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ESTADO, DIREITO E ANALISE MATERIALISTA DO RACISMO jo Luiz de Almeida Introduce > sio poucos os trabalhos no campo do diteito € da politica que se pr snalisar o racismo. Em geral, estes trabathos, a partir de uma perspectiva m no racismo um problema monal ow cultural que deve set enfrentado .ducagio” ou pot meios juridicos, que variam do direito penal as politicas dle acho afitmativa ‘A perspectiva liberal tem se mostrado insuficiente para a compreensio racismo enquanto prética social concreta que, para além dos aspectos morais € culeurais, manifesta-se nos planos da economia e da politica. O racismo estruura relagdes de poder, de tal sorte que sua inteligibilidade histériea passa por uma in vestigagio sobre os liames existentes entre a discriminagao racial e a reproduc da vida social Mas € na tradigao marxista que podem ser encontrados elementos cruciais para formulagio de uma andlise materialista do racismo. }é nas obras de Marx e Engels, assim como na dos primeiros te6ricos marxistas ~ Lenin, Kautsky, Rosa Luxembutgo e Bauer ~ esto 0s primeiros passos para uma investigagio acerca da cconexiio entre nacionalismo, racismo ¢ exploragio capitalista! ‘As transformagées sociais ocotridas ao longo do século XX, ¢ que repercutem no infeio do século XI, exigiram um reposicionamento tesrico do marxismo e, ara vin bom itineréio do tratamento da questio racial pelo marxsmo "clssico”, ver 0 niga de Peto Caldas Chadarevian "Os precursores da interpretagio marxsta do problem I", Crfca Mamas. Sto Paulo: Revan,v. 1,1. 24, 73-91. Ver também os textos {Ge Augesto Buonicore sobre a internacional comunists ea questo racial emt: . Acesso em: jun. 2015, por consequéncta, o aprofundamento das andlises sobre oracismo, Temas como a subjerividade, aide Escado capitalista ¢ as crises, 0 nencolonialisma e o papel das minorias na luta de classes tiveram forte impacto sobre o marxismo, que fol “travessado ou confrontado com teorias como a psicandlise a fenomenologia, © estruturalismo e o pés-estruturalismo. No século XX pode-se observat o surgimento de pensacores que trataram do racism partinde da andlise de experigncias histéricas dstintas e de miltiplas snterpretagSes e apropriages dos conceitos presentes na obra de Mars: Muitos Jost estudiosos da conexo entre racistno ¢ capitalismo estiveram diretament envolvidos nas hutas sociais em seus respectivos paises Se 6 pretenszo do materialismo histrico dar conta da realidade conereta, ren do como ponto de partida relagées socias igualmente concretas, 0 racismno € fendmeno que ni pode ser desprezado. Longe de se reduzir a um dado meramente psicolégico, o racismo é, antes de tudo, uma relagio social A. compreensio das estruuras do capitalismo exige uma investigagao sobre 0 racismo enquanto prés que se reproduz segundo uma l6gica especifia, de mo do que nfo se trata nica e tio somente de estabelecer vinculos crcunstancias ‘e empiticos entre o racismo ¢ a exploragio de classe. A operacio, muito mais complexa, é composta por dois grandes desafios: 1) er a social do racismo ou, em outros fermos, como o racism se objetiva e se reproduz em rela Goes relativamente determinadas pela sociabilidade capitalist; 2) entender se 0 vnculo entre 0 processo de valorizagiio do valor eas prticasracistas €estrutural ou simplesmente circunstancial "A divisio de classes, a divisio de grupos no interior das classes dle individualizagio e os antagonismos sociais que caracterizam as cont que formam a sociabilidade capitalist tém o racismo como veiculo importants Sigua cxemplos da abordagem do racism que de alguma forma be ja marsist: Nec EUA, Oliver C. Cox e 05 membros do Partido dos Panteras Neg a Da ih Carmichael, no continente afrieano € no contexto da resiséneia anticolonil raat c Cobra, Keane Nkrumah e Frants Fanon; sobre a realidade da esrav one ta perapectivacaribenkha Walter Reiney, CRL Jarnes e Eric Williams de sarendes de ralevoy no Brasil, destacase a importaneia de Floresta Fern Centicr Qetivio lant e Clévis Mout, este timo o mais destacao pensador pom ame braileito. Estes sio apenas alguns exemplas e o modo com que srernoptaram do marxsmopetmanece ober de inémeras polemicas, Ao fina deste ex sero mencionadas algumas obras ds autores mencion rae ation Exjenne Baliat “ racist € uma rlago socal e no um simsples del sete race Balan, Edens; Wallecein, manuel, Race, Oss nd Nation uous iden. Londtes, Reino Unido: Verso, 2010 pl Logo, 0 racismo nfo deve ser tratado como uma questio lateral, que pode ssolvida na concepgao de classes, até porque uma nogio de “classe” que psicdera o modo com que esta mesma “classe” se expressa enquanto relagdo | objetiva torna o conceito uma abstragao vazia de contetido histético. As quando materialmente considerad compostas de muthere Ss negras, indigenas, gays, imigrantes, pessoas com deficincia, que no po. ser definidas tio somente pelo fato de nfo serem proprietérios dos meios de Silo. So estes os individuos concretos que compdem as clases & medida que stiquem concomitantemente como “classe” e como “minoria” nas condigies rals do capitalismo. lasses em seu sentido material, portant antes de tu eal das minorias. A situagdo alheres negras exemplifica iss: bs mais baixos salrios, so em. 8 para os “trabalhos improctutivos” faqueles que nio procluzem mais-alia, so essenciais, a exemplo das babs e empregadas domésticas, em geral Jue, vestidas de branco, criam os herdeitos do capital), sio diariamente de asséclio moral, da violencia doméstica e do abandono; recebem o pior MtO nos sistemas “universais” de savide e suportam, proporcionalmente, a sada tributagio, A descricdo e o engquadramento estrutural desta situactio movimento real da divisao de “classes” e dos mecaniismos institucionais ragfo no