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Educando a Direita Nv Tombo2479 aus c Propo Rb; Databkiod 260i Proce a lates, ‘dos Intomacionas do Catalogo na Pubicagto (CIP) {Camara Brest do Livro, SP rat. i Mol "ani omer, aden, Das dpa rio gins Edn te “ght wy mat Has, Geant. Inaices para caitoge sstamatio: Biblioteca Freiriana 5 Michael W. Apple Educando a Direita Revisio Téenia de José Fustiquio Roma. swotos278e IMI SB @ vice “teint hing he “Rh Wy bet, Son, dey Mtl W- Apple ce DAC . od tart Das AQ. Mor shun pre ds is pose er mpi pda atone era {© 20by Roge aer —NY/London it pa an Bria, 317 — Reine un Cov or 0 — 9 22—7 andar Sea sti Fe G1) 86LeSD G/ML TP nat soneoteenidcncomby mae lepers Ingres a Bas — jl 2003 cH INSTITUTO PAULO FREIRE Diotcs Feian Conse editorial Adriana Page (Argentina, Anton Toda on, Aros Ovens Mi), Arl Ben cy, Caos Abert Torres) {2 Cb ton, Daniel cgresky andl Et el la, se Gutcrcs (er, Je Rovers (Fer) ove Eustis Rome (ae | Frank nga toni isobar apo. sessing Herken (ny es Shr Asn Chay Caan, lle Thoms Lint Ke Utane M opeet argentina Corkr fost, aoe Sb (Ss Moser Gado fesord), Moaeye de Goce (Bos, (ice Auguste Pesca Hever Meaty, Pau Rows (Coto aul free: Reie- Bex, Pt Ta {amc ep Api span, er ayo Ma, PaarOF Cadi (USA), Rayon ‘Moro Cady Real Matis ew Bal), Rcd Cavern, Rage Date Nes Zeta Steve Stee (Pra. ylea Sele Men, ae Petes Car fawn 2a Gouna aD, CConsthaltenscgna de Asesotes (tom Pte eke Tas Angeles ser de 20) silent Bild Hal (Canad, Vine pens Abie Kuss (Asin Ck anda {Amarin Latina), Fok Youngman (Ac) ¢ fen oh Menon: a Pgga Anglia, An ts. 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Een Official Kunlaige e em Cultural Politics and Education, combine! investigagies histricas, emplricas e conceituais, fe procurei mostrar alguns dos maioces perigos associa a ess05 "te formas’. A infliéncia que essa posicBes tem hoje sebre.a sociedade fem geral e sobre a politica ea pritca educacional em particular no tliminuiu, a0 conteéro: intensficow-se e arraigou-se mais ainda no senso comum de nossa sociedade e de muitas outras. Essa situagio equer andlises criticas que sejam, elas préprias, mais profundas © amplas ainda, Por isso este livro. Edacando a dveta fundamenta-se os volumes que o precesteram, mas estende sua andlise critica para o que espero que sejam diregies mais empolgantes ainda Preciso ser hanesto agi desde o inicio. Neste livro, meus argu- _mentos sf alimentados por ma série de coisas: um nuimero conside- rivel de evidéncias nacionaise intemacionais sobre os efeitos das politics correntes da educagio; minha partcipagio em movimentos ‘contra a reestruturagio radicalmente conservadora da educagio em _mitasnagGes, experincias que sio uma evidéncia da natureza abso- Iutamente fantéstca das vidas e esperangas que serio perdidas se n30 continuarmos a batalha contra essas politica: e, por fim, minha pro pia indignagio canta a arcogineia daquees que acreditam tanto na Iigica da mercado que nio conseguem enxergar os danos que essa artogineia cria no mundo real Portanto, minhas preocupagies aqui nao se baseiam somente no mundo do debate académico, mas também nama quantidade consi- dervel de experiéncias pessoas aqui eno exterior. Como disse mais Adetathadamente em Power, Menning, end Identity, um liveo recente de ‘minha autora, os anos que pastei como professor em escolassituadas no centro empobrecide das cidades e na zona rural deixaram absoli- tamente claro para mim que palavras grandiloqientes sobre efiién a, formas de avaliagio, excelnca e padres de qualidade, no mais