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CONSTELACOES FAMILIARES EM CASOS DE PSICOSE Gunthard Weber ¢ Diana Drexler 1. Sobre a teoria ¢ a técnica do trabalho sistémico com constelagdes O trabalho com constelagGes familiares 6 um procedimento psicoteripéutico relativamente recente e controvertido, Ainda menos numerosas so até agora as exparincias realizadas através dessa abordagem com pessoas que exibem comportamento psicético. Tais experiéncias, contudo, sto animadoras a ponto de justificar nosso relato a seu respeito. Dispensamos-nos aqui de apresentar os principios que fundamentam esse trabalbo, (“ordens do amor", consciéncia pessoal e consciéncia do grupo familiar, otc). Apresentamos apenas uma breve introdugéo, dedicando maior atengio aos aspectos que nesse trabalho com pacientes com diagndsticos de psicose nos aparecem como especialmente importantes. 1.1 O desenvolvimento do trabalho com constelagdes familiares A técnica des constelagies familiares foi desenvolvida em seus elementos basicos por Bert Hollinger, sobretudo nos anos 80 *. Desenvolveu-se e expandiu-se rapidamente no espago cultural de lingua elem e, nos iltimos anos, tambéen em escala internacional. Tem suas raizes na abordagem da terapia familiar através de varias geragées °. Abordagens da terapia familiar orientadas pera 0 crescimento jéutlizavam hi mais tempo representagdes espacias para entender constelages de relacionamentos ¢ para estimular modificagbes.’ Depois que Bert Hellinger entrow'em contato com representantes da terapia familiar, nos Estados Unidos, e com o trabalho de escultura familiar, na Alemanha, ele comegou a condensar insights sobre a dinémica femili sobretudo os que tinham caréter estrutural ¢ envolviam virias geragbes -, com procedimentos da anilise transacional ’, numa terepia breve de grupo, sob a condugéo de um diretor. Essa terapia le denominou “Famitien-Stellen” (método de “colocat” ou do “constelar” funiliss), Esse trabalho era complementado, nas assim chamadas “rodadas”, por intervengSes hipnoterapéuticas ow outras, de que se valia Hellinger, através do humor, da confrontagiio ou da narragdo de histérias para quebrar padrdes rotineiros de pensamento e ostimular novas altemativas de ago. Infelizmente, essa técnica de rodadas, onde os participantes relatavam, cada um por seu tumo, seus sentimentos e suas questées, teve de ser abandonada quando Bert Hellinger passou 2 trabalhar com grupos muito numezosos,° 1 Vera respeito Weber (1993) 2 ver Weber (1993); Hellinger (1994), (2001), Ulsamer (2001), Nelles (2002) * ver Boszormenyi-Nagy ¢ Spark (1972), Stierlin (1981) eno psicodrama de Moreno (Moreno 1959) * verSatir (1972), Scheflen (1972) , Dubl et al (1973), Papp (1976) 5 ver Berne (1972) ° Para conhecer o trabalho com rodadas, recomendamos a edigfo de video “Wie Liebe gelingt” (Como 0 amor dé certo), Carl-Auer-Systeme Verlag, Heidelberg, G.Weber e D.Drexler, Constelagdes Familiares e Psicoses 1.2 Comprensiio do sistema e dos sintomas ‘Numa constelagao so levados em conta todos os membros de um sistema familiar no imbito de ‘és geragdes, de maneira a incluir 0s vivos e os mortos. Todos os membros da familia tomam parte numa ordem basica’ & qual estio permanentemente vinculados, Essa ordem basica inelui, por exemplo, o direito de todos a pertencer ao sistema e a precedéncia dos que vém antes sobre os que vén depois, As familias onde os sintomas aparecem estdo frequentemente em “desordem” no que toca a essas leis Os sintomas que estejam condicionados por implicag6es sistémicas sistémicas manifestam a existéncia de um profundo amor resultante do vinculo, uma ligago inconsciente do individuo com seu grupo de origem, Isto faz: com que alguns repitam os destinos de outros e queiram, em lugar delos, assumir algo de pesado, expiar ou até mesmo mosrer. Tal necessidade de compensar se radica num pensamento magico de cariter infantil, j& que tal atitude ndo tem 0 poder de redimir essas pessoas nem de aliviar ou de anular seus destinos. Outra base para desenvolvimento de problemas é a perda de conexiio com as fontes dos lagos familiares. Isto acontece, por exemplo, quando membros da familia nao so respeitados ou so esquecidos, Além da implicagio sistémica, devem ser ainda considerados, na gerago de dificuldades psiquicas, 