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Universidade de Sao Palo Rotor Prof Dr. Jacques Marcovtch Vice Retr Prot Dr. Adela Jos Mel Facaade de Filosofia, Lara Citnis Humanas Dirtor: Prof. De- Francis Hens Aubert Vie-Diretor: Prof Dr. Resato da Siva Queios Departamento de Sociologia hfe Prot Dr. Sis Hirano Vie-Chee: Prt Dr. Linas Nogacea Negro Coordenago do Curso de Pi Graduasio em Sociologia Coordeador: Pro, De. Beso Salam J. Vice-Coordenador: Pel, Dr. Se Hirano Secretaria do Gs Iabel do CC. Maia Celso Yamasaki Agadecineto ‘eat o Caro de Ps. Gradangz em Sviolgia do Departamento {ke Secilogin da Universidade de So Palo agradecem 8 CAPES — ‘Coordenago de Apefeigoament de Pessoal de Nive Superior — ‘ov recursos gue viablizaam» coeds dest lr. Anténio Flavio Pierucci CILADAS DA DIFERENCA Curso de P6s-Graduagio em Sociologia Universidade de So Paulo editoralll34 EDITORA 34 CILADAS DA DIFERENCA sicoca 34 Leda Ras Fungsis, $92 Jardim Europa CEP 01455-000 Apresentagio So Paulo SP Brasil TeVFax (011) 8166777 Entradas n Curso de Pos Geaduagao em Sociologia —_ Departamento de Sociologia da Faculdade de Fisofia, Letras © ‘Gincis Humanas da Universidade de So Plo [A DIREITAE A DIFERENCA: 0 DADO EMFIRIOO ‘nv Prot Lacano Gulls, 315 Ci, Univers CEP 05508-900 1. Ciladas da dferenga « 4 Sto Paulo SP Beas Tel (011) 8183724 Fax (O11) 618-4505 eae 7 ou ‘Ashes ner do apenns mn ons 3» Adres ¢o ease! B Copyright © Ears 4 Lda 1999 i Ocoee = a Cid de dren © Aono Piva Peres, 1999 | ‘des da tenga oc Sa 3s } nsistir nas diferengas? : 43 -roroctms Us. Qu ru DATE UN E CAL CONTEURA MA a SI rnorngio movin bo on NITECTNSEATRDIONAS DO ATOR. Se a 2. As bases soca da dirt: seus med, seu dedo... 58 s Religie eat rrnnernrnnnes 6 ‘Cap, projet rico edtorgio elena . Brahe € Malta Produ Gree O clog das dite. a ‘Os duces dangers @ Reise Bandeae gut ec . rs Alexandre Barbos de Sousa | Dieta wn nome gu aloe di 2 | ‘tala CE | Moca pares a oe © 1 Fagto 1999 i Nova dn vr nov agua os : 8 3. Linguagenssutoriirias, voto popular: 1a Fonte do Departamento Nacional do Lio um exeteco de metodo ” ieee Naciooal, J, Bras owt ei io 1 DBRENGA? rie lire Acna lio Pes. — a ict setae 4. Problema com a igualdade 104 ee 5. A dierenga fa diferenga, ov: aneeere [A produivdade social da diferenga 19 Lae Papin pt, ce {dirs eminio irene depres 12 sna gee a et ‘A prliracio da enssa te potas, be emg ee anemia Muth aga ci ed acl. bs con 08 Diesen det eben ee ia 6. Amanbi a dilerenga. Fantasmas de homopeidade 0 facia da frees Poecoloniahddee promerna de pode [Actieremondaaton” do Ociente Concusio 7, Fundamentalismo e inegrismo: Teadiionaie9? an leer? Fndamentlmo? Concasfo ee Bibliografia Fontes dos capitulos 150 155 164 169 17 184 17 193, 199 202 222 APRESENTACAO Somos todos iguais ou somos todos diferentes? Queremos ser iguais ou queremos ser diferentes? Houve um tempo em que a resposta se abrigava, segura de i 32 um quarto de século, porém, que a resposta se deslo- 10 primeiro termo da disjun- cou. A comegar da segunda metade dos anos 70, passamos a nos ver envoltos numa atmosferaculeural e ideolgica inteiramente nova, na qual parece generalizat-se em ritmo aceleradoe pertur- bador aconscigncia de que nés, os humanos, somos diferentes de ito, porquanto temos cores diferentes na pelee nos olhos, eos ‘sexo e ginero diferentes além de prefer somos diferentes na origem familia regional, nas raise nas lealdades, temos deuses diferentes, diferentes hibitos e gostos, diferentes esilos ou falta de estilo; em suma, somos portadores de pertengasculturas diferentes. Mas somos também diferentes dedireto. Eo chamado “dircto&diferenca”, 0 ditcco&diferenga calural,odieito de ser, sendo diterete, The right to be different, como se dizem inglés o diretodiferenga. Nao queremos mais 2 igualdade, parece. Ou a quecemos menos. Motiva-nos muito ‘mais, em nossas demandas, em nossa conduta, em nossasexpec- tativas de futuro e projetos de vida compartithada, 0 diteto de ‘sermos pessoal e colerivamente diferentes uns dos outros. E dificil discusir diferengae diferengas em abstrato, desvin- cculando-se o analsta de um comtexto especifco e de um projeto| politico definido. Por isso vou comegar minha discussio stuan- dora no contexto de um ponto de vista particular, o da dieita politica, que hoje se pretende uma dieita cultural, Este liv re ias sexs diferentes, Apesenago 7 ne trabathos que resulearam de alguimas pesquisas que fire coor- dene sabre o voto conservador ea hases eletoras da direita em ‘io Paulo, nos anos 80 ¢ 90, Foi em meio a essas pesquisas que surgi perante mim, vnda da dieita, a questo em tudo e por tudo contemporinea da atengio a diferenga. Impos-se-me desde entio fo imperativo de dedicar-me a uma rflexio mais devia eA espe- culagdo tedrica sobre essa crescentevalorizagio que as diferengas coletiamente experimentadas vém afiemativamente recebendo ‘os dias de hoje, tanto dos movimentos socials ede atoresindivi- dais poiticamente mobiizados, quanto da pr6priateora