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  • Maria Isaura Querizo Catolicismo Rustico

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    O CATOLICISMO ROSTICO NO BRASIL Maris ISAURA PEREIRA DE QUEIROZ 1 — Pluralidade dos catolicismos brasileiros A grande maioria dos 80 milhées de brasileiros declara em geral, por ocasiao dos recenseamentos, pertencer 4 Igreja.Catélica.(1) Pode-se, porém, afirmar que pelo menos dois tipos de catolicismo coexistiram sempre no pais: o catolicismo oficial e um catolicismo popular. Esta dualidade é an- tiga. “J& no perfodo colonial, escreve Roger Bastide, encontramios dois catolicismos diferentes e€ muitas vézes em oposicio: o catolicisma doméstico dos primeiros colonos, dos chefes de familia, e 0 catolicismo mais Romano, mais universalista, das ordens religiosas e principalmente dos jesuitas” (2). Thales de Azevedo, por sua vez, além de notar a persisténcia ainda. hoje de ambos, refere-se também a sua disparidade numérica: “A constatacéo de que os catélicos realmente dignos do nome constituem verdadeira mi- noria tem sido feita até mesmo por observadores catdlicos” (3). E dificil precisar quais as proporgdes dos adeptos de um ou outro dos dois tipos de eatolicismo,- pois nao sao captaveis por meio de categorias estatisticas. Tal dualidade n&o é exclusivamente brasileira, mas universal; em todos os paises existiu sempre oposigaéo entre de um lado as necessidades religio- sas esponténeamente formuladas pela massa da populaco aliadas A conser- vac&io de antigas tradigdes religiosas e, de outro lado, a estrutura de uma hierarquia sacerdotal, sustentada por um dogmatismo mais ou menos rigido. {1)_ © recenseamento de 1960 infelizmente nao oferece dados que permitam verificar a porcentagem de catdlicos no total da populacho, que deve se elevar a mais ou menos a 85%, (2) Roger Bastide — «Religion and the Church in Brazil» — «in» Brazil Portrait of Halts Gontinent, edits do por T. Lynn Smith and Alexander Marchant, The Dryden Press, N. Yor] (3) “Thales ‘de "aeevedo - — Catholicism in Brazils — Thought, vol,. XXVIII, no 109, Summer, © CATOLICISMO ROSTICO NO BRASIL 105 cionais que éstes estio habituados a encarar como sendo “verdadeiramente” ecatélicas. Os sacerdotes, em sua maioria, permanecem nas cidades ou nas zonas mais populosas; no. sertio e nas zonas rurais em geral so sempre escassos. As pardquias do interior, muito vastas, raramente dispdem de um vigario ali residindo em permanéncia, e muitas vézes um sé cura tem a seu cargo mais de uma pardquia; a extensdo a percorrer & de tal ordem que a maioria das localidades recebe a visita do vigdério apenas uma vez por ano. ‘Mas mesmo nas cidades a falta de padres é imporante. O Pe. Francois Houtart constatou-o em seu trabalho sébre a vida religiosa urbana na Amé- rica Latina: em 1954, a cidade do Rio de Janeiro tinha 110 pardquias e 197 padres diocesanos para uma populacio de trés milhdes de habitantes; na mesma época, Séo Paulo, com a mesma populacio, tinha 147 paréquias e 200 sacerdotes (7). A porcentagem de praticantes religiosos varia muito segundo as classes sociais. As classes sociais elevadas sao religiosamente mais instruidos e praticam mais a mitdo; habitam também bairros sempre melhor servidos de padres; pertencem as classes mais elevadas os 15 ou 20% de praticantes dominicais regulares com que conta o pais na totalidade de sua populacio. A instrugdo religiosa ministrada por sacerdotes é rara e atinge crian- gas de nivel social elevado, as quais seguem cursos de catecismo durante alguns meses, preparando-se para a primeira comunhfio. As criancas da plebe, seja2 em zona urbana, seja em zona rural, séo instrufdas por seus pais ou parentes, quase sempre analfabetos e que, por sua vez, foram no passado instruidos do mesmo modo. A fé é assim transmitida de geracio em geracéo por uma espécie de inércia conservadora, para empregar a ex- pressio de Thales de Azevedo: a grande maioria dos catélicos brasileiros recebem-na de heranga sem praticamente conhecerem a doutrina. E neste contexto que hoje se difundem cada vez mais protestantismo e espiritismo; seus adeptos sio ainda pouco numerosos quando comparados com a massa eatélica, mas sua vida religiosa é muito mais consciente e seu proselitismo, vigoroso (8).. 