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4 SUPE UNIVERSIDADEDE PASSO FUNDO Timo Santos elisa Furlanetto Graeff VieeReiorade Greduncho Solange Maria Longhi VieteiradePeqiane PéeGrndado Jaime Giolo Wee Retordetstennioe -AsuniorComimitivon Lorivan Fisch de Pigueiredo ViceReorAdminisati José Gaston Hilgert “Mario Maestri Editors (CONSELHO EDITORIAL, José Gaston Hilgert ‘resdente Friederich W. A. Froebel DEDALUS - Acervo - FE OA 20500022675 A EDUCACAO DO HOMEM Maria Helena Camara Bastos Apresentacio ¢ traducao Universidade de Passo Fundo 2001 vis Biblioteca / FEUSP 4351 Copyright © Kaltora Universitaria Maria Eimitse Lucatelt torn deTewo Ga: dodo DanidlerCasciese Revidode csi 7 de Chamada Cina jot Vln To Memon becaca BI! onde Bede Charles Pimentel da Siva eli, no toda ow em prarte, conforme determinacéo legal, no ode serreprodtuzido por qualquer meio sem artorizagéia express e (por escrito do autare da editora, Traduido do orginal em espanhol: FROEBEL,F. Da efucacin det hombre ‘iaclucin del alernén por Luis cle Zahueta Madi: Daniel Jorro Ed, 1915, 454 p 8256 Frochel, Friedrich WA, ‘Aecineagio do homem / Freaich W. A. Frogbel tradgio de Maria Helena Gimara Batts. — Passo Fr ‘UPR, 2001 28. |. Eduragio 2. Teorla da edvencdo 3. Letra 1. Bactos Mav Helena Csr tel Ih: Vitlo cou: s7018, \alogacio a fone Bibliotecria Suzana]. D. dos Nels CRB 10/1 ISB - 85-7515-015-4 UNIVERSIDADE DE PASSO FUNDO. Editora Universitéria ‘Campus I, baiiiw Siu José Fone 0(*)54 316-8974 '99001-970 Passo Fundo- RS - Brasil ‘Home page wuw.upf.tche br/editora Apresentacao ‘as poucas caminhadis que tetho realizado peia educagéo in- fantil, dois fatos chamaram-me reiteradamente a atengio: a profustio de citagdes sobre a obra de Froebel, retiradas de fontes secun- arias, e a constatagdo de que as suas obras fundamentais nao tiveram tradugdo no Brasil, O acesso a sit principal obra - A educagiio do ho- ‘mem - ocorre através de tradugdo espanhola, do infcio deste século (1913), e francesa, da segunda metade do séculc XIX, encontradas em poucas bibliotecas brasileiras. Com a expansdo de cursos, estudos € pesquisas relativas & edu- cago infantil, constata-se um discurso caracterizado por Kulmann como: “O passado teria sido necessariamente atrasado e o que se estd fazendo inaugura uma nova era; agora, a instituigdo seré educacional, agora se dard importancia ao brinquedo e & brincadeira, agora se comegaré a aten- der as necessidades da crianga, expresses que, surpreendentemente, podem ser encontradas em textos do século pasado”. Essa ilusio do novo decorre tanto do desconhecimento da hist6- ria do seu objeto de estudo como da leitura dos textos fundadores que contribuiram para a hist6ria da infancia. Autores como Comenius, Rous- seau, Maria Montessori, entre outros, tiveram suas obras traduzidas ¢ publicadas no Brasil ao longo do século XX. No entanto, com Pestalozzi? € Froebel ndo aconteceu 0 mesmo, encontrando-se somente fragmentos de capitulos de suas obras ou a apropriagao de suas idéias por meio de outros autores, principalmente de tradugées de revistas ameticanas - nos artigos da Revista do Jardim de Infancia, publicada no final do século XIX, em So Paulo? No Brasil, na segunda metade do século XIX, principalmente a partir da década de 1870, as idéias de Froebel comecaram a ser divulga- das por: dr. Joaquim José de Menezes Vieira, que criou o primeiro jardim TT RUNLMANN Ie, Mayda Tiftnca € educogdo infant. Uno sboidegem histea. p. 5 Tnconu afima que Pestaiozal "aio teve nenhum de seu textos itersinentetrduzidos v0 Bros nem de seus dsctpuos iets velo 20 Brasil nenkumna escola oa Insnydoe inspeoe hai it cm fe canestonn coms INEONTL, Ce, Pens ein « > BARARD. Resumo dey princes de Frocbel.Tadosbo de Zaina Roti do Kinderserien and Chis Culture: WIEBE, Edward. A educagdo frocbeliona, Tradogso por G. Presi 30 Parasite of Childhood. Revista do Jardin de Infeta, Ss0 Polo, m2, 1897. Cronologia 1782... Nasce, em 21 de abril, Friedrich Wilhelm August Froebel, sexto filho do pastor Iuterano Johann Jakob Froebel ¢ de Jakobine Friederike Hoffmann, na Vila de Oberweissbach, do Principado de Schwarzburg-Rudolstadt, situado na Floresta da Turingia, regitio asudeste da Alemanha, Fica drffo de mae com menos de: um ano de idade. ‘Muda-se para Stadtilm, onde faz a escola primétia, sob a prote- ao de um tio materno. ‘Aos quinze anos, trabalha como aprendiz de um guarda-flores- tal, o que, sem ddvida, teve grande importancia na sua forma- do espiritual, pois nessa experiéncia aprendew a interessar-se: vivamente pela natureza, 1780 ..... Matricula-se na Universidade de Iena, no curso de Filosofia, ‘mas estuda as ciéncias préticas: matematica, mineralogia,fisica, quimica, direito administrativo, silvicultura e arquitetura. 1801... Volta & casa do pai e trabalha, alguns meses, como guarda-li- ‘vros de um dono de fazenda, adquirindo alguma experiéncia em atividades agricolas, ‘Morre seu pai. Em Markt Baunach, ocupa 0 cargo de est da administragao florestal. Muda-se para Bamberg, onde exerce © cargo de auxiliar de agrimensor, cabendo-Ihe desenhar mapas. 1804... Vai para Frankfurt a fim de estudar arquitetura, 1805 ..... Preocupado com a sua subsisténcia, procura uma vaga provi- e6ria de preceptor na Escola Modelo. O diretor, Gottlieb Anton Gruner, que havia se atualizado com Pestalozzi, em Iverdon (Sui 6), inicia Froebel no conhecimento da obra do educador suigo © na descoberta de sua vocagio. 1808... Interesse-se em conhecer pessoalmente a obra de Pestalozzi, per manecendo dois anos em Iverdon, na Suiga. 1811 ..... Volta & Alemanha, onde estuda ciéncias naturais, na Universi- dade de Gottingen, e formula, pela primeira vez, sua filosofia da esfera ~ lei esférica - “a exemplo de todas as coisas da nature- za, também a tendéncia dos cristais € a exteriorizagio do seu cen- 1792 4 A edacgt to homes, sua teoria cdim de wo", fundamento de sua pedagogia e que influenci io, pedagogia escolar © teorie do jogo no ‘ aprofundar seus estudos de cristelog:cfla, vai para Berlim dar com © assistente do’ prof: uel Weib, fundador da cristalografia, Ante a invasio das tropas napolednicas ( Campanha da Rués- sia), alista-se como voluntério, vindo a conhecer, entio, seus companheiros insepardveis: Langethal, Middendorf e Bauer. ‘Terminada a guerra, volta a Berlim a fim de dar continuidade aos seus estudos universitérios ¢ assumir 0 posto de inspetor do Museu Mineral6gico. 1816 ..... Entrega-se, definitivamente, & educagéo das criangas, fundando ‘sua primeira escola - Instituto Geral Alemao de Educagao -, trans- ferindo-se para Keilhau (1817 a 1831), de forma modesta, com sua mulher ¢ dois colaboradores. 1820/23 . Publica uma série de brochuras sobre a experiencia de Keilhau: Ao nesso povo alemao (1820); A educagdo corajosa e suficie te, ~ consentdnea ao cardter alemdo; Principios fundamentais, meta e vida interna do Instituto de Educacdo de Keilhau, consenténeos ao povo alemao (1821); Referéncidis ao Instituto de Educagito de Keilhau, consenténeas ao povo alemdo (1823); Sobre a educagao alema em geral e sobre 0 que hé de alemao ‘em especial no Instituto de Educacao de Keithau (1823). 1826... Publica 0 livro A educagdo do homem, arte da educagdo, da instrugdo e do ensino, colimada no Instituto de Educagao de Keilhaw, consenténeo ao povo alemao (v. 1, até 0 inicio da adolescéncia), no qual apresenta ¢ teoriza suas experiéncias pe- dagégicas iniciadas em 1816. Comega a publicagao do jornal - revista semanal A Familia Educadora, destinado a divulgar seu sistema de educagao. 1827 ..... Faz uma tentativa de fundar outra instituigo educativa em Helba, mas fracassa. Esse projeto previa um conjunto de instituigdes educetivas: uma instituigdo de cuidado pata érfios de trés a sete ‘anos (precursor do jardim de inféncia); o Instituto de Educagao Popular, que comportava uma tendéncia de educagio ergondmica, © outros estabelecimentos, como um colégio cha ‘mado Escola Politécnica ou Estabelecimento de Formagio a Arte, 0 Comércio e & Indiistria Alema, ¢ um liceu, 0 Instituto Geral ‘Alem@o de Educagio de Keilhau. 1813 1814 Is Se 1829 ..... © colaborado: de Froebel, Barop, assume a diregao de Keilhau Para preservé-lo da faléncia 1831 ..... A situago politica da Alemanha considera subversiva sue obra, por isso, ele tem de refugiar-se na Sufga. Gragas & familia von Holzhausen, é convidado a abrir um instituto privado de educa $0, no Castelo de Watensee. Esse instituto, no entanto, nfo se mostrou vidvel, sendo transferido, depois de dois anos, para Willisau, no canto de Lucerna, 1833...... Redige 0 ensaio “Princfpios da educagéo do homem”, no gual aptesenta sua posicio pedagégica. 1834235 . E convidado pela administragao do canto de Berna a ditigir um ‘orfanato para pobres. Apresenta quatro projetos, os quais se referem & experiéncia de Keilhau e insistem na importincia da atividade criativa, tendo como ponto de partida “o desenvol- vimento natural € harmonioso das faculdades das criangas”, ¢ por objetivo “o progresso ¢ a felicidade da humanidade*, O orfanato nfo: é criado, mas Froebel € encarregado de formar ‘quatro professores-aspirantes e de dirigir o curso de aperfeicoa- mento para professores primérios. Posteriormente, ¢-Ihe confia- da a dirego do Orfanato de Burgdorf e ele é encarregado de instalar uma escola priméria, inaugurada em 1836. 1835 ..... Escreve o artigo programético “O novo ano 1836 exige uma re- novagio da vida", no qual apresenta a educagio esférica da crian- ga em familia, permitindo-the, assim, redefinir a familia sagrada, 1836 ..... Falece sua esposa, Retorna a Alemanha ¢ estabelece-se em Bad Blankenburg, Ao mesmo tempo, cria seu material de ocupagdes € concentrago, ou seja, inventa os jogos gindsticos ¢ as can es de bola, aos quais chama de dons. 1837... Funda o primeiro jardim de inffincia (Kindergarten), Também fun- da uma fabrica de brinquedos, denominada “Estabelecimento para 0 cultivo das disposigées naturais da crianga e do jovern.” Cria ¢ dirige a revista Fotha Dominical, na qual especifica os objetivos dos brinquedos. Projeta a criagdo do Instituto de Formago de Guias da Infancia, inaugurado em junho de 1839. Aparecem os primeiros dons, com ‘0s seguintes cademos de textos: Primeiro domi: a pelota como @ primeiro jogo do menino; Segundo dom: a bola e 0 dado como segundo jogo do menino, Dé a0 seu estabelecimento de ensino 0 nome de Kindergarten, que serve, a0 mesmo tempo, como escola normal para a prepa- 1838 6 1844 1848... 1849... 1850... 