social Cinco dos sete capitulos sio verses arualizadas e amplia- da, as vezes bastante ampliadas, de artigos que publique entre 1987 e 1995 em revistas de ciéneins socials de citculasio nacio nal, como Novos Estudos Cebrap, Revista USP e Tempo Socal. (Os outros dois so ensais inéitos, cujos embrides se formaram como conferéncias que mais tarde pude desenvolver com mais tempo efélego: os capitulos “Amanhi, a diferenga” €“A dferenga far diferenga”. As pesquisas que deram origem aos ensaios aqui reunidos foram financiadas pelo CNPa, Conselho Nacional de Desenvol- vimento Cientifio e Teenoldgico pela Fapesp,Fundagio de Am- paro a Pesquisa do Estado de Sao Paulo. Sem este apoio nifote- ria sido possivel conclur o levantamento empiico nem avangar na pesquisa tries, Devo-Ihes especial grado, Giladas da diferenca deve tanto 2 tantos amigos e colegas, {que no serei capaz de agradecer a todos eles aqui. Nas diversas tapas da pesquisa contei com a colaboracio de estudantes de sgraduagio do Curso de Ciéncas Socais da Faculdade de Filoso- fia da USP, bosistas de iniciagiocientifica sob minha orientasao, 20s quais io posso deixar de agradecer do fundo do coragio, com sincero econhecimento, pela companhia animada e nada buro- critica que me fizeram numa trajetdria que, de inicio, no sabia ‘os bem onde ira dat. Obrigado a voeés, Florencia Ferrari, Dafne «de Souza Sampaio, Fabio Minematsu, Heitor Schulz Macedo, Henrique Zoqui Martins Parra, Mikon Tamaeosi Salvador, Pedro 5 ads da iteenga Paulo Martins de Oliveira e Rodrigo Arés Ribeiro de Cateo, Boas ‘abegas, amiveis companhias. Este liveo & mais uma demonstra: eo de queadiferenga é produtva, Faz diferenga Finalmente, queso agradecer aos meus amigos Alessandro Caldas Lins, da UFAL, Eurico Gonzales Cursino dos Santos, da ‘Unb, e muito especialmente a Reginaldo Prandi, da USP. Em di {erentes momentos nos tlkimos meses e por diferentes raze, mas confluindo no resultado, eles me encorajaram a fazer este lvro, ‘Além de me fazerem vive e pensar, off) course, foram els no fim ddascontas que me levaram a querer publicar 0 que estou sempre comegando a pensar. Muito obrigado, meus caros. Mi Affe, Antinia Flvio Pierucet ‘Sho Paulo, vere de 199 ENTRADAS nade So guns tes da tale em Si Palo. Te sto peso. Derek Wale, premio Nobel de te atu de 1992, em ita Sto Palo acs prs prem maio de 1985, do evento “Banco Nacional fe Leia, concorda em fale detzo de um 2 joel Lica Citi de Bareos da Fath de 8 Paulo, Ela pergnta se ele nfo acha que wm dor ‘andes dsafos da moderidade € a coossncia ts ciferengs “pent que um do grandes denis ds oer sponser a pergnta prfundss no bance de tes dun” (eit da oll, 11.06.1995) Come vost va lia boe™ Gis “Para mim, a0 exe 2 eis, mas 0 undo into. Sou um anargiss, Nao exer fronts no exit um seco um agro. O got cen ¢ pnero amano, Ea pens asi.” (Franco City incase italiano, 0 Estado de, Pao, 20011997), 0 que, exlame cation. Quem? €o que evra pergunta!” asin {sou Diorio. Em seid louse do modo quelhe peculiar, ou sd modo seo. (F.Niache,O vane au sombrs, rojeta de preficio, $10) Parte I A DIREITA E A DIFERENGA: O DADO EMPIRICO 1 CILADAS DA DIFERENCA A sabedora popula nos ening enfin, que sma coi pode ser verdadla mesmo ue 0 sit ‘em bela ements nem bos (a Weber, A cdi como vaca) Conservadores costumam ter as seguintes conviegOes: [As pessoas ndo-brancas so inferores. A miscigenacio deve ser desencoraiada. As mulheres nao s30 iguais aos homens em intligncia [Nem todos os seresbummaros nascemm com as mesmas po: tencialidades [Nao hi razdo para se nstitir a igualdade salarial. ‘6 as pessoas com sam determinado nivel de inteigencia @ ceducagao deveriam poder votar. Pessoas com graves defeitos hereditiros deveriam ser com ulsoriamenteesterlizadas. As leis atwalmente vigentes ndo favorecem os rcos. A propriedade privada nao pode ser abolida A estatizagdo lve 2 ineficincia. A guerra & inerente 3 natureca humana. (0 tratamento que estamos dando aos criminosos nde & _gor0s0 0 bastante ‘A pena de morte nao é wma cosa de birbaros. (Os crimes violentos deveriam ser punidos com 0 acoite. (Os japoneses s20 wm povo cruel por natureza. “ A dia diferega dado empties (Os judeus nao sao tao respetéveis, to bonestos eto bons idadios quanto os outros grupos. ‘Nao éuma conduta antiguada obserear o preeito dominical Az leis contra o aborto ndo deven ser abolidas {As ei do divsrcio nao deveriam ser alteradas na sentido de tomé:lo mais fal Unites conjugais consensuais ndo sio deseveis. [Nao se deve proibir os experimentoscientficos com animais ‘A liberdade irrestrita de discustio nda é desejsve. Deveria haver menos polemicas ¢ discussoes politicas no ridio ena TV. (Os objetores de consciéncia sto traidores. Somente com o retorna i veligio pode a civilizagdo ter es- peranca de sobreviver. ‘A educacao religioss devera ser obrigat6ria, A educagio sexual nio deve ser dada a todos, meninos ¢ [Nao éerrado que aos homens seja permitida maior lberda- cde sexual que as mulberes. [Nossasdifculdades