICA NO SHO A MESA COS camo elemento que confere As pessoas identidade: como individuo ¢ como membro pertencente a um grupo. Millér Fernandes radica- lizou esse poder de significagio do léxico quando disse: “O que os olhos nao veem, a lingua inventa’ (Millér, 1994, p. 285). No Ambito da interacio verbal, concretamente nos textos que claboramos, o léxico recobre diferentes fungdes. Como unidades de sentido, as palavras constituem as pegas com que se vai tecendo a rede de significados do texto. Sao elas que vio materializando, me- diando as intengées do nosso dizer. ‘Como unidades de sentido, ainda, funcionam como elos de amar- racdio de subpartes do texto, So unidades dos nexos com que se constrdi a cadeia do texto. Isto 6, falamos com palavras, com 0 léxi- co da lingua, organizado, nos textos, em combinagées, em cadeias, em sequéncias, conforme as regras previstas pela gramética e pela coesio e coeréncia textuais. Na verdade, é 0 conjunto — léxico e gramatica —, materializado em textos, que permite a atividade sig- nificativa de nossas atuagdes verbais. O componente lexical também conta significativamente para se definir e reconhecer os usos socialmente prestigiados da lingua. Tal- vez conte mais do que o padréo gramatical. De fato, comumente, as, variagdes lexicais estigmatizadas (pot exemplo, “muié”, “trabaid”, “estauta’, “ceuveja’, “sastifaco”) causam mais impacto do que outras denatureza gramatical, algumas das quais até passam despereebidas. Ao contrézrio, em um contexto mais formal, dizer “unidade prisio- nal” por “cadeia”; “grande densidade phuviométrica” por “muita chu- va"; “redugo da maioridade penal” por “atribuigéio de culpa a meno- res de 18 anos”, para citar apenas esses exemplos, parece repercutir ‘muito positivamente. Ou seja, erta ampliagao lexical também 6 mar- ca deum uso prestigiador Ga lingua e, consequentemente, do falante. Mais do que pelo prestigio que confere, a ampliagdo voeabular érele- vante devido as passibilidadies cognitivo-comunicativas que implica. De fato, um vocabulério mais amplo constitui uma via de acesso a muitas informagées ou & matéria-prima com que se eria ¢ se expressa todo 6 complexo de nossa atividade verbal. Garcia (1977, p. 143) lembra que: a ty ASIC 0 sidevar que a gramitica é ue toda a lingua €consttuida apenas de gramatien = Esse equivoco persiste e tem submetid s Joacscolaa - toda lingua exesssivamente centrado om defnigbes chain ee Gierecios em toro das classes gramaticis, Tel tendéncia de rang, bs fats co te a es divulgada | (ver Neves, 1990). to, , interpelados s re que tipos de exercicic Sruntca soliitam de seus alunos, demonstraram, em sus mateche it io preferénca a exercicios de reconhecimento de clases og Palavras das funges sintticasexercidas por essaspalavnne Como se vé, esté entaizada af, n a nessa preferéneia, a conve due a exploraedo da gramitica representa o ponto pberintd para onde devem convergir as atividades de ensino. a TE tamnscacoes PARA 0 ENSINO Se aceitarmos que a li i Tingua se constitui muito mais do Bes de uma gramétiea, natural que nos interessemos taker ny lescobris, por analisar, com igual empenho: - — primeizo, questies relativasa sou léxico, ~ segundo, questdes relativas 8 sua realizagio e - tes relativas -m textos; terceiro, questées relativas ds condigdes sociais da produgao eda cireulacio desses textos, ‘Nessa perspectiva — e tentando dei ixar explicito que outras des- Sebertas podemos empreender, além da gramétion (ou denice aa LUNGUA E GRAMANCK NK KO A MESA COMA ramética, mas com visses mais amplas) — quero lembrar alguns pontos. Vejamos: Todo falante, para ser eficaz, precisa saber, em cada situacéo, (que tipo de vocabulério empregar (vocabuulério téenico, especializa- do, fora do usual, comum, literal, metaférico, coloquial). Logo, ativi- dades de exploracdo das variedades lexicais so bastante significati- ‘vas, com énfase,é claro, na ampliagao do repert6rio disponivel. Para isso, deve-se ir além das listas de sinbnimos e inciuir, na sequéncia dos textos, a exploragio de anténimos, de palavras de sentido afm. (ou semanticamente contiguas); de hiperdnimos (palavras de seati- do geral ou “nomes de classes de seres”, como “animal”, “produto”, “elemento”, “item” e, o mais geral de todos: “coisa”) de parténimos (aomes que designam membros de uma série ou que expressam @ relagdo de “parte’s“todo”, como “igreja/torre”; “casa/porta”; “ix vro/sumario”, entre tantos outros). Muitos estudos tem mostrado © quanto essas diferentes categorias de palavras podem funcionar como nexos cle uma ou mais cadeias coesivas, contribuindo significa- tivamente para promover a articulaco do texto. Deve-se procurar, ainda, reconhecer os “contextos” onde esses tipos de palavras mais tipicamente ocorrem; deve-se até mesmo listar, a partir do examede textos, alguns contextos mais representativos de cada um de seus usus. Eun yeral, us exereicios de exploragio do vocabulérlo tém-se limitado & tética de apenas substituir uma palavra por outra, em frases soltas, atividade que no evidencia as fungdes do léxico na construgio da continuidade do texto, como ficou demonstrado os estudos sobre coesdo e coeréncia (ef. Antunes, 2005). No que concer- ne a0 léxico, vale lembrar também que o fundamental ndo-é expor 0s diferentes processos de formagao de palavras, para que o aluno saiba reconlhecer depois que tal palavra foi formada por aglutinasio ou justaposicio, por exemplo, Isso ¢ ficar nas classifieagies, como venho reiterando, O fundamental é explorar o espérito do proceso de formagao de palavras. Quer dizer, explorar a possibilidade do léxico de abrir-se indefinidamente & incorporago de novas pala- wras, criadas no interior da lingua ou trazidas de fora; adaptadas ou ressignificadas. Tudo isso abordado de maneira tal que o falante se LUNGUA E GRAMATCA NRO SO A NEMA Cova = Lim artincio, um artigo, um editorial; = Fiz um comentario; = Dei um parecer, uma entrevista ete. 0 fato de indicar de que género se trata jé implica a consciénzia fle uma diferenciacao formal e funcional. ) i imprescindivel ainda saber como cada género de texto se ‘dompée; ou seja, quais as partes que o constituem ¢ em que ordem = tals partes devem aparecer; que grau de jleribilidade essa composi- (lo aceita, isto é, quais partes sto obrigatérias e quais sito opcionais. Por exemplo, se se trata de uma carta ou de uma histéria, quais as partes ou os blocos esperados e em que ordem eles devem aparecer, mn ; smplo, ue, por essas vias, precisam ser analisados e entendidos, 9 Tem relevancia também s F uado a situacéo de interagdo em foco! a Em rico de texte nio epee o gus aoa es » Todo falante, para ser eficaz, repito, precisa saber quem é ou quem séo seus interdocutores e aquilo que se pode prever como ja s2- bido por eles, quai seus interesses e, portanto, qual a sua disposi¢io para participar da interagéio em foco. aluno. Se Limitam a dizer: “ produzido pelo © “Fale sobre. ° bre." “Coie um pogueno texto? trey gre tt Tego so- Precisa saber ainda em que modalidade (oral ou eserita)con- explicitamente, o género de texte any ves enieativo indicar, vém se expressar em determinada situagdo. Ha momentos em que 205 als: “Fagam wana ean er Redo 8, soiitar a fala 6 mais recomendével; outros, em que a escrita se impde (ox é an conentre’ pa om um aviso.."; “Fagam imposta, pela instituigéo, como o caso dos oficios, por