1851 1382 1856 1857 ragiio de jardineiras. Por meio de escritos € conferéncias, em- penha-se incansavelmente na divulgagdo das suas idéias peda- 6zicas. Publica a obra Mutter und Koselieder (Cangées para a mae que acalenta 0 seu filho), dedicado as mies, com vérias cangSes para ajudar a mae a estimular sensoriamente a crianga e brincar com ela no primeiro més de vida, Para Froebel, sobre os joelhos da mae deveria comegar a educagao da crianga. Edita Hundert Ballieder (Cem cancdes de bola): Cantos maternos e caricias. Cantigas. Publica, também, Introdugdo para o estudo do ter- ceiro dom. ‘A partir da revolugao de 1848, Froebel esperava uma ampla im- plantagio do seu jardim de infancia. No entanto, a reagio polf- tica também atinge sua obra, sendo acusado de disseminar idéias erigosas para o Estado © pensamentos ateus. Estabelece seu primeiro contato com a baronesa Bertha Marie von Marenholtz Billlow, grande incentivadora e divulgadora de sua obra . Inaugura em Bad Liebenstein o Instituto para a Unificagao To- tal da Vida para a Formagio do Homem e seu Desenvolvimento Educativo, no qual passa a formar as jardineiras Passa a viver num pequeno castelo em Marienthal, gragas & be- nevoléncia do duque de Meiningen, por recomendacio da ba- ronesa von Marenhoz-Billow. Cria um jardim de infancia e fun- da a revista Semandrio de Friedrich Froebel, que teve cingtien- ta niimeros editados. .. Casa-se pela segunda vez. A Prissia profbe o funcionamento dos jardins de infancia, resaltado do movimento clericalista © anti-socialista. E convidado a participa do Congresso de Pro- fessores, ocorrido em Gotha, procurando reverter a sua situa- a. Passa a publicat a Revista das Idéias de Federico Em 21 de junho, morre em Marienthal. Sua esposa continua a dirigir 0 jardim de infancia com a ajuda de Middendorf, Entre 1848 e 1852, so criados 31 jardins de infancia na Alemanha. Estabelecem-se os primeiros jardins de inféncia nos Estados Unidos da América, Na Bélgica, € ctiado o primeiro jardim de inffincia, gracas & di- fasiio do método froebeliano por politicos e jornais liberais, em oposigio as tradicionais “escolas de guarda” ¢ & auséncia de formagio sistematica de professores. Pinch W.A. Pre 7 1860 ..... Liberam-se os jardins de infancia na Prissia e, conseqtientemen- te, difunde-se o pensamento de Froebel na Europa e América. 1861 ..... A educadora Elizabeth Palsner Peabody, grande propagadora da obra de Froebel, abre seu jardim de infaincia em Boston/EUA, 1872 ... O império austro-hiingaro considera o jardim de infancia como compulsério para as criangas com seis anos, ¢ 0 método Froebel, como ensino obtigatério nas escolas normais. 1874... Cria-se a Sociedade Froebel para a promogio dos jardins de infiincia 1875 .... Cria-se 0 primeiro jardim de infancia no Brasil, na cidade do Rio de Janeiro/RJ. O Jardim de Criangas, anexo ao Colégio Menezes ‘Vieira (1875-1887), na Rua dos Invélidos, n. 26, é dirigido por d, Carlota Menezes Vieira, esposa do diretor dr. Joaquim José de Menezes Vieira, Esse estabelecimento utiliza 0 material didético de Froebel. 1877... Em Sao Paulo/SP, na Escola Americana, instala-se a primeira ins- tituigio froebeliana, por iniciativa de protestantes. 1885... A educagdo do homem € traduzida para o inglés. 1892 .... Cria-se em Londres/Inglaterra o Instituto de Educagio Froebel para formar professoras de acordo com o seu método. 1911 ..... Cria-se o jardim de infancia no Deutscher Hilfsverein (Colégio Farroupilha), em Porto Alegre/RS, sendo contratada como jar- dineira Dorothea Gruber, de nacionalidade suiga, que cursara ‘uma escola para formagio de jardineiras na Alemanha Introdugéo Ss uscitar as energias do homem - ser progressivamente conscien- te, pensante e inteligente -, ajudii-lo a manifestar sua lei inte- rior - o divino que ha nele - com toda pureza e perfeigio, com espontanei- dade € consciéncia - nisso consiste a educagdo do komem, Ela nos da, ara esses fins, 0 caminho € os meios. Pont S conhecor essa Ii eterna, adguvirconscitacia dela refetis sobre seu fundamento ¢ sua esséncia, sobre a relagdo, unidade ¢ vitalidade de seus efeitos, saber da vida e abareé-la em sua totalidade, nisso consiste a ciéncia, esta é a ciéncia da vida. Ela € exposta por seres conscientes, pensantes € inteligentes, é exercida neles e, mediante eles, converte-se em ciéncia da educagio. ‘A doutrina a que chamamos da educagdo se refere a0 conheci- mento dessa lei e & reflextio sobre os preceitos que da mesma derivam para seres pensantes ¢ inteligentes, com 0 objetive de facilitar-Ihes a consciéncia da sua missio e a realizagdo do seu destino. A arte da edu- cago consiste na livre-aplicagio desse conhecimento, dessa reflexio, desse saber para a formagio € desenvolvimento imediato de seres racio- nais, porque os prepara para realizar seu destino. O fim da educagio € o desenvolvimento de uma vida fiel sua vocagio - si, pura e, portanto, santa, A sabedoria da vida, ¢ também toda sabedoria, € constituida do: conhecimento e de sua aplicagio, de acordo com a consciéncia, de acor~ do com o desenvolvimento de uma vida fiel & sua vocagio, pura, santa. Nesse sentido, ser um sdbio é realizar a mais alta aspiragdo do homem & ‘© mais sublime ato de sua liberdade. Educar-se a si mesmo e educar os outros - com determinagao prépria, liberdade ¢ consciéncia - é a dupla ago da sabedoria. Nasceu'com a primeira aparigdo do homem sobre a ‘Terra; existiu no primeiro brilhar da consciéncia individual; porém, agora comega a manifestar-se como necesséria e como uma exigéncia humana geral, & por isso, passa a ser compreendida e praticada Desenvolver a educagio € 0 caminho que conduz a vida, 0 tinico: que guia com seguranca & realizacio das aspiragées internas da natureza humana e & realizagio também de suas aspiragdes externas; 0 tinico que, mediante uma vida fiel & sua vocagao pura, santa, leva a bem-aventuranca eterna, Portanto, 0 divino no homem, sua esséncia, deve ser, mediante 2 educagio, desenvolvido, exteriorizado e elevado & sua plena conscién- cia. O homem hé de alcangar a livre-manifestagao desse elemento divino que nele atua se expressé-la numa vida consciente e livre. Também a edu- cago, 0 ensino deve dar ao homem a intuicdo e o conhecimento do divi- no, do espiritual ¢ do eterno que existem na natureza exterior, os quais constituem a esséncia dessa natureza e nela se expressam de um modo permanente. ‘A natureza, de acordo com a doutrina humana, deve manifestar-se ‘mediante um interedmbio vivo entre os dois - a unidade de lei que existe entre a naturzza eo homem. Por meio da educagdo, apresentada em sua totalidade - isto €, como ensino, doutrina e educagao propriamente dita -, ‘ohomem deve levar de forma magniinima a sua consciéncia e & atividade de sua vida o sentimento de que ele, assim como a natureza, procede de Deus, depende de Deus e em Deus encontra seu apoio e descanso. Deve, também, a educago conduzit 0 homem a uma clara visio de i mesmo, da natureza, da sua unio com Deus. Deve elevar-the o conhe- cimento de si mesmo, o conhecimento de Deus ¢ da natureza ¢, mediante esse conhecimento, conduzi-lo a uma vida pura e santa, Porém, para che- gar a tudo isso, a educagio deve fundar-se e repousar sobre o interior © © mais fntimo da personalidade. Todo o interior passa a ser conhecido por meio do exterior: a es- séncia, o espitito, o divino do homem e das coisas 8e conhecem por suas manifestagdes externas, Por isso, as manifestagdes externas do homem e das coisas constituem, para ele, 0 ponto de apoio de toda educagdo, de todo ensino, de toda doutrina, de toda vida que seja testemunho de li- berdade - partindo do exterior, chega-se ao interior e sobre ele se atua Todavia, a educaco no se contenta em deduzir do exterior o interior, ‘mas busca a esséncia das coisas, encontrando-a na dupla relagio do ex- terno com 0 interno e do interno com o externo. Essa multiplicidade ¢ pluralidade que ostenta a natureza nio deve levar-nos a afirmacao de uma pluralidade ce suas diltimas causas, de uma pluralidade de deuses, assim como, tampouco, a unidade de Deus nos fard crer em uma homogeneida- de da natureza, Ao contrério, em ambos 0s casos, a pluralidade da natu- reza deve demonstrar-nos a unidade de seu tiltimo fundamento - Deus, assim como a unidade de Deus, € a eterna pluralidade dos fendmenos naturais ‘Quando nao se aplica tal principio, mas se fata abertamente dele (quando das manifestagdes exteriores na vida da crianga se quer deduzir © {ntimo de sua alina),é ffcil cair em constantes contradicées e debates, perpetuando os erros na vida e na edueagio. Daf provém, com tanta fre- léncia, o desconhecimento da verdadeira natureza da crianga, do jovem ou do adolescente; dat os fracassos em educago; daf a mé inteligéncia entre pais ¢ filhos, tanto por parte daqueles como por parte destes: daf, finalmente, as initeis lamentages sobre a m4 conduta dos meninos, as- siin como também os clogios indevidos ¢ as falsas esperancas sobre 0 seu futuro. Por isso, € tio importante esta verdade - a eterna pluralidade dos fendmenos naturais - em suas aplicagées para pais, educadores e ‘mestres, Deveriam todos esforgar-se em nfo se afastar dela, nem nos seus mfnimos detathes. Assim, obter-se-iam relagdes claras, seguras ¢ pacifi- cas entre pais ¢ filhos, entre educadores e discipulos, entre professores © alunos - relagdes que hoje tratamos de estabelecer em vio. Nao nos esquegamos: a crianga aparentemente boa no o & com freqiléncia. por- que, em reatidade, nio quer 0 bem por livre determinagio ou por amor. ou por respeito ou por conhecimento; © menino - exteriormente rude, obsti- nado e voluntarioso -, 0 jovem que na aparéncia no € bom escondem muitas vezes dentro de si, com livre determinagio, a mais ativa, vigorosa e sincera tendéncia & realizagao do bem. O jovem que parece distraido pode estar concentrado interiormente em uma idéia constante e firme que © impede de atender a todo 0 exterior. E aqui que - originariamente e nas suas primeiras linhas gerais - a doutrina, o ensino e a educacio devem, necessariamente, adaptar-se; acompanhar a natureza e segui-la, porém rnunea prescrevé-1a, determiné-la ou impor a esse menino ou jovem situa- ges alheias & natureza, A edueagdo necessariamente hi de ser assim porque a ago, nfo perturbada, do divino hé de ser necessariamente boa ¢, portanto, nfo pode tender a outra coisa que nfo © bem. Dessa forma, o menino - 0 homem ainda em formagio, mesmo inconsciente e semelhante a um produto na- tural - aspira, em si mesmo e por si mesmo, ao bern de uma maneira deter- minada e segura, eo faz de forma que particularmente convém 8 sua indi- vidualidade; sente-se, assim, com energias e meios para realiz4-la em to- das as circunstincias. O pato recérn-nascido vai A Agua; o mesmo faz.0 pinto, que corre pela terra, e a andorinha, assim que se sente com as penas, no pisa apenas 0 solo, mas busca seu alimento no ar. Ambas verdades educadoras - do duplo processo do exterior ao interior e do interior ao exterior, da adaptagio respeitosa & espontaneidade de cada ser © a suas respectivas aplicagSes - encontram sua plena e mais clara con- firmagao - por mais que as combatamos - quando chegamos a ser homem, quem mais especialmente se referem. 