presents se devem antes a causas mo- ais que econdmicas ‘A “vara de marmelo” én bom principio educativo. A DIFERENGA VEM DA DIREITA Com ese olde enunciados daria para descreverquase com perfeigio a mentaldade de dist enconeadiga na maioe meteé- pole brasileira nas décadas fins do sécalo XX. Em mihas pe com gravado em 19861987 pelos bairos declase mia baixa de Sto Paul enconre muita gene asim, que rege, ente ce pensa tal equal pico. So pessoas que, para surpresa minha zem alto ao pesquibador, aloe sem mares roeios, ‘que eles proprios pensar sentem fe que tntos outros pensam Giada da itera 1s e-sentem, mas nZo dizem) a respeito da convivéneia ov da mera proximidade, € bem verdade que as vezesepidérmica, com indi- vidos de certs categorias ou camadas sociais,cetos grupos de ‘origem que eles saber distinguir muito hem nama cidade tio populosa quanto Sio Paulo. Na verdade, porém, estas frases que na abertura deste en- saio cismei em reproduzirjpsislitteris (com excego da referén «ia 8 TV) compsem 0 retrato do conservador inglés da segunda metade dos anos 40, al como revelado por uma pesquisa amostral realizada por Hans J. Eysenck mediante questionaio apicado in- dlividualmente a 250 conservadores, 250 lberas e 250 socals- tas, todos eles de classe média, adultos, urbanos e brancos. Ape- sar da enorme distancia sécio-culeural entee as populagdes ucba~ nas pesquisadas da Inglaterra e do Brasil, do fosso que separa a histéria dos dois paises, do lapso de quatro importantes décadas a afastar as duas pesquisas as coincidéncias nem im pouco su Perficiais e nada casuais que se pode observar nesses dois univer- ‘os mentas alam, sim, de uma similirude profunda ede wma per= ‘manéncia impressionance. Quando pegucio artigo de Hans Eysenck, “Social Aeinude and Social Class", publicado no nimero de langamento de uma das mais importantes influentes revista de Sociologia, 0 British Journal of Sociology, ano I, n° 1, margo de 1950, ai encontrei aserengas de dirita assim enunciadaseelencadas, empiricamente coletadas,fiquei hoquiaberro em face de tamanha e tio nitida semelhanca entre os conservadoresbritnicos do final dos anos 1940 e 0s atvistaseeitorais de dreita por mim pesquisados na ‘io Paulo da segunda metade dos anos 80. Quisme parecer, apesar do amarclecido da revisa que ex folheava entre curiosoe espan- «ado, que o tempo ndo havia passado, que aquele pequeno artigo ‘io falava de um outro lugar nem de otra gente. Claro, ha nes- sa lista pequenos detalhes que impedem que a coincidénca sea perfeita. Mas de modo algum empanam a similitude nem elaxam ‘oparentesco que linka por linha, quase que palavra por palavea, se constata neste rol de atitudes de dteta I e aqui, que sia de 16 A dinta ea deen: o dado emptico 1s mas que poderiam muito bem see dagui,dagora,saltando to- dos 0s oss histrios,cumulando todos os hiatos elturais, cruzando fronteirasnaionas,embaralhando os tempos ¢ ata. ‘essando 0s espagos, todas as espevifcdadesediferenga hsto- Fas e cultura percorsdas por wma idéntica obsess de firmar « sublnhar as diferengs ente eupos de umnanosdotados(é 0 ‘qe s diz) de especifcidadesiredutiveis. Ionia da pesquisa so- iolgica ou itonia da Histéria, para desespero de Paul Vee, nada mais parecido com um conservador ings de 1940 pou os ant talver o estilo, quando hé estilo, do gue wm palistano de dirita de 1980 e poncos. CChamo a atengio pars um outro aspect coincident: apes visa de Eysenck slecionou os entevistados primeiro por sua clasificagio politica (assim como a mina, que primeto perp tayaem quen a pessoa nha votado ma kia lego) Poi bem, nse faoral das intercorrelagbes entre as espostas 20 ques tionirio de Eysenck rvelow a existéncia de um fator gral de con servadorimo-adicalsmo petcortendo de ponta a ponta todo © conjunto das questes. Ino quer dizer, para bom enendedor, que os conservadores dferem dos socialists e dos iberas “auma mplavaredadede tens, msitos dos quis parecem te bem pou «4 telagio com potica”(Eysenck, 1980: 61). E que um obje to deinvestgagio camo este acaba se impondo como aquilo que realmente & e que, por sina, he conserva e garante wma sempre renovada atualidade, um sempre rejuvenescidoapelo. A saber: mas que uma formula de poverno 0 pensamento, a mentalida- de-e a sensiidae de dita acticulam uma concepeio global de sociedadea um mado de socabildade, Isto foi assim desde © comego, dese que a ultradieta contra-evoluconéria, ati 1789, achou de prescrever wena restauragio da ordem teaicio- ‘al “uma eestauragio social mais anda do que politica”, lem- ‘ya René Rémond, 0 mais importante historiador das dtitas na Franga que vé nesta demanda de preservagio, de retomada ou de einvensio de uma forma de socabildade "a sigiicagio pro- funda da Restauragio a aspiraio fundamental do pensamen- Giada da iteenga mesmo, por essa carga regressva com pretensio holistic, con ‘seguiumanter sempre em forma seus atrativos e bem agucado seu revolucionétio” (Rémond, 1982: $8), 0 qual, por isso rmordente, mesmo