08 aspectos associados evolugio pessoal, por exemplo, a interrupgo do movimento precoce da crianga, dirigido geralmente para a mie. No presente trabalho focalizamos preferencialmente as dindmicas sistémicas, dando menos espago ao significado da histéria individual da vida e do processo da aprendizagem, 1.3 0 processo da constelagio Em nossos seminirios, que duram de dois dias e meio a quatro dias, trabalhamos com grupos de 12a 14 participantes e com um maximo de 10 observadores participantes. Na constelago familiar cada participante do grupo monta espacialmente sua imagem interna de um dos seus sistemas (0 de sua familia de origem ou da atual, ou ainda de suas relagdes do trabalho), com ajuda de representantes, escolhidos entre os integrantes do grupo. Esses representantes geralmente possuem pouquissimas informagées prévias sobre as circunstancias da vida e da historia das pessoas representadas, O terapeuta interroga os representantes sobre suas sensagdes ¢ sentimentos nos lugares que ocupam, As percepcdes dos representantes fornecem indicagdes importantes sobre as dindmicas familiares © as conoxdes sistémicas, pois é incrivel como refletem ‘exatamente, muitas vezes, as pessoas representadas, que nifo silo conhecidas pelos representantes, O dirigente do grupo tenta a seguir mudangas de posigio para os interessados, buscando, na medida do possivel, o ,molhor* lugar parw cada um do sistema. Quando se consegue isto, 0 terapeuta geralmente introduz.o proprio cliente em seu lugar (até entizo acupado por seu representante). Em conexio com determinadas frases" que diz 4s pessoas importantes de suas relagdes, cle muitas vezes experimenta de novo uma dor antiga © emogées que aliviam, ¢ ganha novas perspectivas. A “imagem da solugdo”, quando ele a consegue acolher ¢ interiorizar, desenvolve nele frequentemente efeitos que perduram por longo tempo. ” Ver também Hildenbrand (2002) G.Weber e D.Drexler, ConstelagSes Familiares © Psicosos 1.4 A insergiio da constelagio familiar no processo terapéutico Evolug&o progressiva ou experincia de ihuminaglio? A forte expansio do trabalho com constelagées tem despertado junto ao publico, de um lado, expectativas fora da realidade e, de outro, criticas de simplificago sem seriedade, De acordo com nossas experiéncias, o trabalho da constelago familiar, justamente com pacientes que exibem comportamento psicético, s6 se recomenda no contexto de uma relagiio terapéutica e com uma acurada preparago. Os pacientes se inscrevem para os semindrios de fSrma aut6noma e sob & propria responsabilidade, mas geralmente so advertidos dessa possibilidade por seus terapeutas, que frequentemente também os acompanham nos seminérios. Nao dever apresentar sintomas psicéticos agudos, Muitos pacientes comparecem inicialmente a seminarios, uma vez. ou varias, como observadores participates, nao fazendo incialmente suas proprias constelagdes mas presenciando as de outros ou delas participando como representantes, Os terapeutas que lhes recomendam o trabalho ou os aeompanbam nele deveriam conhecer 0 trabalho com as constelapses © suas premisses, ¢ 0 terapeuts que conduz a constelagio deveria ter experiéncia com pacientes desses grupos de diagndstico. Em seguimento a uma constelago familiar podem eventualmente surgir no pacionte reagbes depreciadoras ou agressivas e até mesmo episédios psicéticos. Tais reagSes, que inicialmente interpretavamos como sinal de insucesso, hoje encaramos como medides distanciadoras, que visam restabelecer a autonomia do paciente para poder lidar com 0 intonso desejo de estar proximo e de ser olhado, que se reavivou nesses somindrios ¢ foi satisfeito apenas por um custo periodo de tempo, Ultimamente, justamente em seguida a tais “pioras”, temos recebido com frequencia excelentes retornos de terapeutas relatendo desenvolvimentos positivos depois de consielagdes familiares, 2. Elementos erapéuticos do trabalho com constelagdes familiares 2.1 Esclarecimento da solicitagiio Um fator importante do semindrio de constelagbes 6 0 esclarecimento do que se deseja do terapeuta. Quanto mais concretamente forem formuladas as quest6es ¢ os objetivos, tanto melhor se poder decidir qual corte do sistema deverd ser representado ou levado em consideragdo, A ampla dispensa de uma anamnese detalhada e 0 