exemplo). ied " a justificativn.”; “Facaun i “latério.; "Facam uma declaracio -.”: “Criem ay pee ) Bo que dizer? Todos nés escrevemos mal se nos faltam ideias ‘ou informagdes sobre o que falar. Por isso, é relevante o cuidado da ste: Alids, é assim que nos referimos is ativida realizamos durante o dia. Ninguém diz: — Recebi um texto, escola em promover leituras, consultas, debates, discussies sobre te- ‘mas diferentes, respondendo, assim, a necessidade de deixar os alt- ‘nos em condigdes de terem o que dizer ‘Mas todos di : eee ) i fundamental também saber qual o registro mais apropriado (0 formal ou 0 informal — que admitem certa escala de graus). A ‘qualidade de um texto depende muito da adequacdo entre a situagéo © 0 registro usado. HA contextos em que s6 cabe o registro formal (uma carta ao prefeito da cidade, um debate ou uma conferéncia, por exemplo); ha outros, em que seria ridfeulo fugir ao registro informal, (um bilhete a um colega de turma, por exemplo). Nao me parece se~ rem comuns as situagies em que a esecla providencie a andlise ea embrto Meurer & Motta-F 2”, Para citar apenas alguns des tr a eet a oracdo de a itis frentes ‘ios de registro. Qualquer um parece bem, eos cr greene ‘ros de gramétien”. No caso de formas , &mais indiferente ainda o ti stro: ni ‘uma sada social quepesa svi de pnd ee amas qu Condigées 0 aluno tem de desenvalver um bom text in A yard de ur {comando do tipo: “Crie um pequeno texto com lin’ comentar quae ae cnsuadem denotativa”? Primeiramente, vale ‘nti 60 texto que nao apresenta os dois tipos de lin dt im que fnalidade 0 texto deve ser eserito; ou x oe ta nav pode desenvolver uma compete: _ competéncia comunicativa rel (Mas que no seja — soainho — culpad por i icativa relevante, eg, abet due ideias, énformagdes ou dados podem sor postos 10 ic a CY von bio, bara, em fungio disso, ndo dizer nem mais nem Medaden a Breesa sr dito. importante que nem se cala em oh “Shem se deixe de dizer o que éimprescindivel ser dito » Com base no repertério de i spertério de informagées, o usuéri r Que Pontos selecionar e, denire eles, 0 que focalizar, Ne a cae LINGUA E GRAMATICA NAO SHO A MUSA COSA recursos — lexicais, gramaticais ¢ gréficos — que a lingua aferece para expressar essas intengdes de primazia ou de énfase. Até mes- ‘mo um sublinhado ou a repetigo de uma palavra podem funeionar como recursos para chamar a etengio do leitor. » importante que se saiba ainda que postura adotar frente 20 que 6 dito (se convém ser taxativo ou complacente, reticente ou ce- tegérico, ostensivo ou velado, franco ou dissimulado ou irdnico ete). Este item tem a ver com outros apresentados anteriormente, como, por exemplo, oda diregao argumentativa que se pretende emprestar a0 discurso ou o do tipo de interlocutor em agio. Nilo se pode deixar de saber que recursos de coesiio empre- gar para garantir a continuidade do texto, Nem todo texto requer 0 ‘mesmo niimero ou os mesmos tipos de nexos coesivos. Vale a pera explorar que recursos so esses e analisar seu uso em diferentes géneros de texto. Nesse ambito da coesio, 6 de grande significagao 0 estudo dos pronomes e dos procedimentos de substituicao a que eles se prestam. I de grande significagio também o estudo das conjun- ‘goes, no naquele esquema simplista de classifieagto apenas; mes, analisando, em textos, como seu uso estabelece (¢ indica!) 0s dife- rentes tipos de relagées seminticas pretendidas. Normalmente, os lexlus de ceria extensdo apresentam conjungSes, ou locugdes con- juntivas, que expressam relagGes de oposicao (adversativas e conces- sivas), de causa-consequéncia (causais, consecutivas, condicionais), de finalidade, de conclusdo, de adigdo, entre outras. O que vale, nes- te setor, 6 explorar os tipos de relagGes semanticas e que partes do texto elas p6em em jungao (cf. Antunes, 2005). Os exercicios, puros simples, de classificagao das oragdes muito pouco acreseentam & competéncia comunicativa do falante, Ao contrério, conhecer aque- las relagOes semAnticas e sua fundo no estabelecimento da coesio do texto é de inteira significacao para a atividade discursiva. Vale a pena acrescentar que as relagdes aqui em foco também podem ser conseguidas pelo uso de uma outra palavra que ndo, necessaria- mente, uma conjuncdo. Por exemplo, uma relagio de causa-conse- uéncia entre dois segmentos pode ser conseguida pelo uso de uma 49 50 MrT Auta DA GRawriCn ‘ait emo on dcoréncia de; resultante de; provocada por, asim por dare -Erlorar tais possibilidades seria positivo, pais leer oes toa oportunidad de pereser come existem discon nos disponves paras conser os mesos efeitos fran foee ict forma, se estatia contribuindo para que a line a pectans tt como uma cosa maleével, vers, sujta a efeitos Frees Por votade do flante Lingua “engessada” das formas ets eda casings pres oie ne ; ~agdes gramaticais é Gimeno parcodesecolinento de hblitade dacasios Ges i sien bem menos sentido a chivida: para que serve ' 2 as cieiia do discurso requer também que se saiba que rel oe eer, que integragées operas, de maneira a garantir '¢, a harmonia ou a coeréncia, O: iia ai cts erie O8 eo chet os exis {6picos, subtépicos, parégrafes, periods ete) que devemn estar or setie — de anilise e de aplicaco — poderia ser feito nas an. ps ttn® acre da exigtsa dese dar um ttalo a um texto So ios explorar, por exemplo, que tipos de titulo, para diferentes Eiteros para diferentes fangdes de texto, para diferentes inter para diferentes suportes de texto ete ee ie, i sit etn precisa saber o que incorporar, expli- recorrer 4 infertextualidade, Un ni iaice ee ce sitet lidade. Uma prética bastante comum, quando ou elon renee & eters nos a coisas que outros dsseram, dalam a te autores que, por diferentes motives, eremos que que antec Nessns texto esto sempre ancorados na palavra oedeu « nossa, mesmo que néo terharios canscitneia disso LUNGUS € CRAMATICA WHO SAO A MESA COS Saber explicitar essa palavra anterior, ou até mesmo apenas sugerit uma alusdo a ela, representa uma habilidade comunicativa bastan- te relevante, Nas aulas de redacéo, sao triviais as recomendagbes ‘para que os alunos evitem incluir segmentos de outros textos. Uma orientagdo mais acertada seria sair da generalizagio — “Evite in- ‘uit trechos de outros textos” — para especificar que tipos de cits gfo so permitidos e até recomendaveis nesta ou naquela situagdo particular, Se poderia, inclusive, ensinar como se faz uma citaco, uma paréfrase de outro texto, Até mesmo os trechos que poderiam set vistos como “do lugar comum”, os provérbios ou as expressbes cristalizadas, por exemplo, podem ter uma aplicagao significative. Tudo depende da situagao, No mundo do texto, predomina 0 he- terogénco, a diversidade; ou melhor, predomina o conffito entre 0 sistemétio ¢ 0 provisorio. Quem decide é quem esta no camando: as pessoas em interaglo. © problema central dos cursos de linguas — materna e estran- geiras — estd longe de ser ndo ensinar gramdtica. B, antes, ndo en- sinar apenas gramética; e, muito mais, é néo ensinar apenas nomen- clatura e classificagéo gramatical. Portanto, nio se est propondo ‘menos, Pelo contrario, se est4 pretendendo muito mais. Em geral, pouco se explicita na escola 0 conjunto de normas textuais e sociais de uso da Lingua. Isto é, muito pouco se mostra “como tal coisa deve ou pode ser dita” e em que situagio. Nao se ‘pode esperar que