quando, mais tarde, se haviam desvanecido todas a esperancas de restauragio eetiva do governo mo «0, Muito mais do que de conservagio politica, © programa his- toricamente fundante da direta inser em seu nicleo mais re- sistente a pretensio de conservacio social: 0 conservantismo & antes de mais nada uma proposta de sociabilidade, um projeto de sociabilidade antagonisa do projeto da modernidade ilustra- dda, Uma “contra-utopia", no dizer de Karl Mannheim (Mana- heim, 1968: 253). E, na medida em que é uma combinagi0 nio apenas de idéias mas de prticas(prticas de atague e aurodefe- 14, de distingio ehierarquizagdo, desprezo e humilhagdo, intole- incia agressio,profilaxine higienizagio, discrimi: sregacdo), de discursos espontineos e discursos dou abrangendo aesfera publica e vida privada, de solugBes polit «as econémicas mas também de demandas de restauragl0 mo- ral ecorregdo comportamental principios eestereétipos, fantas- mas ¢ preconcetos, girando em torno ou nascendo em raio de uma obsess identitsria, iso €, de uma necesidade sempre auto- referida de prservagio a omtrance de um “eu” ou umn ameagado, na medida em que le esta combinagio toda, 0 i retsmo" (se este nome exist) € um verdadeiro“fendmeno s0- Gil tal” (Balibar e Wallerstein, 1988: 28). Noueas plavras, sais do que no campo potic stricto sens, a dicta cons. tiem ese dfundem no campo metapoitio das relagBes soins quotidian, dos mods estilos de vida e da lat cltral.D seu folego de gato dois séulos depose seu charme que ee ‘ora por toda parte neste fis demilénio, enquanto tudo 0 que & sélido continua desmanchando no at: -Mesmo sabendo gue a smcthang entre os achadosemip- ricos de Eysencl eos meus evant un problema interessant ‘mo —a saber seh uma universlidad ou tansclturalidade das atitues opinides, posigese dsposighes de dria se hé uma 18 A dzita ea deren: 0 dado emplrico | cstrutora invatiane, ¢ tado leva a cree gue sim —, no & por a {que vou conduzit este enssio. Abri-lo deste modo, entetanto, for- nece-m o atalho de que preciso para i mas direamente ao ponto {que me interessa e que o titulo anuncia. A saber: a certeza de que ‘08 sezes humanos no so igus porque no nascem iguas e por- tanto ndo podem ser tratados como iguais, quem primero a pro- fessou e historiograficamente mais exato, fi a ultradireita do inal do sculo XVIlle primeira décadas do XIX, alsa primeira dircia 4 surgit na Histria, em reagio A Revolugio Francesa, ao ideal republicano de igualdade e fraternidade ea tudo quanto de univer salismo e igualitarismo havia no movimento das idias flos6 «asdo século XVII (Remond, 1982: 46-71), Dito de outro modo: ‘ pavilhio da defesa das diferencas, hoe empunhado 3 esquerda ‘com ares de recém-chegada inovéncia pelos “novos” movimes: tos socais (0 das mulheres, o dos negros, o dos indios, o dos ho- jossexnals, os das minoras nica ou lingbisticas ou regionals tc.) foi na origem —e permanece fandamentalmente — 0 gran- de signotdesignio das dretas, velhas ou novas, extremas ou mo- eradas. Pos, funcionando no registro da evidéncia, as diferen- ‘sas explcam as desigualdades de fat ereclamam a desigualdade Alegitima) de ditcto. Différence oblige, chacun a sa place. egoou nos tempos madernos foi a diceta. Para ser ‘A ABSTRATA NUDEZ DO APENAS HOMEM ‘Hem Hannah Arendt uma expresso que nfo esqueco. Hi muita, als, na esrita desta pensadora que é também admiré- vel escritora, Uma delasinstalou-se definitivamente em mes es- ‘toque de metsforas logo que ali. Refere-e 20 homem universal e «std no livro sobre as orgens do ttaltarismo: abstrata nude2. “A abstrata nudez de ser apenas homem, a E forte a iti. Fé conservadora, no sentido mais isento da palavra, Tal expressivo sintagma (ou deve dizer impressivo,ié que tanto me impressionou?) aparece pelo menos tres vezes no capt Cada da dierenga 9 tulo sobre “O declinio do Estado-Nagio eo fim dos Diretos do Homem” (Arende, 1978: 347-88). Aparece a primeira vez no con texto imediato de uma discussio acerca da condigdo dos escra- 0s, 0s quais grande Aristteles no incluiu entre os seres hu ‘manos, condigio portanto de desttuigao radical que enteetanto ‘autora rediscute —“® luz de eventos reeentes” — para afirmar ‘que “mesmo os excravos ainda pertenciam a algum tipo decom- hidade humana, (porquanto) 0 seu trabalho era necesirio, usa- do explorado, isto mantinha-os dentro do mbieo da hummani- dade". Logo em seguida vem a frase em cujo meio aparece 0 ho- ‘mem nu: “Ser um esravo significava, final, ter uma qualidade diferente, mas sempre com um lugar na sociedade, portato, algo mais do que aabstrata nudec de ser unicamente humano e nada mais” (Arendt, 1978: 382, grifos meus). Asoutras duas passagens vém poneas piginasadiante, Hannah Arendt anda est discutindo ‘0 paradoxo dos direitos humanos quando, a cera altura, levada talvez pela logica interna de suas premissas “comunitaistas” a respeito da condigio humana, de seus pressupostos “appartenan- cistas", corte ao pensamento de ninguém menos que o pr6prio ‘cone do conservadorismo inglés anti-Luzes — Edmund Burke ‘Arendt retomna a Burke ndo para discordar, mas para lhe dar azo. Como quem pragmaticamente dia mio a palmatéria?, pergunt. “Estes ftos reflexes”, escreve Hannah Arendt, "cons- rieuem o que parece uma confiemacio inca, amarga tarda dos famosos argumentos com que Edmund Burke se opés 8 Declara- ‘0 dos Diretos do Homem feita pela Revoluio Francesa. Pa recem dar alento sua afiemagio de que os direitos humanos eram uma ‘abstragio'.." Arendt, 1978: 384, grifo meu). Eis a passa- sgem-chave: “A validade pragma do conceito de Burke parece ‘stat fora de divide, & lux das nossas muitasexperiéncas. ..) 