You are on page 1of 176
Michel de Certeau ABS os os de azer INVENCAO. IN) COHDIAN) oeeeGEn pst La S*Ealgdo Pewspols © Laitions Calimard, 1990 “Titlo do original frances: Lincention du quotidien ~ a, ars de ‘aire Direitos de publicagio em lingva portuguesa no Bras: Edita Vozes Lida. Ra Frei Lu, 100 5689-900 Petrépoli, RI Internet http://wwevozes.com be Brasil “Todos os dveits reservados. Nenhuma parte desta obra poder ser ‘eprodurida ou transmitida por qualquer forma e/eu ‘quaisquer meios (eletrnico ou mecinico, incluindo fotocépae gra ‘agGo) ou arguvada em qualquer sistema ou banco de datos smn petmissio escrta da Editora Esta obra ua nova edigi de Arts de faire de Michel de Certes, primeiro tomo de Linvention du quotidien (Union générale dd tions, Colletion 1018, 1980; segundo tomo: Habiter, cuisine, por Luce Gian e Pierre Mayol ISBN 2.07-0325768 (edigdo francesa} ISBN 85.326.11486 (edigio brasileira) SUMARIO Apresentagdo de Luce Ciard, 9 ‘Mais que des intengdes, a polsagem de uma pesquisa... 35 INTRODUGAO GERAL, 37 ‘A produgio dos consumiores, 38 ‘Tticas de praticantes, 45 PRIMEIRA PARTE [UMA CULTURA MUITO ORDINARIA Dedicatria, 57 |. UM LUGAR COMUM: A LINGUAGEM ORDINARIA, 59 Cada um" e *Ninguém", 60 Freud e homem ordindro, 61 O perto eo lof, 64 (© modelo Wittgenstein a linguagem ordinsi, 67 ‘Uma historcidade contemporinea, 72 1 CULTURAS POPULARES, 75, ‘ima “arte” brasileira, 76 ‘A enunclagio proverbial, 79 Lica: jogos contose artes de dizer, 83 ‘Ua pritica de disimolago:a“sucata"?, 86 I, FAZER COM: USOS B TATICAS, 91 (0 uso ou o consumo, 93 Batratégasetteas, 97 Retércas das prticas,asticias milenars, 103 ‘TEORIAS DA ARTE DE FAZER Az prétcas coidianas, 108 WW, FOUCAULT E BORDIEU, 111 ‘Teenologias disseminadas Foucault, 111 [A doutaignoranea": Bourdiew, 117 \V. ARTES DA TEORIA, 131 ‘Destacar e pr do avesso: uma recelta da tora, 192 ‘Acetnologizago das “ates, 135 (0s relatas do no sabido, 140 ‘Uma arte de pensar Kan, 145 VI. O TEMPO DAS HISTORIAS, 151 ‘Uma arte de dizer, 152 Contr os lances: Detienne, 155 [Aarte da meméra ea ocaito, 157 Historias, 165 encetea paare PRATICAS DE ESPACO VIL. CAMINHADAS PELA CIDADE, 169 ‘Do conceit de cdade is priticas urbana, 172 {fala dos passs perdidos, 176 Miticas aquilo que “a2 andar’, 183, VIL NAVAL CARCERARIO, 193, 1X RELATOS DE ESPACO, 199 “Eapagos”e “lugares”, 202 ercursos¢ mapas, 203 Demareagdes, 207 Delingincis?, 215 oonsra pare USOS DA LINGUA, X.AECONOMIA ESCRITURISTICA, 221 ‘Bscrever:pritca mica “moderna, 224 Insriges da lel no corpo, 230, De um corp a0 outro, 233 -Aparelhos de encarnago, 236 ‘Armaguinara da representagdo, 239 ‘As miquinaselitatvas", 243 XI. CITAQOES DE VOZES, 247 ‘Acnunciagio dslocad, 250, ‘Acitncia da fabula, 253 Ruidos de corpos, 256 XML LER: UMA OPERACAO DE CAGA, 259 ‘A idelogia da “informacio" pelo lio, 260 ‘Uma atvdade desconhecda a letra, 262 CO sentido “litera” produto de uma ete social, 265 ‘Um “exerci de ubiqtiade esta “impertinenteausinca", 268, Espagos de jogos e aticias, 270, ‘qua pase -MANEIRAS DE CRER IIL CREDIBILIDADES POLITICAS, 277 Queda de cotagio das crengas, 279, Uma arqueologi O treo do cer, 281 Do poder “espiritual” 8 oposig de esquerda, 284 ‘Ninsituigdo do real, 286 ‘A sociedade recited, 289, XIV. 0 INOMINAVEL: MORRER, 288 ‘Ua pric Impensive, 294 Dizer cer, 296 Escrever, 298 (0 poder terapeuticoe seu dup, 299 ( peretvel, 302 INDETERMINADAS, 305 Lugates estatificados, 309 (tempo acidentad, 311 Notas, 313, HISTORIA DE UMA PESQUISA™ tn 3) Em fevereiro de 1980 sai primeira edigio france- sa de A invencio do cotidiano. Tratase de uma obra inédita, apresentando os resultados de uma pesquisa de longo folego {do final de 1974 a 1978), da qual s6haviam circulado até entao alguns pedagos fragmentirios” Michel de Certeau é um destes espiitos anticonformistas e perspicazes, No cendrio intelectual, & personagem especial, inconformado com os cinones de uma disciplina rigid, ecuja irradiagdo intelectual segue caminhos estranhos & logica das instituigdes, quer estas se achem ligadas Universidade, & Igreja ot ao Estado, Historiador conhecid,respeitado por sua producio cientifica sobre a mistica e as correntes religio- ‘as nos séculos XVle XVII 6 também temido por sua critica ten, Attar eras rs poss fil ohne exigente ¢ lucida da epistemologia que governa