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serrresssoszans INN “O nosso livre pode admitir 6 titulo de Fratado ele istOria das retigioes |. aia medida em que introc 0 Ieitor na complexiditlé) ead tos tligiosos,, So} * E ay od jy fundantencais ¢ com a” ‘ special, Tratado de toria das - Religides ve © familiariza com suds estrunutiis dliversidade dos cireulos culiorais de que cles depe Procunmos dour cates te ad ehearropcen, 7 “estilo” Bs pO, atin ee 4a por vezes até de uw: ‘monotonia que amiegca qualquer exposicio diditien” Mircea Eliade i a az Z Ns hee ay } say be [Sonparyagna bapmeeesgso hadobrr range brah sixdonrbonana patsy Publicado pela primeira vex em 1949,0 Tratado de bist6ria das religides, de Mircea Eliade, € hoje um classico do pensamento contemporineo, tendo servido de base de trabalho & numerosas geractes de estudiosos ¢ simples leitores, Esta edicao brasileira da obra inclui o importante prefiicio de Georges Dumézil. Nascido na Roménia em 1907, Mircea Eliade instalase em Paris apés a Seguncla Guerra Mundial, Jecionando na Ecole Pratique des Hautes Brudes, Em 1957 € nomeado professor do departamento de historia das religides da Universidade de TRATADO DE HISTORIA DAS RELIGIOES Outros titulos do nosso catélogo André Comte sponte TRATADO DE HISTORIA DAS RELIGIOES Mircea Eliade Martins Fontes ‘$o Paulo 2008 I. Aproximasdes: extratura © morfolosia do sagrado ‘© Clu: deuses uranianos,ritos esimbolos ceestes {© Sol © 0s ents SOAs enn A Lia e a estica lunar « LY. As éguas ¢ 0 simbolismo aquatica As pedras sagradas: epifanas, VILL A Terra, a mulher © a fecundidade |. A vesetacta: sfmbolos € ritos de renovacao. ‘A agricultura © os cultos de fertilidade «scr ‘© espaco sagrado: templo, palieio, "centro do XI. 0 tempo sagrado ¢ 0 mito do eterno recomego - XII. Morfologia ¢ funga0 dos mitos Coach Ran 0 325.00 Si Pale SP Rend "LY SIF 3697 Fa) 318 aa co A Preficio de Georges Dumézil se pode dizer que as ciéneias envethecem depressa 0 século, ols 188 0 privlézia de nao correrem para w pro ja morte, No entanto, como tnudam rapidarnente de aspecto! cia das refigioes ¢ como a dos ninmeros ou a dos astres. ins ngiienta anos, eobvec menas,juledvamo-nos muito de expllcar das es coisas ao reducirmes as fendme- Sul Esa elders vane ert 13 concretizagdes varialas de famoso mana, esse forea ees aor ese eee: rit em que det as noses palavras: es fora presenie 5 fugares das quais se pode falar de religido; e pale- ae hhagnos e thames, tao e até rapa” do crsvanivno, si variants suas ou seus derivades. de pesquisadores deicou-seaesiabelecer est uni- fico, os atos religiosas que encontravam. F 0 que mas aparece ‘Hoie.come nie Surpreendente, o que recama estudo, jd mio € essa dlfusae confnsa da quel se encontea una naga por todo 0, mas ques é a mesma pela razdo de que acerca dela nada dizer, mas as estruturas, os mecanismias, os ¢quilfbrios ios de toda sel e defnides, discursive ou simbal- lente, em toda telogi, toda mitologa, toda iturgia, Cheaoue x TRATADO DE HISTORIA DAS RELIGIOES se — ow voliou-se — a tdeia de que uma rete diferencia de td epoca dos cous ehmenton, un peraamen to articulado, wma explicerto do mundo. Em resi, € 500 0 Signo do loyo% endo #08 o de: mana que se sia hoje a pesquisa, "Haus cinadenta ans, talver menos, qualquer antropolo- sista nalts ir soclblogo frdncésleventav, solidariamente, dois aimbiciosas problenta da origem dos fatos religiosas ¢ o da ‘eneclonia das Formas religiosas. Memorvet: batalha se trav ram @ verta do Dews Santa dos tens. Aigurnas escola cram 6 eustralanos como osamos testemahos das formas elemen- fares da vii efipioxe, outta apbensshes ox pismeus: seas pr ‘meitos S80, em parte, povos pateolivos, 0 segundos nie serdo sida mats areiens, pots mal se afastam de una condi enn Drlondria? Disa se sobre a genese de des de deus: sed Ine ‘pendence da iia de alma ou feta sco dea? O culto dos mor fos precede odes forgas de naturesa? Pergintas graves. Tals polemicas, frequentemente calorosas, ispiraram lies ad ‘mirvese 0 qe aindo 6 melhor provocaram observapdese com pilagdes. Mas ndo foram exaustivas nem de pleno éxito. Hoje, fa pesquisa afstose dela A ciércie das relgibes delxa pera ox {ilosofes a questdo das orien, tal camo Fe, um pouco antes, ‘a eléncia da linguagem, como fseram toils os outens ccs ‘Renurciatartem a prescrever a posterior, se exsim se pode die 2, para es formes religionas do pasado una evolug tipo, wre marta arse Quer as oes oe Xo i nos anies, munca chegamos mato longe ne vida de quaguer por (0 di mania apenas conser encontrarinos dante dos Tevultadasdevuma maturagio ede acldentes que ocuparam deze nas de séouos ¢ dices entéo que 0 polnésio eo indoreuropeu, O semita eo chinds chegaram ds suas rogdes religions, conf Inurapoes dos seus deuses, por vias musifo diversas, ainda que se nolen semethangas nos pontor de chegarte. ‘Em sum, @tendéacia aru € a de “volta a sentir como disia Henri Hert, de registrar na sua orginalidade coma sue Complexidae os sistenras religtosos ue foram ou so pratcodos enifode o mundo, Max como. exprine essa tendnela? Que ge hero ee estudos 0 atiment? L. Antes de mais, descrigGes cada vez mais exaustivas. Etad- agrafese historiodares, conforme as cas, a0 acuiuartde OB. Servactes e documentos de fo especie €teatar compreender (quloqueestabelce uma unidade eo canter orainivo dese t- WACIO DE GEORGES DUWEZTL éyio, relerivamente a cacke dominio ¢ a cada periodo, Na ver- le, ese esforco fem se realizado, methor ox pior nas, ne mals ects, Dastante bem, em ‘odes as épocas. TI, Emm seeundo luzar, se as questoes de origem ¢ de genea- fi foram conipletansente abordonades, yoltaram no ertanto furgin, de modo mais modesto eso, « propdsito de cacia wna as destricdes, geoaraficae historicamente circunsorias, que a= fm de cer mencionaitas. Em matéris de religido, coro emt ma- ide iguager, tod estado s6 se explica, ou mio se epee, jor uma evolucko, a partir de wn estacto anterior, cam ou ser rerveacdo de inpludncias exteriores. Du, vérios domihies de pes- lisa © vérlos tipos de snétodos iquabinente necesscrias: 1 Para as sociedades que, id mais-ou hd nieias tampa, pos- “sien ima literatura, ou pelo menos documentos escitas, a estu- “lade bistdriareligiosa mdo & mais do que ton éaso particular do “Wistéria da civtizarao, ou da histéria em sentido esrio, ¢, tant. Ii critica como na consirugio, no emprega outros prcessos. "As “trandes religioes”, como 0 buclsma, 0 cristanisme, 0 mia hiquelsmo, o islamismo, representam esie caso ao midxliMo, pals {sa literatura remanta pouco mais ox menos aos principias da “tvalugda, Alf, tones oF religides vom pouco antigas dependem “Gosmesmos metodas ein menor rau, a partir de certo ponte do “yeu desenvolvimento, « corn a condigao de que se fenha obtito Usiio na intorpretacdo das primeiras formas verificadas. 