enfoque dirigido para solugdes @ recursos choca- se, &s vezes com resisténcias, justamente por parte de pacientes com longs historia de tratamento, como se estes tivessem de “defender” seu status do doontes ¢ justificar seus problemas. Contudo, 8e 0s pacientes com diagndsticos de psicose recebem nos semindrios 0 meso tratamento como todos os demais, eles ogo mostram, muitas vezes, incriveis habilidades sociais ¢ geralmento se integram em problemas ao grupo, 2.2 A representagiio O que se exige dos representantes nas constelagdes é que se desprendam em larga medida de suas hist6rias pessonis, que percebam “sem intengdes” e comuniquem as reagSes corporais, sentimentos ou sensagdes que emergem nos lugares que ocupam como represeniantes, Esta exigéncia de deixar “de fora” a propria historia ¢ as hipoteses de uma psicologia corriqueica (por exemple, ,,Aquela pessoa esti longe dle mim - com ela no devo ter muito a ver), e de se entrogar sem reservas a0 que se sente, oferece a cada participante um exercicio de percepglio que no decurso do semindrio vai sendo cada vez melhor dominado. Tem-nos surpreendido, repetidas G.Weber e D. Drexler, Constelagbes Familiares e Psicoses vezes, a maneira diferenciada e sensivel que exibem, como representantes, pacientes que antes apresentavam um comportamento psicético, Alguns ainda precisam de uma ajuda inicial, tanto para cntrarem num papel quanto para se “despedirem” dele, mas muitos vio apreciando cada vez mais a possibilidade de vivenciar papéis ¢ lugares totalmente diferentes nas familias. Numa constelagdo 6 possivel perveber onde esses pacientes frequentemente encontram problemas: em viver relagdes intensas e em seguida voltar a si mesmos (quando, depois de uma constelagso, abandonam os papéis que representavam), 2.3 A vivéncia da imagem Através do método de posicionar membros da familia, com 2 ajuda de representantes, manifesta- se um aspecto vivencial que, & exceyao do trabalho com esculturas familiares, raramente aparece em outras abordagens terapéuticas: a experiéncia subjetiva direta, realizada simultaneamente em muitos canais sensdrios, envolvendo o lado fisiolégico, o expressivo-motor, o emocional e entio também 0 cognitive. Através dessa experiéncia direta que envolve o compo ¢ os sentidos, as ’agens consteladas tém muitas vezes fortes efeitos emocionais ¢ com isto podem ser revivides © trabathadas. O que se procura, em termos de imagem sensivel, é um lugar melhor para protagonista, As mudangas nas sensagbes corporais e nas emogdes dos representantes e do proprio cliente servem de instrumentos para validar a solugio. Na imagem da solugfio ganbam um lugar informagées e pessoas até entio excluidas. Quando o processo da constelagio, com a imagem da solugdo, é significativo para o cliente, ele ativa novas formas de ver ¢ de proceder em constelagdes familiares afé entiio experimentadas como probleméticas, Como num rito de passagem, os passos individuais (as imagens intermedidrias) so condensados numa experiéncia que se pode apreender e compreender.” 3. Experiéncias ja resultantes do trabalho de constelagbes com pessoas com diagndstico de psicose Em contraposigio as teorias ¢ procedimentos de abordagens terapéuticas estabelecidas, cxaustivamente formuladas e diferenciadas através de decénios, o trabalho com constelagéies, especialmente com pacientes de psicoses, s6 apresenta algumas experiéncias iniciais." Essas experiéncias indicam que determinados padres de relacionamento ¢ determinadas dingmicas sistémicas aparecem mais frequentemente em sistemas com pacientes de psicose do que em ‘outtos sistemas. Isto no implica em afirmar que esses padrdes estejam condicionando 0 aparecimento de psicoses. Entretanto, podemos verificar que processo de traz8-los & luz e resolvé-los através das constelagbes frequentemente influencia positivamente e de forma duradoura o comportamento dos envolvidos. Descrevemos a seguir algumas dessas caraecteristicas e dindmicas de relacionamento em pacientes com diagnoses de formas esquizofrénicas, inclusive alguns exemplos de casos. 