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PRE-SOCRATICOS Os primeiros f lésofos gregos Je acordo com a tradigao hist6ri- fase inaugural da filosofia grega conhecida como periodo pré- socratico. Esse perfodo abrange 0 con- nto das reflexées filos6ficas desen- das desde Tales de Mileto (623- =46 a.C.) até o aparecimento de Sécrates (468-399 a.C.) Tales. © Os PENSADORES DE MiLETO: . (A BUSCA DE UM PRINCIPIO PARA TODAS AS COISAS ° Mundo grego por volta do sée. VIa.C. Quando afirmamos que a filosofia | umas das outras, e muitas vezes rivais. nasceu na Grécia, devemos tornar essa afir- No vasto mundo grego, a filoso- magao mais precisa. Afinal, nunca hou- _ fia teve como ber¢go a cidade de ve, na Antigiiidade, um Estado grego uni- - Mileto, situada na Jénia, litoral oci- ficado. O que chamamos de Grecia nada dental da Asia Menor. Caracterizada mais é que o conjunto de muitas cidades- por miltiplas influéncias cultur. Estado gregas (pélis), independentes — por um rico comércio, a cidadegay ey Mileto abrigou os trés primeiros pen- sadores da historia ocidental a quem atribuimos a denominacao filésofos. Sao eles: Tales, Anaximandro e Ana- ximenes. Destaca-se, entre os objetivos des- ses primeiros filésofos, a construgao de uma cosmologia (explicacao racional e sisteméatica das caracteristicas do uni- verso) que substituisse a antiga cos- mogonia (explicagao sobre a origem do universo baseada nos mitos). Esses primeiros filésofos queriam des- cobrir, com base na raz4o e nao na mitolo- gia,o princfpio substancial (a arché,em gre- go) existente em todos os seres materiais. Isto é, pretendiam encontrar a “matéria-pri- ma’ de que sao feitas todas as coisas. 1, Tales ae Mtiero Tales (623-546 a.C., aproximadamen- te) costuma ser considerado o primeiro pensador grego, “o pai da filosofia”. Na condicao de fildsofo, buscou a construcao do pensamento racional em diversos cam- pos do conhecimento que, hoje, nao sao considerados especialidades filoséficas. Foi astrénomo e chegou a prever 0 eclip- se total do Sol ocorrido a 28 de maio de 585 a.C. Na érea da geometria demons- trou, por exemplo, que todos os angulos inscritos no meio circulo sao retos e que em todo tridngulo a soma de seus angu- los internos é igual a 180°. Procurando fugir das antigas expli- Anaximandro de Mileto + fado 6 agua. Tales cacées mitolégicas sobre a criagao do mundo, Tales queria descobrir um ele- mento fisico que fosse constante em to- das as coisas. Algo que fosse o princi- pio unificador de todos os seres. Inspirando-se provavelmente em concep¢oes egipcias, acrescidas de suas proprias observagdes da vida animal e vegetal, concluiu que a agua é a subs- tancia primordial, a origem tinica de to- das as coisas. Para ele, somente a Agua permanece basicamente a mesma, em todas as transformagoes dos corpos, ape- sar de assumir diferentes estados — s6- lido, liquido e gasoso. . lem Agua nem algum dos elementos, mas , /Slguma substancia diferente, ilimitada, e dela nascem os céus e os mundos neles contidos. Anaximandro_ Anaximandro. Anaximandro (610-547 a.C.) procu- ->u aprofundar as concepgées de Tales sobre a origem tinica de todas as coisas. meio tantos elementos observaveis mundo natural — a gua, 0 fogo, o ar —, ele acreditava nao ser possivel uma tinica substancia material o principio primordial de todos os es, a arché. . “E assim como nossa alma, que € ar, nos mantém unidos, da mesma maneira © vento envolve todo o mundo, Anaximenes Anaximenes. Anaximenes (588-524 a.C.) admitia a origem de todas as coisas é inada. Entretanto, recusava-se air-lhe o carter oculto de elemen- ido fora dos limites da observa-. e da experiéncia sensivel. Tentando uma possivel concilia- entre as concepgées de Tales e as Para Anaximandro, esse principio é algo que transcende os limites do observavel, ou seja, nao se situa numa realidade ao alcance dos sentidos. Por isso, denominou-o