2 — Formagéo do catolicismo popular brasileiro. Do ponto de vista religioso, o povo brasileiro foi obrigado a se adaptar a duas condicées fundamentais, desde os primeiros tempos da colonizag&o: quantidade minima de sacerdotes e falta de conhecimentos religiosos. A (1) Francois Houtart — ¢Les conditions de la pastorale dans les grandes villes de VAmerique Latine> — Social Compass, vol, V, n° 5-8, Haya, Holanda. is) para ©, protestantismo, ver Brille G, ‘Léonard, 2” Tituminieme dans on Protestantisme de Constitution ‘Récent: Le Brés Para 0 e5) Hsmo, "ver Boaventura Kloppenbur, «Der, ‘Brasilanische Splnitismus als Religh efahrs — Social Compass, vol. V,'n° 5-6, Haya, Holanda, ose O CATOLICISMO RUSTICO NO BRASIL 105 cionais que éstes estio habituados a encarar como sendo “verdadeiramente” catdlicas, Os sacerdotes, em sua maioria, Permanecem nas cidades ou nas zonas mais populosas; no sertée e nas zonas rurais em geral sio sempre escassos. As paréquias do interior, muito vastas, raramente dispdem de um vigario ali residindo em permanéncia, e muitas vézes um so cura tem a seu cargo mais de uma paréquia; a extensdo a percorrer 6 de tal ordem que a maioria das localidades recebe a visita do vigdrio apenas uma vez por ano, Mas mesmo nas cidades a falta de padres é imporante. O Pe. Francois Houtart constatou-o em seu trabalho sébre a vida religiosa urbana na Amé- rica Latina: em 1954, a cidade do Rio de Janeiro tinha 110 paréquias e 197 padres diocesanos para uma Populacdo de trés milhdes de habitantes; na mesma época, Sdo Paulo, com a mesma Populac&o, tinha 147 paréquias e 200 sacerdotes (7). A porcentagem de praticantes religiosos varia muito segundo as classes sociais. As classes sociais elevadas sao religiosamente mais instruidos e praticam mais a middo; habitam também bairros sempre melhor servidos de padres; pertencem as classes mais elevadas os 15 ou 20% de praticantes dominicais ‘regulares com que conta o pais na totalidade de sua populacao. A instrugiio religiosa ministrada por sacerdotes é rara e atinge crian- gas de nivel social elevado, as quais seguem cursos de catecismo durante alguns meses, preparando-se para a primeira comunhao. As criancas da Plebe, seja em zona urbana, seja em zona rural, s&o instruidas por seus pais ou parentes, quase sempre analfabetos e que, por sua vez, foram no passado instruidos do mesmo modo. A fé é assim transmitida de geragao em geracéo por uma espécie de inércia conservadora, para empregar a ex- pressio de Thales de Azevedo: a grande maioria dos catélicos brasileiros recebem-na de heranca sem praticamente conhecerem a doutrina. E neste contexto que hoje se difundem cada vez mais protestantismo e espiritismo; Seus adeptos sio ainda pouco numerosos quando comparados com a massa catdlica, mas sua vida religiosa 6 muito mais consciente e seu proselitismo, vigoroso (8). 2 — Formagéo do catolicismo popular brasileiro. Do ponto de vista religioso, 0 povo brasileiro foi obrigado a se adaptar @ duas condic6es fundamentais, desde os primeiros tempos da colonizacéo: quantidade minima de sacerdotes e falta de conhecimentos religiosos. A {P ,Erancols Houtart —

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