dlas vezes, passam a0 largo das realidades das escolas de verdade e das sas de ala de verdade cheins de professores de verdadee alt nos de verdade, e castumam ser ieemediavelmente ingénuas aes peito das condicSes eaondmicase sociais dos pais, das mies e das ‘comunidades. © fato de eu tr visto de perto 6 que essas paitcas © priticas conservadoras,e 08 cores nos servigos que elas implicamn, Fizeram a membros préximos de minha pespia familia também & una motivagio, ‘Como no caso de qualquer ivr, este volume é na verdade, tm obra coetiva. Hi muita gente dentro e fora da educagio cua sabedo. Fla tem sido importante no sentido de me possbilitae vero que eu N30 teria visto sozinho. Mas, dada a natureza deste livro em particular, ‘minhas dividas sto ainda maiores e mais intemacionais que de hab to. A lista € longa; mas as dvidas so grandes. Dente as pessoas que me ajudaram a pensar ¢tirar conclusies a respeito de uma série de rgumentos apresentados neste liv estio Petter Aasen, fil Adler, Peter Apple, Shigeru Asanuma, Bernadette Baker, Stephen Ball, Len Barton, Basil Bernstein, Jo Boaler, Barbara Brodhagen, Kristen Buras, Dennis Carlson, Wilfred Carr, Roger Dale, Ann DeVaney, Debbie Epstein, Manuel Fabroga, Stephen Fain, Nillon Fischer, Regina Leite Gareia, David Gillborn, Carl Grant, Beth Graue, Maxine Greene, Richard Hatcher, Diana Hess, Allen Hunter, Michael James, Jonathan, Jansen, Knud Jensen, Daniel Kallos, Ki Seok Kim, Herbert Klieband, Tue-Ho Ko, Julia Koza, Gloria Ladson Billings, Theadore Lewis, Lisbeth Lindahl, Alan Lockwood, Allan Luke, Bric Margonis, Fernando Mathuenda, ames Marshall, Cameron McCarthy, Robert McChesney, Mary Metz, lex Molnar, Anténio Flavio Morita, Akio Nagao, An tonio Névoa, Michael Olneck, José Pacheco, Stefan Palma, Joio Paraskeva, Bu-Kwon Park, Daniel Pekarsky, Michael Peters, Gary Price, Susan Robertson, Judyth Sachs, Fan Schrag, Simone Schyveber, Mi Ock Shim, Tomaz Tadew da Silva, Parlo Singh, Graham Hingangaroa Smith, Linda Tubiwai Smith, Richard Smith, Amy ‘Stambach, Gita Steiner-Kamsi, William Tate, Carlos Alberto Torres, Jur Santme Tres, Rena Vital, Anu Sturt Well Dyan Wai, ‘Ania Zantiots e Kenneth Zeichner. Gostaria de agradecer partilarmente as contribuigdes de Steven ‘Selden, Geoff Whitty e James Beane. Sua amizade e as cliscussses in te tensas que fivemos ao longo dos anos foram importantes para liveo. ‘Ao longo dos anos, tive a oportunidade de trabalhar com muitos ceditores, como Routledge e outros. Ninguém tem mais talento do que Heidi Freund, Sinto-me profundamente grato por sua amizade e s estos. Também quero agfadecer a Karita Dos Santos, que suede Heidi na Routledge Talvex jd este fieando monstono, mas em todo livro que ese vi agradeco 0 Seminsrio da Sexta, Durante as ts tltimas décadas, euneme toda sexta fei 3 tare com meus alunos da ps gradeagio ‘© com 0s profescoresvisitantes da faculdade que vieram trabalhar ‘omigo, Esses semingros so internacionais mesmo, efreqlentemen- temuito intensos. Combinam eritiea politica eculturalletura das obras uns dos outros; mobilizagio em tomo das quests politias e educa- onais de peso em Ambito local nacional o intemacional ¢, 38 ve- 2s, trabalho com outros professores que sio membres do geupo em sas escola esalas de aula De importincia exatamente igual 0 fate sdessasreunides das sextas-feiras serem wma mista deliiosa de se tedade e bom-humor, sendo este ultimo uma das coisas que mais {altam nos grupos de orientagio critica, Quase tudo 0 que esti neste liveo foi escrito e rescrito com a ajuda de membros do