capitalismo. nto, tratar 0 racismo como teflexo mecd lua de classe, sem que historias sejam estabelecdase sem a devida compreensio da ldgica que «sociabilidade capitalist, é recair no economicismo que tanto prejudica mento da sociedade pelos préprios marxista. intelecgao do racismo esté no desvelamento dos mecanismos de pod ferramental técnico ¢ ideolégico do direito, o conerario também pode lireito € 0 Estado em suas relagées mais ftimas com o capi te6rica primordial ido 0 direito, temas essenciais para um mergulho nas estruturas mais € profundas da reprodugdo do capital, no posiem ser estudados como ateriais historicamente engendradas se o racismo no for elevado A lemento analitico essencial. Este é mais um dos motivos da i ‘eorias liberais' idealistas ou positivistas — do Estado e do dire tid Charles Mills considera que teoria do contato social fornece as bos i so de neg (Mills, Charles. The Racal C Cornell University Press, 199 ISP Kelas & Letras, 200 oram as relagGes sociais concretas e, por isso, ov nao levam em conta o racismo 1m o problems racial como uma anomalia dentro de uma estrutura imagi niria que funciona perfeitamente. Daf nfo é de se estranhar que boa parte destas teorias do Estado e do direito que, além de nao darem conta nem do Estado nem do direito, quando reconhecem o problema racial, identificam na educagdo, no diteito penal e nas poltticas pablicas a solugio para o racismo.’ Teorias idealistas ¢ positivistas do Estado e do direito podem ignorar o racismo e outras formas de discriminagao e violencia justamente porque o valor destas teorias esté no fato de ignorarem a realidade Nas préximas paginas aproximaremos as teorias materialistas do Estado e do direito de uma construgio do racismo enquanto prética material que denominare mos de any rilisca do racismo, Se o estudlo do racismo exige a compreensio das artimanhas da teproducdo do capital e da légica do valor, uma abordagem rmaterialista do direito e do Estado tem como pressuposto uma andlise materialisa do racismo (o que certamente se estende a outras formas de discriminago, como as que envolvem a questo de género ¢ de sexualidade). Dagui em diante apresentaremos algumas articulac6es conceituais que preten clemos possam ser futuramente desenvolvidas e aprofundadas a fim de constituir ‘a base para uma anélise materialista do va Estado e capitalismo Estado € a expresso das condigdes estruturais da sociedade capitalista que se assenta na separagiio dos trabalhadores e trabalhadoras dos meios de produgao, nna produgio privada, no trabalho assalariado e na troca mercantil. A politica nfo se expressa como a dominagao direta de uma classe sobre a outra, mas como co aparato de mediagéo entre indivicuos livres, iguais ¢ proprietétios. Assim, = forma-Estado € 0 modo com que as relagSes politicas derivam das condigées de sociabilidade proprias do capitalismo. Da mesma manelta,nota-se que as teorias idealists ou pos edo direito que admnitem o problema racial fagam em linha com o cue em gerl redanda no tatamtento do racism na chave ds deetos humans. lango de sua espeifcidade histica, depreende-se que o nexo entre capitalism e Est do éesraturl. A gene Jagies socias costituidas mediante forma-mercador demand uma fe sparta dos proprios portadores etocadores de exis me principal dl, abalho mediante slaiado. © Estado se conolia como 0 ente terceto, garante en indica do capitalism. Em face dos individuose suas ine rages, que pasam a idenificar a ‘vida priv) o Estado se insereve com distinc: ‘pbc Mascaro, Alyson Leanlto, Estado e forma poles. Sio Paulo: Boitempo, 2013, p. 7. Ainda que tenham as sociedades pré-capitalistas se constituido por miiltiplas mas de dominacéo e de exercicio difuso do poder politico, as caracterfsticas da rem capitalista so bastante especificas. E apenas com o desenvolvimento do apitalismo que a politica assume a forma de um aparato exterior, elativamente aténomo e centralizado, separado do conjunto das relagées sociais, em especial as relagies econdmicas. No capitalism, a organizagio politica da sociedade nfo 4 exercida diretamente pelos grandes proprietatios ou pelos membros de uma sse, mas pelo Estado Numa sociabilidade constituida pela relacao entre individuos formalmente ese iguais, em que aforga de trabalho é também uma mercadoria, a manutenca0 s ordem e a “internalizacio das méltiplas contradig6es", seja pela coagio fi ja por meio da produgo de discursos ideolégicos justificadores da dominagéic pel do Estado, Desse modo, como destaca David Harvey, a acumulago sta depende do Estado para a reprodugao das condigées de sociabilidade © Estado se torna a inscituigho central por meio da qual os conflitos inter onais so laboradas, e a hase a parte da qual cada alianca regional busca 6 seu ‘ajste espacial O Estado, em resume nist o capital. Alémdiso quando ogoverno ntervém pam esabilizara acura A forma com que os individuos atuam na sociedade, seu reconhecimento en: nto integrantes de determinados grupos classes hem como a constituigio de s identidades relacionam-se as estruturas que regem a sociabilidade capitalista stado, nacionalismo e ideologia Um dos pressupostos da anélise marxista da sociedade & que os fendmenos 1 arelagio dos fendmenos sociais com a totalidade das peéticas materiais. Deste >, ainda que as relagées econdmicas determinem as demas relagies soctas, influéneia 6 relativa, ou seja, as formas sociais néo so um desdobramento 0 ¢ reflexivo da economia. Todas as instancias da vida social mantém relativa autonomia, como & caso da politica, em que o Estado, apesar de sua Jo estrutural com 0 capitalism, nfo tem o seu funcionamento absolutamente arvey, David, Or inte do casa, Sao Paul Boitempo, 2013, p. 564 Néo por acaso a referéncia aos Estados modernos é acompanhada do adiet “nacional” 5 A ideologia