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") Metodologia de pesquisa Ee ‘Aworta Cust0o0 Diresio: Capa e diagramagao: Teuma Custoo10 Revisso: Tinaco Zui Passer Kava Apu Penta Imagem da capa: BR.DEPOSITPHOTOS.COM CIP-BRASIL, CATALOGACAO NA FONTE SINDICATO NACIONAL DOS EDITORES DE LIVROS, RJ SO ee 955m Durko, Fabio Akcelrud Metodologia de pesquisa em literatura / Fabio Akcelrud Duro. - 1. ed, - S80 Paulo : Pardbola, 2020. 128 p.:23 cm (Teoria Literdtia 4) Inclui biblfografia ISBN 978-85-7934-178-6 1. Litératura - Histria e critica, 2, Pesquisa - Metodologia. |. Titulo, 19-61394 cob: 001.42 COU: 001.81:82 ‘Meri Gleice Rodrigue’ de Souza - Bibliotecéria CRB-7/6439 Direitos reservados & PARABOLA EDITORIAL Rua Dr. Mério Vicente, 394 - Ipiranga (04270-000 Sao Paulo, SP abx: [11] 5061-9262 | 5061-8075 | fax: [11] 2589-9263 home page: wwwparabolaeditorial.com.br e-mail: parabola@parabolaeditorial.com.br Todos os direitos reservados. Nenhuma parte desta obra pode str reprodu- ida ou transmitida por qualquer forma e/ou quaisquer meios (eletronico ou ‘mecénico, ncluindo fotocépia e gravacao) ou arquivada em qualquer sistema ou banco de dados sem permisséo por escrito da Parébola Editorial Ltda. ISBN: 978-85-7934-178-6 ©do texto: Fabio Akcelrud Duro, 2020. © da edicao: Pardbola Editorial, Sao Paulo, 2020. CAPITULO II ee O processo de descoberta oa parte da bibliografia sobre metodologia de pesquisa nas hu- manidades volta-se para a questo de como encontrar o material adequado e como lidar com ele. 0 MLA Handbook for Writers of Research Papers (2009) 6 um bom exemplo. Por ser publicado pela principal associacao norte-americana de estudos literdrios (geral- mente as entrevistas de emprego realizam-se durante seus congres- sos anuais), esse guia possui um carater quase oficial. A énfase toda recai sobre o achar e o sistematizar: como fazer uso de bancos de da- dos, de sistemas de informagao e dos recursos das bibliotecas; como tomar notas, organizar bibliografias e compor esbogos; como evitar o plagio e respeitar regras de escrita e formatagdo de textos acadé- micos. Tudo isso é muito importante — indispensdvel até — para o bom funcionamento da pesquisa; no entanto, nao toca no ponto que nos interessaré aqui, a dinamica do que dizer, de como postular algo sobre um objeto jé obtido, em oposicao as estratégias de pingd-lo do fluxo das coisas. Jé mencionamos que sé muito metaforicamente é possivel falar de experimento de pesquisa em literatura. O processo de descoberta, nesse caso, ndo se dé em um objeto inerte, pois um texto sé existe a medida que é lido, que seu estado de poténcia, por assim dizer, é transformado em realidade, por meio de um ato no qual o sujeito tem um papel ativo. Tal ato se chama interpretagao. Sua centralidade para a pesquisa reside em uma contradigao bdsica em seu nucleo, responsdvel por seu dinamismo: a simultanea auséncia e presenga de NY | oprocesso de descobeta N oy Faso Akcirue Dur&o Metodologia de pesquisa em literatura ON algo. Na interpretagao, oj existente, que j4 estava 14, e um “mais”, algo adicional, misturam-se. A cépia ipsis litteris de um texto nao conta como interpretagao, nao Ihe traz nada de novo’. Em contrapar. tida, a total falta de conexao sugere mais delirio do que leitura. Inter. pretar significa acrescentar algo & literalidade de um objeto de forma que, ao final, aquilo que foi adicionado parega pertencer a prépria coisa. Tanto mais forte seré a interpretagao quanto mais 0 elemento proposto pelo pesquisador aderir ao texto em questao. Ha varias consequéncias decorrentes dessa caracterizagao do processo interpretativo. Em primeiro lugar, é possivel discernir um principio de tensao entre literatura e investigagao, que difere da ideia usual de comentdrio como subserviéncia 4 obra — dai dizer- mos bibliografia secunddria —, como o simples esclarecer daquilo que estaria mais ou menos oculto. A pesquisa procura fixar a obra, exauri-la em seus enunciados, enquanto esta tiltima se esforga para, ao acolhé-los, deixar restos que se furtem 4 inteligibilidade criada pela interpretacéo’, Em segundo lugar, surge uma ideia importante, a de que ndo existem fatos literdrios como entidades discretas, inde- pendentes de uma intepretagao que os organize. Por muito tempo, estudar literatura profissionalmente signifi- cava colher dados sobre tudo aquilo que circundasse uma obra — a vida do autor, as condigées de publicagao do texto, as caracteristicas da sociedade da época — ou que nela estivesse presente como con- tetido ou problema textual. Talvez o que mais se aproximasse da- quilo que entendemos hoje por interpretagao fossem os estudos de influéncia, quando