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Absorção de amônio e nitrato por plântulas de arroz e milho e seus efeitos sobre o pH da solução

externa: uma proposta de aula prática

Marcel Giovanni Costa FRANÇA(1), Andréia Loureiro dos Reis TEODORO(1), Vanessa Santana
CAETANO(1), Susana Costa REIS(1), Leonardo Oliveira MÉDICI(1), Sérgio Araújo FIGUEIREDO(1), Lázaro
Eustáquio Pereira PERES(2) e Nidia MAJEROWICZ(1)
(1)
Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ), Seropédica, RJ-Brasil, CEP:23851-970. E-Mail:
nidia@ufrrj.br. (2) Departamento de Ciências Biológicas, Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiróz
(ESALQ-USP), SP -Brasil, CEP:13418-900

Introdução
O aprendizado de muitos conceitos básicos da fisiologia vegetal exige a observação e a vivência de um
conjunto selecionado de experimentos, fenômenos biológicos e físico-químicos (Majerowicz et al. 2001).
Amônio (NH4+) e nitrato (NO3-) são as principais fontes de nitrogênio (N) mineral para as plantas. Para
atender à demanda de N, a absorção em grandes quantidades pelas raízes, tende a alterar o equilíbrio
eletroquímico e o pH intracelular, exigindo intenso gasto de energia metabólica. Estima -se que cerca de 70%
dos íons absorvidos sejam representados por (NH4+) ou (NO3-). Portanto, estes íons desempenham um
papel chave no balanço entre cátions (C+) e ânions (A-) nas células vegetais (Marschner, 1995). O contínuo
bombeamento de H+ pelas H+-ATPases é essencial para a manutenção do potencial de membrana e do pH
intracelular, para o transporte ativo de íons e para o crescimento do sistema radicular (von Wirèn et al. 1997).
As H+-ATPases, ao gerarem e manterem os gradientes de potencial eletroquímico entre as células e o meio,
assumem um papel central na aquisição de nutrientes pelas células vegetais (Fernandes e Rossiello, 1995).
Após a absorção de um excesso de cátions (C+), na forma de K+ ou NH4+, as células restabelecem o
equilíbrio eletroquímico aumentando a extrusão de H+ (Marschner, 1995). De modo inverso, a absorção de
uma grande quantidade de cargas negativas (NO3-) tende a ser realizada em simporte com H+ (transporte
ativo secundário). Assim, dependendo da composição iônica e do metabolismo vegetal, haverá acidificação ou
alcalinização da rizosfera. A aula prática sugerida tem como objetivos específicos: 1) demonstrar o impacto
da absorção preferencial de um C+ (NH4+) e de um A- (NO3-) sobre o pH da solução externa; 2)
evidenciar a importância das bombas de prótons (H+-ATPases) para a aquisição de nutrientes pelas plantas;
3) estimar a magnitude do efluxo e influxo líquido de H+ em resposta à intensa absorção de C+ ou A-.

