You are on page 1of 76
I cas UE) ee Dee eed POUR a Ponte es oe) aoe nd ety organismo é mais ee on peyerennct eee urs pepe sd Petry Pet erty en sa Ta ene 3 COMOACOVID AAMEBA DN rc aeomvT ON STUNTS Feel ante) TN BCC SE Eres ratte , Bos ro Cw Milhdes de pessoas utilizam os metrds todos os dias nas principais cidades do pais. Mas 0 que acontece quando eles fecham as portas depois do hordrio de funcionamento? ST CARTA AO LEITOR > EDITORIAL A beleza dos anticorpos “EU SOU 300, SOU 350. MAS UM DIA AFINAL EU TOPAREI COMIGO”, escreveu Mario de Andrade, em 1929. Sem querer, o modemista deu ai uma boa descrigao sobre como funciona 0 nosso sistema imunoldgico. Pois ¢. Todos os dias, 0 corpo produz milhies de células de defesa diferentes, cada uma capaz de reconhecer um tipo de virus. Claro ‘que 0 corpo nio faz ideia de quais sio os virus que estio circulando por ai. O que ele sabe é 0 seguinte: cada tipo de virus tem uma “fechadura” especifica,feita de uma combinagio de proteinas. O lance, entdo, € fabricar células de defesa que carreguem consigo chaves diferen- tes. Como cada célula sé consegue levar uma chave “no bolso’, sistema imunol6gico fabrica milhdes de chaves aleatoriamente e dé para cada uma levar em sua patrulha As células de defesa, entio, nio so uma coisa 86. “So 300, sio 350” Sio, na verdade, milhdes de configuracées diferentes. Uma hora, seguindo a poética do Mario de Andrade, uma delas “topa consigo mesma’, ou seja, com um virus ou ‘uma bactéria que tenha a fechadura certa para a chave que ela carrega. E elimina o invasor. E um jogo didrio de tentativa e erro, numa guerra entre micro-orga~ rnismos que remonta ao inicio da vida na Terra, hd pelo menos 3.5 bilhdes de anos, quando células solitarias Jutavam para sobreviver no caldo primordial dos oceanos. A diferenga € que 0 oceano agora é voce. ‘Mas tem um problema ai: virus io virais. Se reproduzem mais ripido que meme. Cada mililitro de amostra de muco coletada num. teste de Covid pode ter tantas cépias do coronavirus quanto ha de humanos na Terra ~ dependendo do estagio da infeceao, bem mais Por isso, rola uma magica quando a célula de defesa certa encontra 0 invasor da vez. Ela comega.a se multiplicar ferozmente. O organis- mo, entao, passa a contar com zilhdes de anticorpos que carregam a chave certa, e vai fazendo a faxina. E isso que cura um paciente de Covid ~ ede qualquer outra moléstia viral. processo de multiplicagio de anticorpos leva alguns dias, e varia de paciente para paciente. Se demorar, o virus se reproduz mais, ripido que as células de defesa e vence a batalha. E isso que mata ‘ios pacientes que vencem a ‘guerra saem com um prémio; uma carga alta de anticorpos com a chave certa. Essa carga confere imunidade. Se aquele virus entrar de novo, serd aniquilado antes que possa fazer qualquer estrago. Mas e ai? A imunidade dura para sempre? Para certas infecgdes, sim. Para outras, nao: 0 volume de anticorpos com a chave correta cai rapidamente, e as portas ficam abertas de novo. Em qual dessas classes entra a Covid? Bom, esse ¢ 0 assunto na nossa reportagem de capa. Spoiler: ainda nao ha como cravar nada, pois a ignorincia da humanidade sobre como o Sars- Cov-2 interage com 0 organismo ainda é vasta. Mas nio faltam estudos promissores. Boa leitura Alexandre Versignassi Dineror O€ REDAGAO conan Abril a ae Sse cont aaa CARDAPIO > agosto De 2020 ‘Anda no é possvel cravar que exsta ‘um passaporte da alegria para quem ji pegou Covi ese curou: sabemes pouco ‘sobre aimunidade que a doenca confere. Mas comecam a surge estudos mostra do que, sim, nossas defesas podem ser mais fortes do que se imaginava 2 Westport, na irtanda,tevepiratas, milagres.. Até encontrar sua vocacSo: fabricar uma toxina que vale our. 4“ Entenda aciéncia da comuflagem, da natureza 20 front de batalha, 82 Doengas moldam a sociedade. Veja como atuberculose rou a arquitetura reserva para o futuro do design. 