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Emico Okuno Elisabeth Yoshimura Prefacio Somos, com muito orgulho, duas professoras, Costamcs de ensitiar, de dar auies, de interagir com alunos, e fazemos dessa arte ama missio prazerosa, inclusive porque também aprendemos em todo esse proceso. Nesses tempos em que a educacao néo tem zecebido a atencéio que merece, estamos nos esforcando para dar nossa centri- buicdo. Eo minimo que podemos fazer para retribuir a instrugao que recebemos gratuitamente ao longo de nossa vida estudentil, além de acreditarmos ser a educacio o pilar mais importante para ¢ futuro de qualquer nagio, E temos certeza de que fizemos ~ e fazemos - diferenga para muites alunos que passaram pelas nossas maos. Somos também pesquisadoras, o tempo todo, inclusive quando lecionamos e quando escrevemos um livre, Iniciarros ministrando disciplinas relacionadas a Fisica das Radiagdes, a partir de 1987, no Instituto de Fisica da Universidade de So Paulo, ¢ fomos questionadas pelos alunos sobre a existéncia de bibliografia em portugués. Procuramos suprir essa necessidade com apostilas ¢ textos de apoio. A decisdo de transformar esse material em livro-texto veio, finalmente, por nao existir nada similar em lingua portuguesa, pelo aumento do nimero de cursos de Fisica Médica criados recentemente no Brasil e por termos acordado com @ Editora Ofcina de Textos pela publicagio. Essa determinagéo nos trouxe imensa satisfacdo e entusiasmo, mas também muito trabalho e grande responsebilidade. Pelo fato de o projeto deste livro vir sendo pensado e trebelhado hé varios anos, acreditamos ser uma cbra madua, porque muito do contetido do texto e os exercicios j& foram testados com nossos alunos, que serviram de cobaia, no bom sentido. Olivro consta de 13 capftulos. © Cap. 1 6 uma introducao & tecria atémica e & Fisica Nuclear. 0 Cap. 2 discute os raios X e sua atenuagéo. © Cap. 3 discorre sobre elementos quimicos ¢ radioisétopos. 0 deeai- mento nuclear de uma forma gersl é abordado no Cap. 4¢ os tipos de decaimente, no Cap. 5. 0 Cap. 6 apresente uma introducdo acerca da interagdo ca radiacio com a matéria. Mais detalhadamente, os Caps. 7 €8 abordam, respectivamente, a interago de particulas carregadas e de fotons. No Cap.9 sfo apresentadas as grandezas e as unidades de Fisica das Radiagées e, no Cap. 10, os efeitos ioldgicos. Os detectores de radiagdo estiio no Cap. 11; as aplicacées das radiagGes, no Cap. 12 € a introdugao a protegdo radiolégica, no Cap. 13. Entremeanio o texto, ha exercicios resolvidos, para melhor aprendizado e entendimento do aluno, e uma lista de exercicios em quase todos os capitulos, além de historias relativas a cada t6pico. No final de cada capitulo, coletamos dados bibliogréficos de cientistas mais expressivos que colaboraram para a pesquisa ¢ o ensino na drea, e escrevemos uma pequena biografia. f possivel notar que nem todos os capitulos tém 0 mesmo aprofiundamento em cada tema, sendo possivel exploraro livro fora da orem que escolhemos, dependendo das necessidades do leitor. 0 texto no trata de Fisica das radiagGes nao ionizantes. Apresente obra pode ser utilizada em cursos de Fisica, Fisica Médica, Engenharia Clinica, ‘Tecnologia em Radiologia, nos cursos de apr'moramento para fisicos na drea da saiide e nas pés-graduagSes que possuem temas relacionados com a Fisica Médica. Pode-se utilizé-la coms livro-texto ou para consulta ou aprofundamento em alguns de seus tépicos. Também professores de Fisica do ensino médio podem usufruir desta obra para sanar duividas e aumentar os conhecimentos na area, jé que, apesar da sua importincia no mundo modemo, a Fisica de RadiagSes quase nunca é inclufda nos curriculos das licenciaturas em Fisica Nosso desejo mais profundo é que este livro seja, de fato, util para o aprendizado de Fisica das Radiacées lonizantes pela comunidade envolvida profissionalmente com o tema, Nos varios anos dedicados & produgdo deste livro, foram muitos os colegas ¢ amigos que nos auxiliaram das mais diversas maneiras - com cessio dz material, sugestdes de bibliografias, discussées, incentivos e palavras amigas ~, que no vamos conseguir nomear ¢ agradecer a todos, Para simbolizé-los, escolhemos um amigo, 0 nosso primeiro leitor, Almy A.R, da Silva, a quem agradecemos os comentérios, a dedicagdoe a rapidez com que nos deu retorno. Agradecemos também aos nossos ex-alunos do Instituto de Fisica da USP, por terem ajudado na producio do texto e por manterem em nés o entusiasmo pela docéncia. A toda equipe da Editora Oficina de Textos, representada pela Shoshana Signer, pelo esmero # eficiéncia na producio da presente obra, o nosso muito obrigado. Somos gratas, ainda, a nossos familiares, que nos deram retaguarda para essa tarefa intensa, principalmente durante a rete final. Sao Paulo, 19 de fevereiro de 2010 Emico Okuno Elisabeth Mateus Yoshimura Sumario Radiacéo, 11 1.1~Ieteopugio, 11 1.2 RADIAGRO LETROMAGNETICA E © CORFO HUMANO, 12 1.3 Aromos, mouicutas 5 fons, 16 1.4 —ATSTRUTURA ATOMICA, 20 1.5 MODELOS ATéMICOs, zo 1.6 ~ MopeLo br Bou po Aromo De sipaocémo, 22 Raios X, 33 2.1~InTRODUGRO, 33 2.2 PiopugA0 De nALOsX, 36 2.3 Arenvacho Dos Ratos X, 40 Radioisstopos, 53 3.x InTRODUCHO, 53 3.2 ~ eG TorOS = napiowsror0s, 54 3.3 Un Pouce De msréRta, 55 3.4 PRODUGAO ARTIFIGISL DS RADIOISOTOFOS, 59 3.5 -NGIA-VIDA FISICS, MBIA-VIDA BIOLOGICA = MBIA-VIDA BFBTIVA, 61 3.6— CoNTAMMNAGHO AWATENTAL CoM RADIOISOTOPOS, 62 Desintegracdo nuclear, 69 4.1 ITRODUGAO, 69 4.2—Massas arénacas,73 4.3 RAZORS PARA A DESINTEGRACAO NUCLEAR, 74 4.4~ DecammeNTo NUCLEAR, 77 4.5 ~ ATIVIDADE DE UMA AMOSTRA RADIOATIVA, 79 4.6~Decanaenros sucessivos, 81 Tipos de decaimento, 87 ‘5:1 ~ ESTADO DA ARTE EX Fisica DE 1900 4 1940, 87 5.2-Det 5.3 DECAIMENTO BETA, 92 ZNTO ALFA, 88 5.4—EuissAo ne stfrzons AUGER, 93, 5.5 —DECAIMENTO GAMA, 101 5.6 ~ IISTARLLIDADE DE EADIOISOTOFOS, 102 Interagéo da radiacio, 109 6.1 InTRopUGKO, 109 6.2 ~ RADIACAO DINETAMENTE IONIZANTE: PARTICULAS CARREGADAS RAPIDAS PESADAS, 370 6.3 — RaDIAGAO DIRETAMENTE IONIZANTE: PARTICULAS CARREGADAS RAPIDAS LEVES, 122 6.4~ RADIAGAO INDIRETAMENTE IONIZANTE: FOTONS, 123 6.5 — RADIAGRO INDIRETAMENTS ONIZANTE: NEUTRONS, 116 6.6 —DePosigAo DE ENERGIA NO MEIO PELA RADIAGAO! DOSE ABSORVIDA, 127 Interagio de particulas carregadas répidas com a matéria, 125 7.1 ~ CARACTERIZAGAO DAS INTERAGBES, 15 7.2 — PODER DE FREAMENTO, 127 7.3 - PARTICULAS CARREGADAS PESADAS, 128 7-4.