Material e Métodos
O arroz (Oryza sativa) e o milho (Zea mays) foram as espécies selecionadas. O arroz, adaptado a ambientes
alagados, utiliza preferencialmente o NH4+ e pode ser facilmente cultivado em hidroponia. O milho absorve
intensamente o NO3-, mas exige um adequado sistema de aeração das raízes em meio hidropônico (4
horas/dia). Os experimentos utilizam plântulas das duas espécies com oito dias de idade. As sementes são
desinfestadas com hipoclorito de sódio 10% durante 20 minutos e lavadas com água destilada. Durante os
primeiros 4 dias, as plântulas são mantidas em papel umedecido para germinação. Experimento 1 : Efeito da
absorção de NH4+ sobre o pH da solução externa: No 5o dia após a embebição, plântulas de arroz, são
colocas em esponjas (suporte) e transferidas para caixas gerbox ou bandejas contendo CaCl2 0,1 mM. Em
cada esponja, com cerca de 4 cm de diâmetro, são fixadas 20 plântulas (Figura 1). Esta operação é realizada
introduzindo-se cada coleoptile na ponta de uma pipeta Pasteur previamente inserida na esponja. No dia
seguinte, a solução externa é substituída por (NH4)2SO4 0,1 mM. No dia da aula (8o dia), as esponjas
contendo as plântulas são transferidas para bequeres de 50 mL contendo 30 mL de (NH4)2SO4 5 mM com
pH 5,8. As medições do pH da solução externa são realizadas a cada 20 minutos, durante uma hora.
Experimento 2: Efeito da absorção de NO3- sobre o pH da solução externa: No 5o dia após a
embebição, 10 plântulas de milho são fixadas em discos de isopor com diâmetro suficiente para garantir o
encaixe destes nas paredes do recipiente contendo 200 mL de CaCl2 0,1 mM (são utilizadas garrafas pet
cortadas com capacidade máxima de 400 mL, recobertas com papel alumínio). No dia seguinte, a solução de
CaCl2 0,1 mM é substituída por solução de Ca(NO3)2 0,1 mM. Ao mesmo tempo, alguns discos de isopor,
contendo plântulas de milho, são mantidos em CaCl2 0,1 mM. No dia da aula (8o dia), as soluções dos pré-
tratamentos Ca(NO3)2 0,1 mM e CaCl2 0,1 mM são substituída s por solução de Ca(NO3)2 5 mM com pH
ajustado para 5,8. As medições do pH da solução podem ser feitas a cada 60 minutos após a primeira leitura
aos 20 minutos.

Resultados
A rápida acidificação da solução externa evidenciou que as plântulas de arroz absorveram intensamente o
NH4+ (Figura 2a). A absorção de NO3- pelas plântulas de milho acidificou a solução externa durante os
primeiros 60 minutos, tendo sido mais intensa nas plântulas previamente tratadas com 0,1 mM de NO3-
(Figura 2b). Entre 60 e 180 minutos, entretanto, a absorção de NO3- alcalinizou a solução externa. Para
comparação da concentração de [H+] entre tratamentos converte-se os valores de pH em [H+] (pH = -log
[H+] ou [H+] = 10-pH). A variação da [H+] pode ser utilizada para calcular os valores de influxo (IH+) e
efluxo (EH+) de H+ através da subtração entre valores iniciais e finais da [H+] em cada intervalo de tempo.
Valores positivos mostram efluxo e valores negativos influxo celular de H+ (Tabela 1). Nas plantas supridas
com NO3-, a velocidade de alcalinização foi máxima entre 60 e 120 minutos e nas supridas com NH4+ a taxa
de acidificação foi máxima entre 20 e 40 minutos. Ao longo do experimento, o influxo de H+ em plântulas de
milho foi mais intenso nas plantas pré-tratadas com NO3- 0,1 mM do que nas pré-tratadas com CaCl2 0,1
mM (Tabela 1).

Discussão
A absorção preferencial de NH4+ ou de NO3- afetou fortemente o pH das soluções experimentais. A
absorção de NH4+ foi acompanhada de extrusão de H+ para o meio externo, contribuindo para a
manutenção do potencial eletroquímico transmembrana e do pH intracelular. O desequilíbrio na absorção
relativa de cátions e ânions tende a alterar o pH intracelular. A estabilização do pH citossólico envolve dois
tipos de controle: - um biofísico, caracterizado por trocas de H+ através da plasmalema e tonoplasto
(atividade das H+-ATPases), e outro bioquímico, envolvendo a produção ou consumo de H+ (Marschner,
1995). A acidificação inicial da solução externa, observada pelas plantas supridas com NO3-, pode estar
associada à ativação de H+-ATPases com a conseqüente ampliação do gradiente de potencial eletroquímico
transmembrana. Estudos eletrofisiológicos em cevada e milho indicaram que o transporte de NO3- ocorre em
simporte com 2H+ (von Wirèn et al. 1997). Sasakawa e Yamamoto (1978) observaram que a absorção de
NO3- por plântulas de arroz apresentava uma fase lag de 1 hora, seguida de uma fase de rápida absorção. O
maior influxo de H+ nas plantas pré-tratadas com NO3- (0,1 mM) sugere a indução de novos transportadores
específicos (von Wirèn et al. 1997).