58 Eooutros cinco seres terrves. De bacté rias que desfiguram a face em casos de ltalidade de pratc ESSENGIAL 6 (Ocometa Neonise, que passou pertinho da Terra 8 A cidade pés-coro- navirus sera mais polui aaa ‘SUPERNOVAS 0 ‘Sim, sangue de thama pode mesma set uma boa arma contra Covi 39. 2 As vantagens de imprimir Grgios humans na Estagio Espacal De confinamento a riveins ses filmes que transmitem as sensacbes ‘dos ultimos meses w Spray nasal promete red Bir em 99% a quantidade avirusemitida a fal arene ORACULO 6 Como as abethas decider qual dels ser.avanha? ESE... R. Eseosneandertais tivessem sobrevivido? Porque as televisdes usam osistera RCS? Qual orgem do aperto sees ULTIMA PAGINA u A ascensio dos artemessos de trés pontos na NBA. LG: pealy O PODCAST DO GUIA DO ESTUDANTE Obras Sees da FUVEST mastigadinhas para vocé. 7] 4M EMUITO + OUGA NO Cuz ive Me ene arnt) A ESSENCIAL fe na phcina anremion: O cometa Neowise rasga o ctu de uma noite de vero nas plantagBes de lavan- dda de Brihuega, um vilarejo no centro da Espanha. Em 23 de ulho, o Neowise passou a "apenas" 103.5, rmithdes de km da Terra - metade da distincia média até Marte. € 0 cometa mals facil de se observar a cotho nu desde o Hale-Bopp, em 1997. Se vocé perdeu, mis noticias: a prdxima passagem do Neowise ‘ocorrerd daqui 6,7 mil anos. Cometas, vale lembrar, $30 meros béidos de gelo encardido, repletos de ppoeira, Suas caudas podem alcancar um comprimento equivalente & distancia entre a Terra eo Sol > ...UWA OPINIKD A qualidade de A cidade mu pos- corona- == beneficiaram a circulacio de carros virus sera oer volta o fantasma do modelo mais poluida ~~ e desigual em )ADE FEITA PARA CARKOS ¢ cidade feita para gente. Essas mas sio mais adensadas ~ concentram trabalho e moradia em bairros compactos. Isso evita deslocamentos pendulares disrios entre 0s subirbios e o centro. Os protagonistas desse ideal de cidade sio prédios de uso misto, com apartamentos para virias faixas de renda e escritérios. Em volta, nada de grades ou muros. O piso térreo contém lojas e restaurantes que eriam uma continuagio d calgada 1208 transeuntes. Nessas cidades menos amigaveis 208 carros, as ruas tém espacos para bicicletas e 6nibus. Pracas e largos sio espagos de convivéncia aconchegantes, e n3o matagais abandonados. Cidades feitas para carros, por outro lado, dio pre- feréncia a ruas largas, viadutos e vias expressas sem cruzamentos, {que nio servem para comércio ou ha- Ditacao. Em casos extremos, avenidas io construidas no fundo de vales onde antes havia rios, e acabam cercadas por paredées de concreto arido, E 0 oposto da rua com fachada ativa, que interage ‘com o passante. O comércio se concen- traem shoppings sem janelas; 0 traba- Iho, em prédios que sio s6 janelas (de preferéncia, azuis e espelhadas) "Nenhuma cidade és6 uma coisa ou 6 outra. Los Angeles, talvez.o lugar mais carrocéntrico do mundo, tem areas em que da para viver a pé. Manhattan, a menos rodoviarista, onde 76% das resi- déncias nem abrigam um carro, também tem suas ruas indspitas. Eo fato é que cidades que pendem mais para oscarros {geram uma lista de problemas evitados pelas cidades amigas dos pedestres: mais poluigdo, mais transito, menos investi- mentos em transporte puiblico, cérre- {g0s mais poluidos (que s6 abrigam avenidas nas margens, jamais calcadas). Outro reflexo, bem brasileiro, do carrocentrismo sio os bairros de clas- ‘se média das nossas grandes cidades. Nossos condominios residenciais se tornaram torres muradas, erguidas com © propésito de isolar seus moradores. Nisso, o comércio de rua mingua,¢ to- da interagio que 0 morador tem com a cidade acaba mediada por um carro, coronavirus pode fazer esse pro- blema se exacerbar. O advento do home office para os mais ricos criou um boom no mercado de condominios afastados do centro, que oferecem mais espaco a um metro quadrado mais em conta. Bacana, nao fosse por um problema: isso torna a cidade ainda mais depen- dente de carro do que jé & Quanto mais condominios afastados, entdo, sua urbe vai ficando cada vez mais Los Angeles, «cada vez menos Manhattan. Uma pe- na, ainda mais levando