22 Mas esta condigto € dificil de cumprir, e encoxtra-se a ‘mesmia difieuldade em relacdo 2s religioes 36 mult tardia ¢ re- centemente consideradas: por razées diversas, tanto o leitor de Sirehlow como o leitor dos Vecas sofre de fiat deficiéncia de Vitae retraspectiva, pois ambos se encontram perante wii estri- ura relipiose compieta, e até diante de wina literatura religosa, inas desprovida de qualquer neio de explieayo hivtbrca, ito é ide explicapdo pelo anterior. Ora, tratarse do caso mass peral, ue 0 de (odes as religides exdticas descritas pelos exploradores destde fo séeulo XV1 ard sécuto XX; € de todas as religides pads da Europa, tneluindo a de Roma ¢ a da Grécias o caso das religides das antigos poves semsticos ¢ da China, Neste dominia e sobre Cite ponto, a tarcja da ciéncia das relisides & miltipla: 4) Bm primeiro lugar, 6 necesséria wma limpeza, pols as es- reborias de Ausias estéo atufhadas. AS eeragdes anteriores nos evcaram explicagdes que, de maneiva geral, devem ser rejila- es, quer sefam absurdes, quer razodveis, A terdéncia geral de XI TRATADO DE tnISTORIA Da RELIGIOES todo historiador especializad, no moriento emi gue, remontan doo curso dos sécuios, chega até & penumbrt, depots até ws tre as, €4@ de imaginor uma curra pré-histdria, que proionaa, com ener ers pete ot primar dacument a wm hoo. ico coniepo absoturo, ex rihilo, Os ltinstes explicam @ for: ina rei romana parr devo wari ies oe ‘anal, dos quais somente alguns, que te benefictam de circus ‘nas hiscricas, se eran coneretizada om deter pessoas, Mu. {08 indianistas ainda tim dificuldace em se afastar das mirasens de Max Miller juigar ounir as chentes vices exprimiras rer £8e5 naturais do homem primitive peranie 0 grande fenémieno dia naturezn € as outros no esto mul lonse de verem mos hi nos puras fantastas ca imaginardo e de estate — tra forma de ergo ex ill. Tudo so ar: eras de reac 8) A sewuit, wma tarefa positive, gue equivale @ profongar objetivamente a histdria, por processos comparativos,¢ ganar atguns seculas sobre a pré-histaria, Comparande 0 otemismo ds arunte com formas andlogus,¢ no entanto diferentes, praticadas speles outros indigenas da Austria, fos possietdefinir xm sen. ‘ido prowével de evolugao a partir de wn estado antigo (ndo pri- snitiva, certamente), de um estado comarns quer por eofruanida- sede origem, quer por interacdes seculare, 0s austraianos for- ‘mar de foto um “chro eulturat eé posal, auaatis mutan tis, eplcar ds sas rete, ds suas evlzagtes, 0 procesios cort= ‘parativos que permitern ao linguista, quando este dance de um po de linguas geneticamente gpareniades ou aproxtmadas por lum intenso ozo le conrributas, infuse ladas certos «preciso acerca do seu passado, A Polinési, diversas conus da Africa Ne- ‘ae da América permitem amplamente o empreso desse toda Dar mesmia maneira, 2o compararnios ax formas de relizido ‘mais remotamente verficadas enive diversas pover que nio st se. iam nem se conhesiam como aparentades, desde 0 comeco da sua histdria, mas das quaissabemos hoje, preesaniente pele com. Siderepaa da sua tingua, que derivam por dispersdo de wn mes ‘mo poro pré-hisicrico, podemos fazer Induces provdvets acer 2 de veligido desse poro pré-historicae, por conseqiéncia, acer. ‘a as evolurdes variades que, a partir desse ponte fixe, econ’. ‘ituido mas no arbtrdrio, Conduziram os paves dele teriados 4i€ seus respectivoslimiaresFistdricas, até as primeires equit- brios eonhecidos das suas rellgides. E assim que, para os povos pesedcio be ctonoes punatzn. xu lisa, © hoje para os povos indo-etropeus, se reconguist- Jani un bu dots iionos sobre os tempore incognita. Proveita ‘gscesso, se 0 confrontarmos ds ambicdes de ue Taylor ou até de ‘um Durcheimn, mas provelco mais seguro eo qua, se entrevé, se- 1d significative pasa construir, enfin, re histéria natural do ex. ‘pirito numa. 37 Um terceiro género de pesquisas interfere com as prece- dentes, Assim como a0 lado de wma lingutstica descritva, de wma ingsticn histérica (com a sua variedode, a lingiistca compara- fiva de cada fama), hd lugar para wna Fingustca geral, assim amber necessdrio yhumentos proterhistoricos, uma quantidade de rts ed lendas ‘populares do atimo século — hateré alguma coisa mais eters. clita do que o material documental de que dispde o historiador sas regis germanicas ou eslavas? Embora aeitivel no estude de uma $6 religifo, tal heterogencidade torna-se grave quande se trata de nos aprosimarmas éo estido comparativo as eeligibes ede pretendermos ating conhecimento de um grande nimi das modalidades do sazrado. Essa £exalamente a situa do critco que tvesse por obi agi ectever a histéria da beratora francesa sem mais docu: Mlentagdo que os fragmentos de Racine, uma tradugiio expanhe- 4a de Li Bruyere, alguns textos citados por um critica estrangel fo, a6 recordacdes Hterdvias de slguns via janes e diplomatas, © salaiogo ds uma livaria de provineig, 08 resumox eos temas de uum cogil ¢ mais algumas indieagber do mesmo genero. Els en mia, alocumentacdo de que dispdeo historiadar das religibes ‘alguns fraamentos de uma vasta literatura sacerdotal oral (cria- 80 enclisiva de ceria clase soci), algumas reterencias encom: ‘tadas nas notas dos viajantes, 0; matetiais recolhidos pelos mis- Slonsrios esirangiros, as refiexdes extrnides da literatura pra, ‘ay alguns cnumentos, algunas insriges eas recordapet am servadas nas radigdes populares, Também as citncins historias estdo consranglas «ume docimentarao dese nero, fragment taria © contingent. Mas a empresa do hstoriador das religises E muito tals ousada do que a do historiador que se propbe te Constituir um aconteeimento ol nia sérc de aconteciscaros ht Sabi dos escassos documentos canservados, pois nfo s6 tem de 2 "TRATADO DE HISTORIA DAS RELIGIOES tragat a histéria de determinada hierofania (ito, mio, deus ou ulto), como, cm primeiro lugar, tem de conpecender ¢ tomar comprsensivel a modalidede do saerado vevelada através dessa hicrofania, Ova, a heterogencidade & 0 cariter fortuilo dos do- Gumiehios de que dispomos aaravam a diflculdade que a histotia« dor ciperiments sempre para imterpretat corretamente 6 sentido dem hicrofania, Imaginemos a situacao de um budisia que pare sompreender cristanismo dispusesse de apenas alguns ragmens {or dos Evangethos, de wm brevidri calico, de um material ieo- oarifico heterdcito (cones bizantinos,estétuas dos santos a {poea hairoca, yextimentas de um padre ortodoxo}, mes que, cin toca, tixesse a posiblidade de estudar a vida religiosa de uma aldeia europtia. Sem divida o abservador bk belecer uma nitida dstinedo entre a vida Fels $26 ¢.4 concepy Ses tcoldgicas, morais¢ miateas do sacerdote da ldeia. Nas, embora procedesse razoavelmente a0 eslabelecer exe sisting, cairia em erro se eonsiderase 0 crisianismo a partir sas acigbes conscrvadas pelo individua Unio que eo sacerdote #86 considerasse como ‘'verdadera!’ a experiénoia representada Pela comunidade da aldeia. Em resumo, as modalidades do sé- {Rfado revelado pelo cristianiamo so mais rigorosamente canscr- ‘Yadas na tradicdo representada pelo padre (ainda que fortemen te colorida pela histéria © pela teologia) do gue as erencas da al- ea. Ora, 0 que interessa ao observador N&O & 9 Gonhecimento de certo momento da histSrin do erstianismo, em certo setor da Stistandade, mas a propria teligtio evista. O'fate de tim snico Inkdividuo, em toda a aldeia, conhever 0 ritual, 0 dogma c a mis. tica crit, enquanto o resto da comunidade os ignore # pratica Ln eulto clementar imbuido de superstigBes (to é, de restos das hhierofanias decaidas), nao assume, pela menos agi, impoctin- Gia nenhuma. © importante ¢ apercebermo-nos de que est indi viduo conserva de maneita mais completa, se no 4 experiencia Ctignal do cristinismo, pelo menos as seus elementos fundamen {als € as suas valorizacdes misticas, eoiépieae e rituals Etse erode método ¢ muito frequente am etnologia.P. Ra- din julea-se autorizado a rejctar as conclusbes das pesquisas do missionério Gusinde porque os seus inqueritos inci nom 55 individuo, Esta atitude <6 se justifieatia no caso em que 0 objet vo du pesquisa fosse estritamente socioléuico: a vida reliiosn de uma comuridade fueguina main dado momento histeriso; mas ‘quando se trata de apreender as copaeidades de expetsehcialica- -APROXIMAGOES: ESTRUTURA E MORFOLOGIA a ‘G0 da sacralidade pelos tueguinos a situago & completamente ‘diferente, Ora, um dos problemas mais importantes da Bistoria as religides € justamente essa eapacidade de conliecer ss dfe- rentts modalidadss do sagrado dos primitivas. Ds fato, se fosse possivel demonstrat (als sso fol realizado nas dtimas déeadas) ‘que a vid rligisa dos povos mais primitivos¢ verdadsiramente ‘omplexa, que nfo pode ser redurida ao ‘animisma”, 20 “tote- inismo””, nem ao eulto dos antepassados, mas que conece taun- thé os Sores supremas providos de todds os press da deus -riador e todo-poderoso, a hipétese cvalticionista, que priva 05 ‘pfimitivos do acosso as ““hierofanias superiores", fcatia assim imediatamente invalidade, 3. Variedade das hierofanias — As comparagoes a que re- ‘soremos para demonstrar como ¢ precfrio o material documen- ‘al de que dispde o historiador das relipiSee so imapindrias, e somente assim devem ser consideradas. A nossa preocupapiie prin- ‘cipal é a de justifiear o-métado a que vai obedever a obra presen- ‘ie, Em que medida estamos nds autorizados — dada a heterogs- sneidade e a precariedade do material documental — a falar das ““modialidades do sagrado""? © que nos assegura a existéncia red sdessas modalidades #0 fato de uma bierofania ser diferentemen- ‘te vivida e interpretada pelas “tite” religiosas em relagio ao resto da comunidade. Para 0 povo que no principio do outono vers alé o templo de Kalighat, em Celcutd, Durga é uma deusa terri- ‘vel, 2.qual € preciso sacrifiear bodes; mas para uns tantos skah- ‘as iniciados Durga ¢ a epifania da vida eésmnica em continua ‘violenta palingenesia. E muito provavel que entre os adoradores do linga de Shiva grande mimero nfo veja nsfe mals que @ arqué- tipo do drgdo gerador; mas hd outros que o eonsideram como ‘um animal, um “icone” da criago ¢ ds desiruiedo ritmicas do ‘universo, ue se manifesta nas formas e se reintepea periodies- mente na unidade primordial, pré-formal, a fim de se regencrar, ‘Qual & 2 verdadeira hierofania de Durga e Shiva: a que os “ini- siados” decifram ou a que ¢ apreendida pela massa dos “ren tes"? Tentaremos mostrar, nas paginas sequintes, que ambas S80 ‘dlidas, que o sentido estabelecido entre as massas, tal como a interpretagdo dos iniciados, representa uma modalidade real, au ‘ntica, do sagrado manifestado por Durga ou Shiva. E podere- ‘mos mostrar que as duas hierofanias sao correntes, Iso €, que 4 TRATADO BE HISTORIA RAD RBLIGIOES as modadaes do sara reveladasatrayésdelas no io de a heira nenhuma contraditérss, mas intepraveis¢ complement: Fes, Frenos asim aulorzaos a conser uma *alldede” gual um documento que regisira uma experiéneia popular eum documento que refisie a expergnsia de uma ete, As dua tate- forias de documentos so indispentivels — tle apenas para tleserover a hibtdrie de uma bisrofanin, mas, em pemiico Isat, Doraue sidan contr as maids Jo agro reveado atcavés desta hero "Estas observacdes — amplamente isradas nos esuos deste livra — devem see aplicadas & heterogencidade das hicrofanias aia reerias. Poit — como acabamos de dizer — estes docu. menos ndo a6 ste hesrogtneos em telagto A sua orga (uns dimanam dos sacerdotes ot dosinicados, outros das tices us spenas oferocem alustes, fragmento ou vagas teftrbacas, ox {Tos texas originals, et.) mas ambem quanto a sua propa o trituts, Por enemplo, ae bierofanlas vgetals (te 6 0 sastado revelado atraves da vegetagio)encontramese tanto nos sinbolos G@ arvore cdsmict) ot fot mites metaliscos (a drvore da vida) come nos.ritos “populares” (0 “‘cortcjo da arvore de maio"’, as fogueiras, 0 ihe Sirdrios), nas ereneasligadas idea de wna forigem vegetal da humanidade, nas relagdesmisticasexistenes bent certs irvarese certs individvas ou sociedaces hums as superstigdes relativas & fecundagdo pelos frutos ow pelas flores? nos contos em que o herd, covardemente asics, se transforma nvima plant aos mitos enos tos das divindades aa vogtagtoe da apiculate: Exes docunentesdferem ni 5 pela sua histéria (corsparsr, por exemple, osimbolo da arvo. fe eovmica eae ot Indlanos ene of ttacos com as creneas de algumas populagdes primitlvas, a respeite da descondéncia do género humano a partir de uma espécie vegetal) mas também pe- Ja propria estrutura. Quais sao os documentos que nos yao servi de model para conmpreendermas as hierofanias vets? Oss boloa, of lon, ox itor ou as “formas divas"? “O metodo sais seguro ¢evidentementeo que considera ut liza todos estes documentos heterogdneos, sm exclu nenhum tipo importante, eatenta simaltancamente para a questo dos com. ‘Por aarp, as “Woguriys de S80 1050" 4:7) °F cua 0 seu pode repenesasior, como san Vr. spe etna” OT) APRONIMAQOBS: ESTROTURA E MORFOLOGTA 1s ‘etidas revelados por todas as hlerofanias. Obteremos assim um ‘conjumto coerente de notas comuns que — come veremos mais tarde, alids — permoitem organizar um sistema coerente das mo- ddalidades da sacralidade vegetal. Poderemos assim notar que ca dda hierofania pressupde tal sistema; que uni costume popular, de erto modo relacionade com o “cartejo certmonial da arvore de ‘maio", implica a tacralidade vegetal Formulada pelo ideograma dda drvore cosinica; qu algumas hicrofanias sao powco ‘‘abertas”, So antes quate “cripticas”, no sentido de s6 revelarem parcial: ‘mente e de maneira mais ou menos sifrada a sacralidade incor porada ou simboliznda pela vegetagio, enqnanto outras hierofs- has, verdadsiramente “'fanicas”, deisam transparecer as moda- lidades do sagrado no seu conjunto, Paderemas assim eonside- Far como hierofania critica, insuficientemente ‘aberta”, ou “lo- cal", 0 costume de desfilar cerimoniosamente um ramo verde tno come¢o da primavera’*; e como hierofania “transparente” Co simbolo da drvore eOsmiea, Mas tanto uma eomo outra reve- a regeneracto ritmica, a vida inespotdvel que estd concentrada ra vegetaco, a realidade manifestada numa criagio periddien, etc. (124) O que devemos desde ja sublinhar ¢ que todas as hie: rofanias conduzem a um sistema de afirmagdes coerentes, a uma “teria” a scraliade vex teoria impiada tanto nas hi~ rofanias insuficientemente “aberias™ como nas outras. ‘As conseqiiéncias tedricas estas abservapées sero discuti- das no final desta obra, quanda tivermos examinado uma quan- Uidade suficiente de fatos. Por agora contentar-nos-emos em mos- trar que nem a heterogencidade histérica dos docusientos (uns ‘smanados das “cites” religiosas, outros