~ PARTICULAS CABREGADAS LEVES: ELETRONS E POSITRONS, 134 7.5 — DEPOSIGAD DE ENERGIA NA MATERIA POR PARTICULAS GARREGADAS, 141 Interagdo de raios X e garia com a matéria, 151 8.1 ~ ATENVAGAO DO FEIXE DE 7OTONS, 151 8.2 - ESPALHAMENTO COERENTE OU RAYLEIGH, 153 8.3 —_ErEITo Compron, 153 8.4 —EFEITO FOTOELETRICO, 159 8.5 PRODUGKO DE PAR ELETRON-POSITRON, 162 8.6 - O COBMIGIENTE DE ATENUAGAO, 164 8.7 ~ ENERGIA TRANSFERIDA AG MEIO NAS INTERAGBES DE RAICS X E.GAMA, 768 8.8— Aruicagbes , 169 Grandezas e unidades, 181 9.1 ~Intz0DUGhO, 181 9.2 ~ GRANDEZAS £ UNIDADES, 182 9:3 - GRANDEZAS FISICKS, 783, 9.4 ~ GRANDEZAS DE PROTEGRO, 193 9.5 ~ GRANDEZAS OPERACIONA’S, 195 9.6 ~ Resume, 197 Efeitos biolégicos das radiagdes nos seres vivos, 203 30.1 ~ INTRODUGAO, 203 10.2 ~ 08 ESTAGIOS DA AGRO, 204 10.3 MECANISMOS DE AGRO EAS RADIAGOES, 204 10.4 ~ NATUREZA DOS EFEITOS at Go1cos, 22 30.5 ~ INDUGO DE OUTRAS DOENCAS AESULTANTES DE EXFOS:GA0 A RADIAGHO IONIZANTE, 275 10.6 ~ RESULTADOS RECENTES DOS EPEITOS BIOLEGIGOS, 220 10,7 = RESUMO DA DIFERENCA INTRE O$ EFEITOS DE DOSE ALTA F DOSE BAIXA, 221 10.8- HORMESIS, 227 Detectores de radiagao, 231 21.2 INTRODUgO, 237 1.2 DETEGTORES A GAS E © CONTADOR GEIGER-MULLER, 235 11,3 ~ DETECTORES CINTILADORES, 238 11.4—DETECTORES DOSIMETRICOS: DETECTORES LUMINESCENTES E CALORIMETRO, 242 Aplicacées da radiacio ionizante, 249 I-A -AOES INDUSTRIAIS, 249 12.2 AnLicagaes MEDICAS, 254 Protecio radiolégica, 263 33,1 InzRoDUGAO, 263 13.2 EVOLUGKO Dos VALORES ne LinazE DE Dost, 264 13.g~ MovEl0 DA RELAGAO ENTRE EFEITO E DOSE, 266 13.4~ CALCULO DE Bisco, 270 13.5 BASE £ ESTRUTURA Do SISTEMA DE PROTECAO RADIOLOGICA, 272 13.6- ExosigKo ocupaciowal, 273 13.7~ ReGRAS BASICAS DE PAOTEGAO RADIOLOGICA, 274 Bibliografia, 283 Indice remissivo, 291 Radiacao 11 INTRODUCGAO Podemos afirmar que radiaco é energia em ténsito, da mesma forma que calor é energia térmica em transito © vento é ar em transite. Portanto, radiagao uma forma de energia, emitida por uma fonte e transmitida através do vacuo, doar cu de meios materiais. Consideram-se radiacées particulas atémicas ou subatémicas ener géticas, tais como particulas a, elétrons, pésitrons, prétons, néutrons etc,, denominadas radiagdes corpusculares, ¢ as ondas eletromagnéticas, também chamadas radiagdes ondulatérias. As particulas a (niicleo do dtomo de hélio), 6 (elétrons) e B+ (pésitrons) so emitidas espontaneamente de mticleos instaveis de atoms. Além disso, feixes dessas e de outras particulas podem ser produzidos em aceleradores de particulas ou em reatores nucleares. ‘Uma onda eletromagnética é constituida de campo elétrico e campo magnético oscilantes, perpendiculares entre si, que se propagam no ‘vacuo com velocidade da luz ¢ = 3x 10° ms~ Dependendo da frequén- cia da onda, ela recebe denominagées diferentes, como micro-ondas, radiagdo infravermelha, luz visivel, radiagao ultravioleta, radiacao gama, em ordem crescente de frequéncia. A radiagao eletromagnética 6 também denominada energia cletromagnétice ou energia radiante. Durante varios séculos, houve discussGes acaloradas sobre a natu- reza da luz entre os adeptos da teoria ondulatéria ¢ da teoria corpus- cular, A teoria meis modema foi desenvolvida a partir do trabalho de Max Kaz] Ernst Ludwig Planck, em 2901, e de Albert Einstein, em 1905, com a formulagao da teoria dos quanta. Segundo esse teoria, a radiagdo eletromagnética ~e portanto a luz - € emitida e propage-se em forma de pequenos pulsos de energia - ou quantum de energia - chemados fétons, que sdo particulas sem carge e com massa de repouso nula, que se propagar com a velocidade da luz. 12 A sohugio unificada, a qual s luz pode ser uma onda e, 20 mesmo tempo, um corpiisculo, dependendo da forma como o observader interage com 0 fendmeno luminoso, surgiu com a teoria da dualidade onda-particula, desenvolvida a partir de 1924 por Louis-Victor de Broglie. Essa dualidade foi estendida a todas as particulas, com a afirmacGo, por Louis de Broglie, de que: a toda particula esté associada uma onda, ¢ a toda onda est associada uma particula. A radiacdo interage com corpos, inclusive o humano, depositando neles sua energia. 1.2 RADIACAO ELETROMAGNETICA E © CORPO HUMANO. No caso da radiacdo elecromagnética incidente em corpos no ar, parte de sua intensidade pode ser refletida na interface ar-pele e perte, transmitida através do compo. Intensidade de uma onda é a quantidade de energia propageda por unidade de drea e tempo, expressa em W/m*. Os coeficientes de reflexéio e de transmissao que indicam os percentuais de intensidade refletida e tansmitida, respectivamente, dependem muito da frequéncia v da onda eletromagnética e do meio que absorve a cnda. A Fig. 1.1 mostra o espectro eletromagnético com frequéncia v, comprimento de onda A da onda eletromagnética e energia E do foton correspondente cbtida pela Eq (1.1). Ela foi proposta por Albert Einstein, que se baseou 20 conceito de quantizacao introduzido por Max Planck, iz E=nvehs ay onde h é a constante de Planck e vale 6,63 x 10-™ J-s = 4,14 x 10-15 eV's, ec &a velocidade da luz no vacuo, igual a 3 x 10®m-s~*, Aqui usamos a correspondéncia: 1eV = 1,602 x 10-19}, A unidade elétron-volt nao perience ao SI, mas sew uso traz facilidades, porque a energia de um foton de 500 nm 2,48eV, e em joule, um niimero muito Ppequeno: 3,98 x 10-"9), - Infravermelhc alos Xe Gama Ukravioleta | 124xt0% eV 124x004 eV 12,4e¥ 1,24Mev_ Energia do foton G nto Ter sor 10 08 to? to* e+ s9# 10% 10" Seon ait i = 3x10? 