6 Atco dohonem Em geral, tratando-se de plantas ou animais, contentamo-nos em dar-lhes espago e tempo, nio ignorando que, segundo as leis que regem cada espécie, crescerdo bem e adquirirdo um belo desenvolvimento. E 0 que geralmente ocorre com as plantas € animais: se deixados em paz, isto 6, se for evitada qualquer influéncia perturbadora, eles terdo um livre © sio desenvolvimento, Porém, ao contrario, o homem, na sua infancia, parece ser para o homem um pedaco de cera, uma massa de argila com a qual se pode modelar 0 que se quer. Homem que corre campinas e hortas, bosques e prados, por que ndo abres tua alma para escutar 0 que a natu- reza em seu silencioso idioma te ensina? Vé como cresce essa planta que, oprimida, afogada, deixa apenas adivinhar suas proporgées interna re- gulatidade. Mudando, vé-a no espago livre, em pleno campo, ¢ contem- pla com que forga manifesta em sua regularidade a lei interior, como mos- tra em todos os seus aspectos ¢ partes uma vida-harménica, como vem a ser um sol figurado, uma brilhante estrela da terra. Pais, também nossos filhos, que hoje crescem ao teu redor de modo languido ¢ antinatural (porque Ihes impusestes, prematuramente, forma e diego contrérias & sua natureza), poderiam ter-se convertido em seres harmonicamente desen- volvidos, que manifestassem em todos os sentidos suas atitudes livre- mente. Toda doutrina, educagio ou ensino demasiadamente ativos, de- masiadamente inclinados & coagio, demasiadamente abundantes em pres- crigdes tendem, inevitavelmente, a anular, a oprimir e a perturbar 0 ho- mem no que ele tem de espontineo - de originariamente so -, na obra divina que nele se manifesta. Certo é - para seguir em tudo o ensino da natureza - que a uva deve ser podada; porém, a poda, por si s6, no dé nenhum vinho. Pelo contrétio, € muito facil que 0 tronco podado com pouco cuidado, deteriore-se ¢ perca, além do seu aspecto frondoso, ‘sua produgao, se o camponés nao tiver respeitado ¢ seguido toda a estrutura € natureza da planta. Quando se trata de seres naturais ¢ de scu cultivo, sabemos trabalhar com prudéncia naquilo em que, tratando-se de homens, seguiriainos um caminho inteiramente equivoeado. Ainda assim, homens, como as plantas, tiram suas energias de uma tinica fonte e desenvolvem suas atividades segundo uma mesma lei. Por isso, a contempla, peitosa da natureza tem tanta importancia para o homem. ‘A natureza nos mostra poucas vezes, sobretudo no homem, aque- le estado sio ¢ primitivo; porém, essa é uma razio a mais para presumir - pelo menos no individuo, mesmo que nos seja demonstrado 0 contrério - que esse estado so e primitive poderia facilmente ficar anulado, se tam- bém nesses individuos nfo forem respeitadas as estruturas e a natureza ue antes existiam em toda a sua pureza, Além disso, a mesma conviccio de que a espontaneidade original tenha desaparecido da massa dos ho- mens - a certeza de que disso obtemos o mesmo, se considerarmos mais, © exterior do que o interior - deve-nos confirmar precisamente a necessi- dade de seguirmos, com todo o rigor, o tipo de educago indicado. ‘Também uma manifestagio corrompida nem sempre nos mostra 0 interior do homem; com grande dificuldade, indica qual € o ponto de par- lida, a fonte de onde arranca e brota a cormupgio exteriorizada. A vhima pedra de toque, a tinica infalivel, esta sempre dentro do homem mesmo, Nesse ponto de vista, educagio, doutrina e qualquer ensino devem ten- der muito mais a seguir a espontaneidade ¢ a adaptar-se & natureza, do que a preserever normas ¢ determinar condutas: se predominar unicamen- te esta ultima (endéncia, impedir-se-Go 0 desenvolvimento e 0 progresso do género humano ou, © que € 0 mesmo, a manifestagio do divino no |homem e em sua atividade espontinea ¢ livre - tinico objeto e fim de toda educagio e de toda vida. ‘A educagio ativa e diretiva principia propriamente para o homem guando ele comega a viver em unio com Deus, quando comeca a estabe- lecer-se em mitua compreensio ¢ intimidade comum de vida entre pai e filho, porque assim a verdade se deriva da esséncia do todo e da nature- za do individuo para poder ser sem esforgo reconhecida. Entretanto, per- turbagifo, ou corrupgiio, daquele estado primitivo € sto no individuo ndo € conhecida: nao se sabe exatamente em que consiste, nem de onde pro- vém. Para conhecé-la, € necessério rodeé-la de ym ambiente, de um con- Junto de relagdes em todos os sentidos, que sirvam para refletir sobre ‘sua conduta como em um espelho, de tal maneira que imediata e facil- mente 0 préprio menino e as outras pessoas possam conhecer, por atos © por suas conseqiiéncias, 0 verdadeiro estado de sua alma. Assim, fi- cam menos perigosas as manifestagdes dessa perturbacio interior de sua vida ‘A educagio ativa, a que ordena e prescreve, nilo tem, em todo caso, mais do que um destes dois sentidos: ou sugerir pensamentos claros © vivos, a idéia verdadeira, fundada em si mesma: ou bem oferecer algo que sirva de exemplo e de modelo. Porém, o eterno intervém onde existe um pensamento vivo e fandado em si mesmo - de onde se prescreve 0 que é ‘em si mesmo verdadeiro. Portanto, a0 contentar-se com 0 aspecto passivo dda educagio - com a educagdo que se limita a adaptar-se © a seguir -, 0 Pensamento vivo, etemo, divino, pressupde e exige, por sua prépria natu- reza, a determinagio ¢ espontinea atividade desse ser - 0 homem criado para a liberdade e para a imitagéo de Deus, ‘Também aquele que serve de exemplo - que se aceita como mode- lo de uma vida perfeita - nao deve ser tomado, a no ser em sua forma, como padrio mais que em sua esséncia, em seu impulso elevado. Nao ha erro mais prejudicial que o de copiar (como deixado em sua mesma forma) tudo aquilo que constitui um exemplo espiritual para o homem. A expe- rigncia nos mostra que a cada passo os exemplos, quando convertidos em modelos que tém de ser adaptados rigorosamente, mais servem de obstéculo e estorvo do que de meio de elevagio para 0 género humano. Por isso, mesmo Jesus combateu com sua vida € com seus ensina- mentos a adogio servil de modelos exteriores. S6 0 impulso interno, 0 espfrito, a vida de modelo devem ser imitados, deixando sempre livres a forma e a maneira da manifestagao. A vida, a lei, o engano € a maldade, a coagio - a mais elevada e perfeita que a humanidade tenha conhecido - so por nés identificados, assim como foram na hist6ria de Jesus. Jesus reconheceu e sentiu em si mesmo o fundamento original e primitivo de seu ser, de sua obra e de sua vida, expressando-o com independéncia livre-atividade, segundo leis e condigdes eternas, como fruto e conseqiién- cia do princfpio interno etenamente criador. Essa vida exemplar deve ser Feproduzida em todos os homens de maneira que cada um se converta também em um modelo para si mesmo ¢ para os demais, manifestando-se, segundo a lei eterna, com liberdade, vontade e determinacao préprias. N3o € nem deve ser outro 0 objeto, o fim de toda educagio, doutrina ou en- sino, Como vimos, também o mesmo modelo divino eterno € passivo quanto & forma, e limite-se a seguir o discfpulo mais para lhe prestar au lio do que para o dirigir imperiosamente. Ea experiéncia nos demonstra que o pensamento vivificador, 0 eter- no espiritualmente exemplar, tende, por sua prépria natureza, a determi- nar-se € a impor-se - e assim o faz efetivamente em suas manifestagdes. O pensamento tem exigéncias absolutas ¢ inexoraveis; porém, s6 as tem quando essas exigéncias nascem necessariamente da esséncia do todo € da natureza do individuo e quando o préprio individuo pode reconhecer esses caracteres, compreendendo que o modelo se impde como orgénico e como representagio do necessario. Assim, o modelo s6 exige ser imita- do naqueles casos em que se chegar & mesma conclusdo, partindo das proprias exigéncias do espirito, da f€ e da consciéncia; s6 deve ser imita- do, portanto, durante a infincia, naturalmente ingénua, ou em situagdes ‘muito claras e primordiais da vida adulta, Nesses casos, impde-se 0 mo- delo mediante 0 exemplo ¢ as palavras - porém sempre no que concerne 0 espirito € & vida e nunca no que se refere & forma. torte WA. rt 2 A boa educagdo, 0 ensino adequado, a verdadeira doutrina de- vem, portanto, necessariamente, levar a liberdade; a lei, a prépria determi hago; a coago, & vontade livre; o 6dio exterior, a0 amor interior. Porém, quando 0 édio engendra 0 édio; a lei, o engano e a maldade; a coagio, 2 escravidao; a necessidade, a submissio; quando a pressio anula, rebai- xa e a carga abranda e envelhece; quando a severidade e 0 rigor provo- cam falsidade e rebeldia, desaparece, entio, toda a educagi, todo o flu- xo saudével da educagio, da doutrina e do ensino. Para aleangar 0 con- trdrio, a educagio, a doutrina ¢ 0 ensino - em suas necessitias impo: es © preceitos - devem deixam ver, até os tltimos detalhes e de uma ‘maneira evidente, que a mesma pessoa que dirige suprime toda a arbitra- riedade e esta submetida, com igual exatidao e rigor, a uma lei universal, a uma inevitavel ¢ eterna necessidade. Toda educagéo ¢ doutrina verdadeiras, todo verdadeiro ensino, qualquer educador e professor digno desse nome deve, em cada momen- to, em cada uma de suas determinagdes ¢ exigéncias, atuar em um duplo sentido: dar ¢ tomar, unir e separar, mandat e obedecer, fazer e suportar, obrigar e ceder, apertar e afrouxar... Eo mesmo deve dizer-se do discipulo ou aluno. Porém, € preciso que entre os dois, entre © professor e 0 aluno, entre a exigéncia c 0 resultado exista invistvel um terceiro termo: a eleigao do justo, do melhor, que pode necesséria e logicamente deduzir-se das condigdes dadas. Essa eleigao constitui o terceiro termo, a que, por igual, devem submeter-se professor ¢ aluno. O reconhecimento desse terceiro termo, sua clara nog, sua aceitagao'sérena e entusinsta devem manifes- tar-se do modo mais puro e decidido no educador € no aluno, Geraimen- te, 0 menino tem um sentimento claro, uma perspicécia refinada: no ato compreende e raras vezes se equivoca se 0 que 0 educador, 0 professor ou o pai manifestam ¢ exigem responde a um capricho pessoal ou a uma exigéncia real e objetiva Essa entrega, essa subinissio a um terceiro termo, que impera igual- mente sobre o discfpulo € sobre 0 professor, deve manifestar-se até os ‘timos pormenores na agio de ambos. Por isso, a formula necesséria e geral do ensino seré “faz isto e observa qual é nesta determinada relagao ‘ conseqliéncia de teu ato € a que conhecimento te conduz™. Assim, tam- bém o preceito, para a vida em geral, serd para todos o seguinte: “Mani- festa tua esséncia espiritual, o que em ti verdadeiramente vive, o que é ‘ua vida, expressando-a no exterior e mediante 0 exterior em tuas obras, © abserva o que tua esséncia reclama e como tem sido realizada”. Mesmo Jesus se vale unicamente desse preceito para revelar o divino de stia missio, de sua natureza e de sua vida, para demonstrar a verdade de sua 2% A etmacie dahon doutrina, Esse € 0 preceito que conduz ao conhecimento da vida ¢ do fundamento ¢ & esséncia de toda a vida e de toda verdade. Com isso, explicase e compreende-se 0 seguinte prinefpio e di-se ‘© cartinho para realizé-lo: "O ensino, assim como 0 educador mesmo, deve apresentar o individual e o particular como geral, ¢ geral como parti- ‘cular individual, comprovando-os