das massas incultas, ov ‘ros sinda 0 produto de uma eivilizaedo refinada, outros final ‘mente criagio das sociedades primitivas,ctc.), nem a sua hetero- encidade estrutural (mitos, rites, formas divinas, supersticdes, ‘{c.) constituem obstaculo para a compreensda de uma hierofa” hia. Apesar das dificuldades de ordem prtica, s6 esta mesma he- terogencidade éeapaz de nos revelar todas as modalidades do sa- _stado, visto que win simbolo ou um mito tornam evidentemente ‘ansparentes as modalidades que um rito no pode mantfestar, Fae Ema crime, por eemple, am pracino. OLE) =. -"domage da Ramos" poe st ansideado como motalitade ests Hie. OT) 16 TRATADO BE HISTORTA DAS RELIGIONS ‘mas 180-36 implicar. A diferenga enire o nivel de um simboio, por exemplo, ¢ 0 de um rito é de tal natureza que jamais 0 rito ‘poderd revelar tudo 0 que o simbolo revela. Mas, repitamo-lo, ‘thierofania ativa num nfo aprisia pressupae a presenea de todo ‘sistema, isto &, o-sonjunto das modalidades da sacralidade ve- etal que revelam, de maneira mais ou menos slobal, as oULtas hrictofanias agrarias. [Bssas observapbes preliminares compreendler-se-T0 no mo- ‘metto ¢m que o problema for retomade num ponte de vista di- ferente. O fato de a feiticeira queimar uma boneca de cera, pro- vida de uma madeixa de eabelos da sua “vitima”, sem se aperoe- ber, de maneira satisfatoria, da feoria pressuposta por um at0 magico como esse nfo tem 2 minima importincia para com. Dreensto da magia simpatica. O que importa para compreender essa magia ¢ saber que tal ato s6 foi possivel partie do morsen- ‘to em que certos individuos se convenceram (por via experimen- fal) ou afirmaram (por via tedrica} que a8 waht, 08 cabelos on 5 objetos usados por um ser huumano conservarn relagdes iti- mas com este apds a sua separacio. Tal erenca peestupbe a & téacia de um “espago-rede"* que liga entre si-08 ob elas mais afas- tad, efetuando ta ligaeio a wusta de urna simpstia drigida por leis especificas (a coexistincia orgdnica, a analogia formal ou sim- lica, as simetrias funcionais). O feiticeiro (0 que atug como ma- 1g0) 86 pode acreditar na eficicia da sua ago na medida em que tal “espavostede” existe. Conheca cle ou nfo ete "espaco-rede”, tenha ow no canhecimenta da ‘tsimpacia” que liga os cabelas ‘0 individuo, ¢ coisa sem importancia. & muito provavel que mui- tas das feiicsitasatuais ndo possuam uma represeniacio do mu do de acordo-com as prticas mégicas que exereem. Mas, consic deradas em st mesmas, essa prcticas podem eevelas-nos o mun. do de onde vém, ainda que os seus exceutates nao thes tenbara ‘eesso por via leariea. O universo mental dos mundos arcaicos ‘aio chegou até nds dialeticamente nas ereagas expicitas das in- iduos, mas conservou-se nos mitos, nos Simbolos ¢ costumes que, apesar de todo género de degradagao, deixam ver ainda cla- Tamenic o seu sentido original, Em certo sentido, Fepresentarn |Sfossctsvivos'”© por vezes asa um s6-"tdesi” para que Posse ‘mos reconstituir @ conjunto orginico de que ele é 0 vestigio. 4. Muliplicidade das hierofanias — Os exemplos que aca bbam de ser ctados serdo retomados e reforcacos na presene obra. _APROXIMACOBS: ESTRUTURA B MORFOLOOTA uv ‘Axé agora serviram-nos de primeira aproximacio, na para deti- iilar a nogo do sagrado, mas para nos fazuiliarizar com os do- cumentos de que dispamos. Chamamas hierofanias a esses do- ‘cumentos porque cada ui deles revela uma modalidade do ss: arada. As modalidades desta revelagio, assim como o valor on- {olégico que se thes atribui sio das questdes que s6 podestio ser ‘diseutidas no flm da nossa pesquisa. Por ora consideremos cada ‘documento — rito, mito, cosmogonia ou cleus — como consti- ‘tuludo uma hierofania; ow, por outras palavras, tentemos ‘sonsiderd-los como uma manifestagéo do sagrado no universo: mental daquetes que 0 receberam. ‘Certamente ta exercicio nem sempre ¢ fel, Para 9 ociden- ta, habituade a relacionar espontaneamente as naedes de sagra- do, de religido, ¢ até de magia, com certas formas histdricas da jul religiosa fidaico-crist8, as hierofanias estranhas suryem-the, fem grande parte, como aberrantes. Ainda que esteja predinposto a cousiderar com simpatia certos aspectos das religides exsticas — cei ptimeiro lugat 03 das teligides oriemisis — s0 dificilmen- te poderd compreender a sacralidade das pedtas, por exemplo, ‘ua endtica mistica, E supondo ainda que tais hievofanias exetn ‘rieas possam encontrar algumas justifieagdes (considersndo-as, ‘por exempl, somo “fetichismos”) € quase certo que um home ‘modemo permaneceré reftatdrio em relagto a outrac, que hesi- ‘ard em coneeder-Ihes 0 valor de hiecofania, isto é, de modalids- de do sagrada. Walter Orto notava, no seu Die Gotter Grische- Janes, como € dificil para as modernos apreender a sacralidade ‘das “formas perfeitas”, uma das eategorias do diving de uso cor ‘Tente entre os anigos hetenos, Esta diftculdade ugravar-se-d quan do chegar a hora de considerar um simbolo como uma manifes- ‘iasdo do sagracio, ow de sentir que a5 estagdes, of ritmos ou a plenitude das fornias (guaisguer que sejamt) S80 outeas tantas mo- dalidades da sacralidade, Tentaremos mostrar nas paginas seguin- {es como elas eram consideradas. assim pelos homens das eultu- ‘ras arcaicas. Ena medida em que nos desembaragarmos dos pre- conceitos didstices, em que nos esquevermos de que essas atitu- ides foram por vezes tachadas de pantsismo, de feitigaria, de in- fantilismo, et., € que conseguiremos compreender o sentido pas- sado ou atual do sagrado nas culturas arcaicas, simultaneamente auimentaréo as nossas probabilidades de compreendermas igual- mente os modas ¢ a historia da sacralidade Precisames nos habituar a aceitar a exist@neia alas hierofanas 18 TRATADO DE HISTORIA DAS RELICIOES onde quer que seja, em qualquer setor da vide fisiolégica, exo- ‘némica, espiritual ou social. Em suma, nds nao sabemos se exis- lealguraa coisa — objeto, gesto, functo fisloligica, ser ou jozo, ef. — que nunca tivesse sido transfigurada, em qualquer parte, no decurso da histéria da humanidade, em hierofania. Questio muito diferente a de procurar a3 raades que fizeram com que e584 alguma coisa se tornasse uma hierofania ou deixasse de © ser em dado momento. Mas é certo que tudo quanto 0 hornem ‘manejou, sentiu, eneontrou ou amou pode tornar-se uma blero- famia. Sabemos, por excmplo, que no seu conjunto as 2est0s, 28 dangas, as brincadeiras das criangas, os brinquedos tém uma ari ‘gem religiosa: foram, no tempo, eestos ou objetos cultuais. ‘bemos, do mesmo modo, que 05 instrumentas de nvisiea, a ar quiterura, os mefos de transporte (animais, eatcos, barcos, ec.) comieyaram por ser abjetos ou alividades sagredas. Podemos pen: sar que no existe nenhum animal ou planta importante que nde tenha participade da sacralidade no decurso da histéria, Sabe- ‘mos da mesma mancira que tados os oficios, arses, indistrias, ‘éenkeas 2m orlgem sagrada on se revestiram, mo curso dos tem: pos, de valores cultuais. Esta lista poderis continuar com os ges- {0s cotidianos (olevantat-se depois da noite dormica, © caminhar, ‘ocorrer), pelos diferentes rabalhos cara, pesca, agricultura), por todos 08 atos fisialdgicos {alimentapiio, vida sexual), provayel- ‘mente também pelas palayras essenciais da lingua, € assim por ie, Evidentemente, no devemos imaginar que tode a espé cic humana tenha passado por focas essas fases, que cada agrus pamenio humano tenlsa conhecido sucessivamente foddas estas hic sofanias. Essa hipbtcse cvolucionista, talvex accitivelalguumas ge rages ards, est hoje completamente exclufda. Mas, em qual (quer lugar que fosse, num dado momento histérica, cada grupo humano transubstanciou, pela parte que Ihe tocava, certo ntime- ro de objetos, de anima, de plantas, de gestos em hierofanias, ¢é multo pravével que, no fim de contas, nada tenha escapade 4 esta transfiguracio, prosicgulda durante dczenas de milénios da vida religioss, 5. Diakétiea das hlerofanias — Relembearnos no peinefpio des- te capitulo que todas as definigdes do fendmeno religioso dads ald o presente colocavam em opasigio 0 sagrado e 0 profana. ‘Ogque acabou de se dizer acima, isto €, que em. qualquer momen APROXIMACOES: ESTRUTERA E MORFOLOGIA 19 totoda.e qualquer coisa pode tornar-se uma hierofania, nBo com- tradird esta definiglo-tpo do fenbmeno relgioso? Se qualquer olga pode incorporar a sacralidade, em que medida permanece lida n dipotomia sagrado-profano? Esta contvadicSo €56 apa- Fenie, porgue, se €verdade que qualquer cosa pode torar-se uma hrcrotania, « que, provavelmente, ago existe nenhum objeto, oll Ser, 0 planta que'em certo momento da bistéri ¢ em certo ha- fat do espago io tena asurnidoo prestlgio da sacralidade, nem por isso deixa de contimiar a ser verdade que iio se conhece ne- fluma religito ou raga que tenha acumulado, a0 longo da sua historia, todas estas hierofanias. Por outtas palavtas, 20 lado dos, Dbjetos ot dos seres profanos sempre exsivam, no quadro de Giualguerreligito, objeto ou seressagrados. (Naa € possivel di Hero mesino dos ates fsiolbgicos, dot ofieios, das tezalcas, dos festos, ee, mas voliaremos a esta distingdo,) Temas de i mais fonge: ainda que ceria clasee de objetos possa eccber 0 valor de ‘uma hierofania, ha sempre objetos, nesta caste, que no so in ‘yestidos desse prvlégio. Porexemplo, quando fala no “clo das pedras”, sso no quer dizer que todas as pedras sejam consideradas como sagra- das. Encontraremos sempre certas pedras vencradas em virbude Ga sua formna, do seu tamanko ou das suas implicagSes rituals. YVeremos, alls, que no se trata de um culo das pedras, quees- Ses pedvas sagradas somentesBo veneradas na medida em que no ‘0 apenas simples pedras, mas hicrofanias, isto €, afgo que uk trapessa 9300 condislo normal de “objetor”_A dilética da hie- Tofania pressupoe urna escolha mais ou menos manifesta, em que incotpora {isto & revela) olgo para ald de si mesmo, Por ofa no interessa muito quc este “algo para além’” se deva muito sim plesmente d sua forma singular, 4 sua efleitncia ov a sua "or Ga” — ov que se deciuza a partir da “participagao” do objeto Em qualquer simbolismo, que seja ateinido por um rto de con- Sagraefio ou udqurido pela insereao, voluntéria ou involuntaria, Alo objeto numa regio saturada de sacralidade (uma 2088 sagra- da, um tempo sagrado, urn ‘"acidente™ qualquer — a queda de {um taio, un erine, uit saerilégia, ets). que acabamos de per ‘en-evidéncia € que uma hierofanta pressupée urna excolha, uma nitida separa¢ao do objeto hicroflnico relativamente 20 mundo Feslante que o rodela, Este muido restanie existe sempre, até ‘Quando se trata de uma rego imensa que se torna hierafanices or exemplo, 0 Cée, oto conjunto do “ambiente” familar, o8 20 TRATADO DE HISTORIA Das RELIGIOES a pattia’”_ Em qualquer caso, a Separacio do objeto hieroftin sco faz-se pelo menos perante ele mesmo, pois $6 s¢ torna uma hhetofania no momento em que defxou de serum simples objeto profano, cm que adquiriu uma nova dimens4o: a da sacralidade. ssi dlalética ¢ completamente cha ao plano elememtat das hierofanias fulgarantes, ta comuns na literatura etnoldgica. Tudo que éinsdito, singular, novo, perfeito ou monsiruoso torna-se eceplculo para as foreas magico-teligiosasc, seundo acciteuns: Lineias, um objeto de veneragiio ou de temor, emt virtudedo sen- mento. ambivalente que 0 sagrado provoca constantemente. Quando uin cdo tem sempre éxito na caga™, eacreve A.C. Knuyt, “€ porque existe al measa (mau-olhado ou agouro), Demasiado asito m3 eaca ¢ coisa que inquiela 0 Toradja. A forca mécica, ‘aragas a qual o animal €capaz de apanhar a caca, acabars neces sarlamente por se tornar fatal para o seu dono: ou este morrerd ‘em breve, ou a colheita de arroz falhard, ou, 0 que € o mais fle: Aiienie, uma epizootia se declarard nos biifalos ou nos porcos. Esta crenga € geral em todo o centro das Celebes." Seja em que Aoitinio For, a perfcigdo assusia, e & neste valor sagrado ou ma ico da perfeiedo gue sera necessdrio procurar a explicagio do Teeeio que até a mais civilizada das sociedades manifesta perante © santo ow o genio. A perfeicio nao pertence a este mundo, £ uuma coisa diferente deste mundo, embora venha até ele. Este mesmo reccio ou esta mesa reserva timorats existe & espeito de tudo quanto é do esirangeira, ou esiranho, ou nove — pois tais presencas surpreendentes s40 ox sinais de uma forea ‘de, sebem que veneravel, pode ser perigosa, Nas Celebes, “quan: do o frato de uma bananeira nasce, nao no topo do caule, mas no theio, tala-se de measa... Diz-se geralmente que isso terd co. ‘mo conseqiéncia a morte do dono de tal arvare... Quando wma aboboreira dé dois frutos auma s8 haste (ca30 idéntico ao de um nnascimento de gémees), trata-se de measa, 0 que causari a morte de um membro-da familia daquele que possul o campo onde essa planta cresce. E torna.se necessdrio arrancar a planta que dd tais futos azarentos, que ninguém poders.comer"®. Como diz Edwin W. Smith, “as coisas estranhas, insdlitas, os espetaculos insta os, as praties inabituas, os alimentos desconhesidos, os novos processos de fazer as coisas, tudo iso €encarado como manifesta: fo das fargas ocultas”™. Em Tanxa, nas Novas Hébridas, todos Os desastreserans imputados aos missionarios brancos queacaba- vam de chegas*. A lista esses exempios pode cresoerfacilmente®, ABROXIMAGOES: ESTRUTURA E MORFOLOGIA a 6. 