determinados temas ou modos de escrever de um escritor eram comparados com os de seus antecessores ou, menos frequentemente, de seus contemporaneos. Do ponto de vista da pes- quisa, isso soa hoje como pré-cientifico; tais estudos sao justificdveis * Ando ser que se argumente que a repeti¢ao exata faga sobressair o aspecto temporal d2 Telagdo entre 0 escrito em sua origem ¢ a iteracdo realizada a posteriori, Mesmo essim™. sso gesto, que tem algo de irreverente, nao é ele mesmo repetitivel. Uma cépia da c6pia da cépia néo tem graca. O locus classicus dessa questo é “Pierre Menard, autor do Quixote” (2007, de Borges. * Discuto a relagdo tensa entre obra e comentario em Modernismo e coeréncia (2012). no maximo como uma tarefa preliminar ao trabalho interpretativo propriamente dito. Se na investigagao nao existem fatos literdrios isolados, desvin- culados de um processo interpretativo, entao o trabalho de busca, por si s6, ndo conta como pesquisa. Tenho consciéncia de que essa ideia pode gerar polémica, mas ela é rigorosamente derivada do que estamos discutindo. Nao importa quéo dificil tenha sido achar uma fonte, quanto tempo foi necessario para descobrir certo texto em um arquivo — isso é louvdvel como um trabalho que por vezes pode ser decisivo para a compreensao futura das obras, mas nao pode ser con- siderado como pesquisa em seu sentido estrito. O mesmo vale para outros tipos importantes de produgdo académica, como a tradugao e a escrita criativa, pois sé se convertem em pesquisa quando a elas é acrescentado um caréter reflexivo, um texto que transforme em questdo a pratica realizada. ¥ importante diferenciar pesquisa de esforgo: embora nao haja pesquisa sem afinco, é plenamente possivel existir dispéndio (mes- mo extremo) de energia que nao sirva como pesquisa; em outras palavras, ndo hd pesquisa em literatura sem um momento de in- tervencao do sujeito, quando algo é postulado por parte do pes- guisador, algo que vai além da mera coleta. Isso néo é razdo para desmerecer o empenho; pelo contrario, vale aqui virar a questao ao avesso para perceber uma interessante possibilidade de critica reci- proca. De um lado, a pesquisa adverte para a tentagao de fetichizar a busca, que no limite parece estar querendo vender algo* e mere- cendo a pecha de oportunismo; por outro lado, porém, 6 possivel vislumbrar aqui o quanto a pesquisa é limitada diante daquilo que se pode fazer com textos literérios, pois ha formas de relaciona- mento com a literatura nas quais 0 rigor nao é tao importante, nem o papel do sujeito, tao primordial. Outro ponto que vale a pena enfatizar 6 o da diferenga entre a interpretagao, 0 méicleo da pesquisa e a descrigéo do objeto em jogo, 2 A logica da mercadoria ¢ sempre a de um ser-par -a-outro. Aquilo que é feito visando a ven- quar Aquilo que se acredita ser atrativo da deve necessariamente abdicar de si para s0 a para o comprador, Sob essa perspectiva, a pesquisa apresenta-se como seu opOsto- 29 Metodologia de pesquisa em literatura oS embora as duas nao sejam opostas e, sob certo Angulo, estojary ie gadas. Sem divida, existem interpretagoes peremptorias, que Prati, camente nao citam, assim como é possivel imaginar uma forma de exposigao que almeje subtrair totalmente o sujeito, deixando a Coiga falar por si mesma a partir da selegdo do material‘, Note-se, todavia, que neste tiltimo caso nao deixa de haver um gesto interpretatiy, na escolha do material a ser citado e que, no primeiro caso, sem ¢ mostrar descritivo, aproximamo-nos bastante do delirio. O erro a Ser evitado aqui esté em uma concepgao frouxa de descrigéo, na ideia de que interpretar significa fazer uma listagem de predicados do obje. to. Se vocé pensar que pode mobilizar a etimologia propria de cada palavra; comparar qualquer coisa com qualquer coisa, dentro e fora da obra; relacionar ideias ao texto, utilizando o pensador que mais dhe aprouver; prestar atengao a tudo aquilo que 0 texto oferece como materialidade, os sons, as imagens, os argumentos etc. Quando ‘voce se da conta de tudo isso, percebe que a listagem de predicados ea construgao de associagées sao potencialmente infinitas, tornando-se necessério algo que organize a massa textual, que lhe dé um direcio. namento, um rumo que possa conter a aleatoriedade caprichosa da selegao do material significante®. Por fim, uma diferenciagao terminolédgica: “Andlise” ¢ “interpre- tagdo” séo praticamente intercambidveis no uso comum do portu- gués e, mesmo na linguagem técnica da critica, muitas vezes nao é preciso distingui-las a ferro e fogo. Sua diferenciagao geralmente se faz necessdria quando se almeja enfatizar o processo de segmentaga0 € ponderagao da