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‘Do mesmo autor: Livre-Troca (com Hans Haacke) Meditagies Paseatianas © Poder Simbético DEDALUS - Acervo - FFLCH-LE ACOA » 24300133609 Pierre Bourdieu A DOMINACAO MASCULINA 2* EDICAO Traduciio Maria Helena Kahner SBO-FFLCH-USP 282273 sare Bonase Copyright © ditions du Seuil, 1998 “Titulo criginal: La domination masculme Capa: Sitnone Vitlss Boas Revisto da tradugao: Gustavo Sora Baitoragto: DEL, 2002 Inpresso no Brasit Printed in Brazil C1P-Brasi. Catalogagdo-na-fonte Sindicaio Nacional dos Fatiores de Livros, RE Bourdicu, Pere, 1934-2002 BITEd A dorninagao mascelina/Pieme Bourdieu; tradugdo Maria Helena Ped Kole ~2"ed. ~Riode Janeiro: Bernd Brasil, 2002 0p. “Tradngdo de: Ladomination masculine Inciancxo ISBN 45-286-0705-4 1. Paget sexual, 2. Domninagdo Psicologia. 3. Poder (Clémeias sociais) 4. Homem Pascologia. 1. Titulo. Dp ~3067 79-9353 . COU ~ 316.3462 ‘Todos os direitos reservatios pela: EDITORA BERTRAND BRASILLTDA. Rue Argentina, 171 ~ 1° andar— Sto Crist6vao 20921-380— Rio de Janciro~ RJ ‘Teh: (OXX21) 2585-2070 — Fax: (OXX21) 2585-2087 ‘Nao ¢ permitida a reprodugto total oa parcial deste obra, por quaisquer eis, sem a prévia autorizagio por eserito 6a Editor. Atendemos pelo Reembolso Postal AETERNIZACAO DO ARBITRARIO Eaetrosem an pute pein, fra con iss ses nein sobe 0 mse tenn apne ne pane piste de blo deeds ds are ae jn pac qucsimeaptroteaqucsao oben bata ed a eases crn prone ress onal ou ‘eee dnosfonmnd ete port ew deta terat ga eae ee naane gor vas peed con ods eras antago 43 con eas dacs smu doves toes do qa ssi rela como i a condivd © eter cosas aa e mediate ead = sen eis temo a sag dv muers), de agar «Ae connate aan ds ce. Se nee neces opr une gt, a eee team ¢ ser 6005 Seth, Sen vest pla era i ely san Ae lor er Go gnu sea peti pe fa cet em acim dese eying de aa socstne cae ulamere bes comcreads (emo 9 soi cb al como pate See kc dos ane Sosea) fret aararetcs gis pect compreender eer a anc iris Gago gu to es Fagen ts vos co deen are mantis cpmicmente reco eames egeiase qua soos ea cata pun pl deo « oa rangi is BE Beniejan ole dos nese svt evesponeres Cleat 0 problems soe ena rs pregrete mt lt eahcinento ge poe ea 0 prinlo Fee ro acsne ta tid ao Lee qe aqui a a Sue deo ere nur qe pret dam tube a eemsgn gece si servile ne cose» fn» ap, cl «tanh Ua oc eden, 9 ee fe nas ge ts wend Spends seins de sae eames, gr dv saab em et cro ate palode Meee ante hone, rare dever taco htc, tao eases sok de dtr ence de sanc (0 comme gusta Eat Se Sah rear nite opps agentes es, font tog itr ads orci da decker prince sent, ns ncn Sei ve ep cache 9 iri eurazana ne nal carn Eta mobili mandate poe, ques See ia cums a tn de evened ne sd ee Baar Pier ope anto 8 rego a gue enor as vies esenctaltt ee eta) uaa co sec to aera edu #8 Cre Sd nats hagpnrs we tempest goe pen ca indie Src etc ets rpius Rees ds tina eatin como “pend eee Ft woth De exes seaside, es param reso mo Einitoe demas ce. ar mn comprontn cama pin ec sents ov norco Se peur pop desided ie Pr er eet uns vate dois lia, 0 saa ira. 