3xd0* sct0* 3108 3x10" asto™3.aol*sxior*aaoMaag” —Frequendia (Hz) [Energia | Forno de i elewica | |micro-ondas 60 Hz 2.450 MHz Rédio AM ‘Telefone celular 53.a 1.606 kHz 900 MHz Radio, TV, FM Radiagio| Radiacao 88-108MHz ——naoionizante’ ionizante Fig. 1.1 Espectro da -adiacso eletromagnética Podemos agora definir intensidade de radiacdio eletromagnética monoenergética, também conhecida como monocromética, como o ntmero de fétons N, multiplicado pela energia de cada foton, por unidade de érea e tempo: Fisica DAS RADIAGOES re EL Nay At AE A Tab. 1.1 lista as principais faixas do espectro eletromagnético com suas respectivas frequéncias, comprimento de onda da onda eletromagnética e energia do féton. A separacdo em faixas nao é muito rigorosa, podendo haver sobrezosicao entre elas, De forma muito geral, podemes dizer que as denominacées diferentes por faixas de frequéncia refletem tipos diferentes de interacSo, Tab. 1.1 SEPARAGAO DO ESPECTRO ELETROMAGNETICO EM FAIXAS Radiacggo Frequéncia Comprimento Energia do féton eletromagniéstica de onda ev) raios X e gama > 3PHz < 100 nm >12 Ultravioleta vc 3PH2-1,07PH2 = 100nm—280nm 12,42 4,42 uve 107 PH2-0,952 PH2 —_280nm—315nm 4,42 -3,94 UA O.952PH2-0,75PH2 ——-315nm—400nm 3,94-3,10 . O.75PHz~0,A28PH2 = 400nm—700nm 3,10-1,77 luz visivel Infravermelha IVA 3857Hz - 214 THz 780am—1,4pm 1,59 -0,88 vB 214TH2— 1007Hz 1,4um— 3,0 um 0.88-0,414 NC 100 THz ~300GHz 3.0pm—1,0mm 0,414 -1,24x10-3 radiofrequencia 300GHz — 10kHz 1mm —30km muito pequena Imicro-onea 300GHz—300MHz 4 mm—1m: frequéncia extrema- 3002-0 10 m-—+ 0 extremamente mente baina pequena 0: M (mega) = 10°: 6 (Giga) = Thera) = 10%; ? (pet A identificacdo das radiagSes por faixa de frequéncia como sendo onda eletromagnética foi feita por diferentes cientistas a partir de 1861, conforme relecionado no Quadro 1.1. Max von Laue realizou experimentos de difragio de raios X com cristais de sulfato de cobre que serviram de rede de diftagio. As figuras obtidas mostraram pontos de interferéncia, que o levaram a estabelecer a natureza eletromagnética dos ra:os X. 0 titulo do discurso de Prémio Nobel proferido por von Laue durante a premiacdo em 1914 foi: Concerning the detection of X ray interferences. Em 1913, E, Rutherford e E. Andrade estabeleceram a Quadro 1.1 RADIAGAO, AUTCR € ANO DE IDENTIFICACAC Radiagao Autor Ano luz visivet ames Clerk Mawel 1861 Radiacao infravermelna Friedrich Wilhelm Herschel 1880 Radiacdo ultravioleta’ Johann Wilhelm Ritter 1881 Raios X Max Theodor Felix von Laue 1912 Raios game Emest Rutherford e Edward Andrade 1913. 1 Radixao 3 4 natureza eletromegnética dos raios gama, com experimentos de difracdo. No perfodo 1886- 1892, Heinrich Redolf Hertz e Guglielmo Marconi realizaram experimentos com ondas eletromagnéticas ne faixa de micro-ondas. Entretanto, a palavra micro-onda s6 foi usada pela primeira ver em 1932, por Nello Carrara, em um artigo cientifico. 1.2.1 Absorcio da radiagao eletromagnética © conceito intuitive e muito comum de que, em um dado meio, quanto maior a energia a radiagio eletromagnética, maior 2 penetraco, é errado, Em primeizo lugar, temos que considerar 0 meio, Costumamos dizer que um dado material é transparente quando ele transmite luz visivel, isto é, ndo a absorve, como é 0 caso do vidro, por exerplo. O vidro & também bastante transparente as ondas de rédio, mas razoavelmente opaco as radiagdes UV eIV. Um centimetre de vidro comum bloqueia cerca de 50% da radiacio UV de 316nm. ‘As micro-ondas penetram facilmente os vidros, mas sao fortemente absorvidas pela 4gua. A radiacio IV é fertemente absorvica tanto pelo vidro quanto pela agua. Como se pode cbservar, a penetracdo ou transmissio de um dado material ndo é fungéio monotonicamente crescente ou decrescente com a frequéncia da onda eletromagnética. Quando a absorcio & grande, é porque a probabilidade de interaco é grande e,em razdo disso, a transmissio & pequena. A transmissio de uma onda eletromagnética em um meio obedece, em termos gerais, a uma lei exponencial. Por esse motivo, define-se « profundidade de penetracio de ume onda cletrorragnética em um dado meio como a disidincia percorrida por ela até que sua intensidade seja reduzida a 1/e (cerca de 36,8%) do valor de entrada, ou a distancia até a qual 63,2% da energia radiante é absorvida pelo meio. Nosso corpo absorve radiagio eletromagnética de todo espectro diferentemente em forma e grau. As células do corpo respondem de forma diferente a radiacdo eletromagnética de uma determinada faixa do especto. Os campos elétricos das ondas eletromagnéticas com frequéncia de 60 Hz, emitidos pelos condutores de energia elétrica, por quase nao penetrarem ¢ corpo humano, agem na superfi- Cie, diferentemente dos campos magnéticos de mesma frequéncia, que penetrem facilmente sem, no entanto, softer atentiacio significativa, visto que a permeabilidade magnética do meio biolégico, inclusive do corpo humano, é quase idéntica & do ar. Ambos 0s campos induzem movimento de cargas elétricas, podendo criar distribuicdes nao homogéneas de carga no meio. A profundidade de penetraco em tecido com alto contetido de gua, como o muscular, das ondas curtas com frequéncia de 27,12MHz, utilizadas em fisioterapia, é de 14,3cm; das ondas ao redor de 900 MHz, de telefonia celular, € de 3,0cm, e das micro-ondas de 2.450 MHz usadas em fornos é de 1,7. cm, como mostra a Fig. 1.2. Em tecidos com baixo contetido de gua, como 0 0880, esses valores sao, respectivamente, 159m, 17,7cm e 11,2cm. Como se pode perceber, a ransparéncia de tecido ne faixa de radiofrequéncia diminui com o aumento da frequancia da onda eletromagnética. Na faixa entre 100 kHz e 1GHz, a interac da radiagdo com ¢ tecido produz aquecimento por meio de processos microscépicos de movimento de mo.