3.1 Fragilidade na diferenciacio entre o ,eu* e os outros“. ‘G.Weber e D.Drexier, Constelagées Familiares e Psicoses Nesias constelagdes, com mais frequéncia e de modo mais drastico do que em outras, os. representantes expressam percepgdes que, num sentido mais amplo, se relacionam ao tema da ndiferenciagdo entre si mesmo e outras pessoas no sistema”, Os representantes se confundem ‘com outros, sentem-se enredados e ligados como se fossem siameses e carecem de um espago proprio perceptivel; ou entio se sentem colocados inteiramente diante do sistema ou para fora dele, Exprimem-se com marcada ambivaléncia, oscilam entre sentimentos de estarem fundidos, amarrados ¢ obrigados, desejando ter autonomia e espago livre, ou entiio se apresentam desorientados, desesperados ou mudos, Estas manifestagbes de participantes ,ingénuos“ do curso em posigdes de representantes correspondem as descriges da dinimica psiquica nas abordagens da terapia individual." Nas constelagdes pode-se mostrar com frequencia que esses estados psiquicos perturbadores, opacos e quase insuportavelmente contraditérios possuem 0 seu equivalente em acontecimentos e processos relacionais obscuros, traumaticos © cercados de segredos do sistema familiar, em que os interessados esto implicados do forma muitas vezes inconsciente. Trata-se af de dinamicas que atuam através de geragdes. Nas constelagdes, 0 comportamento psicético se manifesta como um esforgo ativo para dominar inconcilidveis tensdes ¢ oposigbes, de cardter interpessoal e intrapsiquico, Figayao profunda e identificago jominamos ,identificads" uma pessoa que, de modo inconscicate, esti implicada com spectos de um ou de yérios membros da familia o tenta imitar ou superar aspectos da vida dele(s). Segundo nossa experiéncia, tais identificagdes surgem principalmente quando membros do sistema tiveram um destino especial, ou quando nio siio respeitados ou foram excluidos, “Membros que se seguem no sistema familiar caem entio em contextos de relacionamento em que muitas vezes, de forma inconsciente, repetem aspectos do destino dessa(s) pessoa(s) ou sentem a necessidade de resolver algo em seu lugar. im familias com formages sintomaticas esquizofiénicas, encontramos frequenteméne formas especiais de identificagdo que descrevemos aseguir, 3.2.1 Identificagao transsexual Exemplo 1 ‘Amais velba de duas filhas desenvolvera um comportamento paicético ao terminar seus estudos superiores. Apaixonara-se por um de seus professores, mas também no estava certa de que ela. propria néo fosse um homem, ¢ durante semanas apresentou-se em suas aulas com trajes masculinos. Jamais conseguira trabalhar em sua profissio. Na constelagdio, sua representante se postou ao lado da mic e o pai afirmou que no tinha nada a ver com aquilo, Através de pergunias apurou-se que a mie tivera um noivo e que o casamento fora impedido pelas injungdes da guerra. Durante toda a sua vida, ela rejeitara seu marido, desvalorizando-o em presenga clas filhas © também idealizando 0 noivo por sua methor instrugo. A cliente tinha cursara a mesma disciplina do antigo noivo da mie e, como ela propria dizia, tomara o lugar dele junto da mie Bla se sentiu liberada quando 0 noivo foi introduzido na constelagio e quando ela disse, tanto a ele quanto sua mée, que nada tinha a ver com ele © que s6 queria viver a propria vida e aceitar- G.Weber e D.Drexier, Constelagies Famiiares e Psicoses se plenamente como mulher, Em seguida colocou-se junto do pai e disse-the que ele era 0 responsivel pela mae. Exemplo 2: ‘Um paciente, que vinha sendo diagnosticado como doente psiquico erénice e que fora criado num cfroulo de muitas mulheres, apés um seminario assumiu-se abertamente como homosexual. A partir dai passou a mostrar sintomas bem mais raramente, completou com acompanhamento terapéutico uma exigente formagio ¢ ha dois anos exerce sua profissio. 3.2.2 Identificagées duplas Particularmente pesada é a identificasao simultinea com dois excluidos. Uma forma especial dela é identificagao simuttanea com vitima(s) e autor(es)- Um exemplo: Uma participante de um seminério, de corea de 50 anos, com uma carreita psiquidtrica de muitos anos, tinha um pai de mie solteira, que entrou na policia especial nazista e mais tarde foi vigia num campo de concentragio. Através de perguntas, apurou-se durante a constelagdo que o pai dele era judeu e que nada so sabia sobre sou destino. Com isto a pacionte passou a compreender melhor seus sintomas, que ja duravam anos, de ser simultaneamente simultaneamente