nacionalista é central para a construgao de um discurso em tomo da “unidade do Estado” a partir de um imaginSrio que remonte a uma gem” ou “identidade” comuns. ‘Onacionalismo preenche as enormes fissuras da sociedade capitalista,afastando a percepgtio acerca dos conflitos de classe, de grupos e, em particular, da violencia sistemitica do processo produtivo. Mas, iso nao significa que o nacionalismo — ¢ seu derivado, 0 racismo ~ tenha sido concebido com a flnigdo de acobertar a ex ploragdo de classe. Essa explicacéo funcionalista, ainda que parcialmente correta seria bastante frgil diante de contextos em que a democracia racial ou 0 adh de sociedades pis-raciais sio afirmados; ou, ainda, em situagées em que conflitos de classe, entre etnias ou grupos religiosos esto abertamente deflagrados. A questo aqui, portanto, € também estabelecer a relagao estrutwral e histrica, endo reramente a funcional ou ligica, entre a sociabilidade capitalista e a reprodugio da ideologia racista O desenvolvimento do capitalismo apoiou-se no Estado como aparato de violencia institucionalizada e como sustentéculo da ideologia nacionalista como go. Mas por que o capitalismo necessita de um fator de intexragac E como € possivel falar de integracao numa sociedade que, como aqui mest se afiemou, é estruturalmente cindida? Uma sociedade € definida pela sua capacidade de reprodusit-se ou, dito ¢ outra maneira, de manter-se estavel ainda que portadora de contradigdes, no qu dependers do aparecimento de instituiges cujo papel seré manter a int social, No caso do capitalismo, tem-se uma sociedade cujo funcionan em torno do trabalho abstrato e em que a logica de mercado fornece o de sociabilidade. Se a continuidade do capitalismo depende da reprodugio des condigées de funcionamento, é af que entra o Estado como a principal institu do capitalism. No capitalismo, as relag6es politicas tomam a forma de um Estado impess ec exterior & vida social que, paradoxalmente, establiza a sociedade manten proceso de individualizagio ea separagao de classe que caracterizam o capit mas que, ao mesmo tempo, atua para impedir que os antagonismos e 0s co dlestruam a vida social. Por iso, 0 controle estatal da sociedade dar-se- do estabelecimento de critérios de classificagao dos individuos de mod ‘Sobre s canstrugo do nacionalismo ver: Habsbawn, Eric. Nagdes a naionaisme d programa, mio relidade, S40 Paulo: Pas e Tera, 2013, identidades subjetivas estfo diretamente relacionadas ao processo de reproduc ela ago do Estado e pela conformacao normativa operada pelo dir nndividuos serdo sujeitos de dive, cidadaos, leitores, empregados et Mas mesmo a procucio ¢ 2 extragio da mais-valia, processos que dio espe ficidacle ao capitalismo, nao sio estritamente econdmicos, e dependem de uma tie de condigdes extraecondmicas para se reproduzi. A integragao dos indivi capitalismo um processo histérico que envolve uma dindmica de criagio, adaptagao e de dissolugio de valores, tradigbes e costumes. Por conseguinte, 2 xploracio ¢ a opressio que matcam a reproducio social se normalizam a partir ‘um imagindrio derivado das formas socai Esse imaginzrio forjado pelas praticas sociais coneretas, quando elevado a0 ano da consciéneia dos individuos € denominadlo de ideologia. Porém, o ima nirio socialmente construfdo no molda a estrutura psiquica dos individuos de rma automética, voluntétia ou pelo mero contato com as ideais. A ideologia rma as subjetividades através de uma pratica material que interpela o individu transforma em sujeito para além da sua vontade e consciéncia. E na escola, na ‘lia e nos ambiente de trabalho, ou seja, no interior de determinados aparethos stentados pelo Estado, que a ideologia dari forma (expresso nas relages soci) ubjetividades.” Em termos histéricos, seja em sua versio francesa e “universalista” minista ~seja em sua versio alem — que a enfatiza a Kultur como busca de 1 identidade propria ¢ patticularizada ~ a ideologia nacionalista europeia!” ctializou-se historicamente em processos violentos de subjugacio de comuni: ado (AIE). Rio de Jancico: Graal, 1983. A dissertagio de estrado de Pedro Eduardo Zini Davoglio “Ant-humanisma teético ¢ tleologia juridica m Althusser” merece er consulada pelos excelentesexclarecimentos gue frnece sabre a a de Althusser. (Davoglio, Pedro Eduando Zini. Ani-humnanismo teri " Altiasser Sto Paulo: Universicade Presbietiana Mackensie. Dissettaga eado, 2014 ithusser, Lous. Aparethos ideoigicos de Estado: nota sobre os si ATE). Rio de Janeito: Gral, 1983, Ire Cvilizao e kuleur, dis Norbert Elias "(.) Cvilizagiadescreve umn processo ov, pelo nos, seu resultado. Di 0 @ algo que esti em movimento constante, movendo-se santemente ‘pata a frente. O concetoalemio de hulu, ao empeego corrente, implica a relagio dference, com movin se a produtos humanos que si semelhan a flores do campo a obras de are, lives, sistemas relgioses ou flsdticos, noe unis san a individualidade de wm povo. O conceit ut delinta” Elias, Norbert. O sso citi (1). Rio de Janeio: Zaha, 2011, p dades e grupos humanos, sob a justificativa d dos valores extraidos da “azo natural” ou do “espirito do pove’ O nacionatismo é o solo sobre o qual individuos e como parte de um mesmo povo, no interior de um te Hav e culturas tegionais e particulares que, eventualmente, entrem em choque ¢ ca destruigao, a dissolucio e aincorporagdo de tradicoes, cos a nacionalidade—q ho nacional”, “patria”, “espitito do povo" ~ é resultado de priticas de ¢ de dominagio convertidas em discursos de normalizagao da divisio soc minados violencia praticada diretamente pelo Estado ou por d +0 da delimitagio te orial e da construcfio da nacionallidade particular atengio devido ds implicagies sobre 0 tema aqui tratado. Com bem destaca Joachim Hirsch", o controle da populagao pelo