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A COMUNICACAO E AS TECNOLOGIAS DOS TOYS CHANNELS NO YOUTUBE Everaldo Pereira’ RESUMO Investigarao sobre as relagdes entre comunicagao, tecnologia e infancia por meio dos "canals de brinquedos, denominados toychannels dispo. niveis no YouTube, a partir de reflexées te6r do Conhecimento, o ciberespaco e as relagdes entre Infancia, identiiea-se e sintetiza-se as tecnologias envolv ‘comunicacional. Evidencia-se como a tecnologia potenciallza as relacbes socials desde a infancia, PALAVRAS-CHAVE ‘ibercomunicacio, toy channels, infancia, INTRODUCAO Nesse trabalho investigamos as relacdes entre comunicacao, tec- Nologia e infancia por meio dos “canais de brinquedos’, denominados toy channels, que atualmente ganham destaque entre usuarios infantis, do YouTube. Nesse sentido buscamos uma revisao tedrica a partir do entendimento sobre 0 contexto desses processos comunicacionais nas Sociedades do Conhecimento, por meio de autores como Alvin Toffler, Daniel Bell, Vannevar Bush, Michael Dertouzos, Ethevaldo Siqueira, entre outros; sobre o Ciberespaco a partir de Norbert Wiener, Thomas Friedman, Nicholas Negroponte, Sebastiéo Squirra e sobre Cibercomunicaao com André Lemos, Sérgio Amadeu da ¢ Sebastiso Squirra, entre outros * Doutorando em Comunicacao Social (UMESP); Mestre em Comunicagao pela Univer sidade Metodista de So Paulo (UMESP); Professor do Instituto Maua de Tecnologie (MAUA) e da Universidade Nove de Julho (UNINOVE), Investigamos as tecnologias envolvidas nesse processo comunica- clonal, como 0 desenvolvimento de sites de streaming! de video, como o YouTube e suas logicas de producao; softwares e aplicativos, como Flash e HTMLS; algoritmos de busca, de recomendacao e de medigao de trafe 90; sobre © processamento de quantidades gigantescas de informagao por meio de buffering?, pacotes de dados e metadados; reprodugdo de dezenas de formatos de videos em diferentes codecs’, para dar conta de inimeros displays por meio dos quais milhdes de usudrios acessam as plataformas de videos; sobre dispositivos de gravacao, upload" e edigio de video em tempo real; tecnologias de banda larga e dispositivos de acesso multiplataformas, entre outras tecnologias. Pretendemos assim, caracterizar e sintetizar as tecnologias envolvidas nesse processo entre comunicacao e infancia, crianga e brinquedo, aprofundando o entendi mento da ubiquidade das midias edo seu impacto em novas sociabilidades desde a inféncia, SOCIEDADES DO CONHECIMENTO E CIBERESPACO , Ha ainda um importante debate académico entre os aspectos 50- Ciais e tecnolégicos envolvidos na comunicago midiatica. Por um lado, se os pionelras do pensamento em infocomunicacdo, como Shannon e Weaver (1949), minimizaram o papel da cultura nos processos comuni- cacionais, muitos pensadores da teoria social relativizam o papel das tecnologias nesses mesmos processos. Como constatado por Riidiger (2011), de fato a comunicagao é um processo social dinamico, mas que estd Imbricado com os processos tecnolégicos, alterando € sendo alte- rados por esses. Sob o olhar tecnolégico podemos observar que ha, de fato, novos aspectos sociais. Essas novas so: lades configuram 0 que diversos autores de- nominam Sociedade da Informacao ou Sociedade do Conhecimento para caracterizar a atualidade. Nesse sentido hé obras que se debrucam tanto sobre um termo quanto sobre o outro com diferentes olhares e aborda- gens. Do nosso ponto de vista ha de fato Sociedades do Conhecimento, ‘como expde Squirra (2005) sob a ética de Mattelart (2002), uma vez que a 'Tranemissio de arquivos multimiia por pacotes de dados * Uso de meméria temporsria * Acronimo de codificador/decodificador, dispositive de hardware ou software que codifica/decodifica sinais * Envio de arquivo para um computador remoto ls? 167 pluralidade de conhecimentos e sociabilidades possibilitadas pelas TICs - Tecnologias de informagéo e Comunicagao, tornaram-se fatos irrefutéveis, Para o presente trabalho optamos pelo termo Sociedades do Conhecimento ‘em oposicao 8 Sociedade industrial, indo ao encontro do que Danie! Bell (1989) e Alvin Tofler (1992) entendem desse limiar do século XX\. Atualmente as Sociedades do Conhecimento sao marcadas pela divisdo digital, isto é, 0 conceito de separacao entre aqueles que tem acesso.e aqueles que nao tém acesso aos meios digitais, dispositivos e banda larga, como explica Squirra (2005). Essa distancia tem diminuido drasticamente na ultima década, mas ainda esbarra no poder econdmico de diversas camadas da populacao para manter servicos digitalis que evo- luem constantemente. Nota-se um grande numero de equipamentos de telecomunicagao e informacdo nos domicilios brasileiros, com o telefone celular presente em 92% das residéncias, segundo dados da pesquisa 2014), No entanto 0 acesso a internet estava 05, e desses, 67% com banda larga fixa € las, ainda é& TIC Domi bem mével, mas conclui-se que mais da metade dos domi no possuem banda larga. Alguns aspectos dizem respeito a relagao da crianca com as tec- nologias em grupos de baixa renda e de regides distantes dos grandes centros. Com estruturas sociais diversificadas, 0 acesso as interfaces tecnolégicas como celulares, tablets, computadores; e a servicos, como banda larga, wi-fi e rede mével sdo mais precérios nesses grupos. Se- gundo Buckingham (2012), "é especialmente importante entender as praticas de consumo das criangas em comunidades menos favorecidas, Para quem a escolha do consumidor’ pode ser um assunto tenso complexo", Segundo Orofino (2011, p. 4), 80 raras as pesquisas que se interessam pela condicdo da crianga enquanto sujeito, capaz de ‘se defender, de escolher ou de ressignificar 0 que a midia coloca em pauta. Assim, uma investigagio que possa abarcar as diversas redes, afetivas de formacao cultural, como a famillia, os amigos, as coletividades, tenderd a distinguir chaves de entendimento variadas sobre o fendmeno em questao, tematica que deveremos abordar em trabalhos posteriores. No presente caso, alguns indicadores demonstram como, apesar disso, as criangas e adolescentes convivem com 0 acesso 8 internet constantemente. Segundo a propria Cetic.br (2014), 82% das criangas e adolescentes entre 10 e 15 anos acessaram pelo menos uma vez, predo- 168 ee a ee ae en ee nr minantemente em casa, mas também em escolas, em casas de amigos e familiares e em centros piiblicos pagos ou gratuitos, Ainda segundo a Cetic.br, do total de criangas e adolescentes de 9.a 17 anos que acessaram a internet, 82% o fazem por celular. Nota-se ainda, de acordo com o grafico 1, que entre as faixas de menor idade, © predominio é do computador pessoal ou laptop, enquanto entre os adolescentes o predominio € do celular. Vale lembrar, como expde Der- touzos (1997) que mais acesso nao significa mais igualdade. € preciso nao nos precipitarmos em conclusdes sobre dados de acesso, pois como nos alerta Castells (2003), divisao digital ndo se mede pelo ntimero de acesso a internet, uma vez que essa nao é apenas uma tecnologia, mas um instrumento tecnolégico e uma forma organizada que distribui 0 poder da informacao e do conhecimento. Ao mesmo tempo em que mais criancas e adolescentes podem acessar um numero absurdo de informagées, mais concentrado fica o controle e acesso a big datas por diferentes organismos publicos e privados. Mattelart (2005) jé alertava para 0 fato da internet, na pratica, ser gerida pela Intemet Corporation for Assigned Names and Numbers (Icann), uma entidade americana “sem fins lucrativos’, subordinada ao governo americano e vinculada ao Departamento de Comércio dos Estados Unidos, que reluta em deixar 0 controle para uma iniciativa conjunta de varios pafses, apesar de muita ptessao atualmente nesse sentido, Grafico 1: Perfil de uso da