andlise ou o resultado da leitura com a interpreta- ¢ao. No fundo, ambos devem ser pensados juntos, pois uma anilise sem interpretacao sugere algo mecanico, sem autoconsciéncia, ¢ uma interpretagéo sem anélise aproxima-a do devaneio ou do wishful thinking, o pensamento caprichoso. ; O.exemplo paradigmético aqui 60 livro das Passagens (2006), de Walter Benjamin. on ‘ ae ee Por que nao se entrogar a deriva do texto e an a 5 ‘esposta 6 dupla: primeiro porque, como existe uma pe: ia ‘i 5; segund® pan Gas seociagbes,no final ela é quem vai sero objeto da leitura, endo o texto; s Poraue a falta de conexées faz com que o discurso seja entediante. Aestrutura da conjectura Esse elemento norteador é a hipétese interpretativa. Sob uma forma proposicional, ela seria algo como: 0 objeto "x" significa “y". Cada um desses trés termos merece ser considerado separadamente. 0 primeiro, 0 “x”, corresponde ao recorte do objeto. & importante notar aqui que nao h restrigao alguma a sua configuragao, pois res- peitando-se obviamente a configuragao da area, qualquer coisa pode servir como corpus de pesquisa, desde o artefato mais infimo, diga- mos, um haicai, até o mais extenso, como a sexualidade ocidental. Naturalmente, a magnitude do objeto incidira sobre a sua forma de exposigao, e assim como é um tour de force fazer uma tese de dou- torado sobre um soneto, serA virtualmente impossivel abordar com algum proveito a sexualidade ocidental em um artigo de revista aca- démica, com suas usuais 5.000 — 7.000 palavras, a nao ser, é claro, que o autor seja dotado de um poder de concisao e sintese absoluta- mente fora do comum. A liberdade de selegao do objeto deve ser enfatizada porque vai além de questées de medida para incluir também aspectos qualita- tivos. O fato de qualquer tema poder ser investigado sem subterft- gios ou meias palavras, incluindo aquilo que, do ponto de vista da religiao, dos bons costumes ou de certas politicas partidarias deve- ria ser silenciado, representa em grande medida uma conquista dos estudos literérios quando acolhidos na universidade, 0 que merece ser valorizado. A escolha do objeto j4 é uma oportunidade para o exercicio da imaginagao critica e quanto menos evidente ele for & primeira vista, tanto mais interessante poderd ser a interpretagiio’. Ela pode envol- ver uma visada ampla e articular coisas diferentes, contraditérias ou © x também pode ser algo construfdo, uma conjungao dé objetos ou aspectos aparentemente desconectados. & interessante observar que a ascensio da teoria como campo semiauténo- ‘mo (Duro, 2011) ¢ dos estudos culturais deveu-se om certa medida a novidade daquilo que se colocava como objeto de pesquisa. Embora possa ser eletrizante tematizar algo inaudito 0u arrojado (o abjeto, a tortura, o genocidio, a Barbie ou a Disney...), sem os outros elemen- tos da estrutura proposicional, a anélise facilmente fica refém da moda. O mesmo pode ser Gito da proposicao sobre x na obra/autor y, quando x pretende ser algo inusitado. es a | aparentemente incompativeis, assim como pode correspondey ay aspecto interno de uma obra. Em suma, ao mesmo tempo em ue, “x" 6 @ priori indeterminado, ele possui um aspecto pré- formato, Por isso, é estranho se dar conta de que para varias pessoas » ary alguns programas de pés-graduagao, a pergunta “com o TUE Voda trabalha?” equivale a “qual autor vocé estuda?”. Com efeito, Brande parte das dissertagées e teses defendidas no Brasil voltam-se para: (1) obras especfficas; (2) autores determinados; (3) movimentos literérios; (4) comparagées de textos. Poucas vezes se faz uso da liberdade oferecida pela pesquisa para construir questées originais; quando muito, ela ampara-se no horizonte de um autor, por meio de uma preposigao: a utopia em Ma- nuel Bandeira, a modernizagao em Mario de Andrade. Vale observar aqui que essa fixidez na configuragao dos objetos esta em uma relag4o de causa e consequéncia com certa imobilida- de ou lentidao dos campos de pesquisa, que seréo abordados mais 4 frente. Isso nao é de estranhar, pois pesquisas individuais e campos definem-se reciprocamente: os campos constituem-se no conjun- to das pesquisas individuais feitas em seu interior, assim como as pesquisas individuais devem inserir-se, nem que seja a posteriori, em campos especificos. Em contrapartida, essa relagdo nao deixa de conter tenses e, em raros casos, novos objetos fazem surgir novos campos, que por sua vez convidam a exploragao de objetos inéditos. Para dizer de outro modo, hé um potencial conflito entre a liber- dade a priori que caracteriza o “x” e a fungao reguladora da ideia de 4rea. Retomaremos essa discussao abaixo, Enquanto isso, vale obset~ var que existe outro lado da liberdade na escolha de objetos quando o novo e 0 diferente se impdem como valores positivos, independen- temente do teor dos textos analisados, Se sua tnica motivagao para estudar algo € 0 fato de esse algo nao ter recebido suficiente atencao ainda, vocé pode ser acusado de estar simplesmente querendo ocupar espacos ¢ fazer carreira pela carreira, a definigdo de oportunismo. E se esse argumento for considerado valido para a universidade, ou soja, se ela se legitimar tao somente pelo gesto de langar luz na escu- ridao, de falar sobre algo nao discutido ainda, entéo ela se converte em uma grande maquina produtora de enunciados, pura tagarelice. Burocracia nao 6 um nome ruim para esse tipo de funcionamento. Antes de progredir, porém, uma observagao lateral: 6 comum a crenga de que, quando o pesquisador se encontra em estagio inicial da carreira, cabe ao orientador a escolha do objeto de investigagao. Isso 6 questionavel. Esforgo sem desejo seria outra definigao de bu- rocracia. A precondigao para a escolha de um objeto de pesquisa é nao lhe ser indiferente, mas envolvé-lo em uma estrutura pulsional. Isso nao quer dizer que se deva amé-lo, pois geralmente 6 mais facil escrever sobre aquilo que incomoda ou irrita do que sobre o que fascina. Um exemplo de como os afetos negativos frequentemente sao mais produtivos do que os positivos: os elogios depois de certo tamanho tornam-se ridiculos, as fofocas por outro lado sao infinita- mente expansiveis. Aquestao da escolha do objeto langa uma luz sobre a incomple- tude, ou mesmo insuficiéncia, da pesquisa em relagao aquilo que foi chamado acima (p. 17) de vida literaria. Porque o ideal é que o fu- turo pesquisador jé tenha sido exposto a obras suficientes para que possa saber aquilo que lhe interessa. Se nada o move, é licito per- guntar se vale a pena fazer pesquisa’. Seja como for, um conselho é itil: confie em seu préprio desejo e nao eleja um tema s6 porque ele esté na moda. Uma das maneiras de caracterizar uma boa relagao com 0 objeto de pesquisa é por meio da ideia de apropriagdo; toma- -lo para si, para, com isso, poder dar-se a liberdade de fazer coisas inusitadas com ele. Y, por outro lado, é simultaneamente 0 que ha de mais precioso na interpretagdo e o que é mais dificil de descrever. Ele representa o momento de construgao subjetiva, da invengdo e da criatividade, quando o pesquisador propée um elemento adicional, que néo esta no texto, mas que, depois de fornecido, parece sempre ter estado la. O que existe de frustrante em um livro como este é que 0 y nao pode 7 Ee claro que a necessidade de escolha como uma regra a priori 6 um elemento complicador. BB | cproceso de descoera Metodloia de psiquia em teat | Feo cane Dao | ser rigorosamente ensinado — no entanto, é justamente isso que faz com que a interpretagao seja tao emocionante ¢ capaz de mobiliza, tanto as pessoas. ‘A criatividade, como qualquer tipo de inteligéncia, 6 algo que obviamente nao se leciona, embora seja transmissivel. Como ela faz surgir 0 novo e 0 surpreendente, nao adianta focar em seu resultadg porque a repeticao do criativo j4 nao o 6, Ha, entretanto, algumag coisas que podem ser comentadas a seu respeito, porque talvez de- terminante aqui seja mais uma questao de postura do que de um contetido especifico. Em primeiro lugar, em relagao a flexibilidade e riqueza mental; assim como é aconselhavel que o pesquisador se insira em um hori- zonte cultural amplo para poder realizar uma escolha propicia de ob- jeto, também é recomendavel que tenha sido exposto a uma varieda- de de textos diferentes que energizem e ampliem a sua imaginacao. A ideia brilhante, aquele insight inusitado, frequentemente possui algo de caprichoso, quase como uma vida propria: néo vem quan- do o chamamos, mas quando quer. Intuigdo e intencionalidade nao se combinam facilmente. Uma bagagem vasta propicia articulagées imprevistas de textos e de géneros, além de mostrar a imaginagao 0 horizonte do possivel. O elemento y, portanto, funciona como uma espécie de critica & instrumentalidade encorajada pela universidade com o processo de especializacao. A curiosidade desinteressada pode ser, a longo prazo, interessante. Uma segunda estratégia residiria na atengéo a um aspecto mi- mético na relagéo com o saber. Como o mundo em que vivemos é profundamente individualista, temos bastante dificuldade em perce- ber como a produgao de conhecimento é algo inerentemente coletivo. Até a descoberta mais ousada e genial, que parece ser fruto de uma mente singular, baseia-se em toda uma rede de interagGes, de contato com textos passados e discussdes presentes, conversas com diversas pessoas