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De fato, jamais deixei de me espantar diante do que poderiamos chamar de o paradoxo da déxa. 0 fato deque a ordem do mundo, tal como esta, com seus sentidos tini- cos ¢ seus sentidos proibidos, em sentido proprio on figurado, suas obrigagdes e suas sancies, seia grosso modo respeitada, que ‘nao haja um maior mimero de transgressdes ou subversOes, deli- tos e “loucuras” (basta pensar na extraordinaria coordenacio de mi-thares de disposigoes —- 04 de vontades — que cinco minu- tos de circulacao automobilistica na Praga da Bastilha ou da Concorde requerem); ou, 0 que é ainda mais surpreendente, que 2 ordem estabelecida, com suas relacoes de dominacao, seus di- reitos e suas imunidades, seus privitégios e suas injusticas, salvo uns poucos acidentes historicos, perpetye-se apesar de tudo tio facilmente, ¢ que condicdes de existencia das mais intoleraveis possam permanentemente ser vistas como aceitiveis ou até mes- ‘mo como naturais. Também sempre yi na dominacao mascutina, £no modo como ¢ imposta ¢ vivenciada, o exemplo por excelén- cia desta submissao paradoxal, resultante daquilo que eu chamo de violé” ia simbdlica, violencia suave, insensivel, invisivel @ suas pruprias vitimas, que se exerce essencialmente pelas Vias pus ramente simbdlicas da comunicagao ¢ do conhecimento, ou, ~ Porn ther ramen + optecianos gonna vce banca ov nfo neo pesos © quem foster dos, contrtormnees am expe minh proied2 ‘ko a fodos onulos » scbrde @ todas amielos que me Fore fe uno documents, lets ceric, don, « minha esperonca de Gv oe ‘obetho vero a wr dgno obra em rau lator, do coniomo dak expecta os ue es ou dos nel depestron, “msi precisamente, do desconhecimento, do reconhecimento ‘ou, em altima instancia, do sentimento, Essa relagdo social ex- traordinariamente 6rdinavia oferece também uma ocasito th de apreender a l6gica da dominacao, exercida em nome de wm prinetpio simbelico conhecido e reconhecido tanto pelo domi-_ nante quanto pelo dominzdo, de uma lingua (ou uma maneira ‘de falar), de um estilo de vida (ow uma mancira de pensar, de fa- _ lar gu de agir) e, mais geralmente, de uma propriedade distinti- vva, erpblema ou estigma, dos quais 0 mais eficiente simbolica~ mente é essa propriedade corporal inteiramente arbitearia e no predicativa que é a cor da pele. “Torna-se evidente que, nessas matérias, nossa questo princi- pal tem que ser a de restituir & déxa seu carter paradoxal e, a0 ‘mesmo tempo, demonstrat os processos que sho responsaveis pela transformagao da historia em natureza, do arbitrario cultural em natural. E, ao (a2é-10, nos pormos @ altura de assumir, sobre nos- 50 prOprio universo e nossa propria visto de mundo, o ponto de ‘vista do antropélogo capaz de, ao mesino tempo, devolver & dife- renga entre‘o mascuilino e feminino, tal como a (des)eonhece~ ‘mos, seu cardter arbitririo, contingente, e também, simultanea~ ‘mente, sua necessidadle sécio-légica. Nao ¢ por acaso que, quando quis por em suspenso o que ela chama, magnificamente, de “o poder hipnético da dominacao”, Virginia Woolf se armou de uma analogia etnografica, religando geneticamente a segregagao das ‘mulheres aos rituais de uma sociedade ascaica: “Inevitavelmente, nés consideramos a sociedade um lugar de conspiragio, que engole o iemao que muitas de nés temos razdes de respeitar na vida privada, e impde em sex lugar um macho monstruoso, de voz tonitruante, de pulso rude, que, de forma pueril, inscreve no chao signos em giz, misticas linhas de demarcagdo, entre as quais 6s seres humanos ficam fixados, rigidos, separados, artificiai Lugares em que, ornado de ouro ou de puirpura, enfeitado de pla- ‘mas como um selvagem, ele realiza seus ritos misticos. wsufial ‘dos prazeres suspeitos do poder e da dominacao, enquanto.n6s, “Suas’ mutheres, nos vernos fechadas na casa da familia, sem at ios Sja dado participar