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0) etecuuG Bem-Estar Social no Século XXI Lik RECALIBRAR O MODE ACELERAR ees SOCIA MELHORAR A CoO; L REFORMAg UROPEU: ORDENACAO® Maurizio Ferrera” id PATRIMONIO A REFORMAR Q Estado Social é uma das maiores conquistas do sé Qs seus programas forneceram concretude ARE ne ee grandes ideais da Europa moderna — liberdade, eonaniaue ae dariedade —e deram uma contribuicao enorme a melhoria dex ab digdes e das oportunidades de vida de todos os cidadaos a ae pretudo, dos mais desfavorecidos. O Estado de Bem Estar eon) constitui um patrimOnio institucional precioso que a Europa (a Uniao Européia) pode mostrar as outras regides do mundo, convencendo- as de que é possivel conjugar virtuosamente crescimento e coesao, mercado e protecao social, valorizagao dos méritos e atendimento as necessidades. Se a missdo ideal e a estrutura geral desse patriménio institu- conal mantém hoje intacta a sua validade, ha, no entanto, muitos ()A versio original do presente artigo foi escrita em italiano. A tradugao para 0 Portugués foi feita por Lorena Vasconcelos Porto. se (") Italiano, tem formacao académica nas Areas de Ciéncias Politicas, Ciéncias So- Gas e Filosofia. E Professor da Faculdade de Ciéncias Politicas da Universidade a lio, onde ensina, dentre outras, as seguintes disciplinas: “Politicas Socials ¢ Tabalho”, “Teoria ¢ Politicas do Estado Social” e "Politicas do Welfare 104 © EstaDO DE BEM-ESTAR SOCIAL NO SECULOXXI__ zacdes. O Estado Social es e atualiz m de revi aspectos que necessitar ; OFS! Pe onea nasceu para responder aos desafios da era industrial e para stado-nagao. O contexto de referéncia tadicalmente diverso. Por um lado, 6 ‘as de bem-estar colocou em europeu atender aos interesses do E: externo 6, nos dias atuais, funcionamento interno dos program: evidéncia problemas de eficiéncia e de eficdcia, que nos levam a repensar os limites entre ptiblico e privado, entre responsabilidade coletiva e individual. Nenhuma instituicao pode sobreviver sem se adaptar. A Europa deve enfrentar esse desafio: deve adaptar 0 Es. tado de Bem-Estar Social ao novo contexto, tornando-o, a0 mesmo tempo, estruturalmente mais adaptavel. A partir dos anos 90, va- rias etapas j4 foram cumpridas em diregdo a essa adaptacao. Mas ainda hé muito a fazer. A modernizacao do modelo social europeu permanece como uma grande prioridade da agenda politica nacio- nal e supra-nacional. Duas grandes transig6es estao modificando 0 perfil sdcio-eco- némico do nosso continente: a) a transigao sécio-demografica, em boa medida ligada (so- bretudo no tocante ao declinio de nascimentos) As novas relaces de género e as crescentes aspiragdes de independéncia pessoal e auto-realizacao das mulheres; b) a transicdo em direcdo a uma economia baseada nos servi- ¢os e, sobretudo, no conhecimento, em uma moldura de crescente internacionalizacao e abertura das trocas. Ambas as transformagées abrem a perspectiva de um cenario de maior bem-estar, com oportunidades mais amplas e novas liber- dades. A Uniao Européia pode realmente se tornar a economia mais competitiva baseada no conhecimento e, ao mesmo tempo, a mais “ ¢ livre do planeta, como preconizado pela estratégia de Lis- cHe rcs spars nao podem ser considerados como Por baixo”, influenciado igihhinnee ser 2 eee Sere cererrrar up eomeeet nem C0, 2 Brae a marcantes, permanece, d eines. dapolereastay ind le fato, como um di toe le das dinamicas em curso: los possiveis res! © BSTADO DE BEM. TAR Si AL NO SECULO XX1 105 Uma modernizagao “inteligente” do Estad i cor um grande papel no combate aos resultadee, ioe mogdo daqueles virtuosos. Essa modernizacao dex apoiar-se sobre uma correta identificag clades sociais conexos ds duas grande: cionadas, quais sejam Social pode exer- ndos viciados e na pro- nizacao deve, antes de tudo, ’0 dos novos riscos e neces, 8s transformacdes acima men- * riseos