etc. Se é impossivel aprender o “o que” da criatividade, n40 é impraticdvel tentar se aproximar do “como” e prestar atengao 40 modus operandi da inteligéncia alheia, na forma como pensar 08 grandes criticos do passado, mesmo quando discordamos do contet doide — textos. Essa ideia da cépia como parte de um processo de internalizagéo ¢ das mais antigas e ainda pode ser itil em uma época que tendo a caracteriar a busca polo saber como uma empreitada individual e competitiva, : ° terceiro componente da hipétese de leitura 6 0 verbo que une 0 objeto Aquilo que vai ser acrescentado a ele. Se o primeiro envolve o problema da selegao e este tiltimo, o da inventividade, o que esté em jogo agora é a conexo dos dois por meio de argumentos que devem tentar ser o mais rigorosos posstvel, No encontro entre autor, obra e pesquisador, nao existe nada semelhante a uma empatia mistica ou sintonia transcendental: para a pesquisa, néo ha espago para o ine- favel; ao invés disso, a relagéo entre x e y deve ser discursivamente demonstrada com ideias claras e bem concatenadas. Entretanto, isso nao significa, como se ouve dizer com alguma frequéncia, que o dis- curso cientifico seja excessivamente restritivo. Aliberdade expositiva da escrita académica é consideravel; como o que 6 determinante é o processo de articulagao das ideias, qualquer impedimento ou dificuldade pode ser contornado ao ser trazido & tona e explicado. Como jé mencionado acima, nao ha assunto vetado apriori, e qualquer tema controverso pode ser estudado: a tortura, 0 abjeto, 0 escatolégico etc. Tudo o que é necessario é uma justificativa para tanto. Na maior parte dos casos, as reclamagées de que formas académicas tolhem a imaginacao advém de uma competéncia apenas parcial do jogo argumentativo. Como diz um personagem de Oscar Wilde, “Never speak disrespectfully of Society, Algernon. Only people who can’t get into it do that”. Se bem-sucedida, essa forma de predicagao gera um curioso efei- tivo: depois de enunciado, é como se y pertencesse desde ‘*significar” perde algo de sua transitividade para elhar-se a um verbo de ligagao®. Com isso, quisa em literatura nao é nem exata- mte indutiva, mas faz acontecer um to performat sempre a x. Assim, progressivamente assem« 6 possivel perceber como a pest mente dedutiva, nem propriame i jetendo a ® Talvez seja possivel expressar isso forgando um pouco o sentido do verbo e remé seu sentido literal de “fazer signo”. | © proceso de deicobeta w a 36 g i 3 2 amélgama dos dois. Grosso modo, se Y for dedutivo, x sera indutivg — para leitores de Hegel, “mediagao" seria ° moran mals. preciso, i tem consequéncias para a yelagdo entre sujeito e objeto, pois ambos tendem a uma sintese que, nO fundo, acarreta uma dissotucio ee fos casos mais veementes, 0 efeito performativo 6 tao forte que © objeto de outra maneira sendo como rpretagao. Quando isso acontece, 9 tua. Ni nao se consegue vislumbrar coincidindo com determinada inte interesse pelo texto como alvo de i mudando o angulo, para que uma gr’ de, ela precisa esbogar alguma resistén hd nenhuma razao epistemoldgica ou ont que os textos classicos continuem sendo esta comprometida com a produgao de um co! ciéncia, hé algo de impiedoso nela. Agora volto ao contraste feito anteriormente entre descrigao e nvestigagdo futura diminui — ou, ande obra continue sendo gran- cia A interpretagao forte. Nao oldgica a priori que garanta fonte de saber. A pesquisa mnhecimento novo. Como interpretagao e menciono rapidamente um exemplo concreto. Sobre 0 Bras Cubas, de Machado de Assis, é possivel dizer que o narrador, em primeira pessoa, 6 0 personagem principal do romance; 0 texto possui aspectos cémicos; a narrativa é interrompida o tempo todo; o autor interpela o leitor frequentemente; a linguagem é a de um por- tugués erudito porém claro ete. Apesar de se basear no romance, esse conjunto de predicados se mostra desarticulado quando 0 compara mos, por exemplo, com a hipétese de leitura proposta por Roberto Schwarz em Um mestre na periferia do capitalismo (2000). 0 “x" descoberto por Schwarz corresponde a uma forma deter- minada, a oscilagao sistematica por parte do narrador entre duas visdes de mundo opostas e incompativeis: uma voltando-se ao mun- do colonial, no qual predominam relagées pessoais de dominagao, ¢ outra, ao universo impessoal do capitalismo moderno. 