na vida; deve exteriorizar 0 interior ¢ ‘interiorizar 0 externo e mostrar a necesséria unidade de ambos; deve con- ‘siderar o finito em seu aspecto infinito, ¢ 0 infinito em seu aspecto finito, fazendo ver como um e outro se unem na vida; deve contemplar o divino no humano, ¢ a esséncia do homem em Deus, tendendo a que na vida se ‘manifestem justamente”. Isso € 0 que da natureza do homem nasce com tanta clareza e pre~ ‘cisfo, 0 que se expressa com tanta evidéncia, quanto mais o homem pe- netrar em si mesmo, na natureza da crianga e na hist6ria do desenvol mento humano. E, pois, inegdvel que o nico objetivo, o tinico fim de toda educa- ‘go ¢ doutrina consiste no cultivo integral da esséncia original divina contida no homem, ajudando, assim, que se manifeste o infinito no finito, © etemo no temporal, 0 celeste no tefreno, 0 divino no humano e na vida humana. Nesse sentido, tinico e verdadeiro, deve ser considerado e aten- dido 0 homem desde o instante em que vem ao mundo ou, methor ainda, desde que, ainda invisivel, se forma no titero materno, desde que a mic tem, como Maria, sua anunciagio. Conforme a sua natureza imortal, a sua alma ¢ 0 seu espirito, deve- mos tratar a cada um de nossos semelhantes como uma aparigao da di- vindade sob formas humanas; como nova prova de amor, companhia © -graga de Deus; como um dom divino, a maneira como os primeiros cris- tios consideraram realmente os seus filhos, segundo podemos deduzir dos nomes que thes deram, Assim, desde menino, o homem deve ser tratado como um mem- ‘bro nzcessitio e essencial da humanidade. Os pais devem, como educa- dores, sentir-se responsaveis ante Deus, ante a humanidade ¢ ante seu préprio filho, Devem, também, os pais considerar 0 menino em comunhio, ‘em sua relagio clara e viva com o presente, 0 passado ¢ 0 futuro do de senvclvimento humano, ¢ formé-lo, educé-lo em harmonia com as exigén- ‘cias presentes, passadas e futuras do desenvolvimento da espécie huma- ‘na, O homem, por sua natureza divina, terrena e humana, pertence, por ‘sua vez, a Deus, & natureza ¢ & humanidade. E necessério que nele se con- ‘sidere e se trate uma unidade, uma individualidade, uma pluralidade e que unele se representem, ao mesmo tempo, o presente, o passado e o futuro. Feich WA, Pret 31 Portanto, nem 0 homem nem 2 humanidade, que no homem se exterioriza, constituem uma manifestagio ja definida e completa, algo fixo e estével, 0 fim de uma evolugio, mas, sim, um ser que constantemente muda, progride € desenvolve, vive perenemente, disposto sempre a alcangar a perfeico, tendendo para fins que repousam no infinito e no eterno. Nao hé critério mais prejudicial que o de considerar o desenvolvi- ‘mento da humanidade como definitivo e conclufdo, julgando que ela se limita a ti0-86 estender-se e repetir seus tipos. Com semelhante critério, cada menino, cada geragdo seria unicamente uma imitagdo, uma cépia exterior e morta, algo assim como um vazio no molde das geragdes ante- tiores. Porém, nilo € assim. Pelo contririo, 0 novo sujeito, no lugar que ‘ocupa dentro da totalidade da evolugao humana, vem a ser um modelo vivo para o futuro e para todas as geragées futuras, Certo € que cada geragdo, ¢ também cada individuo, deve recorrer, e de fato recorre, a to- dos os estigios sucessivos da evolugio anterior e da cultura da humani- dade. Se nfo fosse assim, 0 homem nilo compreenderia os seus antepas- sados nem os seus contempordneos, Porém, ele nfo segue essa marcha pelo estéril caminho da imitagdo, da cépia, mas pelo caminho vital do proprio desenvolvimento ¢ da espontinea formagio. Cada homem deve apresentar-se a si mesmo € aos outros como um modelo livre porque, em cada um, existe e se encerra 2 humanidade inteira. Dessa forma, existem fem cada um - exposto ¢ manifesto de uma maneira prépria, peculiar e tnica > a esséncia da humanidade, a esséncia de Deus, que podem ser cada vez mais bem compreendidas, que podem ser cada vez mais exatas e intensa- ‘mente pressentidas em sua infinitude, em sua eternidade, na inesgotavel pluralidade que ela abarca e nela se encerra Esse conhecimento do homem ¢ essa reflexio sobre 0 que consti- tui sua verdadeira natureza sfo os tnicos que bastam e que contém, em principio, todos os demais. Desse conhecimento, dessa reflexiio, trota naturalmente, quando necessitamos, o saber em uma investigagio de consciéncia para o cultivo ¢ a educagao do homem. Unicamente partindo desse critério acerea do hoiem © da anunciagio de seu nascimento, a verdadeira educagio pode prosperar, florescer ¢ dar saborosos frutos, Agora € facil deduzir, clara e distintamente, qual é, antes depois da anunciagdo, 0 dever dos esposos ¢ dos pais: eles devem ser puros sinceros em palavras e obras; devem compreender plenamente todo 0 valor e a dignidade do ser humano; devem considerar que um dom divino esti entregue a seu cuidado e & sun protecio: devem ilustrar aceres do fim e do destino do homem e acerca do caminho e dos meios pelos quais se podem realizar. A missio do filho como tal consiste especialmente em 2 Ardara thane desenvolver ¢ aperfeigoar: a natureza do pai e da mie, 0 paterno © 0 ‘materno, todo o espiritual e sentimental que na consciéncia dos pais pode existir - mesmo que os pais nfo suspeitem, no conhegam as atitudes energias que dormem no fundo de suas almas. De forma andloga, a mis- siio do homem, como filho de Deus e da natureza, consiste em concordar e harmonizar a esséncia de Deus e da natureza, 0 natural ¢ 0 divino, 0 terreno e 0 celeste, 0 finito eo infinito. A missio de um filho como mem- bro da familia é expressar e desenvolver - de maneira clara, fntegra e har- mndnica - a esséncia da familia, suas atitudes e energias espirituais. As- sim, também 0 destino e a vocagio do homem, como membro da humani- dade, pedem que se desenvolvam, aperfeigoem e manifestem a esséncia, as energias e atitudes da humanidade inteira. Para que, no entanto, os filhos ¢ 0s membros de uma familia de- senvolvam e expressem como tais a esséncia dos pais ou da familia (es- séncia que até esse momento se achava latente, dormindo, ineégnita, in- suspeita), é preciso que cada um dos filhos ou dos membros da familia se desenvolva e expresse a si mesmo em todos os sentidos, da maneira mais peculiar e pessoal - quanto mais clara e plenamente realize isso, com tan- ta maior clareza conseguiré aquilo. De um modo anélogo, os homens, como filhos de Deus e membros da humanidade, representardo por sua vez a esséncia comum a Deus & humanidade - esséncia que nesta tltima dor- me, no inteiramente conhecida e reconhecida -, com tanta maior pureza € perfeigio quanto mais peculiar e pessoal for o desenvolvimento de cada erianga, de cada individuo humano. Consegue-se tal estiigio quando o homem se forma ¢ se aperfei- goa segundo 0 caminho, segundo a lei que tem seguido e segue em to~ das as coisas - em sua formagio e aperfeigoamento -, Iei que rege © g0- verna universalmente, onde quer que se encontrem o ser ¢ a existéncia, 0 Criador e a criatura, Deus ¢ a natureza. A lei é esta: que cada homem expresse sua esséncia e manifeste a unidade em si mesmo e por si mes- mo; a individualidade, sobre algo individual por ele concebido € exteriorizado com especial clareza e plenitude, e a pluralidade, em tudo 0 que ele produz e executa, $6 mediante essa triplice manifestagio - tripli- ce, por sua vez, una ¢ unificadora - consegue-se plenamente a exterioriza~ 80 - a exposigao, a revelagao do intimo de cada ser. Se um elemento dessa triplice manifestagio se suprime na realidade, ou falta no conhecimento © na reflexio, no é possivel uma manifestagdo completa, perfeita e sem obstéculos. Somente pela manifestagao triplice se expressa ¢ se revela integralmente cada coisa em sua esséncia e em sua unidade; somente a inteligéncia e 0 estudo dessa triplice manifestagdo - pela qual cada coisa (finioh Win, Prdet ND expressa ¢ revela completamente sua esséncia - conduzem & compreen- sio verdadeira dessa esséncia ¢ a0 conhecimento exato da coisa mesma. Desde seu nascimento, desde sua aparigfo sobre a terra, o men no deve ser tratado de acordo com a sua verdadeira esséncia ¢ de modo que possa empregar sua energia com liberdade. A educagio niio tem de favorecer o desenvolvimento de uns'membros a custa de outros, nem cultivo de umas atitudes tem de prejudicar as demais, Nao impegamos o espontineo crescimento de seu corpo, oprimindo-o ¢ empacotando-o em estreitos invélucros, nem mais tarde fagamos caminhar com andadores. E preciso que o menino, o homem futuro, consiga o quanto antes encon- trar por si mesmo seu centro de gravidade, o ponto de equilibrio de to- dos os seus membros e energias; movimentar-se ativa ¢ livremente; va- ler-se de suas préprias maos; firmar-se ¢ andar sobre seus préprios pési ver com seus préprios olhos; utilizar de uma maneira adequada e harmo- nica todos os seus membros. Logo, 0 menino deve aprender e exercitar a arte mais nobre e mais dificil: saber conservar seu centro de gravidade, 0 Justo meio no caminho da vida, apesar de todos os desvios, iranstornos. € obstéculos. A primeira manifestagio da crianga é a de energia, Porém, a ener- gia provoca resisténcia; daf as primeiras queixas da crianga em repelir aquilo em que seus pés tropegam, ou em repelir os que querém segurar seus movimentos. Paralelamente a essas manifestagdes, desenvolve-se na crianga a sensibilidade do real; por isto, sorri ¢ expressa sua alegriae sua satisfagao quando se encontra rodeada de um ambiente agradavel, de luz. clara ¢ ar puro. Aqui se acha 0 comego da consciéncia do préprio ser, 0 germe da consciéncia humana: tranqililidade e inquietude, prazer e dor, riso e choro. A tranqililidade, a alegria ¢ 0 riso sio indicios de tudo aqui- Jo que a sensibilidade da crianga coopera para o desenvolvimento puro, espontiineo de seu ser, do ser humano, da vida infantil e da vida humana. Essas primeiras manifestagées, sua conservaco ¢ cuidado devem cons- tituir 0 ponto de partida da primeira educagio e a base de todo 0 poste~ rior desenvolvimento, aperfeigoamento ¢ atividade na vida. Pelo contré- rio, a inquietacao, a dor e 0 choro, jd na sua primeira manifestecto, deno- tam 0 que & contrario & evolugio do homem quando crianga. Também a ‘educagio, quando trabalhada de maneira oposta, isto é, para preveni-los € suprimi-los, acaba por ndo encontrar os verdadeiros motivos, a raiz de onde se originam as inquietages. A prinefpio, mas quase unicamente no inicio, a intrangtilidade, os gritos ¢ as légrimas da crianga néo indicam rebeldia ou mé vontade; porém, apontam como a crianga comeca a se sentir, quais dores e moléstias dependem de algum modo do capricho, do au Avenged omen, descuido ou da preguiga dos demais. Quando esses tristes sentimentos se fixam na crianga, nasce o espfrito de rebeldia, a primeira e a mais odio- sa de todas as suas faltas, a maior inimiga da propria crianga ¢ dos que a rodeiam, falta que dificilmente podera ser imediatamente corrigida sem prejufzo das melhores qualidades do homem - essas atitudes