internet entre criangas e adolescentes, por faixa eta 2014 Fonte: TIC Kids Brasil 2014 (CETIC, 2014) poderao ser observadas entre a) a liberdade de escolher entre assistir € produzir e o controle sobre tudo 0 que as criancas interagem nas redes digitais conectadas; b) entre o gerenciamento dos atores empresariais que se interessam pelo mercado infantil e a gestdo politica de grupos de maiorias e minotias relacionadas ao universe infan infantis universais e a diversidade das questées regionais; e d) entre a autonomia do brincar e a heteronomia do agir de acordo. Olhar a so- ‘ciedade conectada no apenas como possibilidade de relacionamento, mas também como aco de controle é compreender o poder da comu- nicacao para além do poder politico e econdmico (SILVEIRA, 2011)-E buscar compreender como as diversas relagées de troca de informagoes e tecnologias de acesso permitem um nimero exorbitante de dados que se constituem em saberes especificos por parte de quem detém os cédigos de softwares. ‘O que compreendemos, entretanto, é que para além dos controles, ‘as sociedades tém se modificado como previsto por Ethevaldo Siqueira (2004), a partir dessa nova ambiéncia séciotecnolégica, ndo porque a tecnologia determine as mudancas sociais, mas porque a tecnologia providencia instrumentos e potencialidades e o uso que se faz dela é que s80 mudancas sociais, como expée Daniel Bell (1989). Quase como um ‘cumprimento as profecias de Vannevar Bush (1945), a internet tomou-se ‘o-memex* mundial, o ciberespaco no qual dades, informacoes e conhe- cimentos se entrelacam a partir da producao, pesquisa e reproducao de para milhdes de usudrios nas suas buscas em satisfazer um “Complexo de Prometeu como salientou Bachelard (apud Gama, 1986), Mais ainda do que um memex cientifico a internet hoje se configura num multimemex ‘cultural no qual as criangas, jé em plena pré-infancia, estéo imbricadas ‘em seus relacionamentos cotidianos. CIBERCOMUNICAGAO E INFANCIA Do ponto de vista dos processos comunicacionais junto a0 publica infantil, o deslocamento do broadcasting® para o wikicasting, ou seja, para ‘a difusao compartilhada, na qual usuérios consomem e produzem con- tetidos quase que indistintamente, possibilitou 0 surgimento de novas TVaanwor Ba canhow o terme merex para deslgnar um sistema mundial de acesso intra. * emissio se rrardi20 de sons e imagens por meio de rédio ou da televisso 170 que se transformou a internet. A profusdo de produtos e servigos comunt- cacionais direcionados as criangas esta num ritmo acelerado, possibilitado pelo barateamento de diversos aparatos tecnolégicos de comunicagao, a partir da miniaturizacao, como nos lembra Bell (1989). Isso permite, por exemplo, que uma boneca como a Barbie possa incorporar uma cdmera de video com conexdo USB’, Esse fendmeno esté diretamente ligado a0 canceito do “mundo plano’ entendido por Friedman (2005) em seu livro homénimo, pois as mudancas a partir da abertura de capital do Netsca- pe, como as tecnologias digitais de fluxo de trabalho, as comunidades colaborativas conectadas, a terceirizacéo global e 0 offshoring! tornaram possivels a viabilidade de produtos e servicos altamente tecnologicos, mas baratos, em escala global. Se muitos adultos néo consequem enten: der plenamente os meandros das tecnologias digitais, superconectadas, ubiquas, pervasivas e sencientes (LEMOS, 2005), as criangas por sua vez tendem a crescer com a sensagao de que tudo é “natural” que o software sempre existiu e que nao faz nada além de nos proporcionar aquilo que necessitamos."O software se esconde exatamente no momento em que se expressa mais plenamente” expde Galloway (2010, p. 99). Desconhe- cendo 0 poder do software, os ciberviventes, ao modo de Wiener (1954), aproveitam todo o potencial de entretenimento, conexao e informacao ‘que até pouco tempo atrds eram inimaginaveis, sem se preocupar com © que mantém