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PWN arm erly ona CCST TiC ss ret LCus} a tatitg ey 1s das Trevas, ax ds nls a a a y ] , \ Vi ' ~ i 4 e 5% P 4 7 ] yj ya a aa HAIN Pay) JLR.R. TOLKIEN Bei) ena) foe eer fort a er ces Reece Bear co dicainspirouopaide 4 do trovaoera or Lee Reet oe oR eee Ue aoe cARTAS. TEMP i MENUS EMALGUMAS COISAS, a Idade Média foi como as pessoas costumam imaginar: tempos de Cruzadas e Peste Negra, em que todo mundo acreditava em dragoes, magia e bruxas, que eram queimadas vivas. Em outras, no entanto, conhecer um pouco mais a fundo pode trazer imensas surpresas. A primeira delas: a Idade Média era bem menos sexualmente reprimida do que se imagina. Nosromances de cavalaria, heréise donzelas faziam sexo antes do casamento. Na imaginagdo po- pular, bruxastinham uma funcio bastante particular para avassoura edeménios podiam ser amantes de papas. Falando em Igreja, o prepu- cio de Jesus Cristo eo leite da Virgem Maria eram reliquias sagradas. E alquimistas faziam experimentos com o proprio sémen. Outra: os padres, por mais que tenham sido os responsiveis pela extingao dos deuses nérdicos, so também a tinica raza pela qual os conhecemos. Como os iinieos intelectuais de um tempo em que quase ninguém mais sabia escrever, cabia a€les registrar o que o povo pensava, efaziam isso com gosto. E mais ainda: muitos mitos e rituais e das religides anti- gas foram incorporados ao cristianismo, e alguns sobrevivem até hoje em dia. Bom, ninguém avisou ao mundo que, em 1453, com a queda dos muros de Constantinopla, a Idade Média acabou. Muitas coisas tipicamente medievais, como a caga ds bruxas ou a alquimia, tiveram seu auge nos séculos 16 e 17. Enquanto os renascentistas faziam suas obras-primas, supostos lobisomens eram queimados vivos na praca em frente. Esse era o lado ruim. Por outro, eram criadas lendas ines- queciveis, que continuam a inspirar o outro milénio. Fabio Marton Editor cARTAS. 0 Cavaleiros e Herdis eal SOT ees Or) Bearcats eel uM a lerel) Mitologia Nordica eee ona) ee Prt ian USES iy do Cristianismo Rememireset ice eed alco Ree er icon) LTCC UCC rte lcd TSE) POR TBE eaten etal Meroe ey acon eea Nd ite MATERIAS CAPITULO CAVALEIROS E HEROIS As Cruzadas levaram ao nascimento de um novo tipo de mitologia. NAO & POSSIVEL ENTENDER A IDADE MEDIA sem seus dois elementos mais fundamentais: o cristianismo ea violéncia, e como as duas coisas andaram juntas. Jesus era um pacifista ou, ao menos, parecia muito. £ atribuidaa ele, afinal, aafirmagao de que, se alguém der um tapanasua cara, é para oferecer 0 outro lado — o conselho menos seguido da histé- ria. O fato é que a cristianizagao de quase toda a Europa nao diminuiu a pancadaria. Cristéos nao eram nada menos competentes em matar seus irmaos de fé que seus ancestrais politeistas dos séculos anteriores. Mas essa matanga acontecia apesar da religido, nao em harmonia com ela, e geralmente sob protestos da Igreja. Em 1095, 0 papa Urbano 2» abriu as comportas para um tipo inédito de violéncia, que mudaria a mentalidade da Europa medieval — e seus mitos — para sempre: a Guerra Santa crista. A Primeira Cruzada atendia a um pedido de ajuda do Império Bizantino, mas o papa deua ela uma justificativa bem mun- dana: que cavaleiros, mercenarios e vagabundos achassem algo para matar que no fossem outros cristaos. De brutamontes que trucidavam seus semelhantes da sela de um cavalo, os cavaleiros tornaram-se 0s portadores da, literalmente, ponta de langa da cristandade. E ai nasceu seu mito. Eles passaram a encarnar as velhas lendas do passado celta ou germanico, que estavam vivas, ainda que ocultas sob ‘o manto da nova fé. Passaram a enfrentar monstros, lidar com magos, salvar donzelas. Os velhos santos tornaram-se cavaleiros, e sobre eles foram contadas histérias no menos bizarras. Mesmo na vida real, todo tipo de boato escandaloso, fantastico ou lunatico foi dito sobre os Tem- plirios, que pagaram caro por isso. As Cruzadas liberaram a violéneia em nome de Cristo ea celebrago de seus heréis, em verso e prosa, mito e realidade. Ao menos quando o inimigo usasse turbante. # Hl ARTHUR Ele moveu os sonhos e os valores da cavalaria medieval. ++ trata Yara m matéria de mitologia medieval, rei era Arthur, os outros eram cartas do baralho, Ele foi celebrado em verso e prosa por toda a Idade Média e além, em paises muito distantes de sua Inglaterra natal, Seus mitos sobreviveram o bastante para tornarem-se fil- mes, livros e até videogames. Centenas de anos apés sua morte, monarcas britanicos entrelagavam suas historias 4 origem e as con- quistas de Arthur. Todos queriam se ligar ao maior rei de todos. Se Arthur entrou para os mitos como figura fundadora da Ingla- terra, ironicamente, ele nunca lutou ao lado dos ingleses. Arthur é uma lenda de origem celta, criada no Pais de Gales, a regiao onde se refugiaram os habitantes originais da Gra-Bretanha apés as invasdes dos anglo-saxdes, vindos da atual Alemanha — aqueles fundariam a Inglaterra. Na batalha do monte Badon, por volta do ano 500, Arthur teria derrubado mais de 900 saxdes. Atrasando a invasio — e a fun- dagao da Inglaterra — em décadas. Filho bastardo do rei Uther Pendragon, Arthur contou a vida toda, com seu tutor e conselheiro, 0 mago Merlin. Concebido em uma es- tranha relacao entre a princesa de Dyfed e um anjo (ou deménio, de- pendendo do autor), o mago ¢ central nas decisdes do rei e nos acon- tecimentos do reino de Camelot. Merlin era apaixonado por Viviana (ou Nimue), a Dama do Lago. Ela afirmou que sé se entregaria a Merlin se ele Ihe ensinasse todo o seu poder, e assim foi feito. O mago apresentou o jovem Arthur a espada magica, Excalibur — que queria dizer “corta aco”. Merlin levou Arthur ao lago, onde a mao de Viviana emergiu da profundidade com a arma, De lamina inquebré- vel, havia sido forjada por um ferreiro elfo da ilha lendéria de Avalon. Mas 0 poder mesmo estava na bainha, que daria ao rei o corpo fechado em batalhas, Com a espada em maos, Arthur acaba se revelando ao pai, Uther, herdando o trono aos 15 anos. EM BUSCA DO GRAAL A Batalha de Badon é sé uma no comego da carreira do rei que, de seu castelo em Camelot, expandiria imensamente os dominios de seu pai, juntando em torno de si um namero cada vez maior de seguido- res, Merlin cria entao a Tavola Redonda. O formato da mesa foi uma estratégia para evitar disputas de poder, ja que, em uma mesa redon- da, todos, geometricamente, esto em pé de igualdade. Mais de cem guerreiros sentaram-se em volta da mesa lendaria. Mas isso nfo conteve a ambigao de um deles. Anos e batalhas mais tarde, Arthur teve de se ausentar do pais, em uma guerra contra “Roma”. Um dos cavaleiros, Sir Mordred, entao usurpou 0 trono. Ele era filho de Morgana, a meia-irma manipuladora de