Seminario da Sexta, no passido e no presente, Meus sinceros agradecimentos ato dos eles. Bekisizwe Neimande trabalhou como assistente de pesquisa em partes deste livro. Nao és6 seu empenho que & admirsvel suas ex- periéncias na Tuta pela educasao na Africa do Sul também seeviear constantemente de lembrete do porqué as questdes que diseuto aqui sho eruciais (Os argumentos deste livre foram testados em muitas univers des, eunides poltcase grupos de trabatho no mundo intro. Mas & preciso fazer mengio especial de alguns gares especiions:em prime- +o lugar, a Universidade de Wisconsin, Madison, continua sendo 0 lar do debate intelectual, politico educacional sro. Oferece ut espago ‘onde as posies social eculturalmente critics so centras,e nfo pe rilvicas. Trés outas inltuigies merecem ser citadas, Parts dest li- ‘ro foram escitas quando en estavatrabalhando no Departamento de Educagio da Norges Teknisk Naturvitenskapelige Universitet, em Trondheim, Noruega, no Instituto de Eucagio da Universidade de Londeese no Inatitit Internacional de Pesquisa da Educago Maori © Indigena da Universidade Auekland, como profesor visitantea con vite dessas instituigdes. Todas elas so caraterizadas por als rara ‘combinagi de amizade ede discussio estimlant, Finalmente, dedico este ivroa Rima D. Apple. Aelongodos anos «que vivernos e trabalhamos juntos, sua dedicagio as eausas progres: Sistas e seu compromisso com a exceléncia no ensing e na vida inte- Jectual foram eruciais para manter a minha chama aces, Sumario Pretdcio 3 edigio brasileira Capitulo 1 + Mercados, padeses de qualidade, Deus & desigualdade Introduce, A histria de Joseph. Agendas conservadoras (© mapa da dieeta Liberdade contestada A mercantilizagio do mundo. A restauragio da ordem cultural. A Igreja eo Estado Economia e religiio 0 gerencialsmo, Uma andlise da modemizagio conservadora Capitulo 2 + Mercados de quem? Saber de quem? Introdugio, : Neoliberalismo:ensin,lberdade de escolha e demacracia O neoconservadorismo: a transmisio do “verdadeina saber xv © populism autoritiro: o ensino como Deus quet ‘A nova classe média de profssionais qualifiadose gerentes: mais provas, mais freqientemente Conelusao Capitulo 3 « A produgio das desigualdades: a moderizagio ‘conservadora em terms politicos e pitas ‘As materalidades e suas muitas rests A guinada para a direita Mereados novos, tradigies antigas ‘Os mercados e 0 desempenho Bom pautio de qualidade em nivel nacional, curricula ‘nacional e provas nacionais, A criagio da triagem educacional Pensar esrategicamente Capitulo 4» © cristianismo em perigo Darwin, Deus ¢ 0 mal (Os perigos seculares Do centeo para a periferia A cur do Sul Capitulo 5 * Deus, moraidade e mereades ‘Teazer Deus par A politica eo cero. omundo, Olen eletrinico ‘Uma nagio crst ea liberdade de expres Etcolas sem Deus, io estamos fazendo nada de mais ‘As estruturasafetivas do populism autoritsrio ag ” ” 2 a 103 m 47 5 138 13, 150 159 159 165; 167 170 176 182 186 ‘Coma o iio poste parecer to bom? {A transformagio da palha em out0 Capitulo 6 # Fora com todos os professes: a politica cultural ‘do ensino doméstico Ocontexto do ensine doméstico A ameaga de Sati eo larfortaleza Oataque a0 Estado DPiiblico © privado Conclussio Capitulo 7 * Corrigir os errase deter a drcita cultura conta Reformas contraditirias - A “corti” em dirego& reforma educacional ‘Tomar os questionamentos puiblicos Aprende com otras nagies Pensar heretcamente Tomar priticas as pritieas edcac A esperanga, um recurso. Bibliograia 198 au au aia 220 209 29 20 213, 251 262. on 23 