o falante descubra sozinho um conjunto t4o com- plexo ¢ tao heterogéneo de regras e normas, que, ainda por cima, admitem toda a flexibilidade permitida pela natureza eminente- ‘mente funcional da lingua, Como Tari & Basso (2006, p. 234), desejamos que o professor de Iinguas néo faga “do conhecimento gramatical o tinico fundamen- to de sua autoridade”, até porque “a lingua excede a gramética” (ibidem, p. 226). aoe st Ficam evidentes, entio, os tundamentos a do como expresso desse segundo ue agora sintetizd CAPITULO Nao basta saber gram atica para falar, ler e escrever com sucesso RAMATICA nao se equivalem, saber gramiéti- ‘a uma atuago verbal eficaz. De fato, um dos isiste em se acreditar que o conhecimento da je para se conseguir ler e eserever com suces- géneros de texto, conforme as exigéncias da “Socialmente prestigiada. Somente com base nesse @'Se pode justificar o apogo dos professores (ede toda a comunidade escolar, os pais, inclusivamente): a) detalhada explanagio de cada uma das classes gramaticais, ‘com suas respectivas subdivisdes; b) es intrincadas veredas da andlise sintética. Mais do que apego a esse tipo de ensino, constata-se até mesmo certa impaciéneia para que, ainda cedo, ele seja devidamente ini- muito mais que conhecimentos de gram : gramiticn. Este 6 a sal ; n ‘aber que se precisa dominar para odesempenho satin? dads, como sever nos tipons a sequin rio dessas junto aod Firs que essas deem aulas de gramitica, passem refas ~ mesmo que paregarn irrelevantes — somente € falados, em situagdes da interned , era da linguagem formal © do dialeto de eee footer as reer i . “Um connecedor de Como ficou explicito no capit i . capitulo. anterior, o uso da lingua, Gh gran, Comporia um léxico em linguas como a noses nen gered 50 slerase pte ainda regras de textualizagdo ¢ tes tonne ao, ertents des tuations em que no NAO BASTA SABER GRAVATICA PARA FAR, LER F ESCREVER CoM SUCESSO. portanto, reduzir a condigo para o uso da lingua apenas a una competéncia de ordem gramatical. Ninguém fala, ouve, 18 ou es- ‘reve sem gramitica, é claro; mas a gramdtica sozinha é absoluta- mente insuficiente. Na verdade, a gramétiea 6 insuficiente, pois a interagio verbal Desdobremos um pouco cada um desses pontos. 5.1.1. O conhecimento do real ou do mundo Naturalmente, se falamos para estabelecer relagbes entre nése 0 ‘mundo, nada mais evidente que precisemos conhecer esse mundo do qual falamos ou, pelo menos, imaginar um outro, com base no que jé conhecemos, Quer dizer, a linguagem tem como objeto de significa cio as coisas que compdem a realidade, seja ela a realidade experi- mentada externamente, seja a outra sentida internamente, desejeda, imaginada, projetada, simulada. Néo importa: falamos das coisas ‘que t2m qualquer tipo de existéncia. Dai por que, em todos os nossos textos, é desnecessario dizer absolutamente tudo, pois nossos interlocutores partilaam conosco muito do conhecimento adquirido. Ouvir os outros, ler o que eles esereveram sfo atividades que mobilizam esse saber jé partilhado. Portanto, no é apenas o material lingufstico que dé sentido Aquilo que ouvimos ou lemos. Noutras palavras, o sentido no esti totalmente expresso ot. explicito no texto, sobretudo quando o in- terlocutor tem a competincia de dizer apenas o que ele supée que 0 outro ainda nio sabe. 55 MUTTO ALEW DA GRAMATICA Por exemplo, diante de ura letreio em que esté escrito: sau, como, Gagan, e de um outro em que estio os dizeres: mance, FRTAS, VERDURA, qualquer pessoa vai entender que, somente na se” funda stuagdo, alguns produtos esto posto & venda. Ninguém vay entender, por outro lado, que, naquele primeiro estabeleciment, eg, {o vendendo nariz, ouvido e garganta, : Em um textomaior do que os letreiros referi cain rn ot ai de mundo sto necessérios para que sejam feitas com éxito interpre ‘goes cocrentes, Nenhurm texto traz explicitas todas as informagées gue fransinite. Nenhum texto 6 absclutamente completo. Muits do ue € dito esta implicito, apenas pressuposto ou subentendido. O Acontece € que essas estratégias interpretativas so tao comuns, io sorrigiriras no daa dia das pasoas que nem as perosbemos ou pe, Tamos para analisé-las, Parecem naturais, Pensar, portanto, quea gente faz interpreta t r , que z textos usando apenas 6s conhecimentos linguistcns (que jf sdo mais do que aqules ure ‘mente gramaticais) 6 falscar a auténtica avidade da interagio verbal Esse princfpio pode ser corroborado em um outro exemplo: artigo sobre “as oscilagées da ciéncia”, 0 autor usou a onan ovimento pendular’,exatamente para significar 0 vaivém das des. coberlas clentifias. Se a gente nao sabe o que é um péndiulo ¢ que Movimento ele faz, como entender esse trecho? ° A mesma insuficiéncia do conhecimento linguis inguistico se poderia comprovar a partir de versos do j citado poensa de Drummond NAO BASTA SABER GRAVATICA PARA ALAR, LEE ESCREVER COM SUCESSO Professor Carlos Géis, ele € quem sabe E vai desmatando Oamazonas da minha ignoréncia, Sea gente no sabe a que se refere a expressiio “o amazonas”, se 4 gente desconhece certas particularidades do objeto designado — por exemplo, sua extens%io imensa — como interpretar o verso: “o amazonas de minha ignordncia” Somente o conheeimento de mun- do que compartilhamos permite uma interpretagao correta. E como entender a manchete de um jornal que diz: “A rede néo balangou para 0 Sdo Paulo neste final de semana”? E como entender a re- feréncia a “uma grande manifestag3o emplumadat” sem que sejam conbecidas as particularidades dos grupos indigenas? E como enten- der a afirmagéo de que alguém “tucanou”? Os exemplos podiam se raultiplicar a exeustao. Cremos, no entanto, que esses so suficientes para provar que a interag3o verbal mobiliza muito mais que o co- nhecimento linguistico. Quantas vezes as escolas jé presenciaram a ansiedade dos pais em pedir aulas de gramdtica, em apressé-las, mesmo nos primeiros ciclos do ensino fundamental, como se o conhecimento da gramética fosse suficiente para garantir o desenvolvimento satisfatério do bom esempeniho das criangas! Jé sabemos que nao é; muito menos 0 co- nhecimento da gramética a que as escolas tém concedido primavia: © da introdugio as classes de palavras corn sas miiltiplas classifica ges e subdivisdes. Seria tio bom que a pressa dos pais se orientasse para a exi- géncia da leitura de bons textos, para o acesso & literatura, pare a 1. Muto aerescentae leitara do ivro Texto ¢ coerdncia,indicado na bibliograis, Questdes como essi do "conhecimento de mundo’, do *conkecimento partlhado", base para as muitas inferéncias que sao feitas na stividade de compraender um text, atestam a insuficléncia do conhecimento lingulstco, tal como temes demonstredo gu Outraleltura bastante produtiva podera sr feta em Kock & Blias (2006), onde ruttas das questbestextuats brevementereferidas aqui recebem um desenvolvimen- to maior, inclusivamente com 9 apoio de textos de diferentes géneros e propésios ‘comunicativos, 57 experléncia da troca verbal: fuente, funcional, bem ordenada, clara relevante, em textos orais e em textos escritos! Ponhamos nessa meta adiante, na reflexfio do verbalmente, ‘nossas maiores aspiragées. E, vamos ue precisamos saber para interagir 5.1.2. O conhecimento dos recursos de textualizacdo cma tives de linguagem, além do conhecimento do mundo, necessrio também que conhecamos as muitasregras