0 tabuea ambivaténcia do sagrado — Yeremos mais ta ‘deem que medida tais fatos podem ser considerados como hhe- rofanias, De toda a maneira so cratofanias, manifestagses da forga e, por conseqliéncia, slo temidas ¢ veneradas. A. ambivs- lencia do sagrado nao ¢ excsivamente de order psicolonica (na inedida em que stra! ou causa repulsa} mas também de ordem axiokigice: 0 sagrado ¢ a0 mesmo tempo “'saprado”” “macls- do". Ao comentar as palaveas de Vireilio, aurt szera fares, Servius! fax notar, muito justamente, que sacer pode sismificar 449 mesino tempo “maidito" ¢ ‘santo’. Fustathius® observa a ‘mesma dupla significacdo de bagios, que pode exprimir ao mes- yng tempo. a naydo de “puro” « de “poluido™™, E essa mesma saimbivalencia do sagrado aparece no mundo paleossemitico!? ceipcia ‘Todas a vlorzades neatvas das “thnureae (conte o.com os mortos, os eriminosos, et.) se devem a esta ambiva- Jencia das hievofaaias e das cracofanias. Tudo quanto ¢ “impl- (0! «por canseqiéncia “cousagrado™ distingue-se, na esfera do ‘ontoldgico, de tudo quanto pertence & esfera profana. For isso, tanta as oBjetos camo os seres mpuros esto praticamente pra bidos a experiéncia profana, assim como as cratoFanias ¢ as hie rofanias, Endo é sem rico que todo aquele que pertenea &esfe- 1a profana, isto ¢, nfo preparaco ritualmente, se aproxima de uum objeto impure ou consagrado. Aguilo a que se d8 © nome de tabu — segundo uma palavra polinésia adotada pelos etn- grafos — & precisamente essa condigto dos objetos, das agdes ow das pessoas “icoladas” ¢ “interditas™ em virtude do perigo que somporta 0 seu contato, De wma maneirs geral € ou transforma- em abu todo objeto, acdo ou pesoa que, em virtude do seu prdprio mado de ser, ou por uma ruptura de nivel ontolosica, Se torna portadora ou adquire wma forea de natureza mais ou, menos incerta. A morfologia do tabu ¢ dos ebjetos, pessoas ou ages tabiticas ¢ muico rica. Basta folhearmas 0 tomo Hl do Rameau d'or de Frazer, Tebow et des perils de Péme!", ou 0 vas- to repert6rio de Webster", para nos convencermos disto. Vamos conteatar-nos com alguns exemplos ecolhidos na monogratia Ge Van Gennep'*, 0 termo correspondente a tabu, em malgacke, & Sady, faty, palavra que designa 0 que ¢ “‘sagrado, proibido, in- {erdito, incestuoso, de mau sugscio, ou sj, em altima anal fe, 0 aucé perigaso"*. Assim, foram fac “0s primeiros cavalos imporados para ailha, 0: coelhos trazidos por umn missiondrio, 2 TRAFADO DE IISTORIA DAS RELIGIOES fs géneros novos, inciuindo os remédios curopens” (a sal, 0 io- deta de potassio, o rum, a pimenta, e(c.'*. Encontramos por- tanto aqui as cratofanias de insélito do nova, de que ja fala- mos mais acima. A sux modalidade é fulgurante, pois de manei ra geral todos estes fabus nde duram muito tenipo; a partit do momenta em que 10 couhecidos, manipulados, integrados no ‘cosmos autdctone, perdem a sua capacidade de destrut 0 equill- brio das Foreas. Outro terme malgache & loza, que os diviondrios Uefinem nos termos seguintes: “tudo o que «sta fora ou é sonsra alei natural, um prodigio, ums calsmidade publica, una despraea extraordindria, um pecado sentra a lel natural, um incesio""*, ‘Evidentemente 0s fendmenos das doencas e da morte se agr pent também nas categorias do-insdlito ¢ lo rernvel. Entre os mal aches, como por toda @ parte, als, varias "interdiqdes™ sepa- ‘Fam nitidamente os daentes ¢ os mortos do resto da cormmida- de, E proibida (ozar num morta, olhi-lo, pronunciar o seu no. sme, Quira série de tabus refere-se & mulher, & sexuatidade, 40 rnaseimento ou a detetrninadas situacbes (6 proflido ao soldado ‘comer galo morte em combate, ou qualquer outro anitnal moro ‘por uma saagaia; nfo se deve matar um animal macho numa ca- sa cujo dono anda enyolvido em querelas ou aa guerma, ete."). [Em todos esses casos se trata de um interdigio proviedria que se explica por uma soneentragdo fulgarante de forgas em deter ‘minados centros (x mulher, a morte, a daenga) ou pela situago perigosa em que se encontram algumnas pessoas (0 soldada, o ¢a- {gedor, 0 pescadar). Mas existem tabu permanentes: 9 do rel ou ‘Odo santo, a do nome ou o do‘Terra, 0 de certas resides cOsmi- eas @ montana de Ambonarooo, de que ninguém uss saproximar-se*', os lagos, 95 rios,ifhas intsiras)*, Nestes casos, as interdigdes sho devidas & maneira de ser especifica das pestont ‘dos objetos tabiiticos, Deyido a sua prapris situagao real 0 rei ‘Gum reservaréeio pleno de fareas e, conseutienterente, x6 & nos ‘vel ume apcoximacao da sua pessoa tomando certas precaugdes; ‘5 ei ndo deve ser tocado new olhado diretamenta, assim como também nao se lhe deve dirigit a palavea, Erm vertas repides 0 50- ‘berano ndo deve tocar a terra, pois poderia assim torné-la estéil devido as forgas em si acumuladas; portanto, torna-se necesst- rio que seja transporiade, ou entio deverd ciminhar sobre um tapete, As precaugdes tomadas cam os santos, com os sacerdotes ‘ou com 03 eurandeiros explieamse pelos mesmos ressios, Quer: to a “tabuticussio” de certos metais (9 fetta, por exempla) av | ‘ APROXIMAQOES: ESTRUTURBA E MORFOLOOIA B de certas regides (as ills, o8 montes), 880 miltiplas as causas determinantes: a novidade do metal, ov o fato de ser wilizado or grupos secretes [indidores, feificeiros),« majestade ou 0 mis decettas momiantias, o faio de nda serem integraveis ou nd0 cestarem integradas no cosmos indigena. [No entanto, o mecanismo do tabu é sempre o mesmo: algu- ‘mas coisas, pestoas ou regides participa de um sistema ontol ‘8ico muito diferente e, por consequeacia, o seu contato produz lima ruptura de nivel antaldgica que poderia ser fatal. O tenor perante tal ruptura — necessariamente imposta pelas diferengas de sistema ontoldgiea evistente entre a situacao profana e a ie tacdo hievoFaniea ou cratofanica — verificasse at€ nas relacties {do homem com os alimentos cansagrados au com os alimentos Ge se supde contterem certas farcas magico-reliziosas. “Alguns alimentos a al poito so santos que niais vale munca os comer, ‘ou comé-dos apenas em pequenas quantidades.""** E por isso que, fem Marroces, 0s visitantes dos santudeios ou os particpantes de Juma festa comer pouquissimo dos frutos ow dos pratos que se Ihes ofesecem. Fazem-se tentativas para aumentar a “forga”” (ba- ‘raka) do ttigo enquanto ele permancce na era; mas, concentra da em grande quantidade, esta forga pade tornar-se nocival!, Pe- Ja mesima F280 a mel rico em baraka € perigoso™. Esta ambivaléncia do sagrado — queao mesmo tempo atral causa repulsa — sera discutida mais profundamente no sezun- do yolume desia obra. Aqutlo que desde j& podemos notar é a {endéneia contraditéria manifestada pelo homem perante sa» {grado (considerando este termo na acepso mais geral). Por um ado, 0 sagrado procura assegurar ¢ aumentar a sua prOpria rea- Jidade por um contate to [rutioso quanto possivel com as hie rofankase as cratofanias; por outro, arriscasse a perder definiti- ‘yamente esta “realidade" pela sua integragdo num plano onto 6sieo superior 2 sua condicto profana; embora a descje ultra ppassar, nie pode entretanto abandoni-la completamente, A am bivaléncia da atitude do homem perante @ sagrado nao 0 se ve- Fiffea nos casos das hicrofaisias e das cratofanias negalivas (me do dos morios, dos espiitos, de tudo quanto € “impuro""), mas ‘também nas formas religiosas mais evoluidas. Ate uma teofania, como a quenos é revelada pelas misticas evita, inspira a grande ‘ajoria dos individuos nao semente atrayao mas também repul- ‘st (qualquer que sofa o nome dado a esta repulsa: ddio, desdém, Temor, ignorincia veluntéria, sarcasmo, etc.). ™ TRATADO DE HISTORIA DAS RELIGIOES ‘Vimos acima que as manifestages do insite ¢ do extraor- Sindrio provecam geralmentz 0 medo ¢ 0 afastamento, Aleuns exemplos de tabus-e de ages, de seres ou objets tabiticas Fevelaram-nos através de que mecanismos as cratafanias do in- sito, do funesto, do: misterioso, etc. estio separadas do circu to das experigncias normals, Esta separagao tem por vezes cfei- tos positivoss ndo se limita a isolar, também valoriza. Por isso, a fealdade © a disformidade, embora singularizem aqueles que & anifestam, a6 mesine (empa também os consagram. “'Assim, ‘:ntte 