281 253 Prefacio a edi¢&o brasileira Apésanquiescéncia de Michael Apple, em face da manifestagio de interesse do Instituto Paulo Freite na tracugo e publicagio de sew livro no Brasil entendemos que talvez, devéssemos regi nota que ‘© contextualizassem, para faclitar ¢ enriquecet a compreensio de nossos educadores sobre a reaidade ecucacional norte-americana ‘final, & muita importante conhecer concepgbese projtos pegs ‘cos que espalham tenticulos por todos os continentes,Imeclatamen- te percebemos que, qualquer que fosse nose intervengio no texto da ‘ediglo nacional do ivr, teriamos uma imensa responsabilidad. Af ral, Apple & um dos pensadores da edueagso mais consagrados nos Estados Unidos. Além disso, contextuaizar um trabalho, como 0 gue ‘ora se oferee a0 publico,exige, como se percebers apés si lita, ‘um empenho muito grande, darante mito tempo, porque a sa com ‘preensio mais profunda sé pode ser atingida a partir de am “exame abissal” ede uma verificagio ampla de educagio comparada. Por isso, ‘optamos por fazer um preficio que resultasse de das leituras © de ‘uma discussio sobre a adequaco critica e oportunidade do lvro para © publico brasileieo. ‘A medida que fomos avangando na leitura dos originals, perce 'bemos que Michael Apple, emboraestja mais preocupado com 0exa- me eritco © com apresentagio de alternativas da/para a realidade ‘educacionalestadunidense~ predominantemente voltada para a "di- reita, segundo ele-desenvolve, na verdade, uma reflexao a partir de realidades de referenciais devenvolvidos em outras partes do mun- do, como, por exemplo, na Europa (Inglaterra, mais freqientemente) ‘em regides bem mais distantese diferentes das formagdes socials ‘ocidentais, como &o caso da Nova Zeléngla, Além disso, mesmo quan- do trata de questies mais especificase localizadas na América do Norte, Apple escolhe temsticas e formas de abordagem que seat aplicfvuisem qualquer sistema educacional do Planeta; sem falar que, certamente por causa da mundializagio das propostas conservadoras hhegemBnicas, os problemas da educacio, como os das demaissetores das relag6es humanas, tendem a uma homogeneizagio planetiia ‘Assim, as questoes educacionalstratadas na obra nose diferem subs tancialmente das que ocortem no Brasil, mesmo pore a interaliza ‘lo da agenda internacional de “austes estruturais” ae economias Tatino-americanaslevou a uma restratueacio dos sistemas educacio- nais do subontinente. Mesmo que as politics educacionais neocon- servadloras e neoliberais atinjam, com intensidades variadas, os d- ‘vers pases do mundo, dle acordo com os contextos especificos tamente impactam mais dramaticamente os paises latino-americanos do que as nagies centras, dadas as fragilidades peculiaes& periferia f porque é af que se trava a luta mais avangada do neocapitalismo, E notivel, por exemplo, veificar que os alvos das critics de Michael Apple sto.o8 mesmos que as eduicadorese pesquisadores da ceducagio da América Latina temos enderegado a0 projeto politico- pedagegico neoliberal e neoconservador. A partic de determinado momento da leitur, foi ficande cada ver mais claro que nao havia necesidade de notas “contextuaizado- ris” para o eitor brasileiro © que, talvez, fosse mais interessante a formulagio de uma apresentagio ou algo congénere 3 edi brasil '. Percebemos, também, progressivamente, a importinca do texto para os educadores de todo o mundo, mormente, para os que viver & trabalham no “elho do furacio” da acumulagio capitalist, © que nos tenta a propor, futuramente, ao autor a versio do texto para o