dpeiron, termo grego que significa “o indeterminado”, “o in- finito”. O apeiron seria a “massa gerado- ra” dos seres, contendo em si todos os elementos contrarios. Anaximenes de Mileto de Anaximandro, concluiu ser 0 ar o principio de todas as coisas. Isso por- que o ar representa um elemento “in- visivel e imponderavel, quase inobser- vavel e, no entanto, observavel: 0 ar é a propria vida, a forca vital, a divinda- de que “anima” 0 mundo, aquilo que da testemunho a respiracao”’. ‘BERNHARDT, Jean. O pensamento pré-socratico: de Toles aos sofisas. In: CHATELET, op. cit, v. 1, p. 28. © PiTAGorAs DE SAMOS: © CULTO DA MATEMATICA ® FTodas as coisas sao nuimeros. ' Pitagoras (570-490 a.C., aproxima- damente) nasceu na ilha de Samos, na costa jénica, nao distante de Mileto. Por Volta de 530 a.C., sofreu perseguicao po- litica por causa de suas idéias, sendo obrigado a deixar sua terra de origem, Instalou-se, entao, em Crotona, sul da Ita- lia, regiao conhecida como Magna Grécia. Em Crotona, fundou uma poderosa sociedade de carater filos6fico e religio- so e de acentuada ligagdo com as ques- tes politicas. Depois de exercer, por lon- g0s anos, considerdvel influéncia politi- ca na regiao, a sociedade pitagérica foi dispersada por opositores, e 0 proprio Pitdgoras foi expulso de Crotona. Para Pitagoras, a esséncia de todas as coisas reside nos ntimeros, os quais representam a ordem e a harmonia. Se- gundo o historiador de filosofia norte- americano Thomas Giles, “pela primei- Pitdgoras Pitégoras ra vez se introduzia um aspecto mais for- mal na explicacao da realidade, isto é, a ordem ea constancia”. Assim, a esséncia dos seres, a arché, teria uma estrutura ma- tematica da qual derivariam problemas como: finito e infinito, par e impar, uni- dade e multiplicidade, reta e curva, cir- culo e quadrado ete. Pitagoras dizia que no “fundo de todas as coisas” a diferenca entre os se- res consiste, essencialmente, em uma questao de ntimeros (limite e ordem das coisas). As contribuigdes da escola pita- g6rica podem ser encontradas nos cam- pos da matematica (lembre-se do célebre teorema de Pitégoras), da mtisica e da as- tronomia. A essas contribuigées junta-se uma série de crencas misticas relativas A imortalidade da alma, & reencarnagao dos pecadores, a prescrigaio de rigidas condutas morais etc. © HerAcuo pe Ereso: © MOVIMENTO PERPETUO DO MUNDO © Judo flui, nada persiste, ./ ‘nem permanece o mesmo. © ser ndo é mais que o vit-a-ser. Heréclito Hericlito. Nascido em Efeso, cidade da regio jOnica, Herdclito é considerado um dos mais importantes filésofos pré- socraticos. A data de seu nascimento e a de sua morte nao sao conhecidas. Ha referéncias hist6ricas de que, por volta do ano 500 a.C., estava em plena “flor da idade” Herdclito 6 considerado o primeiro grande representante do pensamento dialético. Concebia a realidade do mun- do como algo dinaémico, em permanente transformacao. Dai sua escola filos6fica ser chamada de mobilista (de movimen- to). Para ele, a vida era um fluxo cons- tante, impulsionado pela luta de forcas contrarias: a ordem ea desordem, o bem eo mal, o belo e 0 feio, a construgdo e a destruicao, a justica e a injustiga, 0 racio- nal e o irracional, a alegria e a tristeza etc. Assim, afirmava que “a luta (guer- ra) € a mae, rainha e principio de todas as coisas”. E pela luta das forcas opostas que o mundo se modifica e evolui. Atribuem-se a Herdaclito frases marcantes, de sentido simbélico, utiliza- das para ilustrar sua concep¢ao sobre 0 fluxo e a movimentagao das coisas, 0 constante vir-a-ser, a eterna mudanga, também chamada devir: ‘Nao podemos entrar duas vezes no mesmo rio, pois suas aguas se renovam a ./ cada instante. Nao tocamos duas vezes o mesmo ser, pois este modifica con- tinuamente sua condi¢ao. Assim, Herdclito imaginava a reali- dade dinamica do mundo sob a forma de fogo, com chamas vivas e