as superestruturas necessérlas para manter on-line um servico de grande complexidade informacional. Portanto, se hd de fato muita investigacao sobre os potenciais da rede e os beneficios da conexéo em tempo real, é necessdrla salutar a investigacao no campo da Comunicacao que possa dar conta dos as- pectos criticos que envolvem uma sociedade que mantém bilhoes de pessoas interligadas por interesses eletivos, Essa visio critica é ainda mais necesséria quando nos deparamos com o universo infantil nos diversos estratos sociais, na diversidade de género e de espacos. E importante salientar que nesse ambiente de cibercomunicagao, produzir, disponibilizar e consumir videos tornou-se para a maioria do publico infantil algo tao cotidiano quanto ir 4 escola. Nos grandes cen- ‘tts urbanos, com as mudancas nos comportamentos sociais, queda no Sigia em inglés de Universal Serial Bus (‘Porta Universal’, em portugues), um tipo de tecnologia que permite a conexao de periféricos sem a necessidade de desligar 0 computador, além de transmitir e armazenar dados. Offshoring é 0 modelo de r locagdo de processos de negécio de um pals para outro intensamente suportados por tecnologia da Informacao e comunicagao. ma FURIE IRAE STEL SUNEEN ies fone FRAME Nar gen steel Ceneed Hea en cen Meenas Sener AY TUT 1993), esses processos estdo incorporados no cotidiano infantil, como constatade por Corréa (2015), em pesquisa na qual detecta que dos 100 maiores canais de YouTube no Brasil, 36 s40 consumidos exclusivamente pelo puiblico infant Essa revolugao tecnoldgica detectada por diversos autores, como Dertouzos (1997), Negroponte (1995), Rifkin (2001), Gleick (2000), entre ‘outros, tem transformado os processos comunicacionais. Antes, num ambiente analégico, apesar de muitos domicilios e espacos publicos contarem com televisores e radios, a producao e veiculacao era altamente concentrada, 0 que limitava o ntimero de estradas entre consumidores produtos comunicacionais. Atualmente com a evolugao dos sistemas de producao e disponibilizacao, as vezes presentes em quase todo aparato, como 0 smartphone, a ubiquidade de displays com acesso em banda larga, temos verdadeiros “ecossistemas de comunicacao’, minimizando a figura do consumidor de midia e ampliando a figura do “prossumidor’, como expée Toffler (1992), espalhados e interconectados pelo mundo, como no caso do YouTube exposto neste trabalho, YOUTUBE E INFANCIA Criado em 2005, por Chad Hurley, Steve Chen e Jawed Karim, € adquirido pelo Google em 2006, 0 YouTube nasceu com a proposta de facilitar 0 compartilhamento de videos na internet, oferecendo ao usud- rio uma plataforma com interface de facil interagao e que nao exige um grau elevado de conhecimento técnico, tanto para publicar, quanto para assistir aos videos. Atualmente, 0 YouTube possui mais de um bilhao de usuarios em todo 0 mundo, quase um terco dos usuérios da Internet, € esta disponivel em 76 idiomas, segundo o proprio YouTube (2016). No Brasil, o site de compartilhamento de videos € o terceiro mais acessado, ficando atrés apenas do Gaogle e do Facebook, como constatado em pesquisa da Emarketer (2016), além disso, 0 pais ja ocupa a segunda posicao entre os paises que mais consomem videos no portal, segundo a revista Exame (2014) Um dos fatores preponderantes do YouTube é que ele faz parte de um dos maiores conglomerados de tecnologia digital do mundo: 0 Google Inc. Segundo Vaidhyanathan (2011), essa empresa americana mundialmente conhecida, domina os mecanismos de busca digital na im WNTERN ET CH VORAS Tag Ces: CO'glOno, COM excegso'Ge alguns grandes mercados como Japao, Coreia do Sul, Russia e China © Google, como uma empresa constituinte do que podemos de- nominar como “ecossistemas de comunicacao’, que est presente quase que permanentemente entre os usuarios da intemet. Esté em celulares computadores pessoais por diversos aplicativos, como