Arthur — para alguns autores, o pai dele era o préprio rei, enganado por ela a ter uma unio incestuosa. Acontece entao a Batalha de Camlann, a iltima do grande rei. Mas a situagao estava contra ele. Merlin nao péde ajudar seu mestre, pois havia sido aprisionado pela Dama do Lago, com medo de que ele a es- cravizasse com sua obsessao. Morgana havia roubado Excalibur, que foi recuperada, mas sem a bainha magica. Sem a protecio, Arthur eseu sobrinho/filho travam combate, e atin- gem um ao outro. Mordred tomba ali mesmo. Arthur é ferido mortal- mente. Entao ordena que o cavaleiro Bedivere devolvesse Excalibur a0 lago, que é recebida pela mes CAVALEIROS € HEROIS No total, havia ‘mais de 100 OTRAIDOR Sir Mordred podia ou no ser filho de uma unio incestuosa envolvendo o rei Arthur e sua irma Morgana (ou Morgause, em versées mais antigas). Ele é a causa da Batalha de Camlann, que teria ocorrido precisamente em 537. Arthur havia viajado para o continente — nas versées mais antigas, para enfrentar o "imperador Licio" de Roma. Na prosa do século 13, correndo atrés de Lancelot, apés 0 caso com a rainha Guinevere ser revelado. Na auséncia, Sir Mordred usurpa o trono e tenta se casar com a rainha Guinevere. Em Camlann, Mordred tomba em combate, enquanto Arthur & ferido mortalmente, 0 que leva a busca pelo Graal Mitos celtas As origens pouco cristas da lenda. Alenda do rei Arthur surgiu no Pais de Gales, aregiéo que continuou a ser dominada pelos celtas, em contraste com a Inglaterra, tomada pelos anglo-saxdes no século 6. Varios elementos da lenda traem essa origem. Comega por Merlin, que em tudo se parece com um druida dos tempos antigos, um sabio em contato com anatureza, responsivel por aconselhar reis e ajud-los com poderes magicos. Depois, Excalibur: os celtas famosamente faziam espadas que estavam entre as melhores da Europa, que foram copiadas pelos romanos. Elas tinham valor sagrado, e dar a essas armas um vel6rio em um lago, como acontece na Jenda, era uma velha tradigao quando seu dono morria. 0 préprio Graal, uma mania aparentemente tao crista que se espalhou por todaa Europa, tem o mesmo formato e poderes curativos dos caldeirdes da mitologia celta, na qual eram relacionados a deusa da inspiragao. A irma de Arthur, Morgana, 6 derivada da deusa céltica Modron, que aparece em versdes antigas da lenda. CAVALEIROS E HEROIS © que aconteceu com Arthur apés Camlann e a busca frustrada pelo Graal varia de autor para autor. Levado para Avalon, por Merlin, ele pode ter morrido das feridas da batalha ou ter sido curado e morrido anos depois, de causas naturais, De Avalon, Arthur espera para ser reencarnado como rei da Inglaterra, para salvar o pais de uma grande crise, e leva-lo a uma nova era dourada. Morgana, Excalibur, © Graal: tudo tinha um péna velha mitologia CASO TENHA EXISTIDO UM REI ARTHUR, NAO SOBROU NENHUM VESTIGIO DE SEU REINO. HA APENAS ESPECULACOES E LITERATURA. DA HISTORIA PARA O MITO Ahistoria que vocé acabou de ler é basicamente a versio contada por Geoffrey Monmouth e Chrétien de Troyes, autores do século 12. Eles foram os primeiros a descrever uma mitologia completa do rei Arthur. Escritores maistardiosacrescentaram detalhes diferentes, comoopo- etadoséculo13, Robert de Boron, para quem Excalibur é tiradadeuma pedra, nao dada pela Dama do Lago, cumprindouma profecia quetorna Arthur orei. O caso de Lancelotcoma rainhaGuineveretambéméuma criacao posterior. A batalha do monte Badon, aquela onde Arthur teria matado 900 saxdes, foi mencionada pela primeira vez por Sao Gildas, ainda no século 6, algumas décadas depois de ocorrer. Nesse relato, nao existe Arthur nenhum. A primeira vez que o nome surgiu foi em Historia Bri- ttonum (Historia Britanica), livro escrito em 828 pelo monge Nennius. Mas esse Arthur era apenas um guerreiro. Foi apenas em 1136, com Geoffrey de Monmouth, em Historia Regum Britanniae (A Historia dos Reis Bretdes), que Arthur tornou-se rei — e também surgiram o mago Merlin e outros personagens centrais. “O trabalho de Geoffrey criou uma historia de vida completa para Ar- thur, mas nao ha provas de que ele tenha, de fato, existido”, conta John Withrington, professor na Universidade de Exeter, na Inglaterra. Mon- mouth, como seus antecessores, era um religioso catélico do Pais de Ga- les e, assim como eles, acreditava estar fazendo um relato historico, nao literatura ou mitologia. Foi preciso que a hist6ria atravessasse o canal da Mancha para erguer Arthur a um mito mundial. Foi nos textos de Chrétien de Troyes (1135-1191) que a histéria do rei tornou-se literatura épica, e passou por um processo moralizante, convivendo com aideia do pecado e de uma conduta casta, correspondentes aos valores de cavalaria da época—no século 6, quando o eventual Arthur histérico teria vivido, nem havia cavaleiros ainda. Também surgem personagensemblematicos no ciclo arturiano, como Lancelot. Caso tenha existido um rei Arthur, nao sobrou nenhum vestigio de seu reino. Hé apenas especulagdes e uma riquissima literatura — que, provavelmente, é muito mais interessante que a realidade.« ROMANCES Dr CAVALARIA Tudo a respeito do herdi medieval nasceu com eles. magine a vida de um eavaleiro, Nao um personagem histérico, mas o cliché da fantasia, dos filmes, jogos e desenhos animados. Voce provavelmente pensou em coisas como vagar pela terra sozinho, ajudando os fracos e oprimidos, seguindo o mais rigido eédigo de honra, secretamente apaixonado por uma princesa que, quem sabe, seja preciso salvar de um dragao, que também guarda um tesouro. Na vida real, o dragio nem era a parte mais implausivel: cavaleiros eram militares profissionais que lutavam em formagGes de centenas, € seu maior alvo eram fracos e oprimidos plebeus, armados geralmente com areos. Na pritica, seu cédigo de honra era uma ligeira sugestio: estupros ¢ pilhagens eram feitos mesmo pelos cavaleiros das ordens monasticas, que eram, para todos os fins, monges. ‘A imagem popular do cavaleiro nao vem da realidade, mas dos roman- ces de cavalaria e das eangdes de gesta, generos em prosa e verso que se tornaram populares apés a Primeira Cruzada. Eram livros cheios de acao eromanee, feitos para divertir e inspirar, e nao davam a minima para o re- alismo. Como aconteceu com muitasoutraslendas nesta edigao, ninguém avisou osautores quea [dade Média havia acabado, eo género seguiu firme e forte pelo século 16, quando “cavaleiro” jé era quase s6 um titulo, sem qualquer papel militar. Foi s6 com a sitira impiedosa de Cervantes, autor de Dom Quixote, em 1600, que a ficha caiu e eles sairam de moda. A seguir, alguns dos personagens mais importantes nascidos da ima- ginacdo medieval. Tire as criancas da sala: diferente do esterestipo moderna, as relagGes entre cavaleiro e donzela frequentemente eram