0 “y" postula que essas alternancias representam mais do que uma tendéncia do personagem Bras Cubas porque, na realidade, encenam a posigao da classe dominante do Brasil no final do século XIX, que era capaz de apelar para uma ou outra visao de mundo conforme seus interes- ses particulares. O “significa” estrutura a argumentacao, que comeg? com uma leitura atenta do romance, decalcando pouco a pouco 0s elementos textuais que serao consolidados como forma. De fato, o estudo de Schwarz presta-se a ser lido a partir de sua forma e inde- pendentemente do romance machadiano; para tanto, basta atentar para as estratégias de construgao e encaminhamento da hipétese de leitura, a0 mesmo tempo, rigorosas e imaginativas Para concluir esta parte, duas observagées titeis sobre a hip6- tese de leitura. Primeiramente, ela 6 um mecanismo heuristico que instaura uma perspectiva questionadora em relagao ao objeto; nao tem nada a ver com alguma nogio de dificuldade. £ plenamente pos- sivel lidar com um texto muito dificil sem acrescentar nada a ele, simplesmente decompondo-o ou parafraseando-o, por exemplo, do mesmo modo que se pode incentivar a formagao de hipéteses de lei- tura desde o primeiro ano da graduagao — quigd mesmo no ensino médio. O que varia 6 o grau de complexidade mobilizado. Quanto mais avangado o nivel, tanto mais sofisticada pode ser a hipéte- se, articulando saberes amplos, ideias contraintuitivas e universos textuais extensos. Somente para 0 doutorado se espera uma incor- poragao do estado da arte, uma bibliografia dominada e uma visdo de cima. Para repetir e enfatizar, nao hé diferenga entre a iniciagao cientifica e o doutorado no que se refere & postura do pesquisador, mas sim quanto a profundidade e sofisticagéo, 4 maturidade, enfim, da hipétese de leitura. Em segundo lugar, 6 sempre bom nao perder de vista que a hip6- tese de leitura esté submetida aos procedimentos retéricos de exposi- cao dos achados interpretativos. Embora seja mais simples e seguro deixar claro no comego a ideia reguladora do texto, nao é estritamen- te necessério ter de dizer “minha hipétese de leitura é a de que...”. Ela pode aparecer em diferentes momentos da apresentagao, pode ser desmembrada, composta de elementos contraditérios etc. E preciso ter em mente que, quanto mais sofisticados 0 processo de composi- ao e a articulagao da hipdtese de leitura com o resto do texto, tanto maior deve ser a autoconfianga do pesquisador em sua capacidade de escrita e clareza de pensamento, pois quanto mais indireta e obliqua tanto mais nitidas devem ser suas ideias para é também necessario estar consciente a forma de exposigao, si mesmo. Em contrapartida, a w x w © Metodologia de pesquisa em literatura | Fano Axceunup Dusko | da forga organizadora contida nos diferentes géneros de escrita aca. démica. Pelo simples fato de conter um abstract e keywords, 0 artigo obriga a enunciagao da hipétese de leitura logo no comego’. Jé de um ensaio espera-se uma configuragao argumentativa mais fluida, ag passo que um projeto é 0 tiltimo lugar para a pratica de experimentog expositivos, Finalmente, por seu tamanho — e pelo fato de a banca ser obrigada a ler o trabalho —, uma dissertagao ou tese permitem uma variedade considerdvel de procedimentos retéricos. Aleitura Comegamos definindo a interpretagéo como um procedimento que conjuga auséncia e presenga, o acréscimo de algo que depois parece sempre ter estado 1d. Se isso se sustenta, entao 0 processo de mediagao entre o dentro e o fora do texto torna-se decisivo, o que nos leva a pensar nos instrumentos adequados para tanto. Na historia da critica literdria, a atribuigéo de causas desempenhou uma fungao importante no século XIX; romantismo e positivis- mo convergem na procura por condicionantes externos ao texto para conferir-Ihe sentido, a diferenga mostrando-se apenas no tipo de origem: biografica, para o primeiro, e do meio social, clima ou raga, para o tiltimo. Outro procedimento relevante de leitura era 0 comparativismo, que cotejava obras e autores de periodos diver- sos buscando alcangar uma iluminagao mtitua, um terceiro termo que permaneceria apagado e somente poderia aparecer no confron- to de coisas dispares. Tanto a atribuigao de causas quanto a comparagao viriam a ser criticadas por mobilizarem para a anélise elementos extrinsecos a0 texto em questao. A oposigao entre interno vs. externo ou imanente vs. heterénomo jé fez derramar muita tinta e talvez nao seja exata- mente a melhor maneira de expressar o problema, pois o que esta Bee eee > Uma amiga certa vez me disse que nao spoilers da ideia central, tirando toda a e mento, que agora era visto como um enre surprise ending nao é nada mé. Bostava de artigos porque eles sempre davam Smogéo, todo o suspense da progressdo do argu- 'o. Com efeito, a ideia de uma concluséo como um ————— em jogo nao é algo topografico, mas uma questao de rigor légico. As causas possiveis e os textos A disposigao para contraste sao conjun- tos