o sistema opera- clonal Android, o sistema operacional Chrome OS para netbooks. Esté nas buscas com 0 Google Search, em computacao na nuvem com 0 Google Drive, entre outras dezenas de servicos. No entanto, como constatado por diversos autores (VADHYANATHAN, 2011; ANDERSON, 2008) o que realmente tornou 0 Google uma empresa gigante financeiramente ¢ © modo como ela usa a matematica para entender pessoas e vender propaganda. Seus sofisticados algoritmos que classificam usuarios, sites anunciantes, formam um intrincado sistema que “limpa" os resultados de busca e recomendagao em todos os seus aplicativos. Limpar a rede, segundo Vadhyanathan (2011), € proporcionar ao usuario uma navegagio tranquila em meio a um turbilhdo de informagées presentes na internet, Hoje isso é feito por meio de sistemas de web semédntica que “entendent”o ‘que o usuario quer dizer. Quando uma crianga clica no microfone ao lado da caixa de busca e diz’Peppa Pig’ o Google calcula instantaneamente que a crianca “deseja’ assistir a um desenho animado dessa personagem. Talvez possamos nos indagar “nossa, mas 0 que tem isso de extraordi nario?" A tecnologia de web semantica hoje esta tao veloz que mal nos damos conta da quantidade de esforco fisico e intelectual por tras de acdes como essas, quase impensadas anos atras. Web semantica é um conceito, como entendido por Berners-Lee, Hendler e Lassila (2001), para a técnica de computacao que cria ontologias semanticas e metadados, Isso permite que 0 YouTube, ou outros sites, interpretem sentencas in- telras no lugar de apenas palavras. Somando-se a isso os fantAsticos big datas’ que 0 Google tem construido, com acesso a espalhadas pelo mundo, a partir do Google Books, ou troca de mensa- gens pelo Gmail, documentos pelo Google Docs, comportamentos pelo Google Plus, locais pelo Google Maps e tantos outros aplicativos que sams sem nos darmos conta de contribuir para a interpretacao e posse desse conhecimento. Assim, desde muito cedo, as criancas também estao inseridas nesses big datas e cada vez interessam mais a diversos agentes da sociedade, de setores publicos e de setores privados. * Megadados, ou seja, um grande conjunto de dados armazenados 173 Por isso, entre as criangas brasileiras, 0 YouTube também aparece como um dos sites de grande acesso, como informa o estudo“A voz das criancas" (OFFICINA SOPHIA, 2015). Quando perguntados em quais sites de midia social mais entravam, 20% dos entrevistados responderam que ‘0 YouTube era um desses sites. Recentemente, a pesquisadora Luciana Corréa (2015), citada anteriormente, conduziu uma pesquisa com © pro- pésito de investigar a relacdo da crianga com a tecnologia, obtendo dados relevantes. Segundo essa pesquisa, dos 100 maiores canais de YouTube no Brasil, 36 sa0 consumidos pelo puibico infantil (0 a 12 anos). Ao todo, foram mapeados 110 canais voltados especificamente para esse publico, ‘que juntos, atingem uma audiéncia de mais de 20 bithées de visualiza- ges. Em trabalho recente Pereira e Oliveira (2076) levantaram aspectos de producao dos chamados toy channels, no Brasil. Um dos destaques dessa pescuisa foi o crescimento desses canais que produzem contetido audiovisual tendo o brinquedo como objeto principal, seja para apresentar suas caracteristicas, criar historinhas por meio dele ou desenvolver brin- cadeiras a partir dele. Sao canais de unboxing'” de brinquedos e videos de brincadeiras, cujos contetidos consistem basicamente em tirar os brinquedos das caixas, apresentando suas caracteristicas € componentes, e desenvolver historinhas a partir de brincadeiras com os brinquedos. TECNOLOGIAS POR TRAS DOS TOY CHANNELS NO YOUTUBE Para esta investigacao, nos interessa os diversos aspectos que envolvem a tecnologia que possibilita o desenvolvimento de canais de streaming de video como os toy channels. Streaming é o nome dado em inglés para o proceso mais