fu regula Fidadles) que especifieam o que devemos fazer para organizar um partes (blocos ou pardgrafos, subtépicos); > due estratégas de nteragén oom nosso interlocutor preferimos dolar Ge direta ou indiretamente; se de fama eaesérion, pre se ou de forma reservada, eautelosa eretionte;se num lin, eecetn comin ¢ informal, se fora dos padres corriqueiros. > que precaupdes convém tomar para evitar malentendidos; » 0 que vamos explicitar e o que vamos deixar ‘implicito,j4 que nae eg O08 saberes do intexlocutor podem suprir 0 que nio esta dito; Se devemos parafrasear, fazer alusio ot mesmo citar outro texto etc, FEnfin tudo o que é neoesséro para se entender ou para se fazer um relatério, um. aviso, um convite, um artigo, um resumo, uma re- senba, por exemplo, vai além da gramiética edo léxieo da lingua, Ou seja, conhecimentos relatives & composigao dos diferentes géneros bats 5 38 ser eficazes comu- textuais sio imprescindiveis para que possamo: 2 nicativamente, até mesmo na hora da escolha dos padres ou des regras tipicamente gramaticais Nao basta saber, insisto, que o pronome é uma palavra que substitu o nome, ou que uma elipse 6 omissdo de um termo re- cuperével pelo conterto precedente. Néo basta ainda saber que existe umn artigo que é definido, e outro que é indefinido. & preci- 50 saber que efeitos 0 uso de um ou de outro provoca na sequén- cia do texto. E preciso saber em que pontos do texto convém usar um prono- ‘me em lugar de uma expresso nominal ou recorrer a uma elipse em vvez de usar a forma explicitada. A titulo de ilustragdo, vejamos uma proposta de atividade, copia- da de um Livro didatico, que tinha como objetivo levar os alunos a exercitarem 0 emprego dos pronomes. ‘A proposta era a seguinte: paitcpg lana 2 eg oe (eaten auc i Pois bem: caso 0 aliuno siga a risca a proposta feita pelo livro, 0 texto resultaré no seguinte: [NAO BASTA SABER GRAMATICA PATA FALAR, LER E ESCREVER COM SUCESSO 39 Como podemes ver, certas atividades escolares, supostamente atividades para se ensinar gramética, aeabam por descaracterizar © que é fundamental na linguagem, que é permitir uma interagdo, com a troca de sentido e de intengdes. Nao surpreende, assim, que as alunos submetidos a esse tipo de atividade retraiam nao s6 0 gosto por escrever como ainda a neces- séria competéncia para escrever bem. (Que pelo menos tivéssemos a ccapacidade de andlise suficiente para encontrar a totalidade das cau- sas desse insucesso: nZo jogarfamos, ent, sobre os ombros dos alu- nos toda a responsabilidade por esereverem textos “cravejados de pérolas”, exibiveis jocosamente em programas nacionais de himor!} Quando um aluno, dissertando sobre questées de mudangas nas relagdes homem x mulher, escreve: Como ficaria 0 entendimento deste tifiear ‘ texto? Como identit em se est falando, quem fez o qué? Basta, entéo, empregar os oe Tem naa as devas Hexdes de nero ede mimero? Ese qualques sfalasse dessa maneira, contasse uma historia assim? A verdade é que ninguém conta uma historia si t6ria simplesmente pa ew ee ara divert, para iustrar uma ideia, refutar uma opiniao ete, Isto é, ieee a 8S pessoas falam movidas por inten- $6es comunicativas diversas, Ser io par trenar emprogo de elementos gramaticais?. wre Bab pare ee cesté exatamente demonstrando que o conhecimento gramatical é in- suficiente. Esses dois trechos néo apresentam nenhum problema d= E muito, Provével que essa historinha saia troncha e. artificial, pois gramitica. Do ponto de vista morfossintitico, tudo esta bem; nao hi XO BASTA SABER CRAMATICA PARA FALAR LER ESCREVER COW SUCESSO suas condigées de Produgdo contrariam substancialmente os principios Que palavras se vai escolher, quem leva a isso 60 conteddo da histérie denen GP ate cla fala isto 6 aqnilo que se tem a clzer; a letras que parecer nas palavras do texto vém como consequéncia, os Pengulse de mestado label Pishtro demonstrou quea tra da ac auitas vezes,objetiva nfo a interaeao mas 0 cal ape er gat Tt omer tints deiguna rsh graae, inadequagdo de espécie alguma. Entretanto, a obviedade com que as coisas so ditas leva a uma total irrelevancia e deixa o que é dito sem ‘menor graga e interesse. Falamos para dizer coisas relevantes, que implicam qualquer tipo de novidade ou de interesse. Dizer, no contexto de um comenté- rio, que o homem é um ser masculino e a mulher um ser feminino é, no minimo, deseoneertante. Como se pode concluir, as nogées gramaticais so apenas parte dos saberes indispenséveis as atividades da interagdo verbal. Mas a escole, a -MUrTO Aut oa cranAricn G6es (mas carentes de relevantes conhecimentos sol ; vbre a teoria da I ager) acabam por jogarlenha seca nas brasas dessa foguera fatal E preciso que os estudos mais Tecentes da teoriz i css gue pram a es do docu, as sateen ‘ualizagdo, 0s componentes da cena comunicativa — cheguem, de {a‘o, aos programas de ensino das salas de aula, Falta chegar ainda a ‘iulas escolas 0 sopro desses novos ventos;, sem eles, tudo continu exalamente como se nada de diferente tivesse sido descoberto, £ bom que os pais (eaté mesmo os alunos) saibam também dessas coisas, Saibam que a gramética ¢ insuficiente para preencher todas as Rossas necessidades comunicativas ¢ garantir a preparagao que Feec/amos ter para enfrentar as solicitagGes do mereado de trae. 1ho bom, portanto, qu eles percam a inoeénca, ara néo eredita- Tem todas as condigdes de éxito a gramtitica, Assim Petsuadir pelo diseurso fécil de quem vende on dé, em “bons pace, 4s", dieas rapidas de “salvagdo”, por aprenderem a “néo errar mai Gu hlo dese defender quando a eles, alunos, atribuida toda a cause do fracasso de seus textos inusitadamente hilariantes, A pevtensio de escrever um livro para os pais se justifica, sobre- fue, por esse desejo de querer udverti-ls contra esses equivveos en {oro da compreenséo do que éuma lingua, do que éuma gramatica, om suas fungbes e em seus limites, ede como deve ser seu ensina, So sores de Iinguas. E bom, afinal, que se _ Eom, afina, procure divulgar — deixar acessiveis ao Diblieo em geral ~ as descobertas de uma eiéucia que se ccupa da i Buagem e tenta explicar seu funcionamento, sem o vies da red $40 ou do simplismo que certos interesse: 8 ee 's menores emprestaram ao [NAO BASTA SABER GRAMATICA PARA FALAR, LER E ESCREVER COM SUCESSO. ‘Em suma, no dmbito das regras de textualizagéio — sem as quais ‘a comunicaao no poderia existir e que aqui foram apenas parcial- ‘mente enumeradas — muito precisa ser sabido para que nossos tex- tos — orais e eseritos — sejam considerados amostras significativas de atividades de linguagem. E sinal de muito atraso cientifico — como frisei — pensar que basta saber gramética ou mesmo basta conhecer a lingua para exer- cer as atividades de linguagem. A escola, por vezes coma gjuda dos pais ¢ dos alunos, ainda colabora muito para alimentar esse atraso! 