geram a dis- simulagio. a mentira, a teimosia, a obstinagio e outros tantos defeitos lamentaveis. ‘Muitas vezes, porém, quando se segue o bom caminho, € possivel que esses sentimentos aparegam. O homem, por sua natureza e destino, deve acostumar-se a suportar dores pequenas ¢ sem importincia, apren- dendo, assim, a resignar-se diante.dos maiores e a desprezar as penalida- des da existéncia, Se os pais e as demais pessoas que cuidam da crianga tém absoluta seguranga de que, apesar de sua inquietude e de seus cho- 08, proporcionam tudo aquilo de que necessita a crianga,.e de que tira- ram do seu caminho tudo aquilo que podia prejudicé-la, eles podem e devem deixé-la abandonada a si mesma, dando-lhe tempo para que es- pontaneamente se acalme - ndio é bom que a crianga se acostume a recla- mar ¢ a obter auxflio dos outros para dores fingidas ou qualquer pequena moléstia facilmente suportével. Assim, muitos pais e educadores tém per- dido a oportunidade de deixar a crianga procurar sozinha seu caminho -e nio serd facil recupers-la pela imposigfo e pela violéncia. Os pequenos Possem um pressentimento sutil, uma percepedo refinada da debilidade de quem os rodeia, Essa energia origindria, que vive e trabalha na crian- a, manifesta-se mais facilmente para dominar os demais quando a fr ‘queza desses permite do que para agir e para ter paciéncia em suportar as préprias doengas. ‘Nesse primeiro perfodo de vida, dé-se geralmente & crianga o nome de bebé, e niio pode ser mais exata essa denominacdo, porque 0 amamen- tar constitui sua quase vinica atividade - todas as demais manifestagdes citadas, 0 riso ¢ o choro, referem-se geralmente & lactago. Nessa primei- ra fase, a crianga nfo 6 toma o peito de sua mae para nutrir sua vida como também se esforga para receber, por meio dos sentidos, toda a va- riedade de coisas exteriores que a rodeiam. Por isso, € to importante para ‘© homem esse primeiro perfodo de erescimento - para o seu presente € seu futuro. Assim, nessa fase, 0 homem ndo deve receber nada de mal, nuim, desprezivel, equivocado e prejudicial. O olhar e 0 rosto daqueles ue o cercam devem revelar uma serena confianga, expressdo da clareza pureza interiores. Mesmo que outras coisas sejam escassas, nio devem faltar & crianga ar puro, luz clara e espago suficiente, porque dificilmente esqueceré, depois de homem, as impresses de sua infiincia: junto com 0 leite mateo, seus olhos ¢ toda sua alma se abriam as impresses do mun- do, Com imensa freqliéncia, as mais violentas lutas do homem consigo mes- ‘mo e suas maiores desgracas tém sua origem nessa primeira época, Nunca é demais lembrar a importncia que tem um bebé. Devem- se também comparar com seus respectivos filhos os resultados ol por aquelas maes que os amamentam com os daquelas que no cumpri- ram com 0 dever. Em ambos 05 casos, as miles sabem que o primeiro sorriso da crianga assinala uma etapa transcendental de sua vida; cons- titui, pelo menos, uma expressio de sua personalidade corporal, fisica. Porém, pode ser mais: nio $6 a sensagdo corpérea da propria pessoa, mas também o principio de um sentimento de comunhiio entre mie e filho, principio de outros andlogos para com o pai ¢ os irmaos e, depois, para com os demais homens. Esse primeiro sentimento de comunhio - sentimento que une pri- meiramente a crianga com a mie, 0 pai e os irmios - serve de base para a ‘mais alta ¢ espiritual unido, da qual nasce a certeza absoluta de que 0 pai, ‘a mie, 0s irmios ¢ todos os homens se sentem também unidos € em comu- ‘nhdo com algo superior, com a humanidade, com Deus. O sentimento de comunhiio ¢, pois, 0 principio, o principio exterior de toda religiosidade verdadeira, de toda sincera aspiragao & unio perfeita com o Eterno, com Deus, A religido verdadeira, a viva, a que perdura através dos perigos e das lutas, através das necessidades e misérias ou das alegrias prazeres, inicia-se no homem desde o bergo; nesse momento, a crianca ja tem um pressentimento obscuro de que algo vivo, algo que provém da divinda- de, manifesta-se no finito, no homem, E esse obscuro pressentimento, essa consciéncia nebulosa, deve ser quanto antes cultivada, fortalecida e li- mentada no homem para que possa logo aperfeigoar-se e elevar-se A ver- dadeira e clara consciéncia. Isso € no s6 um espetéculo comovedor para ele, que sem ser visto © contempla, mas também um augirio de eterna beatitude para a crianga - 0 costume da mie que, ao deposité-la no berco, eleva a0 céu um olhar desde o fundo de sua alma, pedindo para seu filho a protegiio d’Aquele que é 0 pai comum dos dois. E hd outra cena que igualmente comove, que alegra, mas que, por sua vez, tem a maior importincia moral para a vida presente e futura da crianga, Quando ela acorda, serena, alegre e sorridente, levanta também a mie seus olhos até o Pai comum, dando-Ihe com os labios trémulos as gragas pelo repouso permitido, pelas forgas adquiridas, por aquele filho que Deus parece dar-Ihe de novo a cada manhi. Isso também exercerd ‘uma ago positiva sobre toda a vida que mie e filho levam juntos. E aqui que a verdadeira mae, consciente dos maus desejos de outra pessoa, nio % Atuccte do hemen permite que se aproxime da crianga dormindo no bergo € a tome nos bra- G08 a0 despertar. ‘A crianga tratada assim por sua mae est4 santificada no hamano, ho terreno eno celeste. J4 fez sua oragdo. Descansa em Deus, principio € fim de toda a existéncia. Esse divino ponto de apoio, que se sustenta sempre firme e seguro, ¢ 0 mais alto dom para a vida que os pais podem entregar a seus filhos. Porém, para o bebé, € necessério que pais ¢ filhos se sintam unidos, que se déem, exterior e interiormente juntos, quando aspirem também a unit-se com seu pai celestial, quando elevem a Deus sua oragdo na fntima quietude da alcova ou no meio da natureza livre Nao se diga que as criangas nio podem entender essas coisas. Com esse critério, privé-las-famos do melhor e mais elevado. As criangas as compreendem; compreenderam-nas sempre, quando j4 nfo estejam corrompidas, quando nao se sintam jé espiritualmente separadas dos seus pais; compreendem-nas no por conceitos, mas, sim, com o fundo do seu coragto. A religiosidade - a vida interior em Deus e com Deus em todos 0s momentos da existéncia, em todos os estados da alma - muito dificil- mente se manifesta com a plenitude de sua energia, se nao tiver sido despertada desde a infaincia. Pelo contririo, um sentimento religioso cul- tivado desce os primeiros anos saird triunfante de todas as tempestades © perigos do mundo. Esse serd 0 fruto dos ptimeiros exemplos paternos, quando a crianga parecer nio se fixar neles, quando a crianca nfo se der conta de seu valor. O mesmo se passa com outra classe de exemplos dados pelos pais. Isso nio s6 se refere a educagao religiosa, ao aperfeicoamento do divino no homem, mas também tem uma importéncia extraordinéria para toda sua formagao geral. Em toda ela, convém considerar o desenvolvi- mento humano como uma evolugio que se inicia desde 0 primeiro mo- mento ¢ que se desenvolve de maneira continua ¢ ininterrupta. Nada é mais prejudicial e destruidor que estabelecer, na sucesso constante de cada vida, etapas excessivamente separadas umas das outras, distingdes © divisdes que nos impedem de ver o que hé de continuo, de perene em cada evolusio vital, o que constitui sua unidade e substancia. Especial- mente errénea é a separagio das diversas fases de crescimento, das vé- rias idades: menino e menina, adolescente, jovem e moga, homem e rau- Iher, anciae ¢ ancia. Tais fases nfo esto realmente separadas; a vida nos ‘ensina que nao ha descontinuidade entre umas e outras, mas que essas fases formam uma sucessio realmente indivisivel. Quando se considera 0 menino, ou o garoto, como um ser inteiramente distinto ¢ separado do adolescente ou do adulto, hd 0 perigo de esquecer 0 comum: o homem. Finder WEA, Braet 31 Assim, niio vemos fundamentalmente humano ns vida real, limitando- nos s6 a um frio conceito, a uma va palavra - erro frequente que se exterioriza nas conversas vulgares. J4 entre a crianga ¢ 0 adolescente estabelece-se uma separago absoluta - as etapas posteriores antecipam algo absolutamente distinto dessas primeiras. O jevem j4 no vé dentro de si a crianga, nem a crianga se descobre no adolescente; o jovem, ten- dendo a olhar 0 futuro, esquece-se do adolescente € da crianga que den- tuo dele existiram e nfo sabe ver na crianga e no adolescente as premis- sas da juventude. Porém, 0 pior € que o homem adulto se desligou total- mente de suas idades anteriores: no reconhece em sua pessoa a crianca, © adolecente ¢ 0 jovem, ¢ fala deles.como se tratasse de outros seres de natureza inteiramente distinta. Essas divisdes, esses limites rigorosamente estabelecidos entre os. sucessivos momentos do desenvolvimento humano so originados, ge- ralmente, por ndo terem prestado, desde o inicio, uma incessante atengao a0 que se passa no curso da propria vida, e, por isso, so causa de cons- tantes erros, de intimeras perturbagdes, de obsticulos mais faceis de assinalar do que de evitar. $6 naturezas excepcionalmente piivilegiadas conseguem sobrepor-se a esses obstdculos, a esses entraves impostos de fora pelo meio exterior em que vivem; mesmo 9s vencendo, nio seré sem uma brusca decisio, sem uma atitude violenta que estorvaré e, m tas vezes, destruiré outras manifestagdes do espirito. Por isso, o homem que tenha lutado com tais obstéculos descobre sempre uma certa violén- cia interior, uma certa falta de espontaneidade. Tal violencia ndo ocorreria se os pais considerassem as criangas em relagio com as sucessivas idades e etapas da vida; ndo passassem por cima de nenhuma delas; se tivessem, sobretudo, presente que a enci- gia e a perfeigao do desenvolvimento em cada periodo dependem de to- dos e de cada um dos periodos precedentes. Isso € 0 que, com muita freqiiéncia, esquecem os pais. Pensam que a crianga é um adolescente quando chega & idade de sé-lo, que é um jovem ou um adulto quando alcanga aquele mimero de anos que respectivamente se supe para essas. denominagdes. Porém, o adolescente ndo é adolescente, nem o jovem & Jovem porque completaram determinada idade, serdio porque em corpo ¢ ‘alma passaram, ponto por ponto, toda a evolugao da infancia ou da ado- lescéncia. Tampouco, 0 homem chega a ser adulto por contar tantos ou quantos anos: 6-0 por ter vivido ¢ acumulado as experiéncias da infancia eda mocidade. Ha também pais - muito dignos de elogios em outros aspectos - que educam a crianga para que ela se comporte ja como um jovenzinho, e 38 Antragte ds hone alguns para que o adolescente se manifeste como um homem formal, sal- tando por cima de etapas necessérias e essenciais. Disse-se antes que os pais deviam ver na crianga 0 adolescente e o futuro homem; porém, vé los e consideré-los, em principio, como uma crianga é algo totalmente diferente de ver e tratar a crianga como homem, exigindo dela que preco- cemente se conduza. Os pais que tém tais exigéncias esqueceram que eles