Conclusões
Em 40 minutos, através de um experimento simples e de baixo custo, é possível demonstrar aos estudantes
que a absorção de NH4+, por plântulas de arroz, é acompanhada por acentuada acidificação da solução. No
caso da absorção de NO3-, são necessárias 2-3 h para que haja uma expressiva alcalinização do pH da
solução externa. Esta prática motiva a discussão sobre a importância das H+-ATPases para a absorção de
íons e manutenção da homeostase celular.

Bibliografia
Fernandes, M.S. e Rossiello, R.O.P. (1995). Critical Reviews in Plant Sciences 14:111-148.
Majerowicz N. et al. (2001). Fisiologia Vegetal – Curso Teórico-Prático. UFRRJ. 106p.
Marschner H. (1995) Mineral Nutrition of Higher Plants. Academic Press, San Diego, 889 p.
Sasakawa, H e Yamamoto, Y. (1978) Plant Physiol. 62:665-669.
von Wirèn et al. (1997) Plant and Soil 196 : 191-199.
Figura 1. Esquema experimental para medidas de pH

6 7
A B
NH4 →NH4
+ +
NO3 -→NO 3-
5 6 Ca2+ →NO3 -
pH
pH

4 5

3 4
0 20 40 60 80 0 60 120 180 240
Tempo (minutos) Tempo (minutos)

Figura 2. Variação do pH das soluções experimentais em função do tempo, da fonte de N e da espécie


vegetal: (A) NH 4+ /arroz e, (B) NO 3 -/milho

Tabela 1. Valores de efluxo (EH +) ou influxo (IH+ ) de H+ das células de raízes nos tratamentos
NH4 + /arroz ou NO3-/milho. E H+ ou IH + = [H+]final – [H+ ] inicial, em cada intervalo de tempo.

(EH+) ou (I H+ ) entre os intervalos de tempo (minutos)


-
NO 3 /milho 60-0 120-60 180-120 240-180
CaCl -> Ca(NO3)2 8,4 -8 -1,2 -0,5
NO3- -> Ca(NO3)2 14 -8,1 -4,7 -2,2
(EH+ ) entre os intervalos de tempo (minutos)
NH4+ /arroz 20-0 40-20 60-40 80-60
+
NH4 -> (NH4)2SO4 13,4 143 42 51

Todos os resultados nas Figura 1A e 1B e na Tabela 1 podem ser facilmente reproduzidos desde que
observado aproximadamente o número de plantas e o intervalo de tempo requerido.
Absorção de amônio e nitrato por plântulas de arroz e milho e seus efeitos sobre o pH da solução externa:
uma proposta de aula prática

Marcel Giovanni Costa FRANÇA(1), Andréia Loureiro dos Reis TEODORO(1), Vanessa Santana
CAETANO(1), Suzana Costa REIS(1), Leonardo Oliveira MÉDICI(1), Sérgio Araújo FIGUEIREDO(1),
Lázaro Eustáquio Pereira PERES(2) e Nidia MAJEROWICZ(1)

(1) Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ), Seropédica, RJ-Brasil, CEP:23851-970. E-Mail:
nidia@ufrrj.br. (2) Departamento de Ciências Biológicas, Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiróz
(ESALQ–USP), SP-Brasil, CEP:13418-900

A aula prática proposta objetiva demonstrar o impacto da absorção preferencial de NH4+ ou de NO3- sobre
o pH do meio e evidenciar a importância das bombas de H+ (H+-ATPases) para aquisição de nutrientes.
Plântulas de arroz e de milho são mantidas em CaCl2 0,1mM até 6o dia pós-germinação, transferidas para
pré-tratamentos (NH4)2SO4 (arroz); Ca(NO3)2 ou CaCl2 (milho), todos a 0,1mM. No momento da aula
prática (8o dia) plântulas de arroz são transferidas para (NH4)2SO4 5mM e as de milho para Ca(NO3)2
0,5mM, tendo o pH ajustado para 5,8. O pH da solução é determinado a intervalos de tempo
preestabelecidos. Em 40 minutos é possível demonstrar que a absorção de NH4+ é acompanhada por
acentuada acidificação do meio externo. Para alcalinização da solução, induzida por NO3-, são necessários 2
a 3 horas. Esta prática motiva a discussão sobre a importância das H+-ATPases para absorção de nutrientes
e manutenção da homestase celular.

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