espa hol, s# ele ainda nao 0 fez. O abandono de notas exphcatvas © 3 ‘opgio por este preticio se des, no porque failitsse a tarefa do “exa- me abssal”e do estudo de educagio comparada exigido, mas por ser esta forma mais apropriada para destaca, para os brasileiro, aspec- tos cruciais deste ivr, especialmente os instrumentos anaitcos que Apple usa para o desnuddamento de formulagies e propostas aparen temente ibertadoras, mas que, na verdade, buseam a consolidagio de numa eclucagio alienante, ou ej, para usar uma expresso do pesprio fautor, de uma “eduecagio a direit Sabiamos que a propasta de substituigSe de notas por sim prefs cio niosignifcava simplifcar nossa tarefa, Contudo,estavames con- ‘vencidos pela profundidade das ansises impulsionados pela im- pressionantes dentincias de Apple, no sentido de alertar os leitores brasieios para pontos que, ainda que venham sendo desenvolvides na literatura pecagégia latino americana e brasileira, ganham novas cores, nuances expliativas e dramaticidade no exame de quem vive ‘no coragio do Império e percebe, com mais propriedade, aspectosiné ditos das intengdes dominantes alimentando, ce forma mais Wcida © tonsiotente, a construcso de instrumentos de poitcas de resstncia, Primeiramente, cabe destacar uma das feses de Michael Apple que facilita a compreensio da hegemania da allanga dretista (9801 berais, neaconservadores, populistas autortéios e “nova classe me dia de profissionais qualifieados e gerentes"): a despolitizagio.do pro- jeto palitco-pedagegico e sa consequente "economizagio". Ou sea, ' educagio deixa de ser discutida como um bem de uso e passa pelo processo ce mereantilizagio, transformando-se num bem de toca no mercado de trabalho e no mercado dos bens simbicos. Esta esate ‘gia dos grupos dominantes faciita a eriagio de consensos em torn do débito do fracasso na conta dos proprios “fracassades", ao mesmo tempo que justifin a exclusio montada sabre as yerifiagies de con ppeléncias individuats. “Em vez de democracia serum conceito pl fio, 6 transtarmado mam conceto inteiramente econdnico.” (Apple, 2002: 46). Ea verificaglo das competineias¢ instrumentalizada pela “nova lasse média de profissionais quaificados e gerentes” ~ na verdade, a ‘equena burguesia burocratiea- que, “enquanto expecialistas em eft ‘inca, administragéo, provas e avaliagio,fornecem os conecimen- tos téenicos necesrios para implementar as politicas ee moderniza- «go conservadora” (p.71). Numa passagem um pouco anterior 3 esta citacio, Apple refere-se a am corto “liberalismo” (diriamos, antes, progressismo) dos membros dessa nova fraglo da pequena burgue- sia este ponto merece uma refleio mais aprofundada, sobre a qual ji nos estendemos em outros trabalhos (especialmente em ROMAO, Joos Bustiquio, Dist de dfrengn. So Paulo : Cortez, 2000). Esta coseilagio ott ambigiidade da pequena burguesia devese, primera ‘mente, sua ainda indefinida posigho no modo de produgio, que especifca papeis bem determinados para duas classes ~ dai evtar~ ‘mos chamilia “classe”, como o faz Apple. Em segundo lugar, esta Simpatia alianga direst e sua disponbilidade para a defesa e ope ago do projeto potico-pedagdgico neoconservador, 20 mesmo tem po.em que proclama “discordncias” sobre outros setores, consi, ‘ertamente, aquele fenimeno do “intimismo § sombra do poder", Hi pico dos intelectuas cooptades. Ou sea, se de um lado, se intel: tunis da pequena burguesia manifestam seu antagonisme aos discur- 036 posigdes hegentsnico-conservadores~exprimindo seu intimismo. = por outro, a ees aderem,e até