comum de distribuicéo de videos digitais. Segundo Apostolopoulos et al, (2002), diferentemente do download de videos, em que todo 0 arquivo entregue de uma Unica vez, fazendo com que 0 usuario tenha de esperar 0 término do processo, 0 streaming permite a separacao do video em pacotes para que eles sejam enviados por partes, em sucesso, ao usuério. Assim o usuario passa a ver 0 video na medida em que é entregue, sem necessitar esperar até 0 carrega- mento total, Para o publico infantil, imediatista e avido por constantes novas experiéncias, essa tecnologia permite o consumo de videos € a navegacdo por diferentes titulos sem a dificuldade de baixar 0 arquivo. Isso colabora para a popularizacao desses sites de videos, tornando-os organicos, como uma extensio da crianga, Desembslamento, ou seja, videos demonstrando a retirade de um brinquedo da caixa Uma das grandes questées para a distribuicao de videos digitais Globalmente é a profusao de displays com linguagens diferentes, resulta- do da grande revolugao tecnolégica das viltimas décadas, como vimos no inicio. A sempre acirrada briga de mercado entre empresas produtoras de softwares de video, sistemas operacionais e aplicativos, além de diferentes qualidades de definicao e velocidade tem levado a um numero grande de formatos possiveis para gravagao, distribuiggo e consumo de videos digitais. 0s formatos compativels para envios de video para 0 YouTube, segundo 0 préprio site (YOUTUBE, 2016b) so MOV, MPEGS, AVI, WMV, MPEGPS, FLV, 3GPP e WebM. Um servico como 0 YouTube tem a capacidade de proces- sar, gerenciar e disponibilizar quantidades enormes de videos, sem perder qualidade de informacio ou ritmo de acesso em todos os aparelhos. De acordo com os sites Teemundo (HAMMAN, 2013) e Computerphile (2013), quando 0 usuario faz o upload dos videos por pacotes de dados para o servidor do YouTube, cada filme é recebido pelos servidores e convertidos ‘em diversos formatos de arquivos diferentes. |sso possibilita 0 acesso por diferentes tipos de displays ao redor do mundo em navegadores comuns, navegadores com HTMILS, codecs H.264, WebM e diversos outros formatos para computadores, smartphones e tablets com diversos sistemas operacio~ nais, além de consoles de videogame ou cibervisores"' com suporte para funcdes Smart TV. Esses arquivos podem ser replicados para diferentes servidores do YouTube ao redor do mundo para agilizar e desafogar trdfego de dados, O YouTube, por meio de algoritmes, identifica as prefe~ réncias de navegacao do usustio, escolhendo qual é 0 formato e qual é a qualidade de video que melhor se encaixa no perfil de cada um, utilizando informacées de navegacao capturadas no decorrer da sua utilizagao. Alem disso, também se baseia na qualidade de conexao da internet para evitar que 0 carregamento acarrete em travamentos. Em relacao a qualidade de conexao da internet mével, de acordo com a Associacio Brasileira de Telecomunicagdes (TELEBRASIL, 2015), 0 numero de acessos em banda larga chegou a 225 milh6es no Brasil até setembro de 2015, somando 469 municipios com rede mével de quarta geracdo (4G) de pelo menos uma operadora. A rede mével de terceira _geracdo (3G) esta presente em 4.471 municipios, de um total de 5.570 no pals. Vale lembrar que a rede 4G opera em uma frequéncia distinta da 3G. ‘As antenas 4G s80 mais baixas e atendem de 300 2 400 telefones. As 36 podem compartilhar o sinal com cerca de 60 a 100 telefones, segundo dados da Tecmundo (ARRUDA, 2016). T Atualizagao do termo “televisores", Nesse sentido ver Squirra (2015). 