perseguida © perseguidora, ” Essa dindmica foi por nds encontrada diversas vezes, por exemplo, nos chamados doentes mentais transgressores. Seja frisado, neste contexto, que com muita frequéncia tomamos a letra conteiidos de manias, que se revelam carrogados de sentido. Se alguém se sente Perseguido ou envenenado, perguntamos: quem na familia foi perseguido ou envenenado? Ou, se alguém sente compulsdo de lavar-se, perguntamos: quem na familia precisava lavar-se? Nao dispomos aqui do espago necessario para entrar mais fundo nesta matéria 3.3 Segredos e tabus Em constelagdes de pacientes de psicoses pudemos verificar repetidas vezes que provocavam Perturbagio nesses pacientes relacionamentos confusos e mal definidos, como pateridade obscura, adogées mantidas em segredo, ocultagio de um irmio gémeo que morteu no parto ou durante a gravidez,"’ causas de morte obscuras ou ocultadas (por exemplo, um suicidio apresentado como um acidente). Devido a sentimentos de lealdade, os pacientes frequentemente no se atrevem a comunicar as incertezas que experimentam, fazer perguntas sobre elas ou investigé-tas. 3.4 Sequelas de culpa e de violéncia na familin "Ver também relatos sobre familias alemas onde familiares foram envolvidos em ages criminosas na época nazista, ou foram vitimas de crimes: Hellinger (1998 und 2001a), Ruppert, (2002). G.Weber e D.Drexler, Constelagdes Familiares @ Psicoses Em familias onde ha psicoses parece também haver um nimero bem maior de segredos de familia e de tabus relacionados com atos de violéncia, crimes e injustigas de que participaram, como autores ou como vitimas, membros da famia (geralmente de geragdes precedentes). A culpa ‘cometida ou experimentade geralmente nfo era encarada nem exteriorizada, lustro com um exemplo de um seminario de constelagdes familiares: ‘Um homem de 33 anos, apés uma grave tentativa de suicidio, procurqu-me pata uma terapia, Contou que nos iiltimos meses, quando estava se separando de sua namorada, retraiu-se de todo contato social e desenvolveu fantasies de perseguido e de perseguidor. Finalmente abrin a propria veia jugular e s6 foi salvo devido a circunstancias folizes. Na época do inicio da terapia nfo mostrava sintomas psicdticos agudos, mas todos os sinais de uma grave crise de identidade e de autovalorizagdo. Estava fortemente deprimido e padecia de sontimentos massivos de culpa, insuficiéncia ¢ fracasso Experimentava uma forte diminuigao de seus impulsos e um retardamento motor, falava por monossilabos o estava grandemente limitado em sua expressiio. Durante um ano de acompanhamento psicoterapéutico aconteceram vitrios episédios de crise e conversas em familia com 0 pai e o irmio mais novo, que sempre exprimiam medo de uma recaida e pela vida dele. Eie se estabilizou, mas yoltou a viver com os pais ¢ cortou quase todo contato com o mundo exterior. Ele mesmo se queixava de falta de acesso emocional a si mesmo eA tentativa de suicidio, experimentava-se como se estivesse cortado de alguma coisa ¢ nijo ,,sentisse“ mais a si mesmo. ‘Sua participagtio num seminario de constelagées familiares tinha o objetivo principal de retomar Contato com outros (interessados), No decurso do seminsrio ele constelou sua familia de origem (@s pais, ele proprio © um irméo mais novo). Os representantes de todos eles dissetam que tinham Pouce contaio com os préprios sentimentos. Como o representante do pai, na constelagdo da familia, se virou © othave~ para fora, intecrogamos o cliente sobre destinos ou acontecimentos especiais em sua familia de origem. Apuramos que dois de seus irmios tombaram na guerra e que seu avé voltara para casa Zerido por um tiro na barriga, Fizemos com que o eliente incluisse na constelago os dois tios o avd, Ele reverenciou cada um deles, Os representantes dos tios se sentiram olhados © honrados em seu destino, mas 0 representante do avé disse que nfio se devia reverencié-lo pois cometera algo muito grave. Paralelamente ja se tinham modificado antes 03 sentimentos dos demais representantes da familia, de forma incomum e dramética, Todos eles se ‘afastaram do representante do avé © mostravam um forte medo, Respondendo as perguntas, 0 cliente 86 pide informar que o avé tinha sido um participante entusiasta da guerra. Experimentalmente foram entio introduzidos