mesmo serve ~Ficndo a sombra do poder ~ porque, na cite, fomaram 0 cuidado de nio atacae os po- blemas mais estuturals, possibiltando esta conciiagSo entre oposi- ho esituagio, Apple revela que a alianga neaconservador,liderada pelos neo liberais, acaba impondo a igica do mercado em todos os setores da vida e das relagdes humanas. Como exemplo, no setor educacional, narra o caso extremo da mereantilizagio de nossas escolas ede seus estudantes, nosso fos. Em trea docquipmento edo nti, tada ae esos participates tm de asnat um contrat dete cinco any garantind gue sus tunes vio sist a0 Chanel One todo dite [=] ‘Come por fe ses alunos tn de estar nas escola, os Estados Unidos ‘io ur das pris mages do mundo 4 permitrconsientemente que sun ventude ea vendida como mercaoriaAqueas grandes en ress dispodtasapoparo pogo levade de faze publica na Chon (One para ebter um ico ctv) grant, p50 51) Com este exemplo, Michael Apple no apenas demonstra a vo~ tacidade do neocapitalismo, como nes alerta para as ameacas que poem se abatr também sobre ns, sob © manto da “ajuda ds esco- Tas”. A mercanilizagio das escolas ocrre, também, segundo Apple, ‘om a criag3o de um verdadeiro “mercado escolar", no qual cada uni- dade tom de se mostrar competitiva para conquistaros "melhores al- ‘os, de acordo com as elasiicagdes padronizadas pelos sistemas de angio socal, expressas, nos sistemas educacionai, por meio dos “pa- drdes de qualidade” exigidos pelossistemas nacionais de exames. Todo ‘esse movimento escolar em diregio & mercantiizagio resulta numa predominancia de atividades cocentes votadas mais para o marketing do que para a “substncia pedagagicae curricular” (p. 92), 30 mesma tempo em que uniformiza o ensino, a despeito das proclamagaes 50- bre a necessidadle das identidades escolaresespecificas, "Embora assnale a hegemonia dos neoiberais no arco da alianga modemizadora-conservadora, Apple dedicat capitulo (do 430 6) 2 anise das concepeses, projecdese propostas dos populistas autor trios, chegando a afiemar que “nenhuma eseatégia contrarhegems. nica e progressista, nenhuma pedagogia critica pode dar certo, f- guanto no compreender a realidade construfda por esses grupos” (p, 124) E€ ai que o livzo se torna impressionante, pois 0 autor, com base em pesquisas empiricas, demonstra a verdadeiralavagem cene- bral que 0 findamentaismo erist3o evangélica vem fazenda na ju- ventude norte-americana, Para se ter um exemplo (p. 131 © 171), até mesmo a anacrinica discussio da proibigio do ensino da teoria ‘evolucionsta de Darwin nas esclas bias anges retomna com £3 dlicalsmo, retomando a polémica que chegou a resultar no famosa julgamento de Thomas Scopes, em 1925, tema que gerod um filme clissico, “Eo vento serd tua heranca”, com Spencer Tracy, na década de 1960, Em suma, uma espécie de “evangelisma findamentalista con: seevador” invade o sistema educacional norte-americano,ressuscitan do discussbes, desde as mais ridiculas, como a mencionada, até as de rnatureza mais atval, como a do publico e da privado ~ porém, agor®, numa perspectiva neoliberal. E este fumdamentalismo crist8o posiciona-se ora na defesa do Estado Misimo, ora no bastio do Bta- do Minimo, de acordo com as canvenigncas das proprias tees e pre- tenses hegemdnicas Felizmente, no Brasil 0 mercado editorial tem sido generaso com as publicagies voltadas para o setor educacional. Contudo, infeliz ‘mente, na ganga bruta dos itimeres titles, pouco tem escapado das repetigoes e das especulagbes destitudas de relevancia peda social. Olivro de Apple constitu uma feliz