5.1.3. O conhecimento das normas sociais de uso da lingua Efetivamente — podemos jé concluir —, a atividade da lingua gem é muito complexe, pois mobiliza tipos ber diferentes de saberes € de competéncias. Nada, partanto, daquele simplismo com que fo- os introduzidos ao estudo das linguas. Somado ao conjunto das regras linguisticas (gramaticais ¢ lexi- ais) e das regras textuais, existe um tereeiro conjunto, aquele rela- tivo as normas sociais que regulam © comportamento das pessoas em situagdes de interagéo verbal. Em termos bem gerais, podiamos comegar lembrando que nin- guém fala o que quer, do jeito que quer, em qualquer lugar. Existem ‘também os bem-comportadas e os maleomportados do ponto de vis- tada comunicacdo. Isto é, em toda cultura prevalece um conjunto de normas que especificam quem pode falar, 0 qué, como, com quem e ‘quando, Falar em voz alta, por exemplo, 6 permitido apenas em cer- tas ocasiGes. Interromper 0 outro também tem suas restrigdes. Dizer tudo o que vem & eabeva, sem discricdo, ésinal de ineompeténcia co- municativa (por exemplo, tornar piiblicas as dfvidas de um morto na ceriménia de seu sepultamento — como jocosamente foi apresentado na cena de um comercial, veiculado na Tv). Usar expresses que demonstram atitudes de politlez ou usar 63 Portamento socialmente prestgi 4 opartunidade se pode f Drestigiado. Por exemplo, néo em qualquer: is fazer a alguém qualquer tipo de Preciso avaliar se a privacidade do outro até ou Ti areal tada; néo em qualquer 10 sendo respei= uma atividade soeialmonte normatizada e, assim, regulada, Portanto, ser comunicativat a mente bem-sucedido é mais qui Questéio de saber gramética, de saber anali rca fungies sintéticas de seus term eee O segundo equivoco me da interacio verbal, 0 conhecimen nto lingutstico no basta; néo é | @e6e6 Sto prineipios como o da f i we mo 0 da insuliciéneia dos conhecimentos lin- Tinga segue S@ mostram cada vez mais claros quando se extnda a teagah mune petspectiva de atvidade discursioa, A Linguistica de ‘s fee eae, expistanda espectos altamente relevantes inguas, desde o inicio da década d ia i Wemmosttan que tecepeio ea emisséo de textos setae grates 'ursos lingufsticos ea recursos extralinguisticos tambéne E pena que, mais de juarent: role hel colas “enganchadas” ‘quarenta anos depois, ainda haja tantas es- no estudo da gramatic sozin ‘ udo da gramética, como se cla, Valls aes haver por ai certa propaganda enganosa acerca toa ‘ane fesse: estudar apenas gramatica, As descobertas da lit guistica nao tém repercutido ‘suficientemente’, oP a 4 CE News, 2008, 51 [NRO BASTA SABER GRAMATICA PARA FALAR LER E ESCREVER CON SUCESEO) Seria altamente relevante para todos 0s cidaclios ealtamente gre- tificante para professor e aluno poderem reconhecer, no final da tre~ Jetéria escolar, que o trabalho da escola teve grande éxito, pois foram ‘ensinadas e aprendidas liedes de programas amplos, que Tecebem & valoragio da sociedade letrada, como o gosto pela literatura, a pré~ tica da leitura e da analise plural e critica, da produgao oral e eserita de textos adoquados ¢ relevantes, ¢ a simpatia indiscriminada pela ‘condigéo variada e mutavel das manifestacées linguisticas. F 1 5.2.,IMPLICACOES PARA 0 ENSINO Admitix conjunto de prineipios apresentados neste capitulo Jeva a que scjam selecionados determinados contetidos curriculares, ‘que sejam definidas certas prioridades e escollida uma série de ati- vidades pedagégicas. Por outro lado, o mesmo conjunto implica que -uma série de pontos seja rejeitada ou, pelo menos, néo genhe priori- dade ou destaque. Vejamos. » Em termos bem gerais, podemos dizer que estudar mais que ‘gramética leva a procurar explorar o conhecimento de outras éreas, de outros dominios e assumir a certeza de que, ao lado do conhecimento da gramatica, outros sao necessérios, impreseindfveis e pertineutes. Portanto, nfo tem fundamento a orientagdo de que “nao é para ensi- nar gramética.” Repitor nfo ¢ para ensinar apenas gramatica. » Em termos mais especificos, lembramos que, para ir além da gramética, a escola deve empenhar-se também no estudo do léxico, do vocabulério da Kingua, Esse estudo pode contemplar as inter-te lagGes internas, de uma palavra com outras — relagées de sinon! ‘mia, de antonimia, de hiperonimia, de partonimia ~ e inter-rela- es externas, das palavras com as coisas, 08 eventos, o$ fatos, os valores culturais que povoam os mundos em que vivernos. Poder:os explorar ainda o sentido metonimico ou metaférico de uma palavra, de uma expressio, inclusive, em contextos da linguagem néo literé- ria, Da palavra casa, por exemplo, podemos chegar a palavra teto — 65 ment é ‘Propor >a a sea Por exemplo, pode-se 05 alunos uma pes oa emo Jevantamento das expressies adverbais que cena em onde Sue ligagdo com a categoria do aspecto cute bee * iin pesquisas assim, além de se favorecer um estas a® alsamplo erlacona dos elements linguistics so Eas mudandoo foo de est da Kngua, pos o mieleo as vasGes felts deixaria de sero contrast entre o certo eoervula, a él » Ocoee ainda lembrar a relevineia de se explarar a ques cologismos dos estrangeirismos, naquelas permpectives © naquela outra, das repereusséi 86es intercultural a balavras e de valores estrangeiros envolve. se Sin aoleste > Outra implic agio de se avs Bar fia eer interesses: ‘ancar além da gramética seriam os "Nko BASTR SABER GRAMATICA PARA PALA, LER E ESCREVER COM SUCESSO. — por ampliar o rol das competéncias a serem desenvolvidas e, assim, estimular, paralelamente & leitura e & escrita, a explo- racdo da oralidade. Nesse Ambito, vale a pena lembrar quanto poderia ser itil a andlise das “méximas da conversagao”, isto 6, dos principios que devem estar presentes para o sucesso da conversagio; — por ampliar, ainda, o repertério de informacdo dos alunos so- bre assuntos e temas diferentes, em leituras, debates e refle- -xdes orientadas; — por explorar, enflm, as chances advindas do estudo de outras disciplinas. Nesse ambito, vale ressaltar a importancia desse estudo, para se conseguir éxito nas atividades de linguagem ~ cuje relevaincia depende, antes de tudo, daquilo que se tem 2 dizer, pois a linguagem é uma atividade de expresso, quer dizer de par para fora. & fundamental, portanto, que haja 0 que expressar, ou seja, 0 que dizer. Evidentemente, insisto, nao é a gramética que vai suprir essa fungéo, A irrelevancia de certos discursos, por exemplo, nao deriva do pouco conhe- cimento gramatical; deriva, em prinefpio, de nao se ter 0 que dizer; deriva daquilo que comumente chamamos de pobreza de informagéo, Portanto, informagées, dados, ideias, princi pios, temas, visdes, perspectivas, hipdteses so a pélvara que dé efeito ao gatilho da interagiio verbal. A gramatica é apenas uum dos componentes que tornam a pélvora inflamavel DAs regras de textualizagio (ou regularidades, como querem alguns) também comporiam um programa avangado de estudo da lingua; isto 6, a exploragéio das propriedades do texto — incluindo, é claro, os recursos de intertextualidade, coesto e coeréncia, o que, na- turalmente, retiraria do foco a formagdo e a andlise de frases soltas, Essas regras compreendem tudo o que é exigido para que se elabore ‘um texto conforme as determinagdes de seu tipo (narrativo, deseri- tivo, dissertativo) e de seu género: fazer um editorial néo é 0 mesmo que dar uma noticia; fazer um antineio é bem diferente de redigir um requerimento, um convite, por exemplo. Essas regtas compreen- ron mtb BA GRAMATICR dem também o conhecimento de como dosar a informacdo (entre 0 j4 sabido eo ainda desconhecio), de onde distribui-la ede como optar Por determineda sequéncia e divisio do texto. Compreendem ainda Propée Beaugrande: “O trabalho com textos mudaria a paisagem {eéricae prtica da Linguistica"; ao que Neves (2006, p. 31) nevesten. ta: °F, com eerteza, a visio da gramética”. Ou seja, um programa de éstudlo