0 conceto de direitos humanos, baseado na suposta existencia de lum ser humano em si, desmoronou no mesmo instante em que aqueles que diziam acreditarnele se confeontaram pela primeira ver com pessoas que realmente haviam perdido todas as outras qualidade erelagdesespecficas—exceto que ainda exam hua 2» A dei diferega 0 dad empiio nos. © mundo nao vi nad desgrado na abutrata mec de ser tnkamentehumano™ (id: 385), TE fnalment atria vez, como um eco da mesma vsada comuntaris,flexionande apenas no tom: “Ossobrerinetes dos Campos de extrminio, on interados nos campos de concen cdo deefigados st 0 ratvamene afortunados pda, Prnderam ver, mesmo sm os rgumentos de Burke, que a midee Usa de serem unicamente humanos era © maior sco que ora” (iid 385) Sem exagero no paraiso: pra ala sobre tsclladas da diferena,¢ fundamental revise certs autores qo, como Hanah Are exveram sempre de obo nas clades da lgwaldade, sents ao enorme rsco que representa —“o maior ‘hco" di ela —ouniveralism igual, a gualdade univer: sal O homem universal é0reltado hisico de um desnuda: meno: ele surge histokamenre quando sno do valor de ierenga ultras, Quando desalrizado on sua difren- prelidio dss aga de “relagdeseetcas”e “geal dade irene ft denticado pelo “Hihrais conservadores™ {Flume, Bake, Constane, Tocqueillee bem mastarde Raymond Aron) no jecobinsmo cecinalita-ocsratita em a0 na R= ‘ou Frances; Hannah Arent ileal seu aeabamen Ico nos totaltarismos do sca XX. Deixemos de lado a recsainconfessada de Hannah Arendt a encarar de frente a diferenge daca, dito de outro modo, a diferenga d conti tlucnada eo alo da perseguioe da von de extern Fea Gift acompanhar a flsofanesse verdadero tour de force de projetaro motivo da barbie que desabou sobre os judeus na eneraidade de sa asta condi de homens em si ho Gu sc eabeye a hioriografa recent sobre os toralarismoseuropeus do sceulo XX tem ido neta des, os aes no fora at dos dag inconesbie forma peo fo de serem considrados ‘nwaisarodos o eres humanos, absrados de “todas as utras halides e lags especies, Ao contro. Fol precisamen te plo io ds espeiicade de *judeus" — a sua diferenca judaica, como tendo sido, ela sim, a tazi0 iad da iferenga a Foi porheterofobia, por fobia 8 sua alteridade ieredurivel. E uma vex reconhecidoo ato brut da alteridade da diferencaincomen surdvel, foi por desvalorizagio da diferenga reconhecida, cuja existncia neste mesmo ato é rafirmada para ser negada, expeli- da, exterminada, E nfo, como quer Hannah Arendt, por abot ‘Gio das particularidades culturss no moderna despojamento que leva 8 abstrata nudez. Deixemos de lado, por ora, os excessos co metidos pelo “comunitarsmo” de Hannah Arendt e acompane- ‘mos rapidamente suas incursdes plas fontes do pensamento con- tra-tevolucionério do século XVIII onde se encontra —e se apren dde — um elucidativo modo de eontrapor diferenga a abstragao. Voltemos a 1789, De 1789 €a Revolugio Francesa ¢ de 1789 € live de Ed rund Burke, Reflexdes sobre a Revolugio de Franca de longe a obra que maior atragdo« influéncia exerceu sobre as correntes ‘contra-evolucionsrias no mundo todo. Por contra-evoluciond- rias neste contexto entenda-se, obviamente:contrrias as deman ddas modernas de liberdade, gualdade efaternidade; conta, por- tanto, as formulagies politicastrbutivias do esprit de abstra- so, Bis © bindmio que traveja © principal da argumentagio de Burke: a rejcgdo dos Dieitos do Homem como metafisica abs- trata, geomeérica, ea recusa a acetare mesmo a conceber, em cima de tis inseguras bases, uma nova sociedade civil desde logo re= dduzida a ndo ser senko,.. uma tabuda vasa, uma carte blanche Barks, 1989: 264), Burke enxerga contradigio na prete rigir ox Diritos do Ffomem em pr fica de um povo que nio égeral, é singular. “O governo dos ho- ‘mens nfo €eitabelecido em vrtude de direitos naturals que po- dem exist ede fto existem em total independéncia dele. Eexis tem em muito maior clareza,e nism grau muito maior de perfi- a abstrata: mas esta abstrata perfegso & seu defeito pritico” libid: 76), Por natureza, so ditetos subjetivos, individuaiss sociis, portanto, eapoliticos, anteriores que sio a toda conven ‘0. Direitos do Homem? Mas o Homem, enquaato abstracio, revolucionéria de » Adina ea diferengs 0 dado empitico fo existe para Burke, que declara ter sob sua contemplagio 