consumadas. Foi sé em tempos recentes que adaptaram as lendas para gostos mais puritanos. + ORLANDO Franea e outros paises, 1115-1516 Desde a Espanha até a Noruega, dezenas de livros foram escritos sobre o legendirio paladino de Carlos Magno, morte em combate com os mouros ra Batalha de Roncesvales, em 778. Orlando seria 0 dono de Durendal, a espada mais afiada do mundo, feita com um dente de So Pedro, 0 sangue de Sio Basilio, o cabelo de S30 Denis e um pedaco da roupa da Virgem Maria. Com ela, enfrentou o gigante islamico Ferrabrés (ou Ferraguto) e forcou-o a se converter ao cristianismo. Também participou de torneios pela mao da princesa Angélica. Em sua batalha final, ele se recusa a chamar por reforgos, até gue, tarde demais, toca seu olifante — uma trombeta feita de marfim de elefante — com tanta forca que estoura as veias da cabeca, morrendo sem combate. SIR EGLAMOUR Inglaterra, 1350 Um cavaleiro pobre se apaixona pela filha de seu senhor, um bardo feudal. O nobre diz que concorda com 0 casamento, desde que ele resolva trés tarefas: primeiro, tirar um cervo de uma floresta tao distante que fica depois do parafso celta, protegido por um gigante. Depois, matar um java assassino que aterrorizava Sidon, no Libano. Por fim, acabar com um dragio em Roma. Tudo isso ele resolve galantemente, mas, entre 0 javali e 0 dragao, ja meio sem paciéncia, acaba deixando a princesa gravida, Mie e filho so banidos do reino, e acabam separados quando um grifo rouba a crianga. Depois de muitas reviravoltas, que levam décadas e¢ incluem a mae casar com 0 filho (felizmente, sem consumar a relagio), todo mundo acaba junto, € 6 filho casa com uma princesa prometida ao pal. Orlendo: destruido pela propria trombeta, AMADIS DE GAULA Portugal, sée. 14 Aautoria é portuguesa, com certeza, mas 0 personagem é estrangeiro. Filho de um rei da Galia e uma princesa da Bretanha, Amadis foi abandonado pelos pais e criado pela feiticeira Urganda. De volta ao reino, jé adulto, enfrenta varios desafios, incluindo mater o gigante Endriago, coberto de escamas e cujo fedor é fatal. Com isso, consegue ser feito cavaleiro por seu préprio pai. ‘Apaixonado pela princesa Oriana, da Inglaterra, fica louco apés receber uma carta mal-educada da amada, Mais tarde, o casal consuma a relagao, sexo antes do casamento - pelo qual ganha o dio eterno do pai da ex-donzela. Amadis foge com Oriana e eles, tempos depois, se casam. Mas acaba morto por seu préprio filho, que vinga a“desonra” de ter nascido de mae solteira. FREDERIK DA NORMANDIA Suécia, 1308 O duque Frederik era um dos cavaleiros do rei Arthur. Um dia, ele sai para cacar e acaba perdido. Até que encontra o reino dos andes, dentro de uma montanha. O rei deles, Malmrit, enfrenta uma revalta, que o cavaleiro ajuda a controlar. Como prémio, ele recebe um anel magico, capaz de torné-lo invisivel. As semelhancas com O Senhor dos Angis acabam aqui: usando o anel, 0 cavaleiro consegue 0 acesso a uma torre no castelo do rei da Irlanda, onde ele mantinha presa sua filha, Floria. Os dois tém um romance — consumadissimo , ap6s mover mundos e fundos, ele consegue levar a princesa para a Normandia, com um navio cheio de tesouros. E sao felizes para sempre. TEMPLARIOS SATANICOS Lendas levaram a destruigéo da ordem de cavaleiros. m 118, nove cavaleiros franceses decidiram fundar a Ordem dos Pobres Cavaleiros de Cristo, para defender os peregrinos cristaos que iam até Jerusalém. Dez anos depois, eles foram reconhecidos pela Igreja e ganharam um quartel-general no Templo de Jerusalém, de onde vem o nome Templarios. Na ver- dade, era a mesquita de Al-Aqsa, construida pelos islamicos proxi- modo local do antigo templo mencionado na Biblia, destruido pelos romanos no ano 70. Os templarios eram famosos por sua bravura fandtica e pelo se- gredo de seus rituais, j4 que eram isentos pela Igreja de qualquer forma de investigacdo. Isso levou a inimeros boatos a respeito do que fariam entre quatro paredes. Apesar do nome “pobres cavalei- ros”, eram tudo, menos pobres. Eles dominavam uma imensa rique- za, paradoxalmente, porque todo cavaleiro fazia voto de pobreza e doava seus bens ao ingressar na ordem. Em seus quase dois séculos, a ordem adquiriu uma reputacio legendaria, Todo tipo de histé- ria circulou sobre eles. E isso foi sua destruigao. O rei Filipe 4°, da Franca, que acumulou uma grande divida com os eavaleiros, decidiu eliminar a ordem e ficar com seu tesouro. Em 1307, ele quitou a fatura prendendo os lideres templirios e acusando-os de heresia, aproveitando os boatos que corriam. Com confissoes obtidas sob tortura, eles foram queimados vivos em 1314. O que nao acabaram foram as lendas sobre as conspiragSes ¢ ritos seeretos dos templirios. Veja ao lado. ¢ 38> Baphomet, ©Graal e 2 maldigéo dos cavaleiros. BAPHOMET Desde o inicio da Primeira Cruzada, vez ou outra 0 nome Baphomet pipocava em relatos ou cancées de trovadores, como uma entidade misteriosa cultuada na Terra Santa. Durante sua tortura, varios ‘templérios admitiram que o culto a Baphomet fazia parte dos rituais secretos, em que o deménio seria representado por uma cabeca decepada, um idolo de trés cabecas ou um gato — a imagem cléssica do bode 6 surgiria no século 19. Nenhum desses idolos foi encontrado. A explicagio pode ser bem mais mundana: Baphomet é simplesmente uma corruptela francesa para Maomé. E possivel que falsas converses a0 islé fizessem parte dos rituais secretos, dos templérios, porque eles tinham ordem de fingir quando capturades, para salvar a prépria vida. Com a perseguicdo, alguns cavaleiros se refugiaram entre os islamicos e acabaram convertidos. PRAGA DE CAVALEIRO (Os templarios foram presos numa sexta-feira, 13 de outubro de 1307. Essa pode ser uma razdo pela qual o dia assumiu conotagées malditas. eles préprios jogavam suas pragas: de sua estaca 1a fogueira, aos 71 anos, 0 dltimo Gréo-Mestre dos cruzados, Jacques de Molay, amaldicoou o rei e 0 papa pelo julgamento absurdo, dizendo que, em um ano, ambos responderiam perante a Deus por sua injustica. Era 18 de marco de 1314. O papa Clemente 5»morreria em 20 de abril — enquanto seu corpo repousava numa capela, ela foi atingida por um raio, e seus restos foram carbonizados. O rei Filipe 4° morreu em 29 de novembro, de derrame. INICIAGAO No proceso do rei Filipe 42, a principal acusacao contra os ‘templérios é que, em seu ritual de iniciagdo, eles deveriam negar a Cristo, cuspir na cruz, beijar as costas, o umbigo ea boca de seus superiores, entregando-se a relacdes carnais com eles por toda a vida. Também usariam um amuleto consagrado a imagem de Baphomet. E possivel que houvesse algo de verdade nisso: os cruzados poderiam simplesmente estar reencenando a negacao de Séo Pedro a Jesus, como na Bibl ARCA DA ALIANCA E SANTO