representantes de vitimas da guerra, que se deitaram no chiio. Sua presenga provocou no representante do cliente uma veemente compaixio, enquanto 0 representante do avé permaneceu frio ¢ distante. O representante do cliente se inelinou diante das vitimas, despediu-se também do av6, que fora colocado a parte da familia, ¢ deixou com ele a culpa. Em seguide foi colocado ao lado do pai Depois da constelagiio o cliente contou que da heranga do pai ele tinba pedido para si a mochila de guerra (na ocasiti, tinha sete anos), Essa mochila continha, entre outros objetos de uso, 0 livro de Hitler , Mein Kampf (Minha Luta) e uma velha pistola, Foi com essa arma que ele tentou suicidarse e 36 recorreu a faca quando a pistola falhou. Foi profundamente tocante, para o cliente, sua vivéncia num grupo onde nem ele nem seu av6 foram moralmente julgados, e no qual ele, de forma comovente, se dirigiu a seu pai e seu pai a ele. Por desejo proprio, ele terminou a terapia, depois umas cinco sessées adicionais, separadas por intervalos mais longos Dois anos depois, aparecen no consultorio do terapeuta com um ramo de flores nas mfios, Relatou que tinha prestado com éxito seus exames finais como engenheiro, assumido um emprego e iniciado uma nova relago. Sentia que tinha ,aterrissado hem na vida", Disse que o semindrio da ‘G.Weber e D.Drexier, Constelagdes Famillares e Psicoses constelagdo tinha sido a coisa mais dificil que conseguira na vida, ¢ que fora incrivelmente ‘importante para ele. 3.5 Outros dilemas que pesam Cerins situagdes se tomnam também insustentiveis para tais pacientes quando, além das implicagdes sistémicas, se defrontam com varios dilemas de relacionamento. Podem estar colocados, por exemplo, entre duas pessoas relacionadas que estejam em conflito total entre si (or exemplo, seus pais ou a moe uma avé que também more em casa). Pode ser ainda que alguém tenha colocado para eles expectativas comportamento totalmente contraditérias © inconciliéveis, ou que virias pessoas ao mesma tempo thes tenham colocado expeciativas diferentes e estressantes, ¢ Isto aconteceu, por exemplo, com uma paciente simultanemente identificada com agressora e vitima. Na constelagfio ela ficou em posigo transversa entre a representante da mie-e da avd paterna, que se odiavam mutuamente, Taistriangulagbes adicionais marcantes desses criangas foram frequentemente encontradas por nés nas constelagdes. Suas solugées proporcionarans claros altvios adicionais. Quando 0s pais provinham de paises diferentes ou pertonciam a diferentes comunidades religiosas, isto trazia aos filhos novos dilemas. 4. Conclusio Requer-se uma grande experiéncia terapéutica para se lidar cuidedosamente com as jintormagdes” reveladas nas constelagdes, tomando-as, sim, a sério, nfo porém exeessivamented letra, Talvez mais do que em outros métodos, existe aqui, conforme a formagao e a mentale do praticante, o perigo da simplificagao, de uma abreviagio sem seriedade eda manipulagao, Além disto, cada familia tem o direito de manter sous segredos. Pode ser itil que, depois ae ama constelagao, familiares acrescentem as percepgdes, até entao tomadas como “loucas”, informagGes que esclaregam os acontecimentos jt egistrados. Quando, porém, aquilo ue emerge has constelagdes passa a ser considerado como a tnica verdade vélida, a confusio ¢ as manias apenas ficam piores. Em nossa apreciagio, o trabalho da constelagso familias, com sua Perspectiva sistfmica que abrange geragies e a utilizago da represontagao espacial 6 uma Comp [emmentasio ¢ um prolongamento essencial do espectroterapéutico no tralamonto de pessoas que ex bem um comportamento psicético, Nossas experincias apoiam as tentativas de pessoas Versadas em assuntos psiquicos, no sentido de buscar um entendimento de seus sintomes jParentemente incompreensiveis como “mensagens do mundo interior”"®, Nossa tendéncia é de {nterpreti-los, antes, como indicagées de implicagdes sistémicas até ent@o nio compreondidag Tradugito: Newton Queiroz Rio de Janeiro, julho 2002 “Ver também Simon et al. 1989) sobre dissociagao sincrdnica. GWober e D.Drewer, Constelagoes Famillares 0 Psicoses Citagdes Baxa, GL. (2001): Aufstellungen als Ubergangsrituale (Constelag6es como ritos de passagem) Ja G. 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