chegaram a ser bons pais € bons homens na medida em que antes vive~ ram conforme a natureza dos diferentes perfodos de sua existéncia, des- ses periodos que agora, créem, deveriam suprimir de seus filhos. Esse critério, essa tendéncia em depreciar os primeiros estigios de desenvolvimento criam logo dificuldades quase insuperdveis aos pro- fessores ¢ educadores. Parece, entio, que pode passar-se também por cima do ensino correspondente Aqueles primeiros anos e, portanto, nada é mais prejudicial para o garoto que Ihe propor prematuramente um fim exterior, pteparando-o, por exemplo, para uma determinada atividade, para o de- sempenho de um determinado emprego. Nem a crianga, nem o jovem, nem © homem devem ter outra aspiragdo sento a de serem em cada perfodo da vida 0 que esse perfodo exige. Ser4, entio, cada uma das etapas como flor nova saida de brotos saudaveis. Cada etapa servird de base as se- guintes para dar-lhes o que elas pedem até chegar plenitude: sé um desenvolvimento suficiente em cada idade assegura o desenvolvimento pleno na idade seguinte. Disso dependeré o estimulo a ser dado para o desenvolvimento aperfeicoamento da atividade criadora, da produgio de obras exteriores, do trabalho. No entanto, os homens tém hoje uma concepgio falsa ¢ superficial do trabalho, da atividade, da produgio; por isso, o trabalho no se estende a vida, nem a envolve como um principio vivificador - apenas € algo que pesa, oprime, rebaixa, estorva e mata. Deus trabalha ¢ produz etemamente. Cada pensamento divino se traduz numa obra, numa agi, numa eriago. Cada pensamento divino se manifesta, se exterioriza como energia criadora até a eternidade. Quem du- vida contemple a vida e a atividade de Jesus, contemple a verdadeira vida a verdadeira atividade humana; contemple se deveras vive - sua prépria vida sua propria atividade. O espftito de Deus flutuou sobre 0 caos do indefinido e, removen- do-o, deu-the forma, aparéncia, existéncia ¢ vida as pedras e plantas, ‘animais e homens, Deus criou o homem a sua imagem e semelhanga. Por isso, 0 homem deve trabalhar, deve criar 0 mesmo que Deus. O espirito humano hé de flutuar também sobre o indefinido e sem forma e, removen- do-o, hd de produzir aparéncia e forma, exteriorizando, assim, 0 que consti Bierioh WA, Probe 2 tui 0 fundo da esséncia da vida do homem mesmo. Nisso consiste o- sublime sentido, a profunda significagao, a grande finalidade do trabalho, da atividade, da agdo e da criagto - palavra considerada a mais adequada, ‘A nossa atividade, todos 05 nossos atos € obras - sejam acompanhados da conviegao clara ou, pelo menos, de um vago pressentimento, de uma. intuigdo imediata ¢ viva - so exteriorizados a partir do nosso interior: da ‘mos corpo ao espiritual, forma a idéia, realidade ao ideal e existéncia po: tiva, finita e transit6ria a0 principio eterno que vive dentro de nossa alma. Dessa maneira, seremos verdadeiramente semelhantes a Deus e nos eleva- Femos por essa mesma semelhanga a um conhecimento cada vez mais puro da divindade, a uma contemplagdo de sua esséncia, aproximando-nos, a0 ‘mesmo tempo, externa ¢ interiormente, do supremo Criador. esse sentido, também é etemamente verdadeira a frase de Jesus “Dos pobres ¢ 0 reino dos céus ”, porque s6 eles compreendem todo 0 valor do trabalho, da atividade criadora. Também das criangas é 0 reino dos céus. As criangas se entregam com ingénuo entusiasmo a seu es- Pontiineo instinto de atividade, quando no so perturbadas pela igno- ante suficiéncia dos maiores, Nao se pode admitir - apenas suportar - a idéia vulgar e deprimente de que o homem trabalha, produz, cria sé para cexteriorizar seu espirito, o que tem de divino, adquirindo, assim, cons- cigncia de sua propria natureza espiritual e divina e da mesma natureza de Deus. O pio, a casa ou as roupas que obtém constituem o acréscimo, ‘© complemento insignificante. Por isso, disse também Jesus: “Busca pri- ‘meio o reino de Deus - ou seja, a manifestagao do divino em-vossa vida © por meio de vossa vida -, e todos os demais, o que para esta vide tem- poral faz falta, se os dard por acréscimo.” E Jesus disse assim: “Este € 0 ‘meu sustento, fazer a vontade de Deus, executar fielmente 0 que Deus me confiou.” Os litios do campo, que na nossa percepco no trabalham, foram vestidos por Deus mais belamente do que péde Salomao adornar- se com toda sua magnificéncia. Mas por que 0s litios no dio pétalas © flores, expressando e revelando em todas suas manifestagdes Deus e a esséncia divina? Os passaros do céu, no nosso entendimento, nio se- ‘meiam nem trabalham; porém, quando cantam, quando fabricam seus ni- ‘hos, quando nos mostram em mil ¢ uma ages diferentes, nfio expressam © espirito, a vida que Deus thes deu? Por isso, Deus os sustenta e ali menta, Os Itios do campo ¢ as aves do céu devem ensinar-nos a man festar 0 que Deus depositou em nossa alma, exteriorizando-o em atos € em obras, em formas materiais, de maneira que exija o tempo e o lugat, as condigdes ¢ circunstincias, que tornam, entio, tio pequena essa mani- festago, que nos apresentam como de extraordinario valor'e transcen- A educate de hom déncia. E quanto ao nosso sustento, estamos seguros de que Deus ha de mostrar-nos mil caminhos para que, empregando nossa energia espiritual, escolhamos um que nos permita satisfazer nossas necessidades materiais. Mesmo que todo o exterior nos falte, se soubermos suportar essa falta e nos sobrepusermos resignadamente @ ela, nio diminuird, antes deverd acrescentar-se a energia divina que podemos desenvolver. Todas as mani- festagdes de nosso espirito, visto que se produzem no finito, aparecem sucessivamente no tempo, ordenando-se em uma série. Por isso, ¢ inevité- vel que, em qualquer momento préximo ou remoto de nossa vida, deixemos ou de traduzir em obras nossa energia - concebida como energia divina - ou, pelo menos, de dirigi-la para @ ago; logo nos encontraremos com algu- ma falta, com alguma dificuldade, com as coisas que nfo so como haviam sido - se, figis & nossa vocaciio, houvéssemos empregado sempre todas as energias espirituais, considerando-as como verdadeiramente divinas. Por- tanto, as leis que governam nossa existéncia exigem que, de um momento a outro, aparega o resultado de cada atividade. E, se a atividade faltou, que resultado ou que fruto poderd produzit? Quando nos encontramos nesse triste caso, devemos recorrer a outro aspecto de nossa energia moral, & resignagio, sobrepondo-nos & desgraga e preparando-nos resolutamente para evitar outras situagdes andlogas no futuro. Hi, pois, um duplo fundamento, um duplo motivo interior e exte- rior - ¢ como 0 primeiro encerra 6 segundo, um motivo transcendental, eterno - para que o homem, desde que nasce e comeca a desenvolver-se, aprenda quanto antes a trabalhar, a produzir, a manifestar sua atividade em obras exteriores. Assim o exige, considerada em si mesma, a natureza humana. A atividade dos membros e dos sentidos da ctianga de bergo é a primeira manifestagdo, o botdo, a primeira tendéncia ao trabalho. De~ pois desse bot, véem as frescas ¢ delicadas flores do jogo, a modela- gem € a construgdo. Esse é 0 momento melhor para educar a crianga no sentido de sua atividade futura, Todas as criangas, todos 0s adolescen- tes e jovens, sem nenhuma excegdo, quaisquer que sejam sua situacio ¢ sua classe, deveriam empregar pelo menos uma ou duas horas digrias em uum trabalho sério, na producdo de objetos determinados. Hoje a crianca, o homem, aplicados ao trabalho intelectual, sito absorvidos pelo conhecimento, pelo que carecem de configuragio mate- rial e exterior, descuidando demais do trabalho manval; assim, a educa- ‘so por meio do trabalho, por meio da vida, é a mais direta e exeqifvel, a ‘mais pr6pria para se desenvolver de maneita viva tudo © que o homem é possui. Tanto os pais como as criancas consideram o trabalho propria- mente dito como algo prejudicial para sua personalidade e intl para 0 deh WA, Poa 4 futuro. Os estabelecimentos de ensino e a educagio deveriam esforgar- se em avaliar os males que se origirtam desse falso conceito. A educagio atual, na casa e na escola, zcostuma a crianga & inanigao fisica e A pregui- a. Que soma de energias se quer desenvolver? Quanta forca perdida Seria muito conveniente que as ligdes atuais dedicassem algumas horas a0 verdadeiro trabalho. Assim se fara um dia, porque hoje, diante desse desenvolvimento incompleto da energia humana - orientada s6 pata fina- lidades exteriores - se perde a verdadeira medida da mesma; por isso, no se tem dela um conhecimento exato, uma apreciagio suficiente. Assim como importa comecar quanto antes a educacio religiosa, importa igualmente nao atrasar a educagao para o. verdadeiro trabalho Uma primeira atividade, adaptada & fntima significagio do trabalho, ro- bustece e eleva os sentimentos reli iio sem atividade contém © perigo de converter o homem em um burro de carga. Trabalho e religiio marcham juntos; juntos nasceram: Deus, o Eterno, criou-os desde a eter- nidade. Que progresso se realizaria se os homens se convencessem des- sa verdade, nela penetrassem e, de atordo com ela, trabalhassem na vida! Porém, a energia humana deve no s6 se desenvolver e atuar - repousar ‘em si mesma, como quando se manifesta na teligio, e produzir fora, como quando se trata do trabalho, mas também se voltar sobre si, interiorizando- se em forma de economia, sobriedade e moderagio. Falar em acrescentar algo mais para o homem que se tenha encontrado alguma vez em si mes- mo? Onde se realiza, em sva primitiva unidade, esta trindade insepardvel + teligifo, trabalho e moderagao - ali esté o céu na terra. Ali esto a paz, a alegria, a salvagao e a bem-aventuranga. Tentemos ver 0 homem na crianga; consideremos a vida do ho- mem ¢ da humanidade na infancia. Reconhegamos na crianga 0 germe de toda a atividade futura do homem, Assim deve ser. Para que 0 homem se éesenvotva totalmente na sua humanidade, € preciso que se veja na crianga, reduzida a unidade, & totalidade das relagdes e dos aspectos da existén cia, Porém, a unidade no pode manifestar-se mais que se desdobrando em miltiplas singularidades, ¢ essa pluralidade de manifestagdes se ex- ressa por uma sucessio, por uma série. Por isso, o mundo e a vida se desenvolvem na crianga e para a crianga s6 em forma de patticularidades, 86 em série. E € necesséric, tambéri, que as diversas energias, as atitu- des, as varias atividades dos membros ¢ sentidos sejam desenvolvidos educados naquela mesma necessiria sucesso, naquela mesma ordem em que aparecem para a crianga, = A primeira infancia AA Rant se compono dor mesms objets ede uma mesma el ‘$0, 0 mundo comega a sair do nada para a crianga como uma forma nebulosa, como uma confusao caética. O mundo exterior € a crian- ga se confundem: entre eles ndo se pode estabelecer uma distingio pre- cisa, Essa separagio s6 comega a manifestar-se quando os objetos se destacam por meio da palavra, que vem - sobretudo dos labios da mile © do pai - distinguir progressivamente