Estado, o que ao capitalismo, de processo de formagio das subjetividades adaptad 0 territorial que permia o controle ¢ a vigilancia da poy da natalid: un planeja Ocon le, a definigo dos critérios de entrada e perm: no tettit6rio consoante elementos de nacionalidade determinados pel cringio de guetos ou de reservas para certos grupos sociais (também de direta ow indiretamente, segundo padres étnicos, culturais ou religi tabeleciment ritérios condigdes juridicas para o reconhecimento ck as, indive propriedades coletivas segundo a identidade de grupo (quilom Jemonstram a sobejo nacionalidade e a dominacio capitalista s em uma construgio espaco-identitaria que pode ser vista na classifica étnica, religiosa e sexual de individuos como estratégia de poder: ntretanto, hé que se apontar para o fato de que a nacionalidade col 0 do discurso naci asoberania dos povos dominados. Esse tipo de apropti independéncia das coldnias*, convertendo-se esteve na base das luta: vezes, em poderoso combustivel para a luta anticapitalista nos pafses pe 1 Hesch, Joachim, Tenia materiale do Exo: proceso de wansformagao do si de Ezades. Rio de Janene: Revan, 2010, p. 81-84 Bid, p81 e82 Sobre 6 nacionalismo, acismo e a luta politica anticolonial sio exemplares os btegul. Martegu, José de la realidad peruana (1923) Lima: Empresa Edivoral “_cvetturas deste conceito cheio de ambiguidades, o que se é ¢ que o sentido, 's6rico da nacionalidade se define no interior das com, radigdes do capitalism, O resultado mais bem acabado donacionatismo éone Smo, tio importante para Oe —_—_——— Racismo e ideologia Mas como poderiamos entender o racism para alm de ircunsténcias partic roncnaos eabetifces?O racism & construtdo a partir do inmayn tio social de ‘eoridade, sj intelectual ou moral, de uma raga em face de outta raga (send “ea "*aca” dominadora nio aparece como “ag a”, mas como “seres humans” ou Pessoas “normais"), © racism, portanto, nfo é umn ato isolado de preconceito tum “mal entendido’; 0 racismo & um proc © social de assujeizamento, em q ———“——S—sS—. od Ks ¢ eproduzidos socialmente. Esse processo, ue implica na violencia “enética¢ na superexploragao de individuos que persenear, 1 determinados HPO Tacalmenteidentiticados,s6 se reproduz quan € ssreneg le pelo poder tal sea pot ages insttucionatsdiretas (apath d, por exemplo), seja pela ‘sto sistemstica diante da desigualdade material e inseguranga existencial se abatem sobre as minoria Consequentemente, aetsmmo est inscrito nas estruturassociais e no modo de fonamento da politica e da economia. Ao contr io do que se poderia pensat, starry 2088 eProduz com base no poder politico, € quem foray 3s “sujeitos “tas” ou identificados como pertencentes a uma det rminada “raga”. O racism deloa qu se manifesta nes uetosformads plo mo, Mas que nao tem no seta. Dessa forma, 0 racism no se define unin ente pelos atos de ~petoy mas também como indferenga que “normaliza” ade igualdade racial “omo € préprio da ideologia, o racismo se movimentan »nnconsciente, podendo a # dat moldat as prticas materiais que dio unidade justficago As contradigties HiSGI® SOctais. Ao racismo se aplica o racioeinio que Roswitha Scholz anélise da dominacio masculina: é wma dominagis son sujeito, em que: Lec til, tstego das elagies € anterior a seo qe rede amas telages, Todavia, a rigo no podem er aoe te ets guts (-) A reprodio ds rlagies svi a on les, supe sarem, a teodigio do tabalhonio ¢ fundamental anes Trem damental € uma terodusso propia do sete ta hens icon. Madrid, Espana: Cate : 's depositatios do don sujeitos autoconscientes, mas agem no tor de uma male dade dotada de constituigio historicamente nconsciente © valor sm sueito remete ao homem sem sujeito, que na qualidade de dominador, de iniciador ¢ realizador, calocou em movimento instituigdes culturais e politcas eapazes de cunhar a histéria, que comesaram a ter vida Todavia, ¢ preciso cautela: dizer que o racismo é um processo sem sujeto signi- fica dizer que “penetragao" e “renovagio” do racismo a cada geraclo dependem: essencialmente, de condigdes estratuais e institucional para que praticas discrimi. nat6rias possam “atingit" a formago dos afetos e da consciéncia dos individuos, Ou sea, o8 sujeitosracistas so o resultado mais bem acabado destas condices estruturais¢ insttucionais ¢ nio o contrério. Ainda que o racismo nao dependa Sinica eexclusivamente da consciéneta, ele nao é tecido apenas por iracionalidades, ‘misticismos ou pela religito. O racismo também vaza dos discursos “racionais" otias cientificas”. O nazismo, o apartheid sul-africano (que possui elementos nazistas e colonialistas em suas explicagées e em seu modo de funcionamento) © a demoeracia racial & brasileira, ainda que compostos por doses expressivas de irracionalismo, completam-se com elementos de “racionalizagéo” que elevam ac Plano cientifico prticas racistasjé bem instaladas no cotidiano, De fato, no hi racismo sem teoria 9) Seria completamente init perguntarse istasprocedem das elites ou de as massas, das classes domin 1 das classes dominadas, Plo contrdro, é evidente que esta “racional intelectuais. E sumamente importante perguntarse sobre a fun desempenham as teorizagies do racismo cuto (eujo protipo. evolucionista das rags ‘biolGgicas claborada no final do século X Tagio da comunidade que se eria ao redot do significante da rac, Por certo o racismo, entendido de modo genético e impreciso como discri- minagio de individuos pertencentes a grupos sociais, nao € algo exclusivo do capitalism. Porém, dar ao racismo um cardter eterno e universal apenas encobre © fato de que se faz referéncia a algo especifico, integrado as priticas sociais deste fempo hist6rico e que se define segundo a légica do capitalismo. A respeito da relagio entre a reprodugéo das discriminag6es ¢ 0 capitalismo, a