0 bhomem-social-cvil, endo outro: the iil social man, and no other (Burke, apud Seruton, 1991: 34). Ora, a definigho dos Ditetos ddo Homem €fita a prior. Sao direitos teSricos, abstratos, ind ferentesa toda consideragio de ordem pritica ea rodo conteido histérico nico, Sio pura fiegio metaisica, “these metaphysic rights” x. Mais sensato,entio, do que canfar “em principios abs ‘tos como os Direitos do Homem”, seria oapoiar-se na *heran «2 vinculada” daqueles direitos que um homem, nfo o Homem, ‘transmit a seus filhos do mesmo modo que Ihestansmitea pré- pria vida e, assim apoiado, descobrie que suas salvaguardas sio “os direitos dos ingleses” (the rights of Englishmen) esse “pari- _ménio herdado dos seus antepassados” (bid: 30), emanagd0 que vem “de dentro da nacio” ef. Arendt, 1978: 384). Dai que para Burke as constituigdes dos diferentes povos no podem ser sendo diferentes umas das outras “Eas no podem ser fixadas sobre uma regraabstrata nada 60 tolo quanto discutlas com base nes- te principio” (ibid: 77, grifo meu) A ficgoespeculativa dos direitos do homem — these meta physic rights —ignora em sua simplicidade fil acomplexidade do set humano e dos mecanismos da vida social. “A natureza do hhomem é inrinea salto grau de complexidade possve; ‘30 ou organizacio s# 78). A concepsio See ne Thumana, da vida sociale da ordem politica, tal como encontrada na dow trina dos Droits de Homme e nas novas constiuigdes poliicas :modernas, descompromete 0 homem em relagdo a sua comuni- dade de origem, 3 qual deve sua diferengahistrica,arranca-Ihe as raizes, das quais depende sua vida pessoal, que € sociale & c vil, A violénciarevolucionéria,leitimada pela teria, éa conse- ‘éncia Iogica de ma filosofiaabsteata que tea do coragio do hhomem os sentimentos mais clementares de compaixio, os agos idenivios, as raizescomunitirias, a parceria “no s6 com os que Cada da iecenga 2 tio vivos, mas entre os que estio vos, 0s que morreram ¢ 0s {que vo nascer" parcera que, além deintergeneracional, “conceta ‘o mundo visivel com o mundo invisivel” (apud Seruton, 1991: 38) [Nao é 8 toa que no texto de Burke, num relance, a construcio abserata do mundo, preconizads pela Assembla revolucionsria, parece diabolizada como “o espitito do mal”, a prépria figura «da negago em ato — um poder destrudor das sociedades e dos costumes estabelecidos pela Historia: “Como o espirto do mal, 1 poder de que (a Assembléia)goza é feito para reviaredestuir; jf que poder para construir ela nfo tem nenhum, a nia ser 05, cngenhos necessirios a ouras convulsdes ea novasdestruigbes” (ibid: 87). Em Burke se associam harmoniosamente conservadorismo c empirismo, E conservador ¢ empirista, ov melhor: porque em Pirista. Sua filosfia politica é ela mesma, um empirismo, uma filosofia da experiénca. Seu conservadorismo sécio-politicotra- bualha no registra da evidencia imediata, A démarche se apresen- ta antes pragmitica que teérica, mais proxima da sociologia po lca do que da especulago flosies, interessada antes nas rea- lidades coneretas de uma vida social realmente existente do que nalguma idéia abstrata de iberdade humana, nalguma idéia me taflsica de emancipagio do individuo como ser humano “em si", privado de sua true contmaety. Os prinepios gerais de sua filo- sofia politica esto de pontaa ponta atravessados por aquelaar~ tia empirista que, contea as pretensses da Razio cartesiana, defende desde David Hume 2 heranga do passado eda tradigio, ‘o cabedal das épocas passadas. Para Burke, as qualidades especi- ficas das comunidades humanas esto entee os dadossensveis que corrigem a Razdo, a razio nua, the naked reason (cf. Setuton, 1991: 38). Onde Burke vem falar de “ea73o nua", Hanoah Arende vai falar de “absteata nudez”. Dé para perceber que, quando se dd enfaizae a desconfianga em relacio a Razio revolucio- ‘tia iluminista, equalizadora, um recurso imagético muito ex- pressive para uso do pensamento conservador éustamente a u- dz, o que no deixa de sr altamente sintomtic. Po Adit ex diferenga dado empico A DIFERENGA £0 SENSIVEL ‘Meu propésito neste ensaio é entrar numa diseussio. Com todos aqueles que, sustentando posigdes de esquerda hoje no Bra- sil, procuram fszer da diferenga uma hoa causa pela qual lat, ‘uma hoa idéiaa ser defendida,difundida e ensinada, O que vai se dito aqui foto de minhas indagagdes e minhaslecura, bem ‘como da semtpre renovada surpresa com o teor das entrevistasfei- ts por mime minha equipena cidade de So Paulo, no ir segura- ‘mente to undo, nem stiri tio ordenado quanto eu gostaria N pretendo originalidade. $6 quero entrar no debate, por escrito, “Mas eu ia dizendo que o retrato-tipa do cidado conservador revelado por Eysenck me forneceo atalho para ir dretamente a0 que me interessadiscuti aqui. E que a listagem de aritudes de sireita que reproduzo na abertara deste ensso incu boa dose de afirmagies raistas, sexistas e moralistas. Deixemos o moralismo pata outra ocaido e © sexismo para mais adiante, Comecemos por onde