GRAAL Em Jerusalém, os templarios teriam achado o Santo Graal e a Arca da Alianga. O primeiro nem é tao dificil assim: existem ainda hoje vérios candidatos a Graal em igrejas da Europa (veja mais na pagina 34). A segunda teria sido um baita achado. Ela foi perdida em 597 a. com a conquista babilénica do reino de Israel, e continuave perdida na época de Jesus. Nela estavam as tébuas da Lei dadas a Moisés, € 0 objeto seria capaz de destruir exércitos e matar quem olhasse pare ela do jeito errado — isso aparece na Biblia, ndo s6 em Indiana Jones. Em 1180, cavaleiro Ralph de Sudley teria encontrado a arca ea trazido para a Europa. Em outras versées, ela foi parar na Etiépia —e, de fato, ainda hoje a Igreja Ortodoxa Etfope diz que tem a arca escondida em uma igreja na cidade de Axum. Pelo fim dos templérios, ou a arca no foi encontrada ou nao era to poderosa assim! NOVO MUNDO Essa nao é exatamente uma lenda medieval. Durante a perseguigo, os templérios teriam enfiado seus vastos tesouros em navios e partido para Oeste. Na Idade Média, dizia-se que o refigio secreto era a Escécia, onde acabariam por se aliar & guilda dos pedreiros locais e fundar a Maconaria ~ que gosta da relagao e ainda hoje ‘tem uma organizagao interna chamada “cavaleiros templarios’. No século 19, foi encontrada uma pedra em Westford, Estados Unidos, com um aparente desenho de um cavaleiro. Especulou- se ento que a viagem foi bem mais longa, chegando 8 América, antes de Colombo. Na vida real, eles realmente tiveram um papel: em Portugal, os templarios banidos formaram a Ordem Militar de Cristo, cujo simbolo era a enorme cruz vermelha exposta nas velas das caravelas portuguesas, e da qual eram membros Vasco da Gama, Pedro Alvares Cabral e Fernao de Magalhies, Existe a teoria de que o préprio Colombo poderia ser um navegador portugués — portanto, um templério indireto — disfargado. RUBIN HOOD, U MATAUUR Histérias medievais mostram um personagem mais bandido que heréi. odo dia primeiro de maio, celebra-se o “May Day” em varios pai- ses europeus, um ritual de entrada da primavera, que sobreviveu desde os tempos pagaos. Na Inglaterra, desde 0 século 14, esse ritual tem como personagem central Robin Hood, 0 Rei de Maio. Entao cantavam-se baladas contando seus feitos, e também en- cenavam-se pecas. Havia também concursos de tiro ao alvo com 0 arco. longo, a arma que se tornaria seu simbolo. Esse cultoa um fora da lei no passou despercebido, e chegou aentrar num julgamento na Cimara Estrelada, a corte superior da Inglaterra, em 1492. Mas o fato é que o personagem era popular demais para ser suprimido. E, na festa, procissdes com homens vestidos de verde, re- presentando Robin e seu bando, saiam para as vilas vizinhas, pedindo dinheiro para a igreja, que ajudava os miserveis locais. Tiravam dos ricos para dar aos pobres. Hoje, gragas a dezenas de filmes, todo mundo conhece a historia de Robin Hood: perseguido pelo rei Joao Sem Terra, o nobre Robin de Loxley se refugia na floresta de Sherwood, formando o bando dos “ho- mens alegres”, incluindo o gigante Little John e o pancudo e beberrio Frei Tuck. Eles roubam dos ricos — inclusive da Igreja — para dar aos pobres, e por isso contam com seu apoio. Robin tem romance com a nobre Lady Marian, sobrinha do rei Ricardo Coragao de Ledo, que esta nas Cruzadas. Apés muitas desventuras, o xerife de Nottingham acaba derrotado pelo bom ladro. Essa é uma colagem moderna de histérias escritas ao longo dos séculos, mas a maioria delas veio depois da Idade Média. A julgar pelas histérias mais antigas, o Robin medieval era uma figura bem menos inofensiva. CAVALEIROS E HEROIS Amais antiga balada conhecida, que data de 1450, é Robin Hood and the Monk. Nela, Robin deseja assistir a uma missa, apesar do perigo de ser visto na cidade. Era um grande devoto da Virgem Maria. Ele e Little John vao a Nottingham para visitar a igreja. No caminho, fazem uma aposta de tiro ao alvo, que Robin perde. Sem nenhum espi- rito esportivo, o lider omega uma briga, e eles se separam. Durante a missa, um mon- ge reconhece 0 ladrao, que o havia atacado antes, e avisa 0 xerife. Assim, Robin vai pre- so. O monge viaja até a capital para levar a noticia ao rei, acompanhado por um pajem, isto é, uma crianga servical. O bando de Ro- bin, liderado por Little John, intercepta os dois na estrada, e trucida sem ceriménia tanto o religioso quanto seu acompanhante. Levam a carta ao rei eles mesmos. Feliz com a noticia da captura, 0 monarca enche-os de presentes e manda-os de volta com outra carta, ordenando trazer o prisioneiro. Com isso em maos, eles conseguem entrar na priso para resgatar o Robin. Ainda assim, acabam matando um careereiro. Impres- sionado com a faganha, Robin declara que Little John deveria ser o chefe. Ele ele se re- cusa, ajoelhando-se humildemente diante do mestre. Ouvindo noticias de tamanha lealdade, o rei deixa passar o incidente. Na balada, como em varias outras dos sé- culos 15 e 16, nao hé nenhuma referéncia a tirar dosricos para daraos pobres. Também ainda nao haviam sido introduzidos Frei Tuck e Lady Marian, nem é dado nome ao rei. O que surgem sao temas bem medievais, como devoedo religiosa, lealdade e submis- sao aos superiores. Nos séculos 15 e 16, as histérias comegam a ser refinadas e Robin passa a confiar mais na astiicia que na vio- Iéncia, Ele nunea teria ganhado um filme da Disney se continuasse como era. CAVALEIROS E HEROIS Roubando dos Ficos. E era so Nos contos medievais, 6 extremamente cabeca-quente e violento, nao era nobre, nem tinha um interesse roméantico. © nome é irénico, pois tinha mais de 2 metros de altura, Segundo em comando, era menos bruto e mais inteligente ras historias antigas. O religioso que se junta aos rebeldes nem sempre foi gordo e fenfarréo; era as vezes retratado como um guerreiro competente e em forma. O filho do moleiro entra para o bando quando é pego cagando ilegalmente. E ele quem acaba matando o pajem 1na balada do monge. Sobrinho de Robin, retratado como o mais bem vestido e vaidoso. Longe de ser uma donzela indefesa, nas historia: medievais ela se junte a0 bando apés lutar com Robin MATERIAS CAPITULO2 MITOLOGIA NORDICA Os deuses escandinavos e bilticos eram to ferozes quanto seus povos. Thor chegou aser cultuado como um “anticristo”. POR VARIOS SECULOS, OS VIKINGS foram o terror dos desorganizados reinos cristios da Europa. Seus alvos preferidos eram os monastérios e igrejas, no s6 porquea resisténcia era pequena, mas também porque era onde achariam reliquias, célices, candelabros e imagens com detalhes, em ouro e pedras preciosas. 