ligt de Leandro Mascaro: Scho Raswitha. “O valor € 0 homem. Revistas Nows Esudos. So Paulo: Cebvapy n. 45 Iulbo de 1996, p. 15:36 Bolas, Etienne; Wallerstein, Immanuel. Race, Class and Nation: am Ares, Reino Unidos Veto, 2010, p No que tange & raga, a aco estatal apenas parece se plantar em dados de origem biol6gica. Ocoete que toda narrativ em torn ve ou da pele. De algum modo, revela, inclusive um: preconceito que vai imanente com as nogGes de respeitoe admiragio a0 By A sorte das minorias, nas sociedades capitaistas, deve ser tida ni apenas como replique, no mundo stual, das velhas operagies de preconceito e identidade, mas como politica estatal deliberada de insticuigao de relagies estrututas ¢ funcionais na dinémica do capital. Por isso o capitalismo € machista, homof- bico,racistae discriminador de deficienes e dos indesejves Distingdes de género e de raga sio construgdes socioidealégicas que apenas ganham relevancia pelas consequéncias sociais que engendram. Aspectos biolégicos 1 culturais 36 se transformam em raga ou género quando aproveitados em processos ie dominacdo e sujeigao. Por isso sio tao importantes os recentes estucdos sobre a ranquidade ou branguitude", cuja virtude € revelar que o “branco” é também c esultado de uma construgao social que materéalmente se expressa na dominagdo ila por indivkluos consicerados brancos. Sob o Angulo das relagGes capitalists, branquidade também pode ser entendida como a interiorizagio do “fetiche do pital’, uma vez que gera a admiracao ¢ a valorizagio das caracterfsticas fisicas € + padres de “beleza” dos povos eurocéntricos, ou seja, dos povos dos paises do pitalismo central.” E-0 que éser “branco” ¢ normal e “nao branco” e “diferente variar conforme a constituigao histérica dos nacionalismos, as especificidades cada formacao social capitalista e as estratégias do discurso racista a fim de nntar um carter universalist Acerca do vinculo entre universalismo ¢ tacismo, Imannuel Wall aclui que o racismo se instaura como um ponto de equilfbrio entre ideologico do universalismo — expresso da “universalicade” da troca eritocracia, cujo sentido maior € naturalizar particularismos os por meio de um discurso racional acerca da “competéncia” e da ppacidade pessoal” de certos individuos." Segundo Wallerstein, a meritacta. Mascaro, Alysson Leandro, Estado ‘Sto Paulo: Boitempo, 2013, p. 67 Sobre © conceito ve: Vion Wate (org) Branquidade: dena branca multiculturalism Rio de Janeiro: Garamore, 2004; Schucman, Lia Vainer, Ene oe guisimo: banaue, heraguiae poder nace de Sao Pa ak onablume, scaro, Alysson Leandro, Estado e ‘Sao Paul: Boitempo, 2013, p. 67 Por outra parte, a meriocracia seria no apenas economicamenteefiaz, mas tam un stor de establizagio politica. Na medida em que existem desigualdades na distibuigdo d compensas no capitalisto bistica (assim como nos sistemas anerioes), «resentment queles que reechem recompensss madestas com relago aos que recebem a5 als impor ites seria menos incenso so justifica tal desigualdade pelo mérto e nfo pela tadiglo. Em cia seria incapaz de sustentar-se como discurso que penetra a subjetividade de dominadores e dominados sem qu mo, antes de qualquer justificaga acional” e “humanista", pavimentasse no inconsciente a inferioridade das minorias, fundamentada em questées de ordem natural ou biol6gica ou na “falta de mérito”, Por conta da meritacracia e da “incapacidade natural das corias”, a desigualdade na distribuicdo dos bens socialmente produzidos seria uma medida justa tum discurso racistae legitimador de privilégios que, caso a igualdade na Gnica e tio somente como igualdade juridica, n momento da troca mercanti, setiasocialmente inaceitavel. E como todo racismo se mantém institucionalmente 6 essencial que existam mecanismos institucionais rmeritoeriticos, como so exemplos os processos seletivos das universidades e os concutsos piiblicos. Por este motivo € que as universidades ¢ certos cargos ¢ fungGes piblicas tenham filtros tio estreitos: dada a estrutura social ¢ a dest gualdade educacional que, em geral, atende a padres raciai nero, aqueles ue ocupam vagas ei determinadas universidades ou acessam cargos piblicos de prestigio reafirmam o imagindrio de que mérito (¢ 0 poder, portante) é mais bem exercido por —ou pertence naturalmente —a pessoas brancas, heterossexuais e do sexo masculino.® Por outro lado, o sistema penal complementa a institucio acio do sistema meritocrético, estabelece o controle carcerério da pobreza e estigmatizanlo jovens negros, cuja insercfo em esquemas de trabalho altamente ccatizados e até mesmo a eliminagio fisica serdo vistos com “normalidade” por parte significativa da sociedade, Racismo e subsuncao real do trabalho ao capital Poder-se-ia dizer que o racismo normaliza a superexploraglo do trabalho, em special na chamada “periferia’, onde em geral o capitalismo se instalou sob a logica colonialista. © racismo, certamente, ndo € estranho & expansio colonial e Baliber, Euennes Wallerstein, Immanuel Race, Class and Nation: ambiguous identity. Lon ares, Reino Unido: Vee Isso enplica, em parte, a lc stores da sociedade 8s politica de agso afiemat Gane & mas curious € que os argumentos contra as ages afimativas tenham como b inkersaimo, snteicado na teafrmacao do principio da isonomia. Dat torne-se sin préximo passo na def im racial: a meritocracia que, paradoxalimente, assem se coma defess da imp violencia dos processos de acumulagaa primitiva de capital” que “liberam” os clementos constitutivos da sociedad capitalista.