eternas, gover- nando o constante movimento dos seres, © Os PENSADORES ELEATICOS: © INICIO DOs EsTuDOs SOBRE © SER E O CONHECER © As diversas cosmologias que acaba- mos de estudar despertaram, na €poca, uma nova questo. Por que tanta divergén- cia? Por que tantas opinides contrarias? Heraclito de Efeso, como vimos, ee, acreditava que a luta dos contrarios for- mava a unidade do mundo. JA para os Ppensadores da cidade de Eléia, a partir de seu principal expoente, Parménides, Os contrarios jamais poderiam coexis- tir. Os dois pensadores representam, Portanto, pdlos extremos do pensa- mento filoséfico. Foia partir dessa discussao sobre os contrarios, sobre o ser e 0 nao-ser, que se iniciaram a légica (os estudos sobre 0 co- nhecer) e a ontologia (os estudos sobre © ser) e suas relagdes reciprocas, confor- me veremos a seguir, Parménides de Eléia ' p ente é; pois é ser e nada nao é, n Nascido em Eléia, na Magna Grécia, litoral oeste da peninsula Itdlica, Parménides (510-470 a.C., aproximada- mente) tornou-se célebre por ter feito oposicao a Herdclito. Platao o chamava de Grande Parménides. Parménides defendia a existéncia de dois caminhos para a compreensao da realidade. O primeiro é oda filosofia, da razao, da esséncia. O segundo é 0 da crendice, da opiniao pessoal, da aparén- cia enganosa, que ele considerava a “via de Heraclito”. Segundo Parménides, 0 caminho da esséncia nos leva a concluir que na tealidade: a) existe 0 ser, endo é concebivel sua naio- existéncia; b) oser é; 0 ndo-ser nao é. Em vista disso, Parménides é consi- derado o primeiro filésofo a formular os Principios légicos de identidade e de Parménides nao-contradigao, desenvolvidos depois por Aristételes, Ao refletir sobre o ser, pela via da esséncia, 0 fildsofo eleatico concluiu que 0 ser é eterno, tinico, imével e ilimitado. Essa seria a via da verdade pura, a viaa ser buscada pela ciéncia e Pela filosofia. Por outro lado, quando a realidade é pen- sada pelo caminho da aparéncia, tudo se confunde em fungao do movimento, da pluralidade e do devir (vir-a-ser). Assim, na concepgio de Parmé- nides, Herdclito teria percorrido 0 cami- nho das aparéncias ilusérias, Essa via Precisava ser evitada para nao termos de concluir que “o ser e o nao-ser sao e nao so a mesma coisa”. Parménides teria descoberto, assim, os atributos do ser Puro: o ser ideal do plano légico. E ne- gou-se a reconhecer como verdadeiros os testemunhos ilus6rios dos sentidos e a constatar a existéncia do ser-no-mundo: oser que se exprime de diversos modos, ‘os seres mtiltiplos e mutaveis. Mas 0 filésofo sabia que é no mundo da ilusao, das aparéncias e das sensagdes que os homens vivem seu cotidiano. Entio, “o mundo da ilusao nao é uma ilusdo de mundo”, mas uma manifestaco da reali- dade que cabe a razao interpretar, explicar ‘e compreender, até que alcance a esséncia dessa realidade. Nao podemos confiar nas @paréncias, nas incoeréncias, na visio en- ganadora. Pela razao, devemos buscar aes- séncia, a coeréncia e a verdade. “O esforco de toda sabedoria é, pois, para Parménides, sistematizar isso, tornar pensavelo caos, in- troduzir uma ordem nele.”* Os homens vivem seu cotidiano no mundo da ilusao, das aparéncias e das sensagoes. ZenGo de Eléia j ( $P que se move sempre est no mesmo agora. wa Discipulo de Parménides, Zenao de Eléia (488-430 a.C.) elaborou argumen- tos para defender a doutrina de seu mes- tre. Com eles pretendia demonstrar que a prépria nogao de movimento era inviavel e contraditéria. Desses argumentos, talvez 0 mais célebre seja 0 paradoxo de Zenao, que se refere 4 corrida de Aquiles com uma tartaruga. Dizia Zenao: a) Se, na corrida, a tartaruga saisse a fren- te de Aquiles, para alcangé-la ele pre- cisaria percorrer uma distancia supe- rior a metade da distancia inicial que os separava no comeco da competicao. b) Entretanto, comoa tartaruga continua- Zenao ria se locomovendo, essa distancia, por menor que fosse, teria se amplia- do. Aquiles deveria percorrer, entao, mais da metade dessa nova distancia. c) A tartaruga, contudo, continuaria se movendo, ea tarefa de Aquiles se re- petiria ao infinito, pois o espaco pode ser dividido em infinitos pontos. Na observacao que fazemos do mun- do, através dos nossos sentidos, é evidente que os argumentos de Zenao nao correspondem a realidade. Entretanto, esses argumentos demonstram as dificul- dades por que passou 0 pensamento ra- cional para compreender conceitos como movimento, espaco, tempo e infinito. 