éculas, como rotago e torgéo em meio viscoso. Fisica vas RADIAGOES Profundidade de penetracio (m) 1 10 100 1.000 10.000 Frequéncia (MHz) - Tecido com baixe contedde de agua Tecido com alto contetido de agua Fig. 1.2 Frofundidade de penetracdo da radiacdo eletromagnética em tecido com alto e beixo conteido de agus em funcSo ds frequéncia ds onda de 1 a 10* MHz Continuando a aumentar ¢ frequéncia da onda eletromagnética, passamos para a faixa da radiaco infravermelha (IV) € luz visivel. A radiagao IN, que também causa aquecimento por meio do aumento de atividade rotacional de moléculas, é mais fortemente absorvida do que as micro-cndas pelo corpo. A maxima penetracdo na pele pode chegar a Smm. para IVA e diminui na regio do IVB e IVC. Para luz visivel na regiao do vermelho de 7001nm, também a profundidade de penetracdo pode atingir ao redor de 3mm. A Fig. 1.3, mostra o grafico de profundidade de penetragdo em funcdo do comprimento de onda da huz visivel ¢ infravermelha, Pela figura, vemos que a penetracdo da radiagio depende, de forna complicada, do comprimento de onda. Comprimento de onda {nm) 1.000 2.000 3.000 4.000 5.000 6.000 7.000 Eg 7 +") Camadacémea as ve piderme eS wo zs ae Derme ge ae Ba Se 4 js pee a Camada subeutanea Se = Fig. 1.3 Profundidad: de penetracdo da radiagdo infravermelhe ne tecido em fungéo do comprimento de once Fonte: amos for infrared cabins; adaptado do folheto da Philips Lighting 1. Radiacao. 15 ‘A seguir, em frequéncias mais altas, vem a radiagao UV. Sua penetracéo na pele é muito menor do que a éa RIV ou a da luz visivel, ¢ é tanto menor quanto maior for a energia do féton, como se pede ver na Fig. 1.4. No caso do olho, 2 radiagas UVC deposita toda a WA UNS UVC energia na cémes; jé para @ UVB de 30am, 92% da r 0 50% ase Is energia é depositada na cérnea, 6% no humor aquoso a0 2 2% no cristalino. A radiagao UVA de 340 nm deposita e 9.5% Late a A oe = | FE % 37% da energia na cémea, 14% no humor aquoso, 48% 3 no cristalino e 1% no humor vitreo. A radiacao UV \ 120 3 nao a‘inge a retina, motivo pelo qual nao a vemas. 160 5 Lembramos que os insetos de uma forma geral enxer- é gam aradiacdo UY. ¥ , 5 200 Passando pare raios X e gama, cujos ftons pos- S suem energia maior do que 12 eV, de novo a penetracio volta a aumentar, Fétons de raios X e gama podem 1% - atravessar 0 corpo e, em exames radiol6gicos, #0 Sukcuténeo J detectados por filmes de raios X. Fig. 1.4 Porcentagem de penetracgo da rediacéo ultravileta Neste livro néo trataremos de radiacdes eletromag- napale néticas nao ionizantes. 1.3 ATOMOS, MOLECULAS E [ONS Tudo que existe na natureza € feito de étomos que, com grande frequéncia, se unem para formar moléculas, A neutralidade elétrica que existe nos atomos é mantida na molécula, uma vez. que o ntimeroée cargas positivas (prétons) é 0 mesmo que o de cargas negativas (elétrons) de uma molécula, mesmo que algumas partes sejam localmente mais negativas ou positivas. Se uma ligagao cuimica que mantém uma molécula coesa for rompida, os fragmentos resultantes poder: ndo mais manter neutralidade elétrica, tendo um dos fragmentos ma‘s ou nienos elétrons que outro fragmento. Quando um atomo perde ou ganha um elétron, diz-se que ele se transformou em um fon, que é positive no primeiro caso e negativo, no segundo. Se uma molécula perde um elétron, uma ligagdo quimica entre os étomos de uma molécula pode ser rompida e, como consequéncia, haver a formacao de fons moleculares, denominados radicais. Tanto os fons atémicos como os moleculares sao entidades muito mais reativas do que dtomos ou moléculas neutros, 1.3.1 Radiagbes ionizantes Uma radiagao é considerade ionizante se for capaz de arrancar um elétron de um dtomo ou de uma moléculs, a0 qual ele est ligado por forga elétrica; caso contrario, é considerada nao ionizante, Quando um elétron é ejetado de um atomo, forma-se o par fon positive - fon negativo (elétron). 0 termo radiagao ionizente refere-se a particules capazes de produzir 16 Fisica bas RaDiacoes ionizacdo em um meio, sendo diretamente ionizantes as particulas carregadas, como elétrons, pésitrons, prétons, particulas a, ¢ indiretamente ionizantes as particulas sem carga, como fétons ¢ neutrons. Com esses tltimos, a ionizagdo em série é produzida pela particula carregada que se origina de sua interacdo com a matéria. Neste livro utilizaremos simplesmente o termo radiago para todas as radiacdes direta ou indiretamente ionizantes. Lembramos que a energia total de um eléton em um dtomo é regat va, significando que o elétron esté ligado ao 4tomo. A energia total do elétron no estado de menor energia, chamade estado fundamental, do étomo de hidrogé é de ~13,6eV. Para arrancer esse elétron, precisamos fornecer-Ihe energia de modo que, no limiar de libertagio da atrag arrancar esse elétron do dtomo de hidrogfnio, precisamos fomecer-Ihe no minimo +13,6eV, , Por exemnpl coulombiana do préton, sua energia fique igual a zero, Isso significa que, para que é chamada energia de ionizacdo. Se a energia fornecida for maior do que +13,6¢V, 0 elétron sai com ensrgia cinética. Pars elétrons das camadas mais internas, nos casos de atomos com mais de trés elétrons, costumamos usar 0 termo energia