excesH0 e, por isso, torna- seleituraobrigatéra para todos quantos queitam carregaras bterias da lucidez sobre © modus aperandi dos grapos que tem pretenses he- ‘geménicas, bem como constr os instrumentos e as estratégias da critica e da resistincia ao imperialsma simbélico de nossos dis. Capitulo 1 Mercados, padrées de qualidade, Deus e desigualdade Inout ‘A temporada de cag edtueagio continua aberta. A midia, car dlidatosa cargos piblicos, eruditos consorvadores dirigentes de gran- sles empresas, quase todos, ao que parece, tém algo a dizer sobre © {que hi de ereado com as escolas. Teno emogies contraditérias a res peito de toda essa atengo. Por um lado, o que haveria de errado em liscutie, de ponta a ponta,o que a exucasio faz e devia fazer? Como, alguém profundamente envolvido com o pensare agit nas esclas,é ‘tito bom para mim perceber que as eanversas sobre ensino, cure ‘culos, avaliagio, abtengio de fundos e tantas outs cosas ni so vistas como 6 equivalenteIigico de conversas sabre o tempo. O fato de essas discussGes serem muitos vezes acaloradas também bom sina. final de contas, o que nosses filhos devem saber eos valores, {que isso deve concrtizar 6 um negécio sério Por outro lado, essa atencio toda gera certainguietagio. Uma palavra da tltima fase do parigrafo anterior explica um eos motivos. dessa inguietagao — negécio. Para muitssimos dos erudites, politi os, dirigentes de grandes empresas e outs, a educago & um nego cio e do deve ser tratado de forma diferente de nenhum outro negs- cio. O fato dessa posigio estar se tomando agora cada vee mas co- mum éevidéncia de algumas tendéncias preocupantes, Dente as mui- tas vozes que falam agora sobre educagio,s6 a8 mais poderosas te ‘dem a ser ouvidas. Embora néo exista nenhiuma posi unitsria que centralize aqueles que tém poder politico, ecomdmico cultural, as fenicléncias mais importantes em torno da qual gravitam tendem a ser mais conservadoras do que progressisas, (0 que essas vozes estio dizend? Durante as dltimas décadas, {grupos conservadores, em particular, Fxzem pressSo para obter fun. dos para escolas privadas ¢ religiosas, Os planos de financamento estudantil estio& frente desse movimento, Aos olhos de seus defen: sores 16 obrigando as escolasaentratem num mercado competitivo «que vai haver algum tipo de mehoria. Essas presses so comple- mentadlas por outros tipos de ataques, como 0s do argumento que se segue: mio hi “fatos” no curricula; 0 conte e os métodos trad- cionaistém sido descartados, 4 medida que nossas escolas vollam- se para disciplinas mais em moda (e exageradamente multicult- als) que fgnoram o saber que fez de nés wma grande naga". Temos ‘de methoraro padrdo de qualidade. Introduit mais provas nas es Aléo disso, & lamentével, mas & verdade que a maioria de nos- ss modelos atuals de educagio tendem a ratifiar, ou pelo menos a rio climinar ativamente, muitas das desigdaldades que caaeterizam to profundamente esa sociedad, Grande parte dis tem a ver com, as relagies entre a educagio e a economia, com divisSes em genero, classe raga na socedade como um tod, com a politica intrincada da cultura popular com as nossas formas de financiare sustentar (o% ro] a educacio. As ligagSes entre educagio e bons empregosfieam mais tinues ainda quando examinames de perto 0 que & realmente 0 mercado do trabalho assaariao. Estatisticas corade-osa dos hacros ‘do mercado de agies e da criago de riqueza obscurecem o fato de iene Tamora Tie aoe mn nee ng Podoietecn neonate fama its ce

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