0s indianos ojibway, muitos sao chamados feiticeinos, sem ‘que eles proprios se considerem peritorna arte da leitigaria, mas slnplesmente porque slo feios ou disformes. Entre estes india- nos, todos as que slo olhados como feitieitos tem geralmente apaténcia exterior miserdvel-easpecto repugnanic, Reade afirma ‘que no Congo tades os andes e todos os albinos se tornam sacer- dotes. Ndo podemos por em diivida que @ respeito geralmente inspitado poe este geneeo de homens tenha a sun origem na idéia de que sio dotados de um poder misterioso,""* fato de os Kamas, 08 fetictirose 08 curandeiros serem pre- fereatemente reerutados entre os neuropatas, ou entre os gue apre- sentam equilibrie nervaso instavel, & devido 40 mesma prestigio do insilito elo extraordindrio. Esses estigmas denotam uma es- ccofhar aqneles que os possuem no tén outro caminho sento © dz se submeterem & divindade ou aos espiritos que assim os dis- linguiram, torsando-se sacerdotes, xamis ou feiticeros. Eviden- ‘temente e35a cscolha nem sempre se efetuia por intermuédio desse aainero de marcas exteriores naturais (fealdade, enfermidade, ner Yosismo encessivo); a vocayao religiosa aparece frequentemente por casio dos exerciclos riuais 4 que, de boa au ma vontade, se submete 0 candidata, ou de uma selesie cfetuada pelo feiticeiro’®, Mas trata-se sempre de uma escolha. 7.0 sana — 0 insdito eo extraordindrio sto epitanias per- turbadoras: indicam a presenga de algo diferente do natural: & presenca, au pelo menos o apelo, ou ent semido predestinado, diesse algo. Um animal babi, assim gomo um objeto nove ou um {ato monsirnoso singularizam-se de maneira tao mitida como um individuo eatremamente sia, muito nervoso ou isolado 0 resto 4a comunidade por qualquer estigima (natural ou adquiride em conseqitencia de uma cerimOnia realizada com 0 fim de dest paar APROXIMAGOES: ESTRUTURA B MORFOLOGIA 3 {0 “eleita!): Os exemplos nos ajudario a compzeencler'6 concel ‘jomelanésia de mond, de onde certos autores julgaram poder de= tlvar todos os fenémenos zeligiosos. Para os melanésios, mana a forca misteriosa e ativa que possuem alguns individuos € xe- Talmente as almas dos mortos e todos os esplritas®”.O ato gran- diosa da eriaca0 cosmica 6 foi posstvel pelo mana da divindade: também o chefe do cli dispde da sua dose de mana, estos ingle- ses submeceram as maoris foi porque o seu mana eta mats forte, 1ssim como 0 offeio do missionérto cristio possi mane superior fo dos ritas autdctones. Apesarde tudo, também as fatrinas pose fem 0 mane, gragas ao cardter de “recepticulo de forga"® que fbrigam 120 46 0$ corps humanos como as suas excrepacs™, ‘Mas os objetos e 0s homens tm nana porque o receberam de determinados seressuperiores, ou seja, porgie participa mis- tieamente do sagrado e na medida em que dele participa, "Se se verifica que uma pedra encerra uma forca excepeional € por aque qualquer espirito a cla se associou. Um osso de um morto ppossui. mang porque 4 alma do morto af se encontra; determin: do individuo pode manter um relagéo tho estreita com um espi- Fito (spiri.on com a alma de um morto (ghost), que fica possui- dor de mana em si mesmo ¢ pode utlizé-lo & sua vontade.”"" E ima forga diferente das foreasfisicas, do ponto de vista qualita- tivo, ¢ por isto se exerce de maneira arbitrdria, Um bom guerrei- To deve esta qualidade nfo as suas proprias foreas ou recursos, mas. forga queo mang de um guerrero morto lhe conzede; este ‘mana enconira-se no pesietio amuleto cle pedra que The pende do pescoro, em algumas folhas presas ao seu cinto ou na frmu- lig que pronuncia, © fato de os porcos de certo homem se multi- plicazem ¢ o seu jerdim prosperar deve-se a determinadas pedces provides do mand especial dos porcos ¢ das drvores que 0 su pro- prividrio possul. Um barso 96 & répido se possuir mana, assim como uma rede que apanha peXe ou uma flecha que fere mortalmente”, Tudo o que ¢ por exceléncia possi man; ou se- Ja, tudo 0 qe parece a0 home fir, cinmic, tion, FN Commo resedo contra ss tcrins de Tylor da sua escola, ave sonsideram que a primera fase da rligidg 38 pode ter sido 0 an mismo, 0 antropélogo inglés R. R. Marrett julgou poder reco- ecer nesta crenca em uma forca impessoal uma fase pré-animista da religido, Evitaremos precisat desde ja em que medida se pode falar de uma “primeira fase” da religiio, assim como nao Vae 26 TRATADO DE HISTORIA DAS RELIGIOES ‘mos indagar s¢ « ideutificagao de tal fase primordial equivale a descobrir as “origens" da religigo. Mencionames alguns exem- pplos da rag apenas para esclarccer a dialética das cratofanias ‘edas hterofanias no plano mais elementar. (Convém precisar que “o mais elementar"’ de modo nenlium significa “0 miais primiti- vo" do ponto de vista psicoldaico, nemo mais antiga’? no sen- ‘ido cronolégico: o nivel elementar representa uma modalidade simples, transpdsente, da hierofania.) Os exemplos. citados Fomeceram-nos uma boa ilustrasio do fato de uma cratofania ‘oul uma hierofania singularicar um objeto zelativamente outros, ©o mesmo acontece com o insalito, com o extraar dindrio e com ‘que € novo. Repatemos no entanto qué: T°, a nogao de mana, se bem quea encontremos tainbém nas religioes exteriores ao cit= culo melanésio, nao ¢ uma nocdo universal e, por conseqiiénc nos difcil eonsiderd-ta como representativa da primeira fase de qualquer religido; 22, ¢ inexato considerar 0 mana come ura fo ca impessoal. ‘Com efeito, além dos melandsios"!, hi outros povos que ¢o- ‘nhecem uma forca desse sénera, capaz de tornar as coisas pade- osas, reais no pleno sentido da palavra. Os sioux chamam Wa- ana esta forea, a qual circula no cosmos mas s6 se manifesta tos fendmenos exiraordinirios (como o sol, a lua, 9 tzov40, 0 vento, ete), assim como nas personalidades fortes (o feiticeito, © missionério cristo, as seresmiticos e lendirios, te,). Os troque ‘ss empregam o termo orendu para designar amesma noc3o: uma tempestade eneerra orenda, a orenda de uma ave difiel de aba- ter & muito sutil, um hometn furioso € presa da sua orenda, ec. ‘Oki entre os hurdes, zea enlse as populagdes das Antilhas, meghe cenlre 05 pigmeus africanos (bam otos) sto termos que expeemtem aamesma nogio de mana. Mas, repitamo-lo, no & qualquer pes- 302 011 qualquer coisa que possui oki, zemi, mexbe, orenda, etc, ‘ia somente as divindades, os herdis, as almas dos mortos ou 665 homens ¢ objetos que miantém certa relacao com 0 sagrado, OL Séja, 0s feticciros, os feitigos, os Idolos, ete. Para citar ape ‘has um dos iltimos etnégrafos que dlesereveram estes fenbmenos ‘mgico-religlosos e, 0 que € mais importante, numa populagio arcaica, onde a existéncia de amano era muito controvertida, P. Schebesta escreve: “CO megbe estd espalhade por toda parte, mas seu poder nfo se manifesta sempre com a mesma intensidade, Fem sob o mesmo aspecto. Alguns animais s80 ricamente provi dos desse mezbe; quanto aos homens, uns possuemt mais, outros APROXIMACOES: ESTRUTURA F MORFOLOGIA ra menos. Os homens habeis distinguom-se precisamente pela abu incia de megbe que acumularam. Os feiticeiros tambern s40 Gos.em megie. Esta forca partee estat ligada a alma-sombra ¢ Aestinada a desaparecer juntamente com la na morte, que por que emigre para outro individuo, quer porque se motamorfoscic no totem." Se bem que alguns estudiosos tenham acrescentado alguns ‘ouiros terms & esta lista (nga dos masatos, andriamanitha dos imalgaxes, petara dos dayaks, etc.) ¢ se haja tentado interpretar ‘no meseio sentido o indian drahman, o Iraniano xvareralk, 0 Tomano imperium, 0 nérdico hamingjd— a nocin de mana nao E universal. O mana ado aparece cm lodas as religides, €mieSin0 haquelas em ave aparece tio € nem 4 Gnica, nem s mais antise forma religiosa. "“Q mama... aio & de manta neahuima Univer sal, e, por conseauencia,servir-se dele como base para construit, tama leovia peral da sel gido primitiva € no $6 errénea como fa- Jacioso.""