de ligaco, em vez de energia de ionizacio. Novamente seu valor é o mesmo que o valor da energia total do elétron naquele temo com sinal positive. Aenergia necessdria para arrancar um elétron da tiltima camada eletronica de um atomo, ow seja, da camada em geral mais afastada do micleo e, portento, mais fracamente ligado, varia de dtorno para étomo, sendo no maximo de 24,6eV para o caso do He, eno minimo de 3,9 eV para o Gs. Em geval, os elementos alcalinos, ott seja, Li, Na, K, Rb e Gs, so os mais facilmente ionizaveis, pois eles tém um tinico elétron na tiltima camada, fracamente ligado a0 nicleo: 08 outros elétrons fazem blindagem do campo elétrico atrativo do niicleo, ea forga que liga o tiltimo elétron ao tomo é equivalente a atracio coulombiana entre ele e um proton no mticleo. Os elernentos com cariada completa (como os gases nobres) so aqueles que necessitam de maior energie de ion'zagdo, como mostra a Fig. 15. Periode Periodo wpe ripe Perfodo Periodo Numero atomico Z Fig, 1.5 Energia de ionizacto de elétron de valencia versus nimero atOmico. 1. Ratiageo ” 18 Por outro lado, para arrarcar um elétron das cemadas mais internas, que também ocorre em interacdes com a radiacio ionizante, a energia necesséria é da ordem de keV, € 0 valor aumenta a medida que aumenta o ntimero atfimico. Como na camada eletrénica K s6 hd dois elétrons, eles sentem a ‘orca de atracdo clétrice devida a praticemente todos os prétons do aticleo. A Tab. 1.2 mostra alguns elementos quimicos com seu nimero atémico Z, energia de ligagdo Bg, de um elétron da camada K, Bi, de um elétron da camada L e energia de ionizagdo Wy para arrancar um elétron de valéncie (da tiltima camada). Pela Tab. 1.2, pode-se observar que Bx ¢ 8 aumentam & medida que 0 Z aumenta, o que nao é verdade para Wy. Tab. 1.2 ENERGIA DE LIGAGAG DE UM ELETRON (15) DA CAMADA K, DE UM ELETRON (25) DA, AMADA L E DE IONIZAGAO DE UM ELETRON DA CAMADA DE VALENCIA DE ALGUNS ELEMENTOS QUIMICOS Elemento Numero Energia de Energia de Energia de quimico atémicoZ —_—ligago Bx (keV) —_ligacao Bi (keV) —_ionizacéo Wy (eV) c 6 0,29 0,016 3 Al 13 1,56 0,12 60 cu 29 8,99 1,10 aw Mo 42 20,0 2,87 am Rh 45 23,2 3,42 74 Ag 47 255 381 76 w 4 69,5 121 79 Po 82 88,0 158 74 A energia necesséria para formar fons de moléculas pequenas é da mesma ordem de grandeza que a energia de ionizacio dos étomos constituintes. For exemplo, as energias de jon:zagao das moléculas Nz, 02 & CO? so 15,6eV, 12,1eV e 13,8eV, eas de 4tomos de N, Oe C sao 14,5 eV, 13,6 eV e 11,3eV, respectivamente. 1.3.2 A radiagao ultravioleta no contexto da radiobiologia H4 muita polémica quanto & radiacdo UV ser ionizante ou nao. Pela seco anterior, percebe-se {que isso estd intimamente relacionado aos étomos do meio. A radiagtio UV, cuja faixa de comprimento de onda vai de 100 nm a 400nm e esté no limite entre a radiagdo ionizante © ando ionizante, é considerada no ionizante usualmente no contexto da radiobiologia (Attix, 1986), por ter uma capacidade de penetregio na pele menor que a da luz visivel. Além disso, os fétons da radiagdo ultravioleta provenientes do Sole que atingem a Terra (UVA e UVB), aos quais os seres vivos estdo mais expostos, tém energia no intervalo de 4A2a3,10eV, A Tab, 1.3 lista os quatro principais elementos em percentual de peso do corpo humano ¢ suas respectivas energias de ionizacao. Nenhum desses elementos pode entéo ser ionizado porum féton da radiaco UVA ou UVB, e praticamente nem mesmo por um féten UVC, cuja energia maxima é de 12,42ev, Fisica DAS RADIACOES A International Commission on Radiation Units Tab. 1.3 OS QUATRO PRINCIPAIS ELEMENTOS QUIMICOS ‘and Measurements (ICRU), em sua publicago 60(1998), CONSTITUINTES DO CORPO HUMANO sugere que a escolha do limiar de energia abaixo do Elemento % de peso do Energia de qual a radiaco nao é mais ionizante deperde da quimico corpo humana —_ionizacéo (eV) aplicagéo, e que, em radiobiologia, o valor de 10eV 4 105 13,6 pode ser apropriado, Para a zadiacdo eletromagnética, ° 67,7 13,6 © limite entre radiacdo ionizante e no ionizante é = i Na N Ba 145 considerado 12,42 eV, energia maxima dos fotons de radiagao UVC. 1.3.3 Energia média para formar um par de ions Accnergia média W necesséria para formar um par de fons num gés por uma partinula carregada ‘com energia cinética inicial K 6 dada por: wes 1.2) i 4.2) onde WV é 0 ntimero médio de pares de fons formados no gés, quando a energia cinética K Ga particula for totalmente dissipada no gés. 0 processo de formacio de pares de fons é estatistico, 0 que leva a necessidade de obter valores médios para NV e W, levando em conta um grande numero de particulas carregadas i ticas interagindo no mesmo meio. O valor de W depende da composicio do gis, do tipo de particula e de sua energia, € tem sido determinada experimental ¢ teoricamente ao longo desses anos. Uma particula carregada em um meio interage causando ionizagio, excitagao e subexcitagdo que aquece o gfs ‘instantaneamente, gastando para isso, respectivamente, cerca de 3/5, 1/5 ¢ 1/5 de toda a sua energia, no caso de gases nobres (He, Ne, Ar). Esses valores sio ligeiramente diferentes para gases moleculares (Hz, Nz, 02, COz), para os quais a energia gasta com ionizaco é pouco mais de 2/5 de K. Dessa forma, como na energie média W gasta para formar um par de fons estd inclufda a parte usada na excitacdo e aquetimento, W é sempre bem maior do que Wy. Em um dos primeiros trabalhos importantes de Louis Harold Gray, publicadc em 1929, ele descreve o principio da equivaléncia entre raios beta e raios gama quanto & deposicao de energia, ¢ introduz o simbolo W para a energia média requerida para produzir um par de fons. O valor de W para fétons e néutrons corresponde ao de particula