de nenhuma das numerosas sociedades ‘iedade"1 “Linhas de demarcagao misticas", sagem ~~ a da transfiguracio magica e da conversio simbélica que produz a consagragio ritual, princi- pio de um novo conhecimento — estimuia a orlentar a pesquis para um enfoque capaz de aprender a dimensio propriamente simbélica da dominagao masculina, "Bard, por tanto, necessdrio buscar em uma anilise materialista dda economia os meios de escapar da ruinosa alternativa entre 0 “material” ¢ 0 “espiritual” ou “ideal” (mantida atualmente por meio da oposigao entre os estudos ditos “materialistas’, que expli- cam a assimetria entre os sexos pelas condigies de produgao, e os estudos ditos “simbdlicos’, muitas vezes notaveis, mas parciais). Mas, primeiramente, s6 uma utilizagao muito especial da etnolo- gia pode permitir realizar o projeto, sugerido por Virginia Woolf, de objetivar cientificamente a operacao, corretamente dita misti- ca, na qual a divisio entre os sexos, tal como a conhecemos, produg; ou, em outros termos, de tratar a analise objetiva de uma sociedade organizada de cima a baixo segundo o principio andro- céntrico (a tradigio cabila), como uma arqueologia objetiva de nosso inconsciente, isto é, como instrumento de uma verdadeira socioanilise? : Esse desvio, indo a uma tradigao exsitica, €indispensavel para enganosa familiaridade que nos lig >. As aparéncias biologicas € os efeitos, bem reais, iologizasio do social produziu nos corpos nas mentes conju- se para inverter a relacdo entre ascausas ¢ os efeitos e fazer ver ma constragao social naturalizada (os “géneros” como habitus sexuuados), como o fundamento in natura da arbitraria divisao que 1 WT gs a Fr, Fa Ele dF, 197 2. Nem que jo pare canprovar que meu propisio all nde rev de ume com ‘cio acl, ral de pgoor down inr o ania #m qua arise nolo de ‘9, quando asicada @ diisieaneal do mondo, arclogis pode “lomorse vets ome portcuarniais poderso ee socoaralee” (F. Bouian, le Sens protgoo, Por, Cone de Mini, 1980, pp. 246247), esté no princtpio nao s6 da reali {agdo da realidade e que se impoe por vezes & propria pesquisa.) ‘Mas serd que esse uso quase analitico da etnografia, que des- naturaliza, historicizando, 0 que € visto como o que hé de mais natural na ordem social, a divisto entre 0s sexos, ndo se arrisea a por em destaque constantes ¢ invarisvets — que esto no princi- pio mesmo da sua eficdcia socioanalitica ~~ e, com isso, a eterni zar, ratificando-a, uma representagio conservadora da relacio entre os Sex08, ‘a mesma que se condensa no mito do “eterno emi que ii se tentou ey ext ob forma de * ‘a historia serd que as invariéveis que se mantém, acima de todas as nmudan- «a8 visiveis da condicdo feminina,e sto ainda observadas nas rela- gies de dominagao entre os sexos, ndo obrigam a tomar como objeto privilegiado os mecanismos e as instituigaes hist6ricas que, no decurso da hist6ria, ndo cessaram de arrancar dessa mesma historia taisinvariéveist Essa revolugdo no conhecimento no deixa de ter consequén- iss na pritica , particalarmieme, na coucepeao das Gtratégias destinadas a transformar 6 estado atual da relagio de forcas mat _ Hale simbdlica entre os sexos. Se 6 verdade quo principio G2} petuagio’dessa relagio de déminagio nto 3. Asim, no & ove qu os patos tetanam por cont prio Wide como dos vero, come canines dialer spciados, sm apo, einorem 0 gray de recebrimeno ante 0 dtibicdas do performances moscvinas faninina,@ oF

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