3. JERPHAGNON, Lucien, Historia dos grandes filosofias, p. 15. KAREN BEARD/TONY STONE IMAGES © Empépoctes pe AGRIGENTO: A UNIDADE DE TUDO AQUILO QUE SE AMA © U que pensam, sentem prazer e dor. Nascido em Agrigento (ou Acragas), sul da Sicilia, Empédocles (490-430 a.C., aproximadamente) esforcou-se por con- ciliar as concepgdes de Parménides e Heraclito. Aceitava de Parménides a racionalidade que afirma a existéncia e Ppermanéncia do ser (“o ser é”), mas pro- curava encontrar uma maneira de tornar tacional os dados captados por nossos sentidos. Defendia a existéncia de quatro ele- mentos primordiais, que constituem as raizes de todas as coisas percebidas: 0 fogo, a terra, a Agua e o ar. Esses elemen- * Demécrito , ‘Pois destes (os elementos) todos se constitu ram harmonizados, e por estes é Empédocles tos sto movidos e misturados de diferen- tes maneiras em funcao de dois prinei- Pios universais opostos: * amor (philia, em grego) — responsavel pela forca de atracdo e unido e pelo movimento de crescente harmonizacgao das coisas; * Odio (neikos, em grego) — responsavel pela fora de repulsao e desagregacéo e pelo movimento de decadéncia, dis- solugao e separacao das coisas. Para ele, todas as coisas existentes na realidade estado submetidas as forgas ciclicas desses dois princfpios. De ABDERA: © ATOMO COMO EXPLICACAO DA DIVERSIDADE © ' $ homem, um microcosmo. / t Demécrito Demécrito, Nascido em Abdera, cidade situada ‘mo litoral entre a Macedénia e a Trdcia, Demécrito (460-370 a.C,, aproximadamen- ®) foi discipulo de Leucipo' e um pensa- dor brilhante. “S6 a tradicao impée o titu- to de pré-socratico a este pensador impor- fante, nascido e morto depois de Sécrates.”* Responsavel pelo desenvolvimento do atomismo, Demécrito afirmava que todas as coisas que formam a realidade sao constitu- das por particulas invisiveis e indivisiveis. Essas particulas foram chamadas de atomos, fermo grego que significa “nao-divisivel” (a =negacao; toro = divisivel). Para ele, o dtomo seria 0 equivalen- te ao conceito de ser em Parménides. Além dos dtomos, existiria no mundo real o vacuo, que representaria a ausén- cia de ser (0 nao-ser). Devido a existén- cia do vacuo, o movimento do ser torna- se possivel. O movimento dos 4tomos. permite infinita diversidade de compo- sigdes. Demécrito distinguia trés fatores basicos para explicar as diferentes com- Posigdes dos Atomos: * figura — a forma geométrica de cada atomo. Exemplo: forma de A # forma de B. * ordem —a seqiiéncia espacial dos Ato- mos de mesma figura. Exemplo: AB BA. * posigao — a localizacao espacial dos atomos. Exemplo: B# 3. Para Demécrito, é 0 acaso ou a ne- cessidade que promove a aglomera- cao de certos dtomos e a repulsao de outros. O acaso é o encadeamento imprevisivel de causas. A necessida- de é 0 encadeamento previsivel e determinado entre causas. As infi- nitas possibilidades de aglomeracao dos dtomos explicam a infinita va- riedade de coisas existentes. A principal contribuicao trazida pelo atomismo de Demécrito a histé- ria do pensamento é a concepgao me- canicista, segundo a qual “tudo o que existe no universo nasce do acaso ou da necessidade”. Isto 6, “nada nasce do nada, nada retorna ao nada”. Tudo tem uma causa. E os atomos sdo a causa tlti- ma do mundo.

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