da lingua que incluisse as regras de tectualieagdo seria bom mais amplo — bem mais relevante ~ do que aqueles que petpas. sam (em todas as gramiéticas) a série das classes gramaticnis ¢ de ss sintaxes, culminando, numa espécie de apéndice de concessao, com as figuras de linguagem, A exploragéo do comportamento linguistico, que as conven {ambémn preencheria um programa mais que gramatical de este da lingua. Bssa exploragdo teria como objeto tanto as aividades Go enunclador quanto aquelas do parecizo da interagio, sobretucs sariles que acontecem em contextos piblcos formas Fazem parte dessas Convengées, por exemplo, as normaa de como yaticiper de de uma reunido, de um debate, de como interpelar alguém hierarquicamente superior, enfim, que expressdes ou pdt. cas de polidez séo convenientes para essa ou aquelastuagio, Enfim, 4 um programa de estudo da lingua poderiam ser somadas muitas atividades de. ‘exploracdo e andlise das condigdes cognitivas, textuais © socials que tornam as atividades de linguagem funcionais e rele. Pensar sobre a Linguagem; tentar vé-la por dentro; tentar entender g eneaixe das pecas que fazem seu funcionamento interativo, CAPITULOR Explorar nomenclaturas e classificagdes nao é estudar regras de Qramatica y oe | ‘O TERCEIRO EQUIVOCO diz repaio a i cate eg im enomenclatura gramatical. Quando alguém Siato os erminangte nomenclaturas das Aiferentes Sass te Yibras 4 estudando gra- favras, 6 comum ficar a impressio de que se est : - Br Isto é, em geral/ a passagem pelo terreno das panes trie mig de pais, profeeorese alunos —, pois da ideia de\que se eta énsinando gramatiea, “garantia futur bom Sessa eemunicativd , sem diivida, “porta aberta para 0 ‘sucesso profissional posterior”. De futo, jf nas primeires séris sine naaeny ooeet de todos por apresentar, com se tudo, os substanti esas os verbose demas conta do roxio tral inidade - uid, se fazer, da leitura de textos, a opor‘u cf-lose gritos B.A motida qu se avenge aes, aang a= bém na discriminagéo das diversas subdivisbes de cada classe, ‘pormenares que chegam a confundir mais do que a esclarecer. Com tal exploragac n cao de el cristaliza a “certeza” de sola veria ser — o estudo da categorias gramati ; eais, se que a escola esta oferecendo — como de. pa Ora, falta & maioria das pessoas leigas em questées lingufstica s is a clareza para discernir entre o que sao v sto apenas elementos da terminologia grama sano ae oe eo nomes das unidades da gramdtica, emia rahe Essa dificuldade de discerni ‘ Viesse sozinha. Ocorre que ~ como jé discuti antes cla coexiste com outros equivocos; por exemplo, com o sin de acreditar 7 , ct com o simplismo de acredit: ~ercicio das atividades de Linguager, Como se vé, um iy Um equivoco agrava o outro. Ou sea: a grametioa no basta, © 0 que ior, o que se extudana escola nda chine @ Ser a gramdtica relevante et ina 6.1. 0 aur sio REGRAS DE GRaMAricA? ita AAs regras, em qualquer dominio, so normes, séo comandos, so Principios que orientam ou diseiplinam a rea izagao de determinada ina EXYLORAR NOMENCLATURAS & ELASINCAGOES NRO € ESTUDAR REGRAS DE CRAMATICA atividade, Uma regra — como define o diciondrio — “regula, dirige, rege, governa”. ‘No Ambito desta nossa discussao, as regras sdo as normas que es~ pecificam os usos da ingua, que ditam como deve ser a constituigio de suas vérias unidades, em seus diferentes estratos (0 fonol6gico, 0 morfossintético, o semfntico, o pragmatic). As rogras gramaticais implicam, portanto, o uso das unidades da lingua: o como deve ser, para que sejam obtidos determinados efeitos de sentido e de intengéo. Dai que as regras so naturalmente preseri- tivas, no sentido de que estabelecem as normas de como deve ser ou de como néo deve ser o uso das diferentes unidades linguisticas. Se- rio, portanto, tanto mais signifieativas quanto mais contemplarem a Iingua em exercicio, a ingua que, de fato, usamos, nos diferentes meios e suportes da comunicacao oral e escrita. Por exemplo, io regras da gramdtica do portugués: » deixar o verbo na primeira pessoa do singular se o sujeito da oragiio se refere & pessoa que fala (Bu gosto de ouvir mtisica brasileira); » pér oartigo antes do substantivo (0 Livro}; » usar o presente do indicativo como nticleo do predicado em definigdes e verdades universais (0 homem é um animal ra- cional); (0 homem é mortal. > deixar sem flexdio de género ou de mimero os pronomes inde- finidos alguém, ninguém, tudo, nada, algo; » alterar a forma dos substantivos para indicar flexio de género (gato; a gata); > usar o demonstrative aguele (e suas flexes) se a coisa referida estd longe (Aquela casa é a casa onde moro). ‘Essas e muitas outras sio regras. Quer dizer, orientagdes que prescrevem como fazer uso da lingua em. determinados contextos. Diferentemente, como se vers logo adiante, de nomenclaturas. esse sentido, vale a pena lembrar que as regras de gramética ‘nao existem apenas para regular o uso culto da lingua, como, por n meios da inter-relagai wo social e marea da id repos, leva a esse cuidado, para que a lingua mane eel os es endo perca a cara quetem, mantenha seus pa Bss i uct Jexbitaae das “eres Bramaticais fo implica, contudo, 4 Usudrit - . 7 {azendo de qualquer coisa o que bem cure enue an Eporisso que as lin nguas sto sistema: a Brie ae um componente — vs ee: & que elas sao att nt flexivel que fixo, a di ae ene tt fenteal ede mai ain fares constituintes da situagaodeinteragay dependéncia PeaDortuguts a posigdodo artigo faz parte daquele comp Daf por que, como mostra Rodrigues (2002, p. 13), ao lado das Fay Compulsérias” (relatives a um tinico uso Socialmente ace|- [XPLORAR NOMENCLATURAS € CLASIMCACDES NKO f BSTUDAR REGRAS DE GRAMATICA as opedes proferenciais (aquelas mais escolhidas entre varias aceitéveis); » as opcdes tipicas (aquelas mais frequentes entre varias accitaveis); Das opces alternativas (aquelas escolhidas com 0 mesmo grau de aceitabilidade e de frequéncia); as opcdes restritas (aquelas aceitaveis apenas por uma parte dos membros de uma comunidade). Como se pode pereeber, das regras compulsérias as restritas, hé um grande terreno onde se move aquele componente flexivel da lingua e onde o usuério pode jogar, no sentido de fazer suas esco- Ihas, conforme as intengdes comunicativas ou estéticas com aue conduz seu jogo. Parece que é outra a experiéneia da escola no tratamento das re- gras gramaticais, Pelo que sabemos (e vivemos)), tudo o que é ensina- do como regra de gramdtica assume um carter compulsério, Como se fosse uma lei. Um tinico modo de atuacéo. Sem relativizagbes; sem ‘atenuagdes. Sem qualquer coisa como: “Depende!” Desse teor compulsério, se passa, naturalmente, ao terreno do erro, do descumprimento, da culpa, do sentimento de incompetén- cia, tao reforcgado, e com tanto éxito, pela escola. Em geral, 0 livros didéticos’ néo se arriseam muito: quando se trata de gramétiva, s6 propdem exercicios fora dessas relativizagées contextuais; quase nunca exploram uma questo gramatical que ad- mite variagao. Vale lembrar que a consideragio desse lado regrado da lingua 6 se toma relevante se a gente procura ver, examinar, descrever (8 usos reais, que constituem amostras de linguagem efetivamerte 1 Por falar em liv ddtico, merevelernbrarastuagio significativa que vem texdo ‘ programa do PNLD na avaliselo das novaseclegs propostas ao mercado. Esse pro- ‘rama tem proporclonado