comega a lista de Eysenck: pelo racismo. Existeporaf, nos meiosletradose mais bem informados, uma espévie de evidéncia primeira, hegemenicae, talver or sso mes- ‘mo, um tanto irefleida, quase uma “idea recebida”, que associa as ideologias, mentalidades e senibilidades de dieita, conserva- doras, aristocritieas,autoritérascolonialistaseliistas, oquescia, ‘com os racismos echauvinismos de todo os tipos e nives. Ata, tudo bem nao ha nada de errado com isto, pelo contrrio. Mas ‘iste também —¢ estas minhas reflexbes pretendem mexer com ‘estado espontineo das arts neste ponto em nosso pais — uma contra “idea recebida'”, que pensa como suficiente, «por ss6 todo ‘esclaccedora,adefinigio do(sracismo(s) echauvinismo(s} como sendo,em sua essénca,rejeiao da difeenca. O racismo & inter. pretado apenas como recusa, incapacidade ou impossbilidade de accitaro outro, o diferente, 0 ndo-semelhante,onlo-iéntio. Deste onto de vista, pelo qual se express também interpretagzo ant racista hegemdnica no senso comum intelectualizado, o racismo acaba limitado.a priori por uma definigio simplificadora, ou pelo ads da iteceaga 2s ‘menos pouco sofistcada (sobretudo para os dias que correm), que ‘cicunsereve nos marcos da heterofobia, sta estranha recusa| da diferenca, na qual o racismo vem um dia se enxertar™ (Dela- ‘campagne, 1977: 145), esta “recusa de outrem em nome de n2o importa qual diferenga” (Memmi, 1982: 118). *O racismo es: ‘sencialenteheterofobia” (Gabel, 1983: 432) £? Esa evidencia efinicional do racism como reeigo fobica da diferenca,convie~ «io generalizaca mormente depois do genocidio nazi certeza pri- ‘ma facie commpartlhada pelos circulos mas esclarecidos eas en- ‘es mais democriticas,evid2ncia imediata que no entanto no diz toda a verdade, apenas mela, igualzinho a qualquer outra verda~ de de valgata claro que facta muitissimo o abragaracausa da dliferenga como algo inovador, progresista, emancipat6rio, hima- nit, i que, reza a vulgata anti-racist, quem recusa a diferen- «a €a direita racist, obscurantsta,atrasada, fascist, ‘Ora bem, isto impede de atinar com tudo aquilo que nos racis- mos echauvinismos existee procede da atengo a diferenca. Now- ‘tas palavras, ito nos impede de ver os racismose chawvinismos detodosostipos eraus como celebracio da certesa das diferencas «, dafsim, como presrigi da urgéncia de sublinhar as diferengas ‘para manteras dstncias ef De Rudder, 1985)-O racsta oun do dos humanos soba éticapriviegiada da diferenga, melbordi- z2endo, pondo em focoadiferenca. A démarcheracstacomesa por “oaapenss sopost, imaginada, {otrato constane coin as Flas de cds paulstanos que fazem dis certeza da diferenga uma raz3o para militar politicamente em favor decandidatoseproposta de dret,edteita autoritria, ov sam ugerirum pouco mais de cicunspecgio no trato desta questo, (0 fancionamentoret6rco da linguagem ordngsia dos ativis- ‘as entrevistados, seu modo de argumentagio (que visa persua io, é claro, quando no supe jé de sada 0 consentimento espon tnco com o seu ponta de vista, posto que tod conservador, mes ‘mo aque no muito elaborado itelectualmente, tem quase sem 26 A dia ea diterenga: 0 dado emptico i pela focalizago da diferenga.O racismo nao € primeio rejeigio da diferenga, mas obsessio com a dferengay sia ela constative, prea boa consciéncia de estar expressindo a opinigo de cdo, instal desde logo na convicyo de que a opnito pablica ests com ele) oslo tempo todo entre a celebrago (ato-eferida) da iferenga ea repulsa aos diferentes entre aafrmagSo ¢ ane 2620, enteaconsatago inescapavel do fat, daexstncaefe tiva das diferengas, areas (mais ou menos agresiva, mais o8 ‘menos violent} de conviver com ls, Afirmagio enepaglo, ce Iebrac repuls convetenv-seindefinidamente um no oxo em suas falas, que uma mesma obsesso (hétero-eferida) prcore: “eles sio diferentes”. Depois de algum tempo de familiaridade com as falas dos entrevistads, de decantago desta ambighdadefun- ional da inguagem no inlecrualizada de drei acera da di- Tetenga (no intlectuliada mas liane, convém nfo esgue- cer), conc que no €ocioso instr em explicitar ot dois mo- ‘mentor, os dois atos mena envolvidos no racism espontineo ¢ displos segundo sua ordem, a saber 2 rejeigdo da difeenga os da afirmagdoenfitca da diferenca Para a direita, portanto, o discurso que afirma as diferengas negro € diferente de branco, a mulher € diferente do homem, nordestin€ diferente de paultae asim por diante— €0 dis curso inaugural, «enunciagdofundante, a evidencia primeira, a verdad mediate incontese, Empire, lust dosensivel) Ox rmecanismos que se seguen a esta *constatagso do bom senso” 2eerea do “ato concer” das diferengas(foalicar, subliaha,f- ar, sbsolutizar, naturalizar, biologaar, perenizar.) que ¥8o transformé-la numa tomada de posgdo racista propriamente dita excludent edestrutiva das) diferenga(s selecionadals) co- ‘mo avo, numa convcgo de segundo au leiimadora de prs- tics de violencia no minimo verbal. A particularidade do rac ‘mo cisco, embra