175 a wn Figura 1: Fluxograma pictérico do funclonamento do YouTube Fonte: elaborado pelo 0 au O funcionamento do YouTube pode ser visualizado pelo fluxograma na figura 1 ‘A transmisséo entre YouTube e 0 usuarios, as criangas nesse caso, & feita por pacotes de poucos segundos que ficam em constante buffering para mostrar os videos aos usuarios. Buffering, segundo a Wikipedia (2015), éa técnica que permite usar uma regiao de meméria fisica de um com- putador ou servidor para armazenar temporariamente dados enquanto estes sdo movidos de um lugar para outro, Uma inovacao em sites como o YouTube é que 0 usudrio pode trocar a resolucao do video sem a neces dade de carregamento do video inteiro novamente, com a nova resolugao, \sso diminui o numero de travamentos e evita que o icone de recarregar aparega na tela, uma vez que é denominado nos melos técnicos como ‘circulo da morte’, pois dificilmente a crianca tem paciéncia para esperar 0 carregamento. O buffering constante altera somente os pacotes que ainda nao foram enviados, Inclusive nesse aspecto tecnoldgico 6 possivel inferir que 0 imediatismo possivel no YouTube, percebido pelas criancas, afetard 05 sistemas ainda vigentes de broadcasting. ‘A figura 1 permite-nos compreender como as tecnologias via zaram que o YouTube passasse a rivalizar com produtores de contetido para broadcasting pelo tempo de consumo de video dos usuérios da internet, inclusive as criancas. Um grande numero de pessoas com acesso com aspecto bastante profissional. Em 2011, 0 YouTube dispo {40s usuarios um editor de videos (fig. 2) direto em sua plataforma, o que facilitou esse processo para os usuarios. O YouTube converte 60 horas de videos por minuto, a partir dos uploads de usuarios de varias regides 176 ee Oe ee ee re eee do mundo, somando 4 bilhdes de videos por dia (PROXXIMA, 2014) e distribui por meio dos 15 data centers, sendo 8 nos Estados Unidos, 1 no Chile, 21na Asia e 4 na Europa, segundo o préprio Google (2016). Figura 2: Editor de videos e melhorias no préprio YouTube , Fim Omni Ome Sire : Fonte: autor No proceso de busca, cada crianga se depara, nao mais com um numero absurdo e desorganizado de respostas, mas com um conjunto coeso de respostas, que tem por base os processos de reconhecimento, medigao € recomendagao do YouTube. Nesse sentido, nao sao mais os pais ou responsdveis, ou uma emissora de TV, que determinam os conte- dos que muitas criangas acessam, mas sim 0 proprio YouTube-Google, por meio de sofisticados algoritmos de web seméntica. Por exemplo, 0 processo de recomendacao de videos no YouTube, segundo Davidson et i, (2010), considera dois campos de dados principais: os metadados do video, como titulo e descricao e as atividades do usuario, classificadas em explicitas (como gostar ou ndo gostar, e subscrever); e implicitas (como datas, horarios, tempo de visualizacao). No entanto, salientam os autores, 0 dados sao bastante complexos, uma vez que os metadados so por vezes inexistentes ou incompletos, e os dados do usudrio sao estima- dos, uma vez que no se percebe o grau de interesse ou desinteresse, 0 grau de felicidade ou infelicidade. Entendemos que isso evidencia 0 crescimento de youtubers profissionais que se dedicam a cada um des- Ses passos para deixar seus videos com melhores recomendacées pelo Google. Evidencia-se a sofisticacao dos sistemas de recomendacao de videos no YouTube pelos trabalhos de Jing et al. (2008) sobre algoritmos W7 CIBERTECS CONCEITOS, INTRA Ors) Ae denominados de adsorgao!” e de Arora (s.d,) sobre o uso da tecnologia de sistemas de recomendacao de video a partir das redes sociais virtuais {que possibilitam um cruzamento de diversas variaveis sociais e individuals igadas 20 comportamento de cada usuario. Segundo Golnari, Li e Zhang (2012) o YouTube esté migrando de uma fase no qual era impulsionado por muitas pessoas que postavam poucos videos cada uma, para ser conduzido por um ntimero menor de pessoas com um maior ntimero de postagens cada um. Compreendemos aqui 0 processo de profissionali- zacao do YouTube com o surgimento dos youtubers profissionais, como (0s produtores de canais de brinquedos. Nesse sentido, somando-se 8s tecnologias on-line, 0 YouTube ainda disponibiliza 