secundaria carregada produzida pela interagao deles com o meio em questo. Ainda hoje hi pesquisadores trabalhando na determinacdo de W em gases equivalentes a tecidos, isto 6, com composicdo atémica similar ao tecido humano em termes de nimero atmico, principalmente para protons e néutrons © valor de W hoje aceito para qualquer feixe de fotons e elétrons no ar seco, para a regio em que independe da energia, isto 6, pera energia do elétron acima de 10keV, é de (33,97 +0,05) eV, tendo sido reavaliado em 1987 por M. Boutillon e A. M. Peroche-Roux. Para protons no ar seco com energia maior do que 100keY, é recomendado pela TRS-398 (2000) 0 valor de (34,23 + 0,4%) eV, e para particulas pesadas, (34,504 1,5%) eV. 4 Radiaeso 20 1.4 A ESTRUTURA ATOMICA O primeiro conceito de atomo surgi com 28 antigos gregos Leucipo de Mileto e seu discipulo Demécrito de Abdera, ao redor do ano 450 a.C. Ele foi concebido a partir do fato de que, se uma dada subst&ncia fosse dividida ind=finidamente, chegar-se-ia & matéria elementar, & qual derain o nome de atomon, constituinte de toda matéria, que significa indivistval. Eles sugeriram que diferentes substincias eam compostas por diferentes étomos ou combinacGes de dtomos e que uma su2stancia poderia ser convertida em outra por meio de rearranjo de dtomos. Hoje, sabe-se que o étomo é constituido de um niicleo contendo protons € néutrons, e de elétrons fora cele. Os prétcns e os néutrons, por sua vez, sio formados per trés quarks. A primeira particula subatémica foi introduzida teoricamente em 1874, derrubandoa teoria da indivisibilidade do étomo, Em 1891, George Johnstone Stoney batizou-a com o nome elétron. A palavra elétron significa certa quantidade de carga elétrica. Em 1897, Joseph John Thomson mediu experimentalmente a razdio carga do elétron pela massa (e/m)..A carga do elétron foi determinada em 1909 por Robert Andrew Millikan, por meio da experiéncia da gota de é'e0. Em 1920, Ernest Rutherford props o nome préton, que vern do grego proves (primeizo), para outra particula subatémica, constituinte do nticleo, com carga positiva © massa 1.840 vezes maior que a do elétron. Doze anos mais tarde, em 1932, 0 néutron 6 descoberto por James Chadwick, discfpulo de Rutherford. O néutron tem aproximadamente a mesma massa do proton ¢ também faz parte do nticleo. Em 1963, Murray Gell-Mann @ George Zweig propuseram, independentemente, a exist€ncia ie quarks. Até o presente momento, estes s&0 considerados indivisiveis e, portanto, designados particulas elementares, tal como 08 elétrons, ¢ como vieram sendo considerados 0s protons e os néutrons até a proposta da existéncia de quarks. 1.5 MODELOS ATOMICOS Entre 1893 e 1896, 0 fisico japonés Hantaro Nagaoka (1865-1950) havia estado em algumas universidades euzopéias, incluindo o Laboratério Cavendish, Ele foi professor de Fisica da Universidade de Téquio, de 1901 a 1925, e anunciou para a Sociedade de Matemética e Fisica em Téquio, em 1903, o modelo planetério ou o modelo saturnino de atomo. No ano seguinte, publicou seu modelo na revista britanica Philosophical Magazine. Ele se baseava na estabilidade dos enéis do planeta Saturnc, que orbitam ao redor de uum planeta com massa muito grande, O modelo de Nagaoka previa que: & amassa do nticleo atémico ere muito grande em analogia com a massa de Saturno; % oselétrons giravam ao redor do nticleo, ligadas por forgas eletrostaticas em analo- gia aos anéis que giravam ao redor do planeta, ligados por forcas gravitacionais. Um outro modelo de atomo proposta em 1904 foi o do “pudim de ameixas”, de J. Thomson, entdo diretor do Laboratério Cavendish. Ele consistia do pudim propriamence dito, carregado positivamente, e de ameixas embebidas no pudim, que faziam o papel de elétrons. Fisica DAS RADIAGOES Em 1909, Rutherford sugeriu 2 Johannes (Hans) Wilhelm Geiger e Emest Marsden, seus discipulos, a realizagao de um experimento para descobrir qual dos dois modelos representava melhor um tomo. © experimento consistiu em bomibardear uma fina folha de ouro com particulas a, emitidas pelos micleos do polénio, Os resultados obtides mostraram que a maior parte das particulas passava pelo étomo sem sofzer desvio de trajetéria, como esperado se o modelo de pudim de ameixas fosse correto; mas elgumas poucas sofriam grandes desvios. Na realidade, o experimento confirmou as duas previsdes do modelo proposto por Nagaoka: o étomo é constituido de um nticleo minisculo, onde se concentra quase toda a massa do étomo, carregaco positivamente e roleado pelos elétrons, que giram a0 seu redor. Os resultados de experimentos de Geiger e Marsden levaram Rutherford a concluir que um campo elétiico intenso era responsével pela tal deflexio, conforme o artigo de sua autoria, ‘The structure of atom, publicado em 1913 na Nature (v. 92, p. 423), Esse campo era devido & carga positiva do étomo, que estaria concentrada no seu miclec € que contrabalancaria a carga negativa dos elétrons ao redor do miicleo. Entretanto, esse modelo continha protlemas porque, se 0 elétron estd acelerado, uma vez que a direcio do vetor velocidade muda constentemente, pela teoria eletromagrética cléssica uma particula acelerada emite radiacdo eletromagnética continuamente. Com isso, 0 elétron iria perdendo energia e sua trajetéria, espiralando-se, acabando por cair no micleo, 0 que, de fato, ndo acontece, Além disso, ainda segundc a teoria classica, a frequéncia da radiagéo emitida nfo coincidia « daquela efetivamente medida, que era constituida de valores fixos e caracteristicos para cada étomo, ma 1.6 MODELO DE BOHR DO ATOMO DE HIDROGENIO Em 1911, Niels Henrick David Bohr, fis'co dinamarqués recém-doutor, foi passar seis meses em Cembridge, para trabalhar com J. . Thomson