Colette Guillaunin, defnido “como uma jiologizasio do pensamento socal” reside na tentativa de, pot te sear Ha ocrvada ou impala (al laumin, 1972: 4), Ener afrmagio da diferenga(contatada ou inyentada ¢ sua rejeigio-(que € onde o racimo se consuma, fidentes a rmedeia uma série de procedimentos discursivos wedentes a au Cada da dieenga ” sceducvel” (neo-tacsmo} (ef. Taguiell 1950) Mas 0 ‘importante € que opasso ical & dado toda vez que a difcenga 6 dita enfaticamente,rada ver que os dicursos sobre a soceda de 0 imaginris soca, si “reentrados” sobre a certeza das Aliferengas, agora enun Se assim é 0 que dizer de quando a diferensa pasa a set lardeada eprocurada, que €0 que anda aconteendo em alguns dos “novos movimento sciis, em certas ONGS e em certos eirclosacadémicos? Fu tendo a concordar com aguces que véem 1a focliasio da dferenga o crterio para dignostcar 0 procs so (sui desde logo, nesta satleza reside muito da forea dos neo racismos) de racilizagSo dos imaginivis sci. Endo s6. Na medida em que sto passa a ocoreer no campo de eno campo ideoldgico das exquerdas, a indstngio dos signticantes faz aumentar a precariedade da sinalzagdo das diferengasideoligi- as, qu, ests cnt, embarathadas,confundidas, dea de po- derser tas com itd. Beto perverso por exceléncia doenfogue na difeensa(degnero, de culture, de ries, de modos de vida ct} como bandeira de lata dos movimentos de esqurda 6 na ‘minha opnido, o embgamento do foco ow um abscurcimenco sinda maior das dferengasdefinidoras dos campos advesiros na guerra idoldgica. Que venha o movimento das mulheres fi sar para o womo qualunque que a milher diferente do homer, uid nov? Que venha o movimento negro em ss flas ecm sen ‘scritos bradar para uma sociedade como a nos, que nascea sscravocrata eas permanece durante séclos¢ proconizar m0 cotdian agessivo desta metrpole que "nega €diterente™ uid novi? Ito £0 que todo mundo i sabe desde spre, no shoca ‘vido algom, apenas confirma o 6 aabido¢, por ainda legit ‘Ba que diferenga sea enfocada eas distncias,alargadss. : ‘gue es atmosTers For Moderna Gue hoje muitos de nos respira ‘mos nos ambientes de esquetda, essa onda de clebragdo neo 28 Adie es diferega o dado empiico harroca das diferengas, de apego as singularidades cultura, de polo daicedusibilidade das partcularidades eespecificidades culturis, sociis e contextuas, tudo isso assusta muito pouco as cabegas de dircta, também elas perpassadas de “fundamentalismo cultural” (ver Stoleke, 1993), Tratase de um discurso absoluta- mente palatvel, familiar mesmo, 3 dreta popular. Para uum individuo dessa dirt, o discutso ndo-palatavel, aquele que mais do que qualquer outro desencadeia sua violén cia verbal, Ihe arrancaimprecagdes,injrias eacusagbes nfo raro ferozes, aquele que provoca sua ojerizae Ihe causa urticiria é ainda hoje, dazentos anos depois o dscurso dos Direitos Huma- nos!, 0 dseurso revolucionsrio da igualdade, seja a igualdade siante da lei sea a igualdade de condigées econdmicas (a con- ‘quistar como direto), sei a igualdade primeita de pertencermos todos 3 mesma condigio, a igualdade ao nascer. Vale dizer que ‘em nosso pais 0 discurso nio palativel eimediatamente odioso ainda 6, cento e powcos anos depois da aboligio da escravarura, ‘odiscurso abolicionista das desigualdades e subordinacées, i meia a fala, havia desfiado uma série de provastiradas da itera- ‘uta historiogefica para por em xeque a “suposigio” de que mu Therese homens tim os mesmo interesese aspires em relagio ao trabalho. Ao conttivi, “homens e mulheres diferem em suas ‘expectativas de trabalho, em seus interesses quanto aos empregos {que prefecem e aos tipos de produtos que preferem vender”. Por conseguinte, “éingenuidade aceeditar que 0 que €efeto natural dlssasdiferengas sei prova de discrtinago pela Sears”. estratégia consequente des- oi pata dees qe nm devine sumieo pote deve ddierenae coin come SSopodo avers upoagio™ da gualdde Granda sor ros pesguisadores nae incase da propria Kes Hari, Rosenberg proton persuade ue “muitos Datadoes cpecmentemuheres tm ojeose alors ous {ue smplesmente razr o gan econdmico maximo”, are ‘Thea tabamerc maul B pcoreno desonmmenn Sahin vn eal do eal nos EUA,mosrana que “thitn males eclhemenpepsquecomplemetan sib cio familiar ef empreger que pderam aumentr Sus Thos pena epun Reeer, a acsagie¢povs tetas presen pela EEOC cores Seas “presume db ‘Store dad oporuniadesigu snares fae se tna cxclias qucum home poeta faze. Alm do quel = oni a bubeada em um molto wadonalenemaselino {came at peer comporameo nies atbercoha mat Import maxima eondia”,.A deen da ease ve pois desde o inicio ancoradae escorada na evidénciaempirca {Eten clral ene honens mulheres As maleres eo Fears na edad gute diferent aguerava Roser, ur arematot “erty oii sempre dsriinagio™ ‘Se a defesa da Sears batia na tecla da diferenga, estava claro ‘que a estratégin da acusagio, em se tratando de provar a ocor- ads da teresa 2

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