em silencio a profissao de historiador censurado por relativizar a nogio de verdade, por suspitar da objetvidade das institu Hes do saber, por sublinhar o peso das dependéncias e das Conivéncias hierirquicas e, enfim, por colocar em divida mo- Aelos recebidos que fazem a fama da escola francesa de historia [Logo o censurarao por dara primazia 8 escrita em detrimento a apreensio do “real” de que o historiador quer dar uma desergio “verdadeira". Nio se interessa demais pela letura ‘semiotica ou psicanalitica das situagdes e dos textos, coisa fstranha ao bom método bistérico © que danificam © ideal {sagrado) de fxagdo a partir do arquivo, de acumulagdo de uma Aimpossvel) documentagéo exaustiva? Censurasrepetidas, cen Sura injustas e que se itrtam por serem tis, pois em nenum dos pontos em ltigio conseguese velo falhar na sua pratica profissional. Assim Emmanuel Le Roy Ladurie deiea transpa Fecer seu embaraco eirritagdo conporativa diante da releitura brilhante (demais?) do caso de Loudun sob Richeliew: “para Michel de Certeau,teGlogo e historiador,o diabo se acha em toda a parte, salvo no lugar exato onde as cagadores de bruxas Jullgaram telo detectado”, Certeau “sabe fazer 0 jogo de todas as palavras eassumir sucessivamente todas as linguagens. Ele € fucessivamente historiador da medicina e da sociedade, tedlogo, psicanalsta, quantiicador, discipulo de Freud ou Foucault’; “nunca baixa a guarda, Mantémse indecifravel, Apresentando esta astuciosa Possession de Loudun, Michel de Certeau escreveu portanto o livro mais diabslico do ano"? Palo leque de seus interesses de estudo, pelo entrecruza mento dos métodos que pratica sem prestar vassalagem a renhum dees, e pela diversidade de suas competéncias, Cer teau intriga © desconcerta. No tabuleito de uma profissio de iostos geralmente sedentarias ele no péra de se movimentar © nunca se identifica com um lugar determinado. Jesuit, ele se recusa a ganhar dvidendos com esta situagao de pertenca 2 uma grande Ordem, mas nunea rompe os vinculos com 2 Companhia Historiador que se mostrou magistral na erudigdo mais clissica, como 0 mostra a sua edigéo monumental da Correspondéncia de Surin, um jesuita mistico do século XVII, w alo de suspeita por sua “loucura", nao se contenta com este estatuto de exceléncia em um compartimento delimitado do passado, Preocupa-se com psicanlis, pertence & Escola Fret tliana de Jacques Lacan, desde a fundagio em 1964 e até a sua tissolugdo em 1980 mantém amizade intelectual com diversos fandes bardes lacanianos- Mas ainda encontra tempo para estudar lingbistca,frequenta assiduamente os seminsrios de semidtica no grupo de AJ. Creimas, em Paris, e os eneontros anuais de Urbino, na Itlia, discretamente orquestrados por Pino Paioni ‘Seem 1974 um érgio public Ihe encomenda uma pesqui sa sobre os problemas de cultura e sociedade (voltare a falar das circunstancias dessa tarefa), isto se devea uma outa faceta de sua atividade. Com efeito, em 1968 sua notoriedade J tltrapassara as fronteiras dos meios dos historiadores onde seus trahalhos o consagravam, fora das redes crstis onde se seria por sua condicio de Jesuita, mas a que se recusava a limitar a sua ciculagdo intelectual e socal. Doravante recebe convites de inimeros circulos intelectuais de esquerda, dos Uecisores poiticas que @ consultam ou mandam consular, de sgrupos de reflexdo.nos mais altos escaloes administratvos. Vese assim associado, de modo informal, ao braintrust que, cm torno de Edgar Faure, procura reformar a universidade ddarante overdo de 1968 ecria novas fundagbes para ordanizar a volta as aulas. Logo vai receber propostas para ensinar Historia e Antropologis ness locas: primelro em Pats Vil Vincennes (1968-1971) e depots em Paris VitJussieu (1971 1978), Este novo papel social asceu de sua surpreendente capa cidade de snalisar, a0 vivo, entre maio e setembro de 1968, 0 turbilhio dos “acontecimentos’, como se diaia entdo, Numa série de artigos brihantes, ¢ ainda atuais, publicados em tudes, revista mensal dos Jesutas, apresentou dese tempo de incerteza uma leturaintligente e generosa,acolhedora da mudanga, livre do medo que paraisava muitos dos seus com temparaneos” Procurou nao propor solugoes, nem apresentar tum diagndstic definitivo que enceerasse o futuro, mas sobre- n

You might also like