0 YouTube Space, local rno qual uma equipe do YouTube ajuda os criadores de contetido por meio de programas e oficinas estratégicas administrados nessas instalacoes de produgao, em 4 cidades: Los Angeles, Nova York, Londres, Toquio, S80 Paulo e Berlim (YOUTUBE, 2016). © que motiva os milhdes de produtotes de conteuido em diversas regides do globo ainda é impreciso, mas é possivel estimar que trata-se principalmente de reconhecimento publico, de divulgacao de ideias € conceitos, e de geracao de receita. Nesse ultimo caso, estimamos que 0s youtubers de toy channels buscam predominantemente gerar receita com seus videos, ou monetizar” como ficou usual falar, vinculando seu ‘canal a uma conta Google AdSense. Esse sistema permite aos produtores se associarem ao Google para disponibilizarem antincios em seus canais ou videos, entre outros recursos. Muito da “limpeza” e preciso no tratamento das informagdes para reconhecer, medir ¢ recomendar est na busca constante pelo YouTube- -Google para compreender e prever 0 comportamento dos usuarios, matéria-prima para 0 verdadeiro foco da organizacéo: a venda de propa- ganda. Mais do que isso, nos alerta Vaidyanathan, ao buscar 0 controle total da informacao com objetivo de gerar receita, 0 Google e, deduzo, YouTube, pode “se transformar num sistema que privilegia o consumo em vez da pesquisa, a compra em vez do aprendizado” (2011, p.26). ‘7 Termo emprestado da fisico-quimica que significa 2 acumulagso de uma substincia _gas0sa 04 liquida em uma interface sélida. (WIKIPEDIA, 2016) 1 Cunhar moeda (MICHAELIS, 2016). Na internet, 0 termo tem o sentido de converter para dinheiro 0s créditos por espaco publicitario, 78 ee ne TECNOLOGIAS (CARACTERISTICAS LINGUAGEM Hovis ALGORITMOS BUFFERING [DE BUSCA, DE RECOMENDAGAO, DE MEDIGRO DE TRAFEGO. ENVIO CONSTANTE OF PACOTES DE DADOS TITULO DO VIDEO, DESCRICAO, CATEGORIA, TPO DE LICENGA, PALAVRAS-CHAVE, CANAL, ‘CODECS E FORMATOS PRINCIFAIS | MOV, MPEGS, AV), WMV, MPEGS, FLV, GPR, WEBM /METADADOS a (COMPUTADORES PESSOAIS, NOTEBOKS, SMARTPHONES, SSMARTTVS, CONSOLES DE VIDEOGAMES. TABLETS. bsosmmuos or cameo | CARERS DE SMARTPHONES, CAMERAS 4 CAMERAS DE EDIGAO DE VIDED ‘PREMIERE, MOVIE MAKER. YOUTUBE, QUICKTINE, MONETIZAGAD (GOOGLE ADSENSE BANDA LARGA [BANDA LARGA FIXA, BANDA LARGA MOVEL IGE 4G, Tabels 1: quadro-sintese com as p consumo do YouTube - Brasil - 2016 Fonte: desenvolvide pelo autor cipais tecnologias envolvidas para a producdo ¢ © CONSIDERACOES FINAIS A presente investigacao evidencia como a cibercomunicagao é um processo social dindmico no qual a sociedade altera os processos tecno- lagicos 20 mesmo tempo em que os processos tecnolégicos alteram a sociedade. Evidencia que a divisao digital é uma realidade, principalmente no Brasil, porém que diminui e se altera muito rapidamente conforme a evolugao tecnolégica se expande. O ciberespaco se configura num ambiente propicio para o cres- Cimento de relacionamentos eletivos dos toy channels pela diversidade de agentes produtores e sistemas de web semantica que permitem as crlangas acesso aos conteiidos de forma répida e facil, sem a mediagao de um adutto. Do ponto de vista tecnolégico, os toy channels, por meio do YouTube do Google, se tomaram um espaco mididtico de grande alcance, apoiados na evolucao tecnoldgica de streaming de video; dos grandes data centers da corporacao; do avango nos algoritmos de reconhecimento, medicao recomendacao de videos, incluindo pesquisa em redes sociais; da evolugao nas técnicas de buffering; e da integracao de linguagem dos diversos apa- relhos de captacao e displays de reproducdo de videos, como observado na tabela 1. A tecnologia disponivel e os novos modelos de negécios no ciberespaco permitem o desenvolvimento de novas formas de produgio consumo midiatico de videos destinados a um publico infantil 179

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