4 Nao era por menos. Em sua religido, mesmo as deusas, como Freyja, arainha das valquirias, portavam armas e partiam cranios. Sd ia para 0 paraiso quem morresse em combate. E os proprios deuses acabariam por matar uns aos outros, levando o mundo consigo. Era, enfim, uma fé tao ‘casea-grossa quanto eles proprios, e eles gostavam assim. Os vikings tomaram contato com o cristianismo primeiro por meio dos escravos — e escravas, que se tornavam esposas — capturados em suas incursées. Missiondrios foram enviados dos paises germanicos pro- ximos, mas eram recebidos com bocejos. Um Deus que vem ao mundo para aceitar ser morto ndo batia com o espirito viking. Dos séculos 8 10, aépoca desse contato, Thor era considerado orgulhosamenteo arquirri- val de Cristo. Seu emblema, o martelo Mjélnir, era usado como um pin- gente, imitando o erucifixo, para afirmar que o dono nao havia aceitado essa conversa de dar a outra face. Por volta do século 10, um a um, os reis vikings comegaram a se con- verter. Figuras como Haroldo Dente-Azul (935-985), rei da Dinamarca, passaram a professar a nova fé. As razdes eram puramente politicas: converter-se significava ganhar o apoio de outros reis cristios para lidar com os vizinhos. Levou mais de 200 anos até convencer os tiltimos che- fes, mas os vikings se tornaram nérdicos cristaos. Mas, em um lugar, a fé nos deuses resistia. No que ia da Alemanha até Finlandia, os bilticos mantinham sua erenea. Foi preciso mais de uma cruzada para dar fim ao politeismo. A Litudnia s6 se converteu em 1387. Nas proximas paginas, os tiltimos deuses europeus. + VIKING Do come¢o ao fim do Universo, de acordo com os mitos nérdicos. 3 Bruno Gtitin Matas ntes que o mundo dos homens fosse eriado, existia ao Nor- te uma terra de gelo (Nilfheim) e ao Sul uma terra de fogo (Muspelheim). Entre elas havia um grande vacuo, que rece- bia as Aguas congeladas despejadas de um lado e a lava in- candescente que escorria do outro. 0 calor derretia o gelo, e desse proceso surgiram ogigante Ymir e a vaca Audhumla. Do suor de Ymir nasceram outros gigantes, e em meio ao gelo que vinha do Sula vaca encontrou Buri, o primeiro dos deuses. Buri se casou e teve filhos, que por sua vez. também tiveram filhos, e seus netos receberam os nomes de Odin, Vili e Ve. Eles viveram em paz por um tempo, mas com o passar dos anos, con- forme a casta dos gigantes se tornava mais numerosa, os trés passaram a se sentir ameacados. Como as imensas criaturas se originavam de Ymir, eles chegaram a conclusao de que precisa- riam maté-lo, Somando suas forcas, os irmaos enfrentaram o gigante em uma disputa sanguinolenta. E houve mesmo muito sangue, tanto que a maioria dos gigantes morreu afogada nas pocas que se formaram no campo de batalha. 0 fim de Ymir foi também 0 inicio do mundo em que vivemos, criado por Odin, Vili e Vea partir de seus restos. A carne se tornou terra, os ossos se tornaram montanhas. Seus cabelos deram origem as plantas e As drvores, e os dentes foram triturados para formarem as rochas. Feito isso, os irmaos jogaram a cabega do gigante para cima: 0 cranio virou 0 eéu e os pedagos do cérebro, as nuvens. Enquanto Odin e seus irmaos realizavam esas tarefas, percebe- ram que havia muitos vermes procurando uma refeigao em meio a carne morta de Ymir. Como nao queriam que o seu trabalho cor- resse 0 risco de desmoronar, os trés transformaram esses vermes em andes e pediram que quatro deles segurassem 0 eéu. Cada um recebeu o nome de um ponto cardeal e foi enviado para uma das extremidades do firmamento, Assim foi criada Midgard, a Terra Média (qualquer semelhanga com 0 Senhor dos Anéis nao é mera coincidéncia— basta lembrar que a mitologia viking também esta cheia de elfos e andes — veja mais na pagina 60). Algum tempo mais tarde, Odin saiu para caminhar acompa- nhado por outros dois deuses. Na beira da praia, eles encontra- ram dois troncos de arvore sem vida: um era de freixo, 0 outro de olmeiro. Os trés deuses decidiram converté-los em seres vivos, ¢ assim surgiu primeiro casal de seres humanos. Eles foram en- viados para viver na Terra Média, e desde entio aquele se tornou o mundo dos homens. RELIGIAO FATALISTA Todos os mundos da mitologia viking eram abrigados por Ygg- drasil, uma arvore gigantesca que servia como eixo do universo (veja mais na pagina 31). Midgard, a Terra Média, estava situada em seu tronco, enquanto os galhos mais altos eram reservados a0 mundo dos deuses; os demais mundos fieavam proximos as raizes. Aimensa arvore era regada pelas Nornes, as Senhoras do Destino, que também eram responsaveis por determinar tudo 0 que j havia acontecido ou viria a acontecer. As trés damas nao eram subordinadas a ninguém, e tomavam suas decisdes a partir de seus caprichos. Em toda a mitologia nérdica, nao hé nenhuma criatura cujo poder se equipare ao delas. ‘As Nornes tém uma importaneia simbélica muito grande, pois revelam a maneira como os vikings encaravam sua existéncia, Se nao temiam a morte, era porque acreditavam que a sua his- MITOLOGIA NORDICA Deuses do fim Figuras principais do Ragnarok. Filha de Loki, tinha metade da face normal, metade escura e decomposta. Era responsavel pelo inferno infeliz, daqueles que morriam fora de combate. Nem mesmo os deuses eram imunes a0 seu dominio: no “apocalipse”, o proprio Baldur, assassinado, foi parar em sua morada. Hel, Fenrir, a vitima Baldur, eo proprio Loki Outro fho monstruoso de Loki, era um lobo gigantesco, mas dotado de razio e fala. Os deuses sabiam desde sempre que ele estava destinado a destruir Odin, Ainda assim, ele foi criado entre eles. Tyr ra 0 Gnico deus que tinha coragem de se aproximar dele. Por isso, acabou tendo sua mio devorada, MITOLOGIA NORDICA Deuses do fim Figuras principais do Ragnarok. Extremamente justo e pacifico, era a divindade da justic¢a e da sabedoria. Com sua simpatia e atitude pacifica, tornou-se um dos deuses mais populares do pantedo viking. Isso acabou por despertar a ira de Loki, que matou-o com uma flechada no cora¢ao. Aparte mais bizarra dos mitos sobre o deus da trapaga é a que trata de seus filhos. Além de Hel, Fenrir e a serpente Jormungand, também era pai do cavalo de Odin, Sleipnir, que tinha oito patas. Qu melhor, mae: ele o concebeu quando se transformou em uma gua e cruzou com o cavalo Svaldifari. ‘A.grande serpente Jormungand era destinada a acabar ‘coma vida de Thor. téria ja havia sido escrita antes mesmo do nas- cimento. Em parte, também era essa a razio de deixarem tantas vitimas por onde passavam: a morte de um inimigo nao era vista como a apli- cacao de um castigo, mas como a consolidacdo de um destino que nao poderia ter qualquer ou- tro desfecho. Assim como os homens, os deuses também ti- nham suas vidas e mortes determinadas pelas Nornes. A diferenga é que, dada a sua condicao divina, os moradores de Asgard jé conheciam © seu destino final, e saberiam reconhecer os pressigios quando eles viessem. Talvez por isso, os vikings contavam a histéria