* Mais ainda: entre as diferentes férmulas (marta, wa- ai, orenda, ete.) existem, se nao diferencas aeentuadis, pelo me- hos matires frequientemente desprerados nos primeiros estudos. ‘Assim, 0 americanista P, Radin, ao analisar as conclusoes ue W. Jones, Miss Fletcher ¢ Hewitt thraram das sas pesquisas 50: bre o wakandl © 0 manitu dos siouse dos algonguitios, nota que estes termos significam ‘‘sagrado".“‘estranho”, “importante”, "hmaravilhoso", Nextraordindsio" forte”, mas sein engkobat a menor idéia de “forea incrente’ ‘Gra, Marreti —e, aids, outros o fizeram também — julzou que o mana representava uma “ forgaimpessoal", apesar de Co Grigion ter ja chamado a atencdo pars 0 fato de “essa forca, se tbem que impessoal em si mesma, estar sempre igada a uma pes- soa que a dirige... Nenhum homiem possui esta forga por si mes- ‘mo: tudo quanto faz, féslo a custa de seres pessoais, epititos da hatureza ou dos anlepassados’", Pesquisas recentes (Hocart, ‘Horbin, Capell)vieram precisar estas distinedes estabelecidas por Codrigion. Como poderia essa forca ser impessoal se estd sem- ‘bre ligada a seres pessoais?"”, perguntava ironicamente Hocart. Por exemplo, em Guadaecanal e em Malaita sfo exclusivamente ( espiritos¢ as almas dos martos que possuem o mania se bern ‘que possaim utilizar sta forga em proveito do homern. “Um ho- mem pode trabalhar duramente, mas se nfo abtiver por isso & aprovacio dos espittos, cujo poder se exerce em seu proveito, nunca se iornard rico." “Todo © qualquer esforco se realiza 28 {FRATADO DE HISTORIA (248 RELIOTOES ‘om o intent de assegutar as boas sracas dos eptitos, de ma- neirs gue o mana esta semptedispontvel, Os sariielos #40 0 initodo mais vulgar pare ganar a sua sprovagdo, as considers: sb qoe algunas outtas ceriménias Thes #80 devalmente agrs- ‘daveis.”"? ‘Radin notava por sua vee que o indianos nto esiabeleciam oposigae entre pessoal ¢ impessoal, corporal ¢ nde corporal. ‘'O que parece chamar 2 sua atengdo, em primeiro lugar, ¢ a questo da xinencia teal; etd quanto pode ser aprceadide pelos se tidog, tudo dlianto pode set pensado, vvido ou sonhaco, ex tc-P8 Portanto, 0 problema deve pBrse em ermos ontolégioos 6 que ense, o gue real eo que nfo exsie — e no et termes depessodkimpessoal, corrarolincorporal, concelios Que, na cons tiene dos “primitvos"™, nao li # precisio que adquitre nas tulturas histgrces, O qué ¢ provide de mona existe no plano on: fologicoc, portant é fir, fecund, Fert, Por sso n80 3 DO deahimmar a “impestaldade” do mano, esa nopio nto tem qa {quer sentido no Horizonte mental arcico, Alls, em parte nenu- tha seenconira o mand hibostasid, separado dos objeton, dos contecimentos cdsmicos, dos seres ou dos homens. Mais ainda através de uma ands cetada apercebemo-not de QUE Um Bf {o, um fendmeno cosiico, um ser qualquer, ec, Dassuem man fracas & Intervencio de um espiita ow 8 cosfusto com 2 epi nia de um ser aivino qualquer. De onde se conlo qUe de modo nenhur se Susie a teo- tia auc considera o mana conto forga mac impessoal Tas tar, nesta base, ume fate pré-relisio (dominada Unicamente pola riagia) ¢ implicitamente erronco. Essa teoria€, ais, infirmada peo into de que todos os povas (esobretd os paves mais Pr- mitivon) aio goahecem o man, ainda peo foto de que a magia Mit bem que se eneontre wim pouco por todo 0 lado — aparece jeupie acompatinda pela rligido. Mats ainda: a mingla no do thin em toda a partea vida espritual dae sociedads primitvas; pelo contririo, ¢ nas sociedades mais evoluidas que ela se desen- ole de manera predominante, (Exemplos & praca da maga Pnuito frac ent on Karmal da Australia e entre or fueguinon: tn certassocedades de esquimésekoriaks, pratiease menos 00 ‘que entre os seus vizinhos ainus ¢ samoiedos, que lhes so supe- Heres no panto de sista eulturl, ete) APROXINACOES: ESTRUTURA E MORFOLOGIA » 48, Estrutura das hierofanias — Relembremos qual era 0 nosso, ‘lesignio quando citavamas as hicrofanias fulgurantes, as crato- fanias, o mama, etc. Nlo se tratava de discurictas (0 que implica fia como jd adquiridas as nogdes do sagredo, da polaridade felipiio-magia, etc.), mas simplesmente de ilustrar as modalida- des mais clementares clo sagrado coun vista a uma primeira apro- ‘nasa, Fssas hlerofanias ¢ ctatofanias sempre nos revelaram uma escolAa; o que éescotido ¢implisitamente forte, eficaz, e- mido ou fértl, ainda que a escola se fuca pela singularizacio slo ins6lito, do novo, do extraorelindri05 o que fol esoofhido © re velads como tal, por intermédio de uma hierofania ou de uma Gratofania, xarna-se freqilentemente perigoso, praibido ou polul- ‘do. Encon ramos frequientemente a nocie de forraou de eficiéncia jumlo a esses bierofanias; deuominamo-las cratofanias previsa- mente porque nos Falta demonstrar o seu cardter sagrado. No en- lanto, vimos como era imprudente generalizar apressadamente; que, por exemplo, ¢ inexato consicierar 9 mana como uma forca impessoal, visto ser acessivel & experigneia.religiosa on a obser- Yacto profana unicamente por uma personificacda ou incorpo- ‘fa¢do; que seria mais sensato por o problema nos seus termos on- toldgicos e dizer que aguilo que existe de uma maneira completa ppossul sempre mana; enfim, que a distingaa “pessoal-impessoal"” no tem sentida preciso no universo mental areaico e que & mais prudente renunciar a tal distingao. Mas devemos notar que as hierofanias e as cratofanias ele- ‘mentares acima mencionadas esto longe de esgotar a experiéncia fe teoria religiosa dos primitivos. Nao conhecemos religito te duzid a tals hierofanias ¢ cratofanias elementares, As catego tias do sagrada, assim como a sua morfologie, excedems constan- lemente as epifanias do mana ¢ do insite, da mesma mancits que extravasam do eulto dos antepassados, da erenga nos espiri- los, dos cultos naturalists, ets, Por outras palavras, uma reli- ‘80, ainda que se trate da religiso mais “primitiva’™ (por exem. plo, @ religito de uma tribe austratiana, dos judamaneses, dos ppigmeue, ete), ndo se deixa reduvir a um nivel clementar de hie FoFanias (0 mana, totemismo, 0 animism). Ao lado de tais ex- peritneias ¢ (eorits selipiosas monovalentes, encantramos cons- lantemente o3 vestigios mais ou menos ricos de outras experign- sias ou teorias religiosas; por exemiplo, os vestfgios do eulto de lum ger supremo. © fato de esses vastigios apresentarem pouce ‘importancie para a vide religiosa cotidrans da tribo ndo interes

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