* Entretanto, hé trés indagagbes que nos colocam diante de um impasse em ace desta boa explicacao funcional do racismo: 1) a existéncia de racismo e supe rexploragiio nos paises desenvolvidos “ou centrais” que se dirige tanto a nacionais como a imigrantes; 2) 0 racismo que se manifesta fora das relagies de produ, como na violéncia policial contra minorias; 3) o fato de que uma mesma formagio ocial possa abrigar as mais diversas formas e niveis de exploracao, podend mesma formagio social, o trabalhador assalariado e com direitos sociais conviver com o trabathador que produza em condligdes andlogas escravidao, inclusive na mesma cadeia produtiva, Talvez a pergunta sobre a relago estrutural entre racismo e reproducfo capi alista possa ganhar profundidade se atentarmos para os conccitos utilizados por Marx na descrigfo das fases constitativas das relagdes de produgio capitalists lho ao capil Na subsungao formal, o trabalho, embora jé organizado segundo padres ¢ obje- ivos do capitalismo, mantém-se praticamente inalterado em relago A maneira de s nas corporagées de oficio ou nas oficinas de artesanato do mundo medieval. sexismo a partir do conceito de acumulago primitiva i ¥ action Madrid, Espanhar Traficante de Sucsos, 2004 (10 process que cra a relagéo capitalsta nao poder ser sno a process de sepa centre o trabalhador e a propriedade das condisées da realizagio de seu trabalho, processo ‘ae, por i Indo, transforms emt eaptal os mets ociis de subsisténcia ede prov ‘outro, converte es produtoresditetos er tabalhadores asalariades. A charmada ac primitiva ndo é, por conseguine, mais da que o processo histrico de separago do ps fe meio de produgio, Ela aparece como primitiva porque constitu pré-histria {do moda de produgo que Ihe earesponde". A estutura econsmica da sociedade capitalista surgia da. estratura econinica da sociedade endl, A dssolugio desta dei liberow os elementos daquela™ Mats, Karl. O capital (1). Sio Palo: Boitempo, 2013.7 (© caso dos imigrantes bolivianos e ago, dos haitanos, no Bras, &emblemstica de como a indica do racism vai consttuindo uma complexa eadela de sedi a mar sein da leglidade e que revela a convivéncia de diferentes tiple Juntacse na constragio da aeridade racista contra bolivianos¢ hatianos o racist interior ej nal contra negros e fis es isere no discutsoa xenofo smo se al imaginério historieamente construdo de que negros eindigenas to racalmente caso contrério, fo haveri explicagio para o modo dissinto com gue imigrantes brancos sfo hem reecbilos. Asim, ainda que haja um horror de certa pacela ca socieded slide” do catamento recebido por haitianos e bolivia tradusir numa acio politica efetiva conta ess violencia e nem imp batho destes imigrantes pela indstria capitalist (NA), Ji a subsungao real” corresponde & etapa em que a proclugdo esta totalmente sob o controle do capital, Nesta quadra, nao hé espacos para a intromissao d elementos que destaquem a pessoalidade ou a individualidade do trabalhade A automagiio do processo produtivo ¢ o avango tecnol6gico tornam o trabally realmente abstrato, no sentido de que as caractertsticas e habilidadles individuais dos trabalhadores tornam-se indiferentes & producao capitalista Referindo-se & subsuncio real, Etienne Balibar chama a atencao para o fat. de que subsungao real do trabalho ao capital: (.) vai muito além da integragio do trabalhador ao mundo do contrato de rendas monetérias, do dieitoe da politica oficial: implica uma transformaci da individualidace humana que se estende desde a edueago da forga de t halho até a formacio de uma ideologia dominante suscetivel de ser adotad pelos préprios dominadbs. A suscetibilidade a que se refete Balibar é reveladora de que a subsunga designa a instituigéo de um “ponto de nfo retorno do proceso de acumulag ilimitada e de valorizagio do valor". A subsuncio real do trabalho ao capital 6 compreensivel no nivel concreto das relagées sociais, em que exper das mais diversas fossem integradas & dinémica do capitalism. Eneste ponto que a relagao estrutural entre racismo e capitalismo demo uma incrivel sutifeza, visto que nacionalismo e racismo sfo priticas ideol6gicas tracuzem a “comunidade” ¢o “universalism” necessitios ao processo de subsun real do trabalho a capital, adaptando tradigbes, dissolvendo ou institucionalican costumes, dando sentido ¢ expandindo alteridades, a partie das especificidades cada formagio social na integragio A organizagio capitalista da produgéo. fa predomindncia —e nfo a exclusvidade — do trabalho asslariado que f nece o indice do desenvolvimento das relacées capitalistas em uma dada for 0 social, Isso significa que as condigdes estruturais para a plenitude da tr mercantil e o processo de valorizagio do valor esto dadas quando se constit ‘Assim se constitui um modo de produgio espeeificamente capitalist, no qual o con do processo de produso pelo captalisae 0 seu dominio sobre o oper € completo, x agora ele tem a efetiva capacdade de dispor dos meas de produsio, configurando as ‘io real do trabalho ao capital” Naves, Marcio Bilhavinbo. A questo do dieto em Mar Dutras expresties; Dobra, 2014, p. 44 Bolibar, Etienne; Wallerstein, Immanuel Race, Clas aud N des, Reino Unio: Verso, 2010, p 4 Ibid. pt [Esa 6 chave de leturn de Marcio ilharinho Naves que rela pa de subsuncto eal do tabalho ao capital em A questo do dive (Ounras Expresses; Dobra, 204) 1 predominancia e ~ devemos insistir ~ nfo a exclusividade do trabalho assala riado. Nesse passo, ha que se lerabrar que a subjetividade juridica — condigdo sine sua non para a realizacio das trocas ~ se exterioriza no momento da circulagio mercantil, que, por ébvio, é determinada pela produgio. Mas a depender das formagées sociais, da conjuntura e das articulagdes econémicas no plano interno internacional, a produgéo capitalista e a exploragio que Ihe é inerente pode se utilizar do trabalho compulsério e de estratégias violentas de controle da produgio, Assim, a existéncia de escraviddo ou formas cruéis de exploraso do rabalho no € algo estranho ao capitalismo, mesmo