depois com £. Rutherford. A partir de entéo, Bohr iniciou a formulacdo de urr modelo de dtomo, una vez que o de Rutherford nao explicava algurs resultados. Bohr comecou pelo mais simples deles: o étomo de hidrogénio constitufdo de um préton ¢ de um elétron, fato este nao aceite unanimemente nequela ép0ca. Quando Bohr tomou conhecimento de um artigo escrito per Johann Jakob Balmer em 1885, tudo pare ele se tornou claro. No artigo, Balmer revelava a dedugdo de uma férmula (Eq. 1.3) para calcular os com- primentos de onda > das raias ou linhas espectrais emitidas pelo étomo de hidrcgénic, separadas por um prisma, Eseas raias estavam na faixa da luz visivel © eram de cores vermelha, azul-verde, azul-violeta ¢ violeta. A equacdo apresentade era empirice, sem nenhum significado fisico, ( ny ) ae ek ‘ x nh nt onde R é uma constante chamada constante de Rydberg = 1,087 x 10-?nm74; nj é um miimero inteizo, que vale 3, 4, 5 ¢ 6 para as referidas raias; e ny & igual a 2. Por exemplo, para + Racin 21 ni =e ny=2, obtém-se A = 657 nm para a raia vermelha, que confirmava o valor medido experimentalmente. Esse conjunto de raias foi depois denominado série de Balmer. Bohr iriciou postulando que o elétron sé pode girar em érbitas permitidas e que, normalmente, permanece na drbita de menor raio possivel, que ele chamou de estado fundamental, Quando 0 étomo de hidrogénio é adequadamente estimulado por algum agente, seu elétron & excitado, passando a girar em érbitas mais distantes do nticleo. 0 elétron fica cerca de 1078s nessas Grbitas antes de sa roe Rien passar para outra mais proxima do niicleo, como se \ f Koes pode ver na Fig. 1.6, Aqui Bohr introduz uma novidade, / / desexcitagac [67 dizendo que, nessa passagem, o elétron libera o ex- 9 | eeeso te evengia eatin wt Tt Por esse Gena, / a teoria do quantum de energia, de Planck-Einstein, j@ havia sido apresentada. Dessa forma, o espectro de linhas do atomo de hidrogénio péde ser explicado Fig. 1.6 llustracio da passage do eiétron para orbita mais como sendo devido a fotons emitidos na transi¢ao aistante do nucleo com absorcéo de energia ea desexcitagdo do elétron de érbitas circulares permitidas com raios ‘com emisséo de um féton maiores para outras com raios menores. 22 Com base na mec4nica classica de Isaac Newton € na lei de Charles Augustin de Coulomb, Bohr igualou a forga elétrica a forca centripeta, Fez uso também da teoria do foton, de Planck-Einstein. Com isso, deduziu férmulas para calcular a velocidade do elétron em diferentes érbitas, 0 raio das érbitas permitidas [Eq. (1.4)| ¢ @ energia total do elétron em cada Grbita permitida, que ele chamou de niveis de energia Ey [Eq. (1.5)]. Ao postular as 6rbitas pemmitidas, Bohr introduziu um numero inteiro associado a cada érbita, que € 0 nimero quantico principal, n. BE ame tm Th aa) ‘onde rn € 0 raio da érbita permitida com mimero quantico principal n; h a constante de Planck = 3,3 x 10~% J-s; m e e sao, respectivamente, a massa e a carga do elétron; e £5, a permissividade do vacuo = 8,85 x 10-1? C?.N-1.n~?, Substituindo-se esses valores, obtém-se que, para n= 1, rr = 0,053nm, que € 0 raio da menor orbita permitida. Exemplo 1.1 Calcule 0s raios das érbitas permitides, considerando o modelo de Bohr, para estados com ntimeso quantico principal igual a 2,5 e 10. Resolucao Bete Como ry = 0,053 x n?, obtemos facilmente (Tab. 1.4): n (am) 2 o2a2 5 1,35 10 5,30 Fisica DAS RADIAGOES Para a energia total do elétron, somando stia energia cinética e potencial, Bohr obteve: me* gegh2n? as) Ep & a energia total do elétron na orbita permitida com ntimero quantico principal n, também chamado nivel de energia dessa érbita. Substituindo-se as constantes na Eq. (1.5), obtém-se: 13,6 En(ev) =-— (16) 7 sinal “menos” indica que o elétron esté ligado, pela atracdo coulombiana ao préton. Para in = 1, E -13,6eV, que é 2 energia do elétron no estado fundamental. 0 elétron fica em vias de desligar-se da atracao coulombiana do préton quando sua energia tende a zero, Assim, quando o elétron esté no estado fundamental, é necessario estimulé-lo, fornecendo no minimo +13,6eV para liberé-lo da atragao do préton (que é a energia de ionizacao do atomo de hidrogénio). As energias dos estados excitados podem ser obtidas substituindo n na Eq. (1.6) por 2, 3, 4etc., como mostra a Fig. 1.7. Gomo jé foi dito, quando o elétron passa de uma érbita com nj= 3 para ny = 2, haverd liberacdo de um féton com energia hv igual A diferenca de energia entre esses nfveis: a g Hy s 435487 «657 2 nm oom nm 2 AG 124 Fig. 1.7 Transicdes do elétron de niveis de energia corn ntimero quSntico principal maior ou igual a 2 para o nivel final corn N1=2, com emissao de fotons na faixa da luz visivel, que cons tuemn a série de Balmer i h (7) que vem do fato de v (frequéncia da onda eletromagnética) ser igual 2 ¢/A, onde ca velocidad de propagacao da luz no vacuo = 3 x 10° m-s~1, Ao efetuar-se o célculo, obtém-se a 57 nm, que coincide com o valor obtide por Balmer. Note que a Eq. (1.7) é equivalente & (1.3) de Balmer, agora com significado fisico. A Fig, 1.7 mostra as transigdes do elétron que produzem a série de Balmer, ou sej, a desexcitagio do elétron quado passa de niveis de energia com n maiores que 3 para o nivel final, com Exemplo 1.2 2, emitindo fétons de luz visivel, Para nmero quantico n crescente, os niveis de energia vo se aproximando um do outro cada vez mais ¢ as frequéncias dos fétons emitidos obtidas para a série de Balmer ficam todas muito préximas, formando quase um continuum de linhas. a) Obtenhe o valor maximo de frequéncia do foton da série de Balmer, que corres- ponde ao limite desse continuum. ») Galcule 9 comprimento de onda do foton emitido quanco esse elétron efetua