conexos & dificuldade de concili ar trabal fae dos familiares, vid alho e cuida: ‘a profissional (inclusive as aspiracoes da carreira) e vida familiar, sobretudo para as mulheres; * riscos Conexos 4 auséncia de ac ‘0 ao conhecimento, sobre- tudo para os jovens; * riscos conexos a obsolescéncia dos atributos profissionais, sobretudo para os trabalhadores com baixa qualificacao; * como efeito dos riscos anteriores, riscos de marginalizacao e de verdadeira exclusao, nao apenas da economia do conhe- cimento (ou seja, dos setores mais dinamicos da sociedade), mas também do mercado de trabalho em geral ou do tecido social em seu conjunto Egses riscos em parte j4 emergiram em todos os paises euro- peus. A resposta prevalente foi o recurso a medidas compensaté- rias, dirigidas a remediar posteriormente os danos sofridos pelo individuo ou por grupos sociais inteiros: politicas de assisténcia escolar, de re-qualificagao profissional, politicas de subsidio aos tra- balhadores mais desfavorecidos, medidas de combate a pobreza ou ’ exclusio, Além de limites financeiros, essa abordagem encontra, no entanto, limites intrinsecos de eficdcia: trata-se de medidas que atenuam as necessidades, mas nao previnem os riscos. Naturalmente, nao se pode deixar de atender posteriormente ds necessidades, quando estas ja se manifestaram. Mas a aborda- | gem necessdria é do tipo preventiva. £ essencial deren oles a Nova “grande estratégia” de politica social, que coloque no ¢ ate do Estado de Bem-Estar Social os novos riscos, aS aus £ jovens; uma estratégia que dé maior énfase a PrOmssios ere ie. a0 Rie arapeeaaes Sas See h haan de contingéncias in- , 0s danos f \ SECULO XXI © ESTADO DE BEM-ESTAR SOCIAL. NS 106. sostaria de propor para identificar mais prjentes dessa “grande estratégia’ é aquele de ado de Bem-Estar Social significa hoje, O conceito que 8° de perto os virios ingredient yeealibragem™. Reformar 0 de fato, deslocar 0s pesos financeiros, 0 acento ideal - a atengao institucional, 08 recursos de algumas fungdes a outras, de algu es a outros. Sem recalibra- mas categorias a outras, de alguns valor n ree vem, oEstado de Bem-Eetar social arrisca de se bloquear ¢ entrar arins perigosa a, Proponho distinguir entre trés e a sa “frentes” de recalibragem, scalibragem funcional, redistributiva espiral involutiv: : dimensdes ou em diregdo as quais con- dimensdes centrar o esforgo reformista: re e normativa. 2. DOS VELHOS AOS NOVOS RISCOS A recalibragem funcional relaciona-se com 0s riscos que S80 ob- jeto de protecdo. Em razao de uma espécie de efeito de inércia, na maior parte dos paises da Unido Européia (UE), 0 Estado Social e demasiadamente um risco antigo, a protege, atualmente, intens velhice, e muito pouco os riscos (novos), conexos a outras fases do ciclo de vida. O trabalho precério, os encargos familiares, a nao- autosuficiéncia, a exclusao social, a indisponibilidade de oportu- nidades adequadas de formagao ao longo da vida, a obsolescéncia das habilidades profissionais: esses riscos nao encontram hoje uma protecdo adequada nos sistemas dos Estados de Bem-Estar Social europeus (ao menos fora do contexto nordico). Por outro lado, a velhice — que é quase improprio definir atualmente como “risco”, ao menos entendida estritamente como “vida depois dos 60/65 anos” — é super-protegida, freqiientemente a prescindir das efeti- vas contribuigGes dos segurados ou do seu efetivo estado de neces- sidade. Em um quadro de vinculos orgamentarios, redimensionar as tutelas no setor da velhice, fortalecendo-as em outros, 6 sem du- eee mate to (embora nao a tinica), na perspectiva aa aire ihe ae I. oe aectet em nada as tutelas para os ido- Ratddé de aime aauubat i: iguras sociais de referéncia do novo levem vir a ser as maes que trabalham, (1) Retomo aqui um Ferrera ¢ Ee 8 proposta em Ferrera, Hemerijck e Rhodes (2000) ¢e™ CIAL No Stcute = 2 XXL EAL 107 por