da morte dos deuses — o Ragnardk — como se ela ja ti- vesse ocorrido, mesmo se tratando de um relato profético, O fim de tudo era, do ponto de vista deles, to inevitavel quanto o passado. A MORTE DOS DEUSES primeiro sinal de que o fim se aproximava surgi quando Loki assassinou Baldur. A morte de um deus pela mao de outro era delito grave, e Loki foi condenado a cumprir pena em um dos mundos inferiores. Ciente do que estava por vir, Odin selecionou os melhores guerreiros hu- manos que encontrou e comegou a prepara-los, para a batalha final, embora soubesse que ndo Uinha chanees de sair vitorioso. Pouco tempo depois, Midgard mergulhou no caos. Um inverno muito rigido se estendeu por trés anos e tornou inviavel a vida dos humanos, que enlouqueceram e se viraram uns contra os outros, Sabendo disso, Loki conseguiu se liber- tar de sua prisio e, ao lado do terrivel lobo Fen- rir, um de seus filhos, comecou a marchar em direcao ao enfrentamento final. Na mesma épo- a, Odin foi informado por Heimdalll,o guardiao da morada dos deuses, de que um exército de gigantes se dirigia até la a bordo do Naglfar, a barca dos mortos — um navio construido ape- nas com as unhas de todas as criaturas que ja haviam perecido nos nove mundos. O Universo Viking Amitologia jomposta por nove Tmundoe META e nosound chamado assim justamente por estar loca- lizado no centro de todos. Acimadela estava Asgard, a morada dos deuses, onde ficava Valhalla, asala dos heréis. Quem morresse om combate ia para Asgard. Quem fosse vitima de doengas, velhice ou acidentes ia para Helheim, o mais proximo de inferno que eles tinham. O dia deixou de raiar, pois as earruagens que levavam os deuses do Sol e da Lua pelo céu em sua rotina didria haviam sido ata- cadas por lobos, e seus ocupantes foram devorados. Enquanto isso, Loki e o lobo seguiram para Asgard destruindo tudo o que encontravam pelo caminho. Juntou-se & dupla o outro filho de Loki, Jormungand, uma serpente imensa que vivia no fundo do mar. Ao emergir para encontra-los, ela provocou terremotos e ondas colossais, que destruiram 0 pouco que ainda restava do mundo dos homens. Chegado o momento da batalha, os deuses deixaram Asgard e lutaram com bravura mesmo sabendo que a derrota era inevité- vel. Thor conseguiu vencer a grande serpente, mas morreu em seguida por efeito do seu veneno. Odin foi dilacerado pelo lobo Fenrir, mas foi logo vingado por um de seus descendentes. Loki e Heimdall se enfrentaram até a morte, e ambos pereceram devido aos ferimentos. Por todo o campo de batalha, os guerreiros huma- nos lutaram contra os gigantes de igual para igual, mas nem isso foi o suficiente. Apés os deuses terem sido derrotados, o mundo afundou em um mar escuro e tudo passou a ser apenas escuridao esiléncio, como era o vacuo anterior A criagio de Midgard. Mas 0 fim do mundo nao seria definitivo, Muitas eras mais tar- de, Baldur voltaria do reino dos mortos e, ajudado pelos filhos de Odin, construiria um mundo ainda mais bonito e fértil do que aquele em que viviam os vikings. Assim eomo ocorre nos ciclos da natureza, a morte aparece no Ragnarék como uma possibi- lidade de renovacao: algo constante nesse universo mitolégico, onde o fim também é sempre um recomego. + YGGDRASIL Aarvore do 4 Universo,e seus im) diversos mundos 4 "5 PONTE DO ARCO-IRIS Liga Asgard) 20 submundo Terra dos aesir, ee 0s deuses maiores, ee paraiso dos guerreiros ee ALFHEIM Terra dos ofc MMUSPELHEIM Terra do fogo ‘MIDGARD Nosso mundo : SVARTALFHEIM Terra dos elfos ANAHEIM Terra dos vanir, deuses da natureza JOTUNHEIM Terra dos gigantes HELHEIM Terra dos mortos NIFLHEIN Terra dos andes SAGAS VIKINGS Os livros épicos dos grandes herdis. runt ats sagas (“histérias” em islandés) sio a principal fonte dos mitos vikings. Produzidas entre os séculos 12 e 14, nada mais so do que transcrigdes daquilo que ja circulava havia muito na tradigdo oral escandinava. Ironicamente, elas s6 sobreviveram gracas aos monges cristaos que estudavam a cultura nérdica— os mesmos que provocaram o fim dos cultos pagaos em paises como Islandia, Di- namarea e Suécia, mas também os tnicos capazes de transcrever es- sas historias, por serem dos poucos que sabiam escrever. Existem duas obras que retinem as principais sagas da mitologia viking: a Zdda em prosa ea Edda pottica, ambas escritas por volta de 1200. Algumas sagas sio historicas, como a Saga dos Groenlandeses, que descreve a descoberta acidental da América pelos vikings. Outras so mitolégicas, como a que contaa historia de Jormungand, o filho de Loki que tinha a forma de uma serpente (suas crias eram todas monstruo- sas). Ciente de que ele representava uma ameaga, Odin arremessou-o nas profundezas do mar que cireundava o planeta. No inicio, ele tinha as dimensdes de uma cobra normal. Devorava peixes cada vez maiores ¢, quando esses ja nao satisfaziam sua fome, passou a engolir cardumes inteiros. Sua forga era tamanha que chegou a enfrentar Thor durante uma pescaria, e o deus perdeu seu poderoso martelo. Quanto mais o tempo passava, mais a serpente crescia, até o dia em que encontrou nas profundezas do oceano um imenso animal escuro. Jormungand nao pensou duas vezes e atacou o animal com toda a sua forea, mas, ao mordé-lo, sentiu uma dor lancinante. Entao ele percebeu que havia encontrado a prépria cauda: seu corpo crescera tanto que agora dava uma volta a0 mundo. Depois desse episédio, ele mergulhou em um sono profundo, do qual sé sairia no fim do mundo. A saga inglesa ‘Uma das mais famosas historias vikings foi escrita longe de suas terras. 0 poema épico Beowulf foi composto em algum momento entre 700 e 1000, na Inglaterra dos anglo-saxées, que tinham uma cultura aparentada a dos vikings, mas entio ja haviam se convertido. A historia se passa na Eseandinavia. O heréi homénimo éconvocado pelo rei da Dinamarea para salvi-lo dogigante Grendel. Beowulf resove a situacao com os préprios punhos. Ea mie do monstro quem acaba dando trabalho. Imune a todas as armas, ela quase acaba com o hersi, até ele encontrar umaespada magica a qual ela era vulneravel. 