exclentesrellexdes sobre a fungi do lve dito na pritiea ‘edagégics, berm como tera desenvolvigo uma série de critrios perspectives de aveia~ (o desoe material, que eforgam a visio dieursvae sociointaracinista da linguagen., % Draticada pelos falantes e nfo a los fi apenas as is ~ como possbildades&dsposiio dos usnaniag nn reas Em geral, a escola se fi oe is saree pete ea ta es padres dens dea de ana os li jomnai: i 0s Tos jomnais, nas revistas, nos cartazes, na boca do ovo, enfimn. Na lingua certa do povo, como disse Mame! Bandeira. Por exemplo, faz parte daquele padra: dhe deters verbs exam cure ee Pau Posigtio (assistir a; depender de; morar ; morar em ete) ea podem ir cristalizando outros pacroos, tee ae de ido prevista ow pel ° sae ein ou Pelo uso de uma outra, com ou sem alteragao . aon ae nenhuraa lingua tem seus ‘padrées absolutamente. fixos pune Ocwesiznitica dizer questémesmoaquelespadroweon dee ean Vewadecompulsros apenas por alguma fragao de earn fm geal, uma frago larga, dependendo do que os fteancs Jaren coneordando como devendo mudar ow consent A + oe ‘ ‘is como itor, innit (Po oe a Q os une ). Nao admitem mudancas. Basta ver, por aris, lade que hé, na prética, para se aceitar o verbo assistir Sei preposigao (assistiro jogo), como, atualmente Omesmo se poderia dizer do so de pronomes obliquos no infci Ae frases. Como continua insistindo que, 10 partugués do Bras complementos prevedidos de pre- | [BPLORAR NOMENCLATURAS E CLASSINCAGOES NKO f ESTUDAR RECRAS DE GRAIWATICA interdig4o de comecar urn perfodo com umm pronome obliquo tem um caréter compulsério? Com base em qué? No padrao ideal da lingua? Nos padrées de épocas passadas? Ou nos usos reais que os usuarios azem da Iingua, agore? Basta ouvir e ver para se ter a resposta. A esse propésito, ainds, por que deixar de fazer referéncias explicitas a0 fato de que o pronome ¥ds, no Brasil, praticamente desaparecen? ‘Temos que reconhecer: hé quem lute também contra as mudancas linguisticas. Parece que se sentem ameagados. Ou, pelo menos, tém dificuldade em reconhecer que as mudangas ja aconteceram e que sio, de alguma maneira, irreversiveis. A kingua fui; e ninguém pode deter 6 seu curso. [sso nao significa, contudo, que esse curso desga A deriva, sem que nadia possa controlar seu fluxo. J4 vimos que a prépria ean= digdo das linguas, de serem marca da identidade cultural dos grupos, funciona como forya estabilizadora que regula e controla as variagdes. Duas notas a mais merecem ser acrescentades. A primeira se re- {ere 20 fato de que, em geral, quando sefala em ensino de gramdtica, se deixa de indicar se se trata de lingua oral ou de lingua escrita, ‘As palavras, as frases, 0s perfodos so analisados muma perspectiva aérea, como se fossem coisas autOnomas, com leis préprias e inde- pendentes de suas condigdes de uso. Sio assim ow assado, e pronto. Sem se fazer a consideragio de que, no oral, “so assim, mas, no escrito, poderiam (ou deveriam) ser diferentes”. Quer dizer, o discurso da escola sobre a lingua considera-a como uum grande bloco homogéneo; uma entidade uniforme, sem possibi- Tidade de variagio, Pelo contrario, nesse discurso, deveria existir ‘uma lingua que é falada, e outra que é escrita; uma lingua informal, uusada nas situagdes de descontracdo, ¢ uma lingua formal, com um. vocabulétio e uma sintaxe especfficos; uma lingua para informar, outra para convencer, para seduzir; uma para explicar, outra para refutar ete. Sem 0 equivoco, como ainda acontece, de acreditar que aquilo que é da lingua falada néo merece ser explorado. 2, A propésto do tema varagio linguistics e sua relagéo com o ensino da Lingua smaterna, sugiro a Jltura do live de Bortoni-Ricard (et. bibliograia). Nese trabalho, 7s Como se deve ou néo fazer, ee verdade, um exame dos eo Cintieamenie, evela que essas graméticas tém muito de Seo de quent Os, Se ocupam bastante de mostrar <1ue & agua dispde (pronomes, adjetivos, advérbios endo tém nada de descritivo e de explicativo, Voltando 20 foco de nossa discussai Valiando 1ossa dliscussio e tentando sumari i. 0 qe o equivoco em andlise tem seus desdobramentos na » falta ainda muita cla fs ae reza acerca do que sio “regras” de D essas regras so considerad: ss las como “leis i oe otek 10 “leis”, como determina- x Bio considered intakes ‘AO as discriminamos como Tnais a pertinente a crita, a esse ou Aquele contexto; aimee compéndios de gramética, se trata- | [EXPLOTAR NOMENCLATURAS £ CASSINCAZOES NAO E ESTUDAR REGRAS DE GRAMATICA » vemos preserigdes até mesmo onde s6 existem descrigdes. Nesse fogo eruzado, salva-se quem pode! Mas aqui também a corda se rompe do lado do mais fraco Vale a pena reiterar que das concepedes acerca da gramética de- corre necessariamente o modo como as coisas so tratadas. Assim, numa concepgao de gramética como um conjunto de regras fixas, intocdveis e indiscutiveis, falta lagar para se admitir uma zona de oscilagdo. Noutras palavras, faltam regras cuja aplicacdo dependa das condigdes de uso, das intengdes dos interloeutores e, até mesmo, do gosto, das escalhas estilisticas desses interlocutores. As linguas tém, em seu comando, pessoas; seres atuantes, suje’~ tos ativos, capazes de administrar, entre possiveis opgGes, aquela que mais se ajusta a situagdo. E preciso, sempre que oportuno, mos- ‘rar ao aluno contextos em que ele pode escolher entre uma forma ou. ‘outra, entre uma organizaggo ou outra do periodo, do parégrafo, ou até do texto. & preciso explorar o lado de flexibilidade dos padres inguisticos, até mesmo porque o que no é flexivel jé esté inter namente sabido e arraigado (ninguém coloca, por exemplo, o artigo depois do substantive ou o artigo feminino antes de uma palavra sebidamente masculina), Ea outra parte do equivoco? Vamos a ela 62,0 QUE SAO NOMENCLATURAS GRAMATICAIS? O termo nomenclatura supée, evidentemente, nomes. Cada cién- cia, eada drea de estudo tem seu préprio conjunto de termos com os quais se refere as coisas de seu campo. Essa atividade de nomear, de dar um nome és coisas, é uma atividade constitutiva da relago entre o homem ¢ 0 mundo, ¢, simbolicamente, esteve presente desde ‘2 inauguragio dessas relagoes, quando “o homem foi chamado a dar 7 Mumm Aut OA Gitatimcn homes ds coisas”. Com efeito, referir-se as coisas pelos seus devidos homes constitui um recurso ‘para que tais coisas sejam ‘identificadas pelo parceiro da interacéo com mais chance de sucesso. Com o mundo da Lnguagem néo ¢ diferente, As nomenclaturas Bramaticais, como o préprio nome indica, dizem respeito aos nomes ave as unidades da gramitica tém. Funcionam como rétulos, como expressies de designagéo, para que a gente posse, quando necessé. 