abertos, potencialmente infinitos; 0 desejével, ao invés, seria um método de leitura que limitasse o horizonte da causalidade e do comparativismo, de modo a aproximar a interpretagao do necessé- rio e do obrigatério e nao do contingente e do caprichoso, aproxi- mando-a assim da ciéncia. Tal método recebeu o nome de leitura cerrada, ou leitura atenta, em inglés close reading. Seu trago mais fundamental é uma atengao extrema aos potenciais de significagao do texto em todas as suas dimens6es; nesse sentido, tem um parentesco claro com a ané- lise retorica da antiguidade classica, a exegese da Biblia ou a inter- pretagao juridica. Do ponto de vista da histéria da teoria literdria, ela é normalmente associada 4 chamada Nova Critica, um movimento critico que tomou forma no mundo anglo-saxao a partir da década de 1940 e foi responsdvel por um novo patamar de insergao da litera- tura na universidade". No Brasil, seus primeiros praticantes foram Antonio Candido e Afranio Coutinho, dois criticos importantissimos para a consolidagao académica dos estudos literarios no pats. O close reading é frequentemente descrito como um método, 0 que nao é de todo apropriado, pois assumiré contornos bastante variados, a depender, entre outros fatores, dos fins e dos objetos em questao. Uma leitura cerrada que vise provar a organicidade de um poema, como ele constréi uma totalidade harménica, sera muito di- ferente em tom de uma que almeje realizar uma critica ideolégica, detectar escorregées, vacilos ou fissuras em um discurso dominante. J4 quanto aos artefatos sob a lupa, ha naturalmente uma diferenga de adequacao. Um curto poema solicita, quase que obrigatoriamente, uma leitura esmiugada, ao passo que um romance pode demandar sentido geral para que o detalhe seja ana- ais adequado referir-se a leitura cerra- uma fixagéo demorada do lisdvel, Por isso, talvez seja m 6 obviamente extensa. Graff (2007) fornece uma outras referéncias em inglés sdo Leitch (2010) wrir Eagleton (1991; 2006), bem como os textos "© A bibliografia sobre 0 New Criticism histéria institucional bastante influente; Litz et al. (2000). Em portugués, vale confer contidos em Lima (2002). & | oprocesso de descberta Mado ae persen ena | reo head | da como uma técnica, porém com um adendo importante: ela exigg uma disposicao subjetiva, uma postura analitica capaz de lidar com a lentidao, de se demorar na e com a obra, exatamente 0 oposto qq chamada leitura dinamica (em inglés browse ou skim), tao Consoante com 0 espirito do nosso tempo. A leitura cerrada 6 regida por um principio tautolégico, pois a atribuigéo de causas e a comparagéo acontecem em relagao ao pré. prio objeto. A primeira pée em cena aquilo que seria o sentido geral, agora entendido como principio de causalidade que motiva todo 9 resto. Com isso, surge a possibilidade de investigar as relagées entre todo e partes, sentido geral e detalhes. Ja em relagao 4 compara- cao, deve-se imaginé-la acontecendo dentro do proprio objeto, um contraste consigo mesmo, o que gera a possibilidade da obra conter tensdes e dissonancias dentro de si. Aconsolidagao da leitura cerrada como procedimento heuristico tem consequéncias decisivas para a constituigéo dos estudos literé- rios como disciplina académica legitima; em outras palavras, o close reading permite reivindicar uma habilidade de leitura exclusiva da area, discrepante em relagao as outras. O que define a inscrigao ins- titucional dos estudos literrios e permite sua diferenga em relagao a outros campos do saber é o fato de lidarem com as obras como algo em si, como obras. Os historiadores sao proximos dos criticos litera- rios porque também as leem, mas as encaram como documentos, que remetem as datas em que foram escritos; 0 mesmo pode ser dito dos filésofos, com quem os criticos possuem uma interlocugéo intima, mas que estao preocupados com ideias e com a tradigao na qual se inserem — e assim por diante, com a psicandlise e as formagées do inconsciente, a antropologia e as diferentes culturas, a comunicaga0 eo mercado etc. Somente para os estudiosos da literatura, a materialidade tex- tual dos seus objetos é determinante do ponto de vista do sentido". Ha varios outros jeitos de dizer isso: poderfamos observar que aqui ™ # por isso que creio ser o teste de Litmus para o pertencimento a rea de Letras a ca- Pacidade de interpretar imanentemente um texto, ou seja, a partir daquilo que ele mesmo fornece, sem o apoio de um pré-moldado teérico. Causa espanto perceber que profissionais ‘bem estabelecidos no meio se mostram incompetentes para fazé-lo. “o que” se mistura ao “como”, ou que o texto literério nao pode ser redutivel & parafrase, ou