um lado, € 08 menores er i m condigdes de Esse tipo de racalibragem teria, jongo prazo sobre os préprios si Alp s sistem da breza, por outro lado,® a, conseqiiéncias positivas a as previdencidrios. : O envelhecimento demograti ee shes ‘fico representa um grande para de Welfare contemporaineo: aeRO dorias aumentaré significativament eS ‘ ‘ativamente pro a eee fe nas proximas duas décadas ; ic a idade de apose: Fete sap ainantea Ciena oa entadoria, na taxa de nata- ‘atérias podem ate roblema, mas a pri ; atenuar a gravidade ps ei prioridade é clara: ha uma Urgent Heed id a er 0 contrato entre as geracées. say Envelhecimento demogré wvelhe emografico, ocupacao fe 5 social so trés fendmenos intimame’ Sete deborah ca pitted : amente conexos entre si. Para a sus- tentabilidade financeira do Estado de Bem-Estar Social d sae SUG, Grn Paice para of sistemas plevidenct SEAT as previdencidrios) serao cruciais os recursos gerados por altas taxas de participagao feminina agthee cado de trabalho. Por outro lado, a contencao dos Ace uiSBH8 oo seperate da disponibitidade das mulheres de ter Ethos, et duplo vinculo impoe um sério desafio as politicas. © eclinio da natalidade, principal responsével pelo envelhecimento populacional, esta conexo, de modo complexo, & participasso femi- ‘Iho. Embora as familias com dupla fonte de renda estejam se tornando a regra em muitos paises da UE, séo fveis by ° eb nainstruéo, que seencontra em niveis mi do que aqueles dos paises anglo-sax0es ° 8 80 fagnagio. Sem uma “recalibragem’ incisiva (funciona , distributiya ¢ eormativa, em conjunto) do proprio modelo de investimento py. blico!, que saiba, todavia, integrar as politicas para a instrugio em um desenho mais amplo de politica social, os paises continentais ¢ meridionais arriscam de ingressar com grave atraso na economia baseada no conhecimento ou de chegar lé em condigdes de marcante baixos nordicos, sofreu uma es. polarizagao social. Recalibrar o Estado de Bem- : operacao facil, sob a perspectiva politica. E necessério remar contra conviccoes enraizadas (embora nao mais empiricamente fundadas), contra expectativas consolidadas (embora nao sempre justificadas em termos de justica distributiva), contra multiplas categorias or- ganizadas e interessadas em defender a situacao vigente star Social nao 6 certamente uma Nenhuma reforma passa sem 0 apoio de coalizées sociais inte- ressadas em sustenté-la e sem unides politicas capazes de decidi-la Mas a matéria-prima de cada reforma 6 sempre um determinado projeto ideal de mudanga: aquele que foi chamado o software do reformismo. Um sério empenho na frente projetista pode contri- buir para remover muitas barreiras, remodelando preferéncias e interesses e aplainando, assim, a estrada rumo a mudanga. 5. O PAPEL DA UNIAO EUROPEIA: REFORCAR E MODERNIZAR A COORDENACAO ABERTA oy moe dos anos noventa, a Unido Européia (e, em parti- ae _ ee Européia) exerceu um papel sempre mais impor- Para colocar no ponto 0 software do reformismo: as idéias e a (11) Cf. Room (2002). (12) Cf. Satvati (2004), O ESTADO DE BEM-ESTAR SOCIAL NO SECULO XX! 45 propostas a serem incluidas na agenda de Social, Do ponto de modernizagio do Estado a sul shut Heetocle eo diegn tien complenn dec oe mn identificagao das grandes linhas de reforma. As Pott angi forneceram andlises e propostas racionais.eestimulantessabse cusce eer se apne SeAIEge eC NeE fos anteriores, propiciando exer- jetos, em uma multiplicidade de arenas supra-nacionais, transnacionais e nacionais, Do ponte de vista pro- cedimental, a Unido estimulou a mudanga, sobretudo através do meétodo aberto de coordenagao, verdadeira pedra angular da estra- tégia de Lisboa. Atualmente, existem trés “processos” codificados de coordenagao no setor da protegao social, relativos as politicas para a ocupagao (de 1998), as politicas para a inclusao social (de 2001) e as politicas previdencidrias (de 2003). A partir de 2005, é prevista a inauguracgdo de um ulterior processo de coordenagao no campo da satide e dos servigos aos idosos. Formas mais ou menos coordenadas de troca de informacées e reflexao coletiva existem também no campo das politicas educacionais. Q Embora nao existam andlises empiricas sistematicas relativas ao impacto de todos esses processos sobre as politicas sociais dos paises-membros e sobre os seus éxitos, a valoragao predominante por parte dos especialistas e elaboradores das politicas (“policy makers”) tende a ser positiva." O método aberto de coordenagao é um bom instrumento para enfrentar conjuntamente desafios seme- Ihantes (embora nao comuns, no sentido estrito do termo), com o respeito das tradigdes nacionais e do principio da subsidiariedade. Sobre o futuro dessa estratégia (e, portanto, sobre um capitulo im- portante de toda a agenda de Lisboa) existem, todavia, dois possi- veis riscos, que poderao comprometer tanto a eficdcia substantiva, quanto a procedimental. O primeiro risco é aquele de um enrijecimento € de uma ompartimentalizagao dos objetivos. Foram mencionadas acima que duas ancoras fundamentais do processo de recalibragem do Estado Estar Social deveriam ser: A) 0 sustento das familias de anaes te de renda e, em particular, das maes que trabalhs » do capital humano a partir da primeira infancia, espe- (4 ae is Ab ng ses ante hy Seid sesiatit ssahp, sities canine’ AL No SECULO XXI pee “AR SOCL 0 DE BE 116 QESTAD’ ao de pobreza. Em ambos os 5 com relagao aos varios pro- tes: objetivos que im- vasta gama de instrumentos diversos de acao, da instrugao, da previdéncia, Mos servigos sociais. O risco é que, nao se pecghitant Conroe tinivoca em um proceso especifico de coordenaga asinenieje ie: tivos como estes nao consigam ser oportunamente identificados e monitorados. A questao da eqiiidade ERESEsrecoren no pardgrafo sobre a recalibragem distributiva, é também Hi tema complexo e bastante discutido, que exigent ulvers0e, am itos de politicas e que nao é inteiramente comprimivel no seio do “pro- cesso de aposentadorias”. Essa questao € tao importante que mereceria tornar-se objeto de uma verdadeira estratégia comum (estratégia de mainstreaming), andloga aquela introduzida anterior- mente pela UE para a igualdade de oportunidades entre homens e mulheres. Para evitar 0 risco da compartimentalizagao, seria necessario dotar a estratégia da UE de modernizacao da protegao social de uma espécie de cabine de comando “‘inter-processo”, que saiba de- limitar de forma mais nitida as conexdes e as interdependéncias entre 0s varios objetos setoriais. Em acréscimo as revis6es periddi- cas jé previstas para cada processo de coordenagao, talvez valesse a pena colocar na agenda também uma revisao estratégica que com- preenda toda a estrutura social da estratégia de Lisboa. e os menores em situas: de objetivos transversais « aberta hoje viger cialmente entre casos, trata-se o cessos de coordenagae plicam 0 recurso a uma politicas nos campos da ocuP: Osegundo risco é aquele de uma excessiva procedimentaliza- ao dos processos, da submissao destes aos tecnicismos dos indica- dores e a liturgia dos planos de agao e das valoracées equivalentes (NAP, peer reviews, joint reports, etc.).° Indicadores e procedimen- tos sdoctlotados de validade e eficdcia, naturalmente. Mas nao de- vem se tornar fins em si mesmos. A conseqiiéncia disso seria um seat a cas politico progressivo de toda a estratégia, o seu afas- deeelne, efetivas Soe de interagao entre os elaboradores politicas (“policy makers”) e os entes interessados (“stakehol- ders”) — organizacoes sindicais, ane (are , Bovernos sub-nacionais, represen- (14) N.T.: Trata-se, em linhas gerais, listas em um determinado axtamer sie elstorios e andlises elaborados por especia~ que, assim, gozam de maior credibilidade. O Esta sTADO DE BEM-ESTAR SOCIAL NO SECULO XX1 7 tantes