para a crianga o seu proprio ser ¢.0 mundo extetior, mostrando-Ihe a pluralidade de suas manifestagées. Des- “sa maneira, a crianga passa a adquirir consciéncia de si mesma - como uma coisa claramente separada, completamente distinta das outras. . Assim, na alma de cada crianga - na experiéncia de cada crianga, no ritual de sua evolugdo, na histéria do desenvolvimento de cada cons- ciéncia humana, desd: que aparece sobié a Terta'- sé tepete-e reproduz a hist6ria da criagdo de todas as coisas, tal como nos contam os livros dos santos, até 0 momento em que © homem se reconhece a si mesmo no meio do paraiso terreno, na formosa natureza estendida também ante os olhos da crianga, Mais tarde, reproduz-se também, essencialmente em cada crian- a, © momento que foi o princfpio da liberdade moral da razao em toda a espécie humana, criado precisamente para a liberdade. Qualquer homem - © em especial qualquer que atentamente considere a evolugao de ua propria alma - pode seguir na alma toda a hist6ria da espécie humana até tum determinado momento, ou até o momento atual. Convém para ele, 0 ‘quanto antes e para sempre, aprender a reconhecer ¢ considerar o mesmo em sua prépria vida, a qual evolui segundo as leis divinas. $6 por esse caminho o homem compreenderd a histéria - a historia da humanidade e a sua prépria, de seus atos e manifestagGes, de seu coragio e espirito: 56 assim compreenderd os demais; s6 assim 0 pai e a mie compreenderio 0 seu filho. Extetiorizar o interior, interiorizar o exterior, unificé-los ambos, 6 essa a férmula geral do destino do homem. Por isso, os objetos exteriores ex- citam 0 homem para que os conhéga em sua esséncia ¢ em suas relagGes; para os objetos, 0 homem estd dotado de sentidos, isto ¢. de instrumen- tos com os quais pode interiorizar as coisas que rodeiam, Porém, a0 se compararem objetos de diferentes espécies e, entre eles, encontrar dife- rengas ou semelhancas, mais perfeito seré o conhecimento de um objeto e melhor sera a comparagio com seu oposto € a unificagdo dos dois, Os objetos do mundo exterior se opdem ao homem de uma manei- ra mais firme ou mais fluida ow mais aérea. Portanto, acha-se o homem dotado de sentidos para o firme, 0 fluido e 0 aéreo. O sentido para 0 aéreo se manifesta nos érgios do ouvido e da vista; o sentido para o fluido, nos érgiios do gosto € do olfato; o sentido para o firme, nos drgios da sensibilidade geral e do tato. Além disso, cada objeto se apresenta em Tepouso ou em movimento; por isso, cada um desses sentidos se subdi vide em dois 6rgdos inteiramente distintos, destinados a0 conhecimento dos objetos em repouso ou em movimento. Segundo a lei do conhecimento das coisas por seus opostos, na crianga desenvolve-se primeiramente 0 sentido do ouvido e, logo, excita- do ¢ ajudado por esse, o sentido da visdo. Para que ocorra o desenvolvi mento desses dois sentidos, é necessario que os pais ¢ educadores aju- dem a crianga a relacionar 08 objetos com 0s seus opostos, com a pala- vra ¢ logo com 0 signo que os representa, fazendo-a ver nessa relagio uma verdadeira unidade © guiando-a, assim, 2 intuigdo e, mais tarde, 20 conhecimento dos objetos. Com o progressivo desenvolvimento dos sen- tidos, também se desenvolve 0 uso dos membros, 0 exercicio do corpo, de acordo com a natureza fisica do homem e com as propriedades gerais do mundo material ‘Quando os objetos do mundo exterior esti préximos da crianga e em repouso, eles influenciam a crianga a descansar; quando se movem € se distanciam, impulsionam-na a alcangé-los ¢ a apoderar-se deles; quan- do, enfim, se poem quictos. porém em lugar distante, convidam a quem queira aproximar-se deles a pér-se também em movimento para consegui- los. Assim se desenvolve, pouco a pouco, 0 emprego dos membros: a crianga aprende a sentar-se e a levantar-se, a agarrar e a abragar. a andar € a saltar. O uso perfeito de todos os membros se dé na posigao vertical quando a crianga est em pé - estar em pé é achar o centro da gravidade de nosso corpo. Esse momento da evolugdo tem tanta importancia como teve, no momento anterior, 0 sorriso - expressio fisica de que a crianga se dava conta de si mesmo - e como haverd de ter, na vltima fase do eres- cimento, a plena consciéncia moral e religiosa, que, por sua vez, é algo como 0 erguer-se, 0 por-se em pé do espfrito humano. Nesse momento, no entanto, importa tio-somente 0 exerci corpo, de seus membros ¢ sentidos, prescindindo do que esse exercfcio resulte. As conseqiiéncias da atividade sfo, para a crianca, indiferentes jo do Findeih WA Boel 43 inreconhecfveis. © que i {Gesombecivis. O que a cvianca fx &comeser a jugar os objets com EEE RfSrios membros, com suas mao, sus dado seus ldding sean € até com seus gestos ¢ olhares, ws que NTS P80, nesses movimento do rst [idee buscar em prinepio, enhvuma manifesto exterior de sein interna da personalidade, manifesagdo que nfo aparece més canes Bunt, Convém vigiar os movimentos para que a erianga mio se sere Img, Mer demais 0 coro e, sbretud, 0 roto sem nenhins mong Macmato se desfigure com carctaso conorgbes da boca dos sine pees, att eae ae espécie de separacio entre seus sentimentos e SepElas entre 0 sepito co coro, ent o interior eo extern eons, scharno fo feta acrang pode conrairoviio da hipocria oc he Guibas @ceros moviments e atitades muito diffeis de seen sa as voluntariamente ~ que, por isso, podem sobrepor-se a6 hy uma espécie de miscara durante toda a vida. * oneal Portanto, a prinefpio, nio é ‘Prudente abandonar muito tem, Oo as tum objeto exterior sua ative, Deve-se ov ne leva inevitavelmente a frouxidgo do tan no Assim, conn qua came cing sei, dead os primero mo. aa i dio » mas de feno, de palha mitida le santas $US as ne renivamene cabertaimpedindo ses, so do pao. Pa rianga, a0 despertar nfo ee a ‘a no bergo, serd bom colocar & ‘sua vista ine hae Sumnicros, au, com seus movimento cates, catera oy seen sua atividade espritual 7 10 € de todo 0 corpo, nao O. menino esenvolvida a atividade dos membros e dos sentidos, o meni- ‘no comeca, espontaneamente, a exteriorizar seu interior, en- trando na segunda fase do seu desenvolvimento. Na primeira, no entan- to, 0 interior do homem constitufa uma unidade indiferenciada e sem as- ectos maltiplos. Com a linguagem, principia a manifestag4o do interno do homem, a diferenciagao ¢ a pluralidade de meios e fins. Desdobra-se, subdivide-se o interior € tende a manifestar-se, a revelar-se. Nesse perfo- do do crescimento humano, que se constitui na infancia propriamente dita, ‘© homem aspira, com sua propria energia, a expressar 0 que leva dentro de si e dar-Ihe forma definitiva. ‘Com essa exteriorizagio do interior, com a tendéncia a reduzir 0 exterior e © interior a uma unidade, a educagio deve ser iniciada, conti- nuando cada vez mais intensamente o cuidado fisico e a formagao moral. Nesse perfodo, a educagtio do homem corresponde inteiramente & mie, 40 pai, & familia, e o homem depende dessa familia, e com ela, por nature- za, forma um todo insepardvel e indivisfvel; a linguagem, a fala, apresen- ta-se como algo insepardvel do homem: no é considerada como coisa independente e, por isso, confuade-se com a linguagem dos bragos, dos olhos, da lingua. Na realidade, entre os ciferentes periodos do crescimento e da educagio do homem, niio se pede estabelecer nenhuma ordem rigorosa de pré-relagio: todos sio igualmente importantes em seu lugar e tempo. No maximo, admitiremos que os orimeiros, o primeiro sobretudo, tém maior mportincia. No entanto, ¢ esse segundo periodo de um valor excepcio- nal, porque abarca os primeiros intentos de rela¢io com o ambiente € 0 ‘mundo exterior, 08 primeiros esforgos para a interpretago ¢ conhecimen- to dese e para a compreensio de sua propria natureza intema. E da maior transcendéncia porque importa, sobremaneira, decidir se o homem que se esté formando vera as coisas em sua verdadeira relagio ou em relagdes falsas ¢ distorcidas; se consideraré o mundo como algo mével ou imével;, como algo baixo, morto, préprio s6 para ser utilizado, explodido ou des- trufdo, para ser gozado, ou com uma finalidade superior, como algo ele- vado € vivo, como alge animado, espiritual e divino; como algo resplan- nich WA Beebe a decente ou como algo sombrio; como algo que dignifica e levanta ou como algo que oprime e envelhece, © menino deve, nesse segundo perfodo, obscrvar bem todas as coisas, deve também aprender a designd-las com a mesma exatidto, mos- trando sua natureza © propriedades. Deve designat as relagées das coi- sas entre si e com o espago eo tempo, cada um com seu verdadeiro nome, com a palavra precisa, e cada palavra serd clara ¢ precisa através de seus elementos: tom, prontincia e sentido, Nessa fase de crescimento, exigi- ‘mos da crianga que nomeie os objetos com toda pureza, clareza ¢ exati~ dio: 6 também absolutamente necessério que tudo que a rodeia se apre- sente puro, claro © exato - este dltimo é condigto inseparsvel do primeira, para que possa observa-lo e reconhec8-lo, Para a ctianga, nesse momen. to de sua evolugio, néo s6 a linguagem se identifica com 0 homem que fala como também os nomes e palavras vém a ser uma mesma coisa com (8 objetos denominados. Assim, no se acham diversificados nem sepa. rados a palavra e a coisa, a matéria ¢ o espitito, o corpo a alma, Isso se vé, sobretudo, nos jogos das criangas, No perfodo a que nos referimos agora, 0 jogo ¢ a linguagem constituem os elementos por meio dos quais a crianga vive, atribui a todas as coisas vida, sensibilida- dee palavra, Fala como se todos a ouvissem, porque a crianga comesa a exteriorizar © seu interior, e faz a mesma atividade com as coisas que a rodeiam - pedra ou tronco, planta, flor ou animal. Dessa maneira, & medi- da que se desenvolve a vida da crianga em geral, sua vida com os pais ¢ 2 familia, a vida como algo invisivel, comum ou superior a todos, desen- volve-se também, especialmente, sua vida na natureza e com a natureza, qual atribui uma vida andloga a sua, E esse contato com a natureza, com o repouso ¢ a claridade dos objetos naturais deve ser cultivado pe. Jos pais ¢ pela familia como um dos pontos mais importantes na formagio geral da crianga, Com esse fim muito particular, deve-se atentar aos seus Jogos, porque o jogo, em principio, néo é outra coisa que vida natural. © brincar, 0 jogo - 0 mais puro e espiritual produto dessa fase de crescimento humano -, constitui o mais alto grau de desenvolvimento do menino durante esse perfodo, porque & a manifestaco espontinea do interno, imediatamente provocada por uma necessidade do interior mes. ‘mo. E, a0 mesmo tempo, modelo e reprodugio da vida total, da intima e misteriosa vida da natureza no homem e em todas as coisas. Por isso, engendra alegria, liberdade, satisfaco e paz, harmonia com o mundo, Do Jogo, emanam as fontes de tudo que 6 bom. O menino que joga tranqui- Jamente, com atividade espontinea, resistindo a fadiga, chegard segura. mente a ser um homem também ativo, resistente, capaz de sacrificar-se & A.wdcagie