1 falar de todas elas chamando-as por ses nomes, embora fam. bémexprossem determinada visio dos fatos que designam, Mas nay fio regras; nfo regem esse on aquele padi, Nao implicam, portan, ‘6, competéncias para alguém falare escrever melhor, como neredi. ‘am alguns que ensinam essa “igramitiea” essa forma, as nomenclaturas nada tém a ver com norma cult, taun Rorma-padrdo ou nortta néo padréo. Distinguir um eomple. nem norma nao padrao, Simplesmente nao é ‘norma nenhuma. Além disso, ndo se pode pretender que a nomenclatura gramatical ‘vigente constitua a tinica forma ceria de nomear 0s fatos linguisticos. Sebe- mos que & nomenelatura que usemos tem muito a ver com aslinguas ocidentais que promoveram a tradigao gramatical. £ muito provavel ue se a linguistia tivesse surgido na China, ndo terfamos tndos os rétulos que Lemos atualmente, © mesmo vale para as linguas indi- Gus gue 86 elas tém e que so desconhecides das linguas europea Pio, até muito recentemente, recebia orto de “planeta” ue foi fansiderado inadequado pelos cientstas da Srea. Iso € vilide tam, bét para as nogdes gramaticais: muitas das nomenclaturas atuais Podliam ser contestadas, pela inconsisténcta de seus termos! Ou sel, ndo devemos atibuir& nomenelatura um valor que ela rio tem. De fato, o grande engano ¢ aereditar que vascilhar 9 tox Pe cet como Peis 88,200), Bag (202), pot exerplo, questi ‘ama consslnea de certas nomenclaturas até de cers defnigice As CaANTICA [XPLORAR NOMENCLATURAS ECLASSIRCAGOES NAO E ESTUDAR REX das reno das nomenclaturas e exercitar 0 reconhecimento dos nomes unidades constitui ensino de gramética e, pior ainda, eonfere com- peténeia a quem ensina e a quem aprende. Mas tuma questéo ainda permanece aberta: o conhecimento as menclaturas, que fang ter? Ou: como fe, afinal, a questo da nomenclatura! Se explora? De que jeito? Quando, em que momenta? As nomenclaturas tém uma funcéo, sim; consequntemeni, conhecimento também. Elas tm a funco de permitir que ai es da lingua sejam designadas pelos seus nomes pon amps pola de scm tac on as suas condigdes de producio. Evidentemente, um diseurso em que as unidades da sramstn so chamadas pelos seus nomes deve ser aquele peiprio de uma soci de andlise da lingua, seja numa aula, numa mite een semelhante. Além disso, a andlise da propria betes pote fovrecer ma malo compreensio do quesjam as undaes cates eas rats deorinadas Por explo ass “stan “pessoas do dscuno’ Yemplemerto verbal, agente dep outros j4 fornecem pisias pars a Lungéo das unida jogo. Portanto, é conveniente que saibamos, numa atividade de ans, derail sobrea ing chamar asus pls ses os = nes io eres una compen amis rekevante, con disse, se 0 contexto assim o exigi: Sem divide neni, se abe mento da nomerclatura gramatical lamb fz parte de nos eae to enciclopéico ¢, de certa forma, de nosso repertérioc “A atividade metalinguiton 6 indlgpncel & construgio do abe soe gu” (Nee, 200, 259, sed quando € postura critica de analisar a consisténcia de certo termo O importante é que saibamos ir além da nomena a i sad ‘vimos insistindo; atribuir-Ihe.a fungéo que, de fato, lhe ca i nomear as unidades da lingua, sem que tenha, portanto, um, 9 80 ‘Muro Att" 04 cRawericn ‘i mesma. Nao teria sentido, reitero, confundir o estudo da nom: clatura com 0 estudo da gramatica, Certamente € essa confusio o que estd na base daquela perg Ge uma professora: “Nas primeiras série, a gramitica néo poderia ser relirada totalmente"? Na verdade, o que se pretendia “rotirar F Ao lmgo de nots reflex, wou pontuando elementos ens pondem a essa questio de fundo. De qualquer fora, Bepats ara a neessidade de que oesino de gramitin deve represenat : io — significativa, mas insuficiente — de um projeto ma togls de poli lingua. Projeto que, da edueagdo infantil ao e- fine meio, em atengae a demands diferentes, procura partir da- sramdtica nunea pode ser retirada da lingua. Nem cedo nem tarde. Nem poueo nem muito, Ela estd na lingua, Bla é parte da lingua Com efeito, nio hd por que se apressar e trazer para as primeiras sérles a estranheza da metalinguagem, com definigées,classifien /ORAR NOMENCLATURAS CLASSIRCAGOES NKO ESTUDAR REGRAS DE CRAMATICA ‘goes e subdivisdes. # hora dos primeiros contatos da crianga com a Teflexio sistemética sobre o mundo da linguagem: que essa reflex, nesse primeiro momento, néo perturbe a possibilidade de admirar 6 quanto esse mundo é fascinante, O didogo a conversa, a eseuta de historinhas, os relatos, as jus- {iffcativas é que devem preencher as situagées orientadas ‘para o de- Senvolvimento especffico da linguagem. Além disso, a leitura de bons textos, cheios de interesse, de graca ou de poesia e de enearntamento €omelhor caminho para levaraerianca a descobrirum sentido para a hnguagem, para a escrta eos mins em que ela era livros ‘als, revistas, faixas, cartazes, placas, meios eletrénicos etc). O equivoco em anélise neste capitulo também se manifesta nas vores de quem pergunta: “Se ndo é para ensinar gramatica, enti, Para ensinar o qué?” Qu: “Como ensinar acentuacdo sem usar regra?®* Mas quem disse que nao é para ensinar gramética? Quem disse Aue nfo € para usar regras? O problema & muito mais amplo: esta em saber o que é gramética, em que consistem suas regras; como se deve ensind-las, Parece haver uma pengunta de fundo que nos ajudaria a com- Preender melhor a questo nada simples de como conduzir 0 ensino da lingua. Essa pergunta se resume em: 0 que érelevante aprender ilo que o aluno sabe para chegar ao dominio do que ele aes saber ‘ivilegiande, & claro, a dimensio integral, social e coletiva desenvolvimento comunicativo aleancado. ; O terceiro equivoco também no resiste a uma consideragio mais fundamentada. Ou seja, De certa forma, as implicagdes pedagégicas desse - ats contidas no capitulo precedente. De fato, ir além da gram: = plica também ir além da sua nomenclatura. No extant, val i tes de gramética, t ertinéneia de que, ao explorar questdes de Sera i ccandigdes de seus us0s ¢ nos efeitos sieemaling pos bilitados pelo recurso a uma ou a outra regra, o que, naturalmer nos leva a: | . » fazer da nomenclatura um recurso, uma mediagio, umposto de paissagem ¢ néo um fim, qu um objeto isolado de estudo si to menos, de avaliagdo, Consequentemente, os muitos exercicic at “ando Brant — passam a ocupar um tempo minimo das atvidades Gesala de aula. Até porque se nos detivermes em um programs co fafase nos componentes textual e discursivo da lingua, vai falta, ‘tempo para atividades de simples reconhecimenta de substantivos, verbos adtvérbios, digratos, encontros consonantais, funcdee snide cas de termos ou Jocugdes ~ ¢ outras coisas similares, Em relagdo zo ensino fundamental, sobretudo nas séties ini. Gals, € recomendével que a exploragio da terminologia gramatical reed muito pouca atencdo, Na verdade, esse é 0 momento dos rie Telros contatos sistemsticos do sujeito com a reflexzo sobre a facul. ade da linguagem, 0 ideal seria que questaes ‘eminentemente termi- nolégicas ou de nomenclatura nao viessem embotar 9 encantamento ue se poderia despertar pela contemplacio do potencial de atuagéo de interagdo assegurado pelo uso da inguagem (lteraria ou ni). } 0 simplismo de que conhecer a termincloyia da gremética terre a) aoes0 do aluno & norma prestigiada da lingua cai por ferzs duando se considera essa terminologia nos limites que ele ce {ato tem: o de possibilitar uma denominagdo adequala des unidatne ci gramétiea, quando as atividades de andlise da lingua tém lugar Fora dessasatividades, 0 recurso as terminclogias metalinguisticas ‘ndo tem sentido. ‘mento da linguagem e sobre o que iss significa na via das pessoas, Me permitam um pequeno exemplo de uma atividade de “Linguagem’ RAS OE GRAMATIA ECLASSIICAGOES NRO € ESTUDAR EGR EXPLORAR NOMENCLATURAS Leia o texto.e facd o que se pede: “Sou pretinho... : ee pretino de uma-perna’sé. ~~ Uso gorro vermelhinho E-cachimbo de cipé. Faco cada traquinadal g Eu sou @sperte como eu 56... oe Retire do texto palavras com: ‘Uma silaba g Duas silebas

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