a transicao desse estado para ny = 41 Radiagas 23 Resolugéo 2) Consideremos o elétron do atomo de hidrogénio no estado com niimero quantico principal n= oo. Empregando a Eq. (1,7), obtemos que Ejiee (-3.4) frequéncia correspondente vale b) Como hy = he/A, sbtemos que 10-7 m=365nm. hv =E x — Ey =0- 3,4eV. Esse foton iré compor a raia espectral Huw da série de Balmer. A 2.4/h e/ Ejecon = (4,14 x 10-1 x 3 x 108)/3,4 321 PH, Posteriormente, outras séries de linhas espectrais do tomo de hidrogénio foram des- cobertas, mas todas fora da regio visivel do espectro eletromagnético. A Tab. 1.5 mostra Tab. 1.5 SERIES COM AS RAIAS ESPECTRAIS DO ATOMO DE HIDROGENIO Série Regio de espectro ni p lyman ultravoleta 32 1 Balmer visivel 23 z Paschen infravermelho 24 z Brackett infravermelho BS 4 Pfund infravermetho 26 5 of 2 ar 4 aati] Th] seriede Paschen ? . dy 5 4 Série de Balmer e £ “10 HI) Série de Lyman Fig. 1.8 Niveis de energia do dtomo de hidrogénio, com tran- sicbes permitidas do elétron que formar as séries de Lyman, Balmer e Paschen essas séries com satis nomes, os mimeros quanticos iniciais e Snais pera a emissdo das raias espectrais dessas séries. A Fig, 18 mostra o diagrama dos niveis de energia, em escala, do atomo de hidrogénio segundo Bohr, as tansigbes permitidas dos elétrons durante as quais hhaverd emisséo de fotons que compordo as séries de Lyman, Balmer e Paschen. Pelo fato de existirem drbitas permitidas e niveis de energia bem determinados, foi dito que os raios das drbitas as energias dos elétrons do étomo de hi- Grogénio eram quantizados, significands como tendo valores discretos, endo qualquer valor. Apesar de 0 modelo desenvolvido ter sido para 0 tomo de hidrogénio, conhecendo-se os valores dos niveis de energia d outros dtomos é possfvel calcular © comprimento de onda do féton emitido, e partir da diferenga de energia entre os varios niveis envolvidos na transicao do elétron. Bohr conjeturoa que, & medida que o mimero de protons no nticleo aumentava, o de elétrons orbitais também aumentava na mesma proporgao para manter a neutralidade atOmica, e sugeriu que atomos mais pesados, par terem mais prétons no nticleo, teriam maior forga para atrair os elétrons e, por isso, os raios dos atomos eram parecidos, sendo da ordem de 10-*9 mn, De fato, 0 raio do dtomo de hidrogénio com um tinico préton (elétron) é somente cerca de trés vezes menor que o do urénio-238, com 92 protons. Da mesma forma que 0 espectro de emissio, o de absorgao também é caracteristico de cada dtomo, A energia absorvida para o elétron passar de niveis de menor energia para os de maior energia é também quantizeda e coincide com o valor da energia do féton emitido, 0 que 6 explicado pelo modelo de Bohr. 24 Fisica DAS RADIACOES As primeiras indicacGes de que 0 modelo de Bohr do dtorno de hidrogénio apresentava felhas surgiram quando técnicas experimentais de espectroscopia melhozarem com o au- mento da resolugao dos equipamentos. Percebeu-se que algumas raias espectrais observadas anteriormente como sendo uma eram, na verdade, constituidas de duas ou -nais raias muito préximas ume da outra. A tha de 657mm, por exemplo, era compesta de sete raias. A teoria do dtomo de hidrogénio valida hoje foi desenvolvida aplicande-se com grande sucesso @ equactio da onda de Erwin Rudolf Josef Alexander Schrddinger, um dos pais da Mecanica Quantica. Nessa teoria, calcula-se a probabilidade de encontrar o elétron em um determinado lugar e, entre outros, o muimero quantica principal n eperece naturalmente na resolugao do problema, O grande sucesso do modelo de Bohr provém do fato de que as Grbitas permitidas, obtidas com esse modelo, esto de acordc com a teoria quantica, sendo exatamente aquelas de maior probabilidade de o elétron ser encontrado. Além disso, todo o resul:ado é obtido com equacées faceis e dlgebra elementar, snquanto que as da Mecinica Quantica s40 muito complexas. Na resolugao das equactes de onda da Mecdnica Quéatica aplicadas a0 étomo de hidregénio, outros niimeros quanticos emergem naturalmente. A Tab. 1.6 mostra esses mimeros quanticos com suas caracteristicas. Como consequéncia, os niveis de energia petnitidos desdobram-se, formando subcamadas ou orbitais. Os estados com o mesmo nimero quntico principal formam uma camada. As érbitas com n= 1,2, 3,4, 5 etc, foram chamades de camadas K, L, M, Oete,, por razbes historicas. Para cada valor de n, og estados com cada valor de { (ntimero quantico orbital) formam uma subcamada. Assim, cada subcamads é identificada pelo seu mimero quantico principal n acompanhado da letra que corresponde ao seu niimero quantico orbital As letras s, p, d, gh ete. sio usadas para designar as subcamadas com |= 0, 1,2, 3, 4, 5 etc. -espectivamente Essa nomenclatura era usada pelos primeiros pesquisadores de espectrescopia dptica. 0 estado designado por 1s tem on = 1el=0,€ 0 estado 3p,n = 3 e/= 1. Os elétrons que ocupam ceda subcamada tém niimeros quanticos de momento magnético orbital (rm) e/ou de momento magnético de spin (m.) distintos. Esses alimeros quanticos podem ser usados para descrever tados os estados eletrdnicos de um étomo, independentemente da quantidade de elétrons, considerando que dois elétrons de um dado étomo nao podem estar no mesmo estado quantico, ou seja, nao podem tero mesmo conjunto de niimeros quanticos. Algumas vezes, os mimeros quanticos me Tab. 16 NUMEROS QUANTICOS DO ATOMD DE HIDROGENIO Namero de Némero quantico Nome: ntimero quantico —_Valores permitidos estados permitidos n principal 1,2,3,4,5, 6etc qualquer némero L orbital 01,2.3....9-1 n s de spin +1/2 1 m magnético orbital HLH 10.111 244 ms magnética de spin -1/2, 44/2 2 1 Radiacgo 25

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