do omen pelo seu priprio bem ¢ pelos demais. Esse perfodo nio é, pois, a mais bela manifestago da vida infantil em que a crianga joga e se entrega in- teiramente a0 seu jogo? Como ja se disse, nfo se devem considerar os jogos infantis como coisa frivola e sem interesse, As mies devem intervir nos jogos, assim como o pai deve observa-los ¢ vigid-los. Para um observador, verdadeiro conhecedor do coragio humano, toda a vida interior do homem futuro est jid presente nos jogos espontineos ¢ livres dese momento da infan- cia, Os jogos dessa idade sio os germes de toda a vida futura, porque ali ‘0 menino se mostra ¢ se desenvolve por inteiro em seus variados ¢ del cados aspectos, em suas mais intimas qualidades. Toda a vida futura do homem - até seus tiltimos passos sobre a terra - tem sua raiz nesse perio- do. Dele depende que sua vida seja serena ou angustiada, doce ou tur- bulenta, ativa ou pesarosa, fecunda ou estéril, cheia de fatos irrelevantes ou de obras brilhantes, educadora ou corruptora, que se desenvolve com visio clara do mundo ou com torpe indiferenga, que produza diseérdias e lutas ou convide & confianga ¢ & paz. As qualidades naturais da crianga , sobretudo, sua maneira de viver nessa idade influitio depois inevita- vVelmente nas suas relagées com o pai e a mie, com os irmios e a familia, com a sociedade civil e a humanidade inteira, com a natureza com Deus. ‘A vida do menino consigo mesmo, com os seus, com a natureza € com Deus se mantém em estreita unio. Assim, nio sabe se sdo as flores que Ihe agradam, ou se é sua propria alegria o que o encanta, ou se € alegria o que seus pais demostram quando Ihe dao atengdo, ou se expe- rimenta um obscuro pressentimento da existéncia de um amoroso Criador de todas as coisas. Quem poderia separar um por um desses motivos, confundidos em um vago sentimento de satisfagio? Se no se atende devidamente & crianga nessa fase decisiva de sua evolugio, se se cor- rompem esses delicados germes de sua vida futura, a crianga no chega- x4 depois, sendo com muito trabalho e extraordindrios esforgos, para ser fo que deveria, e pode ser que nfo alcance inteiramente a obra da educa~ fo, pois néo conseguiré mais que resultados fragmentérios ¢ incomple- tos. ‘Temos de dar real importancia, durante esses anos da infancia, as ‘comidas e alimentos, pois ndo influem s6 na vida atual da crianga; jé é de conhecimento que a alimentagio contribui para fazé-la ativa ou indolen- te, animada ou desanimada, débil ou vigorosa, répida ou lenta. Além dis~ 80, a alimentag&o exerce uma positiva influéncia sobre todo 0 resto de soa vida, porque as impressoes, as tendéncias, us puixdes, as boas ou més disposigdes de seus sentidos e de suas energias morais determinam iors WA, rel 0 toda formacdo do homem. Portanto, se essas inclinagdes ndo estiveram verdadeiramente integradas & vida fisica, espiritual ou as suas impressbes € aos seus sentimentos, o homem adulto dificiimente saberd integré-las. Convém, pois, que o primeiro alimento da crianga, depois do leite mater- no, seja moderado e simples, sem mais refinamentos que os absolutamen- te necessérios e, sobretudo, sem espécies demasiadas nem outros exci- tantes, nem excessivas gorduras, que poderiam prejudicar a atividade do organismo. (Os pais ¢ os professores deveriam ter muito presente essa verda- de geral da qual derivam muitos preceitos particulares. Quanto mais sim- ples e sébria, quanto mais adequada a verdadeira natureza humana tenha sido a.alimentagdo, quanto menos necessidades tenham sido criadas, tanto mais vigorosa ¢ feliz seré a erianga no futuro ¢ mais frutifero resultara seu trabalho em todos os sentidos. Quem nio tem observado freqiientemente instintos baixos, dos quais € dificil livrar-se, em jovens excitados pelos temperos € pelo excesso de comida? E quando mais tarde parece terem esquecido esses instintos, estio s6 cansados ¢ esperam a primeira oca~ para voltar a apresenté-los, com dupla intensidade, rebaixando a dig- nidade do homem ¢ afastando-o do cumprimento dos seus deveres. Nao se esquegam os pais de que a crianga depende de cértos cuidados - que parecem insignificantes - nfio s6 para sua felicidade pessoal, mas também para a da casa, da familia e, em pate, da sociedade inteira. Porém, com freqtiéncia, vemos a mie ignorante, 0 pai nao previdente, que - por minis- trarem indevidamente a seu filho veneno e mais veneno em todas as for- ‘mas € maneiras, em alimentos estranhos, em comidas demasiado fortes, em quantidades excessivas que fadigam os érgios da digesta, e por dar- Ihes de comer em momentos inoportunos e s6 para distrair 0 aborreci- ‘mento de uma crianga inativa - produzem uma artificial excitagio fisica, uma excitago do corpo sem nenhum motivo espiritual que a justifique, debilitando e prejudicando assim 0 corpo mesmo, Hé pais to cegos que tomam a preguiga ¢ 0 desinimo fisico por uma verdadeira paz. que Thes faz bem; confundem a inquietude e mobilidade do corpo da crianga - pro- duzidos nao por influéncias espirituais, mas por um resultado de verda- deiro envenenamento, de uma nociva excitagdo - com a auténtica tonicidade vital € a saudavel animagio de um vigoroso crescimento. © bem-estar, a felicidade e a salvaco do género humano repou- sam sobre fundamentos sensiveis, muito mais sensiveis do que nés os ‘mostramos. Todos temos meios suficientes pare alcangé-los, porém, mui- tas vezes, nao 0s identificamos, porque sa0 tao sensiveis, tao naturais - ois estio tio préximos, tio féceis de aplicar - que nos parecem insi 0 A nag d ene ficantes e indignos de nossa atengdo. Buscamos muito longe a forga que esté em nds; s6 nés mesmos podemos nos salvar. E esta é a causa de que mais tarde se abastece todo hosso esforgo para proporcionar aos filhos: dar-hes as melhores coisas. Se conseguimos fazer isso, nunca é em toda a sua pureza e perfeigao. Mesmo assim, os filhos o adquirem por si mesmos - no & custa de um pequeno sacrificio, mas pela educagio que thes foi dada durante sua infancia. Se os pais nao tivessem se preo- cupado com o cuidado do corpo, talvez os filhos nao conseguissem atin- gir a felicidade, 0 bem-estar. Quem dera que todos 0s pais pudessem ter, desde 0 principio, experiéncia dessas coisas! Parecem pequenas, minimas, insignificantes. E, no entanto, bastam para anular toda a obra posterior da educagio. Se 98 pais compreendessem 0 quanto 0 educador tem de fazer para sanar os erros em que 0s pais incorrem, € com quantos escassos resultados 0 ‘educador conta... Quem ignora a forga com que se gravam as primeiras impressdes recebidas na infancia? Para evitar esses ertos, nfo esquegamos isto: o alimento deve ser sempre um meio de vida - nem mais nem menos que um simples meio de vida, sem converter-se jamais em um fim em si mesmo - e subordinar-se sempre ao desenvolvimento das atividades fisicas ¢ espirituais. Com esse critério de que a comida seja s6 um meio para a vida sadia, pura ¢ ativa, preocupar-nos-emos menos com sua qualidade, com seu sabor e refina- mento - das propriedades que tendem a converté-la em um verdadeiro fim, prejudicial para a satide e 0 equilfotio do organismo. Que a crianga, pois, seja alimentada com coisas simples e modestas, em harmonia com sua vida © em quantidades adequadas & atividade fisica ¢ espiritual que desenvolve. Por outro lado, se se quer que 0 menino, o homem, nessa etapa do seu desenvolvimento, possa mover-se ¢ julgar sem obstéculos, possa ‘erescer e formar-se com liberdade -, convém também que suas roupas no estejam demasiadamente estreitas © apertadas, porque tais vestimentas apertam oprimem.igualmente o espfrito do homem. Nem nessa idade, nem na seguinte, devem usar-se roupas que tendem a tirar do corpo sta unidade de movimentos, porque exercem um influxo semelhante sobre 0 espirito, sobre a alma da crianga. Tampouco a vestimenta - seu corte, sua aparéncia, sua cor - constitua um fim em si mesmo; do contrétio, contri- buird para que comportamentos frivolos e exteriores se manifestem, con- vertendo o ser humano em uma boneca, um fantoche. Porém, nio dedu- zamos disso que as condigdes do vestir so indiferentes para a crianga e para o adulto, nem em particular para o cristio: a vida de Jesus no foi ‘redrich WA Pate st contraditéria nem em retalhos - foi de uma pega como sua tdnica: essa é a lei do cristdo, fim e objeto da educagio dada pelos pais, no ambiente e no circulo da familia, consistem em despertar ¢ desenvolver suficientemente tanto as energias e atitudes gerais como as especiais de cada um dos membros e Srgdios do homem. Isso € 0 que 0 corago sensivel da mie faz ‘espontaneamente, sem necessidade de aprendizagem ou doutrina. Porém, isso 56 nao basta: € preciso que a mae tenha consciéncia de que atua sobre outro ser gue ainda nao chegou, porém deve chegar & plena cons- ciéncia; que tenha uma maneira reflexiva, derivando todas as suas mani- festagdes de uma unidade interior e viva e eneaminhando-as com toda intengo ao incessante progresso do homem. Sua propria atividade, aqui descrita, pode sem divida dar & mie essa consciéncia da natureza, im- portincia e unidade de todas as suas obras. Uma mie sensivel agira de ‘modo verdadeiro, completo e profundo, porém reflexivo: a imperfeigao leva 2 perfeiggo. Quem dera que nossas palavras contribufssem para o des- pertar de um amor mateo, tranquilo e constante, sensivel e razoavel, € para excitar em todos a reflexio consciente sobre as mitiplas manifesta- ‘ees € a interna unidade do processo evolutivo da vida infantil! “Vem, dé-me os bracinhos”... “Acéna-mé tua mlozinha”, assim se esforga a mae carinhosa em mostrar & crianga as diferentes partes de seu préprio corpo € 0 distinto uso de seus membros, " Mostra teu dedinho", esse é um dos mais acertados jogos - com que a mae ingenuamente se diverte, que dé 2 crianga a intuigdo e 0 conhecimento de uma coisa iso- ada, mas unida a ele. Com esses primeiros e mais exteriores fendmenos, © futuro homem inicia o processo de reflexdo: assim, nfo tém menor valor ‘outras diversdes similares com as quais a mae ensina a crianga a conhe- cer aqueles outros membros que ele no pode observar diretamente: 0 naiz, as orelhas, os dentes ou a lingua, A mae Ihe tira suavemente o nariz ou as orethas, como se quisesse separd-las da face, e Ihe diz, assinalando ‘a ponta dos dedos: “Aqui tenho as orelhas, 0 narizinhio”. E a crianga coca, em seguida, as orethas ou o nariz.e ri alegremente ao ver que as encontra em seu lugar. Aqui esté 0 principio do conhecimento de tudo aquilo que no pode ser visto nem apreciado pelos sentidos. objetivo desses jogos consiste em levar pouco a pouco a crian- ‘sa A consciéncia de si mesma, a futura reflexio sobre si mesma. Um garo- to de dez anos, cue ja tinha comecado seus estudos e que recebera antes a mesma educacio natural, dizia uma vez sozinho e crendo que ninguém © escutava; “Mea brago nio € eu; minha orelha tampouco; cada um dos meus membros ¢ sentidos pode ser separado de mim, e, no entanto, eu

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