dos grupos-alvo (“target g: a dependem, de modo ete Sek AEE distributivo. a reforma do status quo Discuss6es, transparér sao eadaplabiidade a aa de refle- teristicas institucionais que devem ser Peer eee aberta e na agenda de Lisboa, em seu conjunto AUS ae deve aplicar as proprias modalidades de einen ee (“policy making”) aqueles tracos inovadores a ela Spee tempos recomenda de serem adotados internamente pelos a membros, sobretudo no que tange as diretrizes (" avervantet) da politica social eee 6. REFERENCIAS BIBLIOGRAFICAS ALLMENDIGER, J., LEIBFRIED, S. “Education and the Welfare Sta- te". Journal of European Social Policy, 13:1, 2008. ESPING-ANDERSEN, G., GALLIE, D., HEMERIJCK, A., MYLES, J Why we need a new Welfare State, Oxford: Oxford University Press, 2002 ESPING-ANDERSEN, G. “Against Social Inheritance”. In GIDDENS, ‘A. The Progressive Manifesto. London: Polity Press, 2003. FERRERA, M. Le Trappole del Welfare. 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Nos demais paises (*) A versao original do presente artigo foi escrita em inglés, em marco de 1998. A tradugao para o portugues foi feita por Lorena Vasconcelos Porto. (**) Noruegués, tem formacao académica nas reas de Ciéncias Politicas, Adminis- tracdo Publica e Sociologia. E Professor de Politicas Sociais Comparadas na Univer- sidade de Bergen (Noruega) e na Hertie School of Governance (Alemanha). (1) A expressao “paises nérdicos”, de acordo com 0 autor, abrange Suécia, Noruega, Dinamarca, Finlandia e Islandia. Eles possuem em comum determinadas caracteris- ticas, que permitem inseri-los em um mesmo grupo, tais como: geografia; religiao luterana; fortes lagos entre a Igreja e o Estado; lingua; uma longa tradicao democrati- ca; conceitos basicos de justica; economia mista; nivel avangado de igualdade entre homem e mulher; Estado de Bem-Estar Social; cooperativismo institucional. en SIAL NOISGOGUE aE : 195 europeus, o Estado também assume uma funca re portante, mas o setor privado, as organizagoes yoo" , é Ages nado. ea familia exercem um papel de maior relevanes tados com os paises nérdicos. m }0-Politica im- Sovernamentais Quando confron- 2, A CRIACAO DA SEGURIDADE SOCIAL A Seguridade Social — que constitui 0 pi do de arb Seal iat le 30 modem a legislacao “pobre” da Europa, os programas nacionais de ae ridade propiciaram uma resposta mais humana e efetiva pare os problemas da velhice, doenga, acidente de trabalho e desemprego Um dos primeiros programas estabelecidos foi a indenizacgao compensatoria paga aos trabalhadores das minas na Noruega, em 1842. Alguns outros planos limitados de Seguridade Social foram desenvolvidos na Europa durante as décadas seguintes, mas a mu- danga fundamental veio a ocorrer com a introducao de um sistema assecurat6rio nacional na Alemanha de Bismarck, ao longo da dé- cada de 1880. A inovacao mais significativa, verdadeiro legado do sistema germanico, foi o principio do seguro social obrigatério, con- trolado pelo Estado. Tal principio foi duramente discutido a época, mas foi sendo incorporado, desde entao, pela maioria dos sistemas de Seguridade Social. O Seguro Social, criado na Europa, veio a se espalhar pelo resto do mundo. Em 1995, cerca de 165 paises tinham ja adotado alguma forma de Seguridade Social; aproximadamente todos eles assegu- ram proventos de aposentadoria e pensdes aos dependentes, bem como indenizacoes por acidente de trabalho. O seguro-desempre- go, todavia, é menos difundido, existindo atualmente apenas em cerca de 60 paises. 3. O PAPEL DO ESTADO Nos estagios iniciais de desenvolvimento dos sistemas de Se- guro Social na Europa, o debate central relacionava-se ao papel do Estado. Surgiu, entdo, uma variedade de modelos, cujas linhas prin- Cipais se fazem presentes ainda hoje. Com efeito, pode-se ainda, de ig __O ESTADO DE BEM-ESTAR SOCIAL Ni TAR SOCIAL NO SECULO XXL vigos de satide gratuitos ae = : ‘a OS