nos ditos paises desenvolvidos ‘civilizados” onde predomina o trabalho assalariado. No capitalismo dividem espaco € concorrem entre si ttabalhadores assalariaclos bem pagos, mal pagos, rauitissimo mal pagos, escravizados, grandes empresérios, pequenos empresarios etc, A insercao dos individuos em cada uma destas condigdes formatadas pela sociabilidade capitalista depende de um complexo jogo que mescla uso da forgae 1 reprodugdo da ideologia a fim de realizar a domesticacdo dos corpos™ entregues indistintamente ao trabalho abstrato. © racismo é um elemento deste jogo: seré ue parte da sociedade nao vera qualquer anormalidade na maioria das pessoas negras ganharem salérios menores, submeterem-se aos trabalhos mais degra Jantes, nfo estarem nas universidades mais importantes, nfo ocuparem cargos de diego, residirem nas éreas periféricas nas cidades ¢ serem com frequéncis ssassinadas pelas forcas do Estado. A institucionalizacao das diferengasraciaise de géneto garante que o trabalho ja realmente submetido ao capital, uma vez que o racismo retirara do trabalhador ralquer releviincia enquanto individuo. No mundo (racista), o “negro” néo tem digo de reivindicar um “tratamento igualitério” ou exigtt que suas “diferengas” sejam respeitadas; o tratamento dispensado ao trabalhador e até mesmo as suas Jiferengas’ no dependem dele ou do que venha a achat de si mesmo. A forma 1mo 0 trabalhador ser tratad, o que é “justo” ou nao e até onde pode ir em suas civindicag6es vai depender (nica e exclusivamente das determinagbes da produ io capitalista e da replicagio da forma-valor. Assim & que 0 racismo se conecta subsuncéo real do trabalho ao capital, uma vez que a identidade sera definida .zundo os padtdes de funcionamento da produgdo capitalista, “Por esse motivo & 10 racismo enquanto “dominagiio” convive pacificamente com a subjetividade {dica, as normas estatais, a impessoalidade da técnica juridica e a afirmacso wcault, Michel. Vigiar e Pamir. PeerSpolis: ozes, 2015 niversal dos direitos do homem, elementos diretamente ligados ao processo abstragao do trabalho CO racismo e sua especificidade Rafael Bivar Marquese, ao tratar dos debates historiogréficos sobre a formacii cla economia brasileira, reafirma a necessidade de que as “relagses entre trabalh strutural e dialeticamente integeadas”. E completa Marquese afirmando q scravidéo deve ser apreendida por meio de sua relago, via mercado mund tabi ccom as outras formas que © constituem, sejam assalariadas ow ni! (O que Rafael Bivar Marquese acusa em relacao & escravidkio serve também j dar sequéncia & anilise do racismo. Tal como a escravidio, o racismo nao é u fendmeno uniforme e que pode ser entendido de maneita puramente 1 I6gica. A compreenstio material do racism: ‘na imperativo um olhar ater sobre as citcunstincias especificas da formacao social de cada Estado. Por is: tom: da mesma forma em todos os lugares, var ratégias de poder e dominagio verificadas no interior Estados; 2) o vinculo de “relativa antonomia” com a reprodugéo capitalist i880, 0 racism 2 € distinto do racismo colonial 6 discursc justificagao que geram en éaias de poder de que am, mas, dlestas distingdes, essa formas de racismo se aproximam, Hida em que isso, as diferentes formas de nacionalismo e de racismo s6 ganham sentido hist. inseridas no contexto da dindmica do capitalismo global, das distintas estt dle acumulaciio e da organizagio instituct nal especifica de cada A evidéncia de que, por meio da conjugacio nacionalismosracisma, 0 ¢ lismo da origem a distintas formas de “unidade contraditoria” é a maneira c se constituiram pafses como EUA, Africa do Sul e Brasi os patses e granite, nos mencionadas paises, o pr erente ao racismo. No Brasil, BUA e Africa do Si imprimiu um sentido d Naves, Mirco Biharinho. A questo do dito em Marx. So Pol Editorial, 20 Rafael var. As desventuras de utn conceit: capitalism his conta das patticularidades do desenvolvimento capitalistae das especificidades da colonizagao em cada um destes paises oracismo néo toma como critério principal > fato de ser nacional ou imigrante, mas o “pertencimento” a'um grupo “érnico” ou “minoria” (ainda que demograficamente maiori), ainda que os membros destes 1p0s sejam institucionalmente reconhecidos como nacionais. A “ordem” proxluzida pelo racismo no afeta apenas a sociedade em suas relagdes xteriores (como no caso da colonizagio}, mas atinge, sobretudo, a sua configura 0 interna, estipulando paces hierirquicos, naturalizando formas hist6ricas de Jominagia e justficando a intervengio estatal sobre grupos socias discriminados, como se pode observat no cotidiano das populagées dos pafses antes mencionados. Enquanto na Africa do Sul e nos EUA, que com as devidas distinedes, es ruturavam juridicamente a segregag3o da populaco negra, mesmo no avancat tlo XX (no caso da Africa do Sul, até 1994), no Brasil, a ideologia do “ra cismo cientifico"” foi substituida a partir dos anos 1930 pelo mito da democracia cial, denotando que o racismo organiza diferentes estratégias de dominagiio que Jependem de circunstincias hist6ricas espectficas. O surgimento do discurso da Jemocracia racial, que ainda hoje é tido como um elemento da “identicade” bra sileita, coincide com o inicio do projeto de adaptagio da sociedade ao capitalismo industrial, perfodo este conhecida como “Estado Novo" O Estado brasileito nfo é diferente de outros Estados capitalistas em um aspécto ‘andamental: oracismo € elemento constituinte da politica e da economia sem ¢ qual nao € possivel compreender as suas estruturas. Nessa vereda, a ideologia da emocracia racial é um discurso racistae legtimador da violéncia e da desigualdade cial diante das especificidades do capitalismo brasileiro, Portanto, no é o racismo estranho & formagio social de qualquer Estado ca