0 heréi acaba decapitandoa bruxae, de quebra, Grendel, que havia ressuscitado em meio Aluta. DEUSES BALTIC As divindades mais resistentes da Europa. o século 13, ap6s a conversio dos vikings, 0 ultimo trecho da Europa a nao dobrar os joelhos a Cristo era a regio do Mar Baltico, numa faixa que ia da atual Alemanha atéa Finlandia. Sua mitologia tinha alguns aspectos em comum com a dos vizinhos nérdicos, como Perkunas, espécie de Thor balti- co. Esses povos viviam de forma tribal, sem alfabeto, organizacao militar ou fortificages — alvos faceis, enfim, para a agressio dos poloneses, russos, alemaes e até mesmo os nérdicos recém-convel tidos, para quem a ideia de “cruzada’ significava entrar nos barcos longos e saquear os pagios, como nos velhos bons tempos viking: A partir de 1193 e por quase 200 anos, varias guerras santas foram convocadas contra os politeistas, sob 0 comando dos Cavaleiros Teuténicos, que usavam elmos com chifres, parecendo demdnios que lutavam por Cristo. Os barbaros nao tiveram a menor chance. Exceto por um grupo deles: 0s lituanos, que passaram a conquistar e unificar os vizinhos, formando o grao-ducado da Lituania, o ultimo pais politeista da Europa. Sé foram se converter em 1387, ap6s 0 casamento do grao- -duque Jogaila com a rainha Edviges da Pol6nia. Confira ao lado os principais deuses dos bravos e teimosos lituanos, que tinham correspondentes entre os povos vizinhos. E que explieam por que eles foram tao resistentes em abandoné-los. \ Perkunas parecia ‘comuma versio mais velha de Thor. PERKUNAS Deus do trovaéo COP Cee occu) Peete eet) Bee eed Recon ee ca ae) Dee ee eed Coreen machados e flechas — 0 raios eee nd inimigo, Velnias. Na Terta, ele Ce eee CT ee an sagradas. Na tentativa de Cee ed eee Ce ee ed cortar essas drvores e provar ery Cee ane Pe eee Pee ee nee ete DIEVAS Deus da criagdo Chefao dos deuses, era o responsavel pela criagao. Um dia, Dievas encontrou uma criatura que nao se lembrava de haver inventado. O deus perguntou de onde havia vindo, mas ela nao sabia responder. Entao ele se lembrou que havia cuspido no chao, e o resultado estava la: a humanidade, cuspida e escarrada. Outra versio do mito dizia que Dievas estava lavando 0 rosto e uma gota espirrou para longe. Curiosamente, o maior dos deuses estava aposentado: nao havia altares para Dievas, pois os lituanos acreditavam que ele nao intervinha mais no mundo ZEMYNA Deusa da terra Esposa de Perkunas, representava a fertilidade do solo, que era obtida com as chuvas mandadas pelo marido. Assim, todas as coisas vivas eram nutridas por ela. Era uma das mais populares divindades lituanas, chamada frequentemente por diminutivos, de forma carinhosa. Os agricultores costumavam beijar 0 chao enquanto faziam rezas para Zemyna, Era relembrada tanto em casamentos, por associacéo a fertilidade, quanto em funerais, ja que todo mundo volta para a terra um dia. VELNIAS 0 Diabo Enquanto Perkunas vivia nos céus e representava tudo 0 que havia de bom e nobre nos deuses, Velnias se escondia no subsolo, embaixo de pedras, tentando fugir dos raios disparados por seu adversario. Tentava levar os humanos para o mau caminho, enganando-os com promessas de riqueza, beleza ou poder. Muitos aceitavam fazer um pacto com Velnias, geralmente para ver suas intengées voltadas contra eles. SAULE E MENUO OSoleaLua Para os lituanos, assim como para os vikings, © Sol era mulher e a Lua, homem. Eram um casal problematico. Menuo, a Lua, era infiel, e se apaixonou por Ausrine, a Estrela da Manhé — o planeta Vénus. Ausrine era filha de Saule, de outro casamento. Como castigo, Perkunas retalhou Menuo com seu machado, mas ele acabava sempre esquecendo a licdo e se recuperava todo més, para ser cortado novamente. Dai vinham as fases da Lua. O casal acabou divorciado, mas ambos insistiam em ver sua filha, Zemyna, a Terra. Ambos faziam isso em suas carruagens — a dela, puxada por cavalos dourados, a dele, por cinzas. Menuo, alias, € preguicoso e as vezes nao aparece. Essas so as noites de lua nova. LAIMA, KARTA E DEKLA Deusas do destino O triunvirato de irmas, as vezes chamadas de “as Laimas”, decidia o destino dos seres humanos, desde a gestacao até a morte. Laima cuidava dos fetos, Dekla das criangas, e Karta dos adultos. Quando um nascimento estava por ocorrer, as trés faziam previsdes sobre o destino da crianga, mas Laima tinha a palavra final, € ‘era também quem decidia sobre a data de morte. Por isso, era a mais popular das trés. © trio de deusas, assim como a bondosa Zemyna, era visto como o combustivel para a ferocidade lituana nas batalhas. Por isso, seu politeismo resistiu tanto, de forma similar a0 que ocorria com os vikings e sua mitologia. A religido dos lituanos era fatalista: como seu destino, assim como 0s dos inimigos, ja estava tracado, eles se entregavam 4 batalha sem temor. MATERIAS CAPITULO 05 SEGREDOS DO CRISTIANISMO Como os mitos do tempo dos deuses sobreviveram. AERA DOS DEUSES ACABOU oficialmente em 391, quando o imperador Teodosiano tornou o cristianismo a religido oficial do Império Romano. Isso aconteceu menos de cem anos apés a conversao doimperador Cons- tantino, em 312. Maso passado deixou mareas. Durante a transigao —enovamente apos a queda do Império, quando os germanicos, eslavos e nérdicos também foram convertidos — os padres tiveram de fazer varias concessoes Ais tra- digdes do povo. Comega pelo proprio Natal. A decisaodecomemora-loem 25 de dezembro foi para abafar a Saturndlia e o dia do Sol Invietus, festas de fim de ano nas quais as pessoas faziam banquetes, trocavam presen- tes e até mesmo cartdes assinados. A religiio mudou, a festa continuoua mesma. Azevinho e visco — a frutinha vermelha e os ramos natalinos — adornavam o fim de ano dos celtas muito antes do cristianismo. Se o Natal manteve um pezinho no politeismo, a Pscoa ainda esta de corpo inteiro, Em culturas de toda a Europa, o equinécio de primavera era celebrado com rituais a fertilidade. Dai vém os ovos, simbolos dbvios para areprodugdo. Em varias linguas, 0 feriado é chamado por variagoes donome Eostre, a deusa da fertilidade germanica, representada por um coelho — como o inglés Easter ou o alemao Ostern. Em alguns lugares, até o sentido erético foi preservado: ainda hoje, na Republica Teheca e Eslovaquia, durantea Pascoa, homens saem armados com um chicotede ramos trangados para dar com ele no traseiro das mogas. f assim desde os tempos dos velhos deuses eslavos. & desse cristianismo impuro, onde o passado e seus deuses continua- vam a ressonar por baixo de uma pesadae sincera camada de monoteis- mo, que brotou toda a riqueza da mitologia medieval. + Constantino, o primeiro imperador cristo, ro perseguiu os poltetstas. RELIQUIAS PARA TODU LADO Do prepiicio de Cristo a ossos de dragiio, o que nao faltou na Idade Média foram preciosidades falsas. urantea [dade Média, um negécio inusitado encheuobolso dos viajantes, reais ou alegados, que retornavam da Terra Santa: odetraquitanaseparteshumanas, queteriamsupos- tamenteum diapertencidoamartires, santosou-esseerao “santo graal” do negécio - do proprio Jesus. A esses ob- jetos eram atribuidos poderes milagrosos, capazes de curar peste bubéniea, dar corpo fechado na guerra, ou boa sorte nos negécios. Mesmo quando as reliquias eram falsas (ou seja, sem- pre), as igrejas faziam um bom negécio ao compri-las, porque se tornavam pontos de peregrinacao. Abaixo, as reliquias mais curiosas, famosas ou simplesmente bizarras. ¢ GE> OS SEGREDOS DO CRISTIANISMO (4]2 > SAGRADO PREPUCIO Como Jesus ascendeu aos céus de corpo inteiro, a Gnica parte que haveria ficado na Terra é a que foi tirada dele com cito dias de vida, conforme o ritual judaico: a pele do pénis. Até 18 candidatos a Sagrado Prepicio circu laram de mao em mio na Idade Média, Roma guarda um deles, que foi dado a0 papa pelo imperador Carlos Magno, no ano 800. O monarca afirmou que foi dado por um anjo. Imagens jorravam leite milagroso. my aoe LEITE DA VIRGEM No século 12, S30, Bernardo de Claraval, um dos idedlogos das Cruzadas, sofreu um milagre inusitado: ao rezar perto de uma imagem da Virgem Maria, ganhou um imagers esguicho delete em sua agers boca. Depois do evento, se milagroso. tornou facil achar o “leite da virgem” em qualquer empério, para curar todo tipo de doenga, incluindo peste bubsnica, ou dar poderes sobre- naturais 20 usuario. SUDARIO DE TURIM O tecido mais controver: so do mundo chegou a Turim em 1453, apés ter passado mais de um século com a familia do cavaleiro Geoffroi de Charny, que © obteve numa peregrina gio. Testes com carbono 14 indicam que nao é mais velho que 1260, mas isso s6 aumenta 0 mistério. Como ele é anatomica- mente correto, é possivel que alguém tenha sido crucificado de verdade para fabricé-lo, Imagens jorravam leite milagroso. LANGA DO DESTINO Dizia-se que quem possu: isse a langa com que Jesus foi perfurado poderia controlar 0 mundo. Nas co- roagbes do Sacro Império Romano Germénico, era usada a mais famosa, mas essa nio teria sido exata- mente a lanca de Cristo, ‘mas uma que teria sido forjada com um prego da cruz. A “verdadeira” Langa do Destino pode ser a que est na Basilica de Sao Pe- dro, em Roma. Ou também em Echmiadzin, Arménia. Imagens jorravam leite milagroso. my aoe SAGRADO CHINELO As sandilias de Jesus foram dadas ao rei franco Pepino, o Breve, como agradecimento pela cessio de territérios para a criag3o dos Estados Pa- pais, em 754, e ainda hoje Imagens esto na Abadia de Prim, jorevem leite na Alemanha. O calcado mrilagroso. em verdade foi feito um ou dois séculos antes, e usado por papas. O que teria tocado os pés de Jesus séo algumas tiras de couro que foram usadas em sua fabricagio. SANTO GRAAL Com tanta gente procu rando, uma hora alguém diria ter achado. Mesmo na época em que as lendas foram escritas, muitas igrejas ja diziam ter o Graal. No total, existem mais de 200 candidatos a Calice Sagrado espalha- dos pela Europa. Os mais plausiveis so 0 Santo Calis naa catedral de Valéncia e 0 Calice de Dofia Urraca, na Basilica de So Isidor. Am. bos foram possivelmente feitos na época de Jesus. Imagens jorravam leite milagroso. ossos DE DRAGAO S30 Jorge nao foi o Gnico a matar drages. S50 Donato também teria feito isso, ea prova esta ra catedral que leva seu nome, em Veneza, onde grandes ossos ainda ador nam o altar. A catedral de Wawel, na Polénia, também guarda o que te ria restado do dragao que assombrou a colina onde foi construida. Ambos, cultuados na Idade Média, so provavelmente ossos de mamute ou baleia. Imagens jorravam leite milagroso. MO JORGE MTU UM Ele pode nunca ter existido, mas seu mito dominou a Idade Média. * Yara nglaterra, Portugal, Etidpia, Malta, Eslovénia, Lituania, Grécia, Ge- orgia, Sérvia, Palestina. Moscou, Londres, Beirute. Escoteiros, sol- dados, ciganos e leprosos. Essa ¢ so uma lista parcial de lugares e pessoas que tém So Jorge como padroeiro. Num culto que teve seu auge na Idade Média, ele é um dos santos mais populares do mundo, Afinal, Jorge deu a vida em nome do cristianismo. Duelou com um dragio para salvar uma princesa ainda donzela e libertar toda uma vila. Montado em seu cavalo branco, tornou-se exemplo de coragem, fé, resis- ténciae, principalmente, das virtudes da cavalaria. E possivelmente nao existiu. A vida de Jorge da Capadécia é uma mistura tao forte de mitose lendas que ¢ dificil achar qualquer dado histérico. Mas isso nao importa realmente para seus devotos, menos ainda na Idade Média, A tradigao conta que ele nasceu na Capadécia, atual Turquia, filho de um oficial grego do exéreito romano. Criado no cristianismo, seguiu para a Palestina com a mae apés a morte de seu pai. Depois foi para Nico- media (atual Turquia) onde entrou para o exéreito, prestando servigos a Diocleciano, imperador de Roma. Foi um militar dedicado — essa éa fase das aventuras — até descobrir as perseguiges e atrocidades contra cristios, que olevaram a renunciar A carreira militar. Por isso, foi punido brutalmente: espetado com laneas, colocado sob uma pedra gigante eem uma roda feita com facas de dois gumes. Por fim, jogado dentro de um caldeirao com chumbo derretido. GIT2> os\gecREDOS DO CRISTIANISMO Batalha épica: o dragdo ‘ea drama aumentaram como tempo, Nao apenas sobreviveu milagrosamente, como se recusou a negara Cristo. De dentro da cela, realizou diversos milagres. A mulher de Dio- cleciano ficou tao impressionada que acabou convertida — o que s0 te- ria aumentado a fiiria do imperador. Para tentar deter a impertinéncia crista, Diocleciano mandou que seus homens 0 arrastassem pela cidade e Ihe cortassem a cabeca em praca publica. E assim foi feito, em 23 de abril de 303. £ umahistéria inspiradora, masa verdade é que Sao Jorge sé se tornaria popular séculos depois. Seu culto era principalmente entre os eristdos ortodoxos, do Oriente. Em Lydda, nos arredores de Tel Aviy, Israel, fica que é considerada a tumba do martir. Durante a Primeira Cruzada, cavaleiros tiveram uma visio dele duran- te aBatalha de Antioquia, na Turquia, em 1098. A partir de entio, ele pas- souaser invocado para protecao contra os muculmanos, e suas faganhas se espalharam rapidamente por toda a Europa. DURANTE AS CRUZADAS, CAVALEIROS TIVERAM UMA VISAO DE SAO JORGE. A PARTIR DAI, ELE PASSOU A SER INVOCADO COMO PROTECAO CONTRA OS ISLAMICOS. MOUROS E DRAGOES Com os cavaleiros, a lenda literalmente criou asas (e passou a cuspir fogo). Na época em que o Sao Jorge histérico teria vivido, nem havia cava- leiros. A cavalaria romana desempenhava um papel auxiliar, nao a parte principal da forga, como na Idade Média, Era dominada por patricios, os bem-nascidos. Um cristdo pobre dificilmente poderia ser um deles. Mas os cruzados decidiram que o velho martir era um cavaleiro como eles, e assim ele passou a ser lembrado pelos séculos. “A importancia das lendas de Sao Jorge advém da seriedade do culto que Ihe foi prestado, sobretudo como guerreiro protetor de exércitos. Varias nagSes cristds na Idade Média 0 adotaram como padroeiro, em particular osingleses”, conta Joao Lupi, historiador das religides da Uni- versidade Federal de Santa Catarina. Afinal, a bandeira da Inglaterra — nao confundir com a bandeira do Reino Unido — é formada pela cruz

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