que a forma de exposigdo incide sobre o objeto, ou ainda que elementos secundarios no processo de signifi- cagao (uma sucessao de fonemas, uma estrutura ritmica, um con- junto de figuras de linguagem...) passam a adquirir sentido. f in- teressante notar, nesse contexto, a ficcionalidade da literatura nao surgir tao decisivamente como aspecto caracterizador do literdrio como se pensa normalmente. Seja como for, se forma e contetido fundem-se na obra, a leitura cerrada é um instrumento privilegiado para chamar a atengao para isso, pois ela pode ser definida como um tipo de ateng&o que vai decalcar do material verbal as passa- gens ou itens dignos de serem postos sob a lupa analitica; ou, com outra terminologia, ela marca um corte que interrompe o fluxo da leitura e do sentido. Grosso modo, e com alguma artificialidade analitica, seria pos- sivel decompor a leitura cerrada em trés gestos constitutivos. O pri- meiro € o da escolha do trecho ou elemento a ser analisado. Como 6 impossivel explicar tudo, torna-se necessério um talento préprio para parar e suspender a concatenagao de elementos significantes (sons, imagens, raciocinios) e pingar algo prenhe de sentido. Mas vale observar que esse talento, diferentemente do que vemos nos filmes, normalmente nao se dé como uma simples faisca; pelo contrario, ele alimenta-se da familiaridade com o texto, que deve ser visitado di- versas vezes. A leitura interpretativa da pesquisa difere diametral- mente daquela feita fora da universidade, centrada no enredo. Saber o final da historia é uma precondigao para decalcar algo de signifi- cante, Nesse sentido, a légica do spoiler é inversa: é quase como se fosse desejavel livrar-se de antemao da surpresa do fim, para que 0 interessante aparega como tal. Desnecessario salientar como essa pratica de leitura é avessa aquela fomentada pelo mercado, caracte- rizada pela decifragao répida e superficial de textos voltados a pro- dugao de sensagoes. O segundo gesto refere-se & imaginagao interpretativa do pes- quisador, do que fazer com o detalhe selecionado: trata-se da ambi- Buidade de uma palavra, de um encadeamento particular de ideias, de uma sucessao reveladora de fonemas? Na maioria das vezes, a & 42 sane dat | cemliteratura | Fa \dologia de pes selegdo e a elaboragéo implicam-se mutuamente, pois “o que” eo “porqué” tendem a surgir em uma tinica ideia. Quando isso nao ocor. re e 0 dado textual parece rico, porém mudo, 6 aconselhavel cogitar abandona-lo. Algo que enfraquece a leitura cerrada 6 a projecao de sentido por parte do intérprete, o desejo de atribuir significado aum material linguistico que parece recusar-se a tanto. E claro, muitas vezes 6 bem ténue o limite entre o forgar a barra e a descoberta do novo"? e, como nao hé regra de ouro, deve-se confiar na propria in. tuigdo, ou, o que é melhor, submeter 0 achado a apreciagao de bongs leitores, pois, como repetidamente veremos, pesquisa cientifica e co- munidade implicam-se mutualmente. Por fim, existe a relagdo entre a materialidade decalcada e ana- lisada na leitura cerrada e sua articulagéo com o argumento desen- volvido. O ideal é 0 resultado do close reading se articular apropria- damente com a hipétese interpretativa, de modo a se reforgarem mutuamente, esta tltima fornecendo uma diregaéo para a minticia interpretativa, e a leitura cerrada sustentando materialmente a ideia defendida. Quanto mais frouxa a conexaéo entre ambas, menos vee- mente ser 0 resultado. O pior caso é o da simples verificagao, quan- do uma ideia é oferecida para, em seguida, ser comprovada no texto; isso ocorre frequentemente com abordagens quantitativas ou basea- das na recorréncia de determinados itens. Em contrapartida, na lei- tura cerrada mais forte, o protagonismo parece residir no proprio trecho escolhido e 0 comentario tao somente parece trazer a tona algo latente, talvez até mesmo ébvio. O verbo aqui é importante, porque em jogo esta um efeito retérico que, quando bem-sucedido, oculta o esforgo do sujeito, como um pianista que faz parecer facil uma sonata de Prokofiev, O fascinante de um close reading bem-sucedido esté no seu po- tencial de configuragéo de sentido, nao apenas gerando possibilide- des dificeis de imaginar de outro modo, mas também alterando 0 ae %2 Posso dar um exemplo pessoal: em uma leitura rreu-me propor uma sugestéo de sufixo de gertindi que descreve justamente o vir-a-nada do homem aj Jluminagdo soméntica pareceu-me forte 9 sufcion de The Snow Man (Duréo, 2019) ocor- io na palavra “nothing” em um pooma le neve, no duplo sentido do genitivo. A te para justificar a violéncia morfolégica.

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