em conta uma tendéncia imobiliria pré-pandemia de construir apartamentos menores em re- sides centrais - que, em varias cidades, estavam ganhando ciclovias (coisa que ha dez. anos era ficgio). Revitalizagdes & parte, a grande ré- ‘gua para medir se uma cidade gosta ‘mais de carros ou de gente ¢ 0 uso de transporte puiblico.E ai temos uma ma Avera O home office criou um boom no mercado de condominios afastados do centro, que exigem o uso do carro. noticia: entre 2013 ¢ 2018, a demanda por Snibus no Brasil caiu 25% ~ ainda ‘que muitas prefeituras tenham me- Ihorado a qualidade dos servicos, com sistemas BRT nos moldes da rede exem- plar de Curitiba corredores exclusivos, ar-condicionado e veiculosarticulados de piso alto, com mais espaco interno. ‘0 que aconteceu, entio? Parte dessa queda pode ser atribuida ‘a0 Uber e seus congéneres. Nao que eles ‘sejam algo ruim. Melhor um carro par- ticular que transporta cem pessoas por dia do que um que transporta uma sé. Mesmo assim, nada é mais eficiente do ponto de vista urbanistico que um bom sistema de transporte de massa. E se a uuberizacio dos deslocamentos atrapalha isso, pior para todos. Outro motivo para ‘a queda est no desemprego. A taxa pulou de 6,4% em dezembro de 2014 12% em fevereiro de 2020 (antes da pandemia). E quem nao tem emprego se desloca menos. O indice aumentou pouco durante a Covid (estava em 13% ‘em junho) e segue em aceleragao ~ a cexpectativa é de que haja um salto nos proximos meses. Se énibus lotado é ruim, énibus vazio pode ser pior, como vamos ver a seguir. Sucateamento Do inicio da pandemia no Brasil até 30 de junho, as empresas de énibus acuriu- Jaram um deficit de RS 372 bilhes. 133 cidades brasileiras reduziram a frota de Snibus em circulagio a partir de margo, 181 interromperam completamente 0 servigo. O nimero médio de desloca- mentos realizados de énibus caiu 71% ‘em margo; foram 30 milhdes de pas- sageiros a menos todos os dias. Agora, ‘com a lenta retomada das atividades ‘econémicas, a demanda por dnibus estacionou em 40% da original (para cchegar a 80%, a previsio é de dez me- 'e3). 0 uso do carro, porém, caiu bem ‘ence sjonas toa ouasta ue snaioucn anaes maamcas om mse CASTE menos. Atualmente, esté entre 20% 25% abaixo da média pré-corona. ‘A maioria das empresas de 6nibus brasileiras é remunerada pelas pre- feituras pelo nimero de passageiros transportados, e nao pela quantidade de veiculos que poem para rodar (ou pe- laquilometragem total percorrida pela frota).Para obter algum lucro, a lotagio média dos énibus precisa ficar em 6 passageiros por m?. Ou seja:o sistema depende de uma lotago muito superior i recomendada pelos epidemiologistas para evitar a transmissio do virus. E ai temos um problema: é incerto que © transporte puiblico sobreviva a pan- demia sem ser sucateado. ‘O sucateamento amplia a desigual- dade: 0 padrio de vida das pessoas de renda mais baixa afunda,jé que elas sio obrigadas a usar qualquer sistema de transporte piblico que houver, seja BRT, seja van clandestina. Enquanto isso, os ‘mais ricos se encastelam em condomi- nios com miiltiplas vagas na garagem. E ‘© sonho de quem ganha menos volta a ser aquele dos anos 1980 ¢ 1990, quando transporte piiblico era pior que o atual: ter um carro, qualquer carro, a qualquer prego. Um retrocesso brutal. Eo pior € que isso de cidades fei para pessoas nao tem nada de utépico, nem ¢ exclusividade de pais campeio de IDH. Pense em Ipanema, um bair- 10 fervilhante, cheio de prédios de uso misto, ou no centro velho de Sao Paulo, com uma densidade de transporte pui- blico compardvel de Paris. Com BRTS, ciclovias, bilhetes tinicos e apartamentos novos em regides centrais, muitas cida~ des brasileiras ensaiavam uma revolugio. A Covi, infelizmente, pode inverter a tendéncia. E trazer de volta o fantasma do modelo rodoviarista. Que a vacina contra o virus, quando chegar, também sirvade cura para esse mal. Porque, sem gente andando na rua, nio ha rua. © tna gr aT gar, costo 2020 SUPER 9

You might also like