talista, mas um fator estrutural, que organiza as relagies politicas e econdmicas. a como racismo “interiorizado” (dirigido contra as populagdes internas) seja ‘extetiotizado” (dirigido contra estrangeiros), é possfvel dizer que pafses como Brasil, Aftica do Sul e BUA nio sio o que so apesar do racismo, mas so 0 que do gragas ao racismo. Em suma: todo racismo & estrutural e, ao mesma tempo, institucional A instabilidade propria das sociedades capitalistas provocada pela dindimica individualizagao, da divisio de classes e da concorréncia interfere na forma Schwate, Lil Moritz © esputdeuo das ragas. So Paulo, Companhia da Letras, 2014 com que o racismo se expressa nas relagées sociais. A opressao d no conheceu folga no capitalismo, ainda que tenha ocorrido d Escravidao, id ¢ mesmo a etapa dos direto cvis foram difere Ja mesma sociedade racista Lidar com as crises do modo de sociabilidade capitalista torn transformagao na atuagao do Estado sobre a sociedade 0 que, f altera os padres de clivagem racial. Crise nido deve set com lencia social, insurgéncia popular, pobreza ou ilegalidade, pois inerentes ao capitalismo, mesmo em periodos de estabilidade que caracterizaa crise do capitalisme diz respeito a incap: arranjo social da produgo capitalista de manter os niveis de ext ce queda na taxa de lucro. Crise, portanto, refere-se aos mecan exploragio do trabalho, de circulagdo mercantl e de concorrénc Diane da crise e a partir do Estado, sero moldados novo: cionais afim de reorganizar as relagies de produgao. Esta reordena mplicar, a depender das circunstncias, em desemprego, aumento de sem aumento de salirio e mudanca nos padwes de consumo. fundamental nesse process, visto que o uso da forga repressiva ( ) © a imposigio de uma reorientacéo pressupostos de um reatranjo social eficiente para lidar com as er Historicamente, as mudangas nas relagdes raciais coincidem de erise do capitalismo e de reformulagao nos parimetros de Por isso, olhar para as relagies raciais nos revela muito sobre a relaca talismo, direito ¢ politica. Apés o fim da segunda grande guerra, a formagio do Estad cial e a “ampliagio da cidadania” nao significou o fim d snas passou a estruturar a desigualdade ea sua percepao a termos. Trabalhadores vinculados a sindicatos fortes ¢ & ind exam, em getal, trabalhadores brancos;jé no setor concorrencial, de e convivendo com a pobreza estavam os negros.®* Por isso que cera de ouro do capitalismo nao impediu que, no centro do ¢ movimento pelos direitos civis, reprimido, no mais das vezes, com extre por um Estado que nao poderia ser tolerante com grupos que contestas funcionamento da “democracia”. © Estado de Bem-Estar social foi uma mudang: nos padrées de intervengao estatal diante das exigéncias da acurnulagio capita sta e que teve como estratégia principal a integragio de parte dos explorados & cidadania. Mas, 20 mesmo tempo, o Welfare State nao dispensou o uso sistematico violéneia contra as minorias. Todavia, a partit dos anos 1970, com a crise do Estado de Bem-Estar social ¢ do modelo fordista de produglo, ¢ o predominio do capital financeito sobre o capital industrial, o tacismo gana uma nova configuragao. O fim do consumo de massa como padtdo produtivo predominante, o enfraquecimento dos sindicatos, 2 producio baseada em alta tecnologia e a supressao dos direitos sociais em ni da austeridade fiscal tornaram populagées inteiras submetidas as mais precsrias condigées ou simplesmente abandonadas& propria sorte, anunciando 0 que muitos onsideram o esgotamento do modelo expansivo do capital. O resultado disso & que antagonismos se acentuam, as contradigdes se agudizam, ¢ 0 racismo, o sexism « todas as discriminagées sociais assumem sua face mais cruel nesse contexto de Jisputa e esfacelamento da sociabilidade regida pelo trabalho abstrato. Assim, 0 cencarceramento em massa, fome, epidemias ou, simplesmente, a eliminago fsica aro o tom da forma do racismo nesse momento da hist6ria CO encarceramento e © assassinato pelas forcas policiais do Estado si “aceitos’ or parte da sociedade justamente pelo fato deste processo atingir especialmente ovens negros e moradores da periferia, ocasiio em que a compatibilidade da or ganizagao espacial e racial da sociedade mostra-se totalmente compativel com o nncionamento regular do capitalism. Por fim, como nos alerta Joachim Hirsch”, a ligagdo entre capitalismo, nacio- ‘listo, racismo ¢ sexismo nao € simples e funcional. Ao longo da hist6ria, esta pide se expandir como nuneafizera em sua hstria, a ponto de se cansoiar con tde mundial sem vais ~ a0 pérdulo punitivo. Sinais de esgotamento desta onde so encomtrados por todos os lands. O deseapregoestrutural que resulta de mais uma ba transfotmagao das forcasprelitivas voi tornand o trabalho escaso e obsaleto. A pobres cbyolita com fome em massa, juntemente com a mogte por epidemias, passa ase rep umn mesmice sem tégua. A disolug forma social regia pela valerizagbo pura fe prener todos os que parecen ameagadores parecer ni ter limites. No mundo inte {do Estados Unilos & China, e desta & Europa, passando pelo Brasil, estio encarcerande ropulagdesgignotescas Esta tendéncia evcla uma irracionalidade sem sald (.)” Meney Mario, Estudos sobternas. Rio de Janeiro: R isch, Joachim, Tenia materalita do Esa ransformaci Je Estates. Rio de Janeiro: Revan, 2010, p. 89 ligagdo ganhou os mais diferentes significados, formas e contetidos, a depender d Iutas sociais e das relagdes de forga travadas nacional ¢ internacionalmente. Mas ‘o que se pode observar até o momento é que, historicamente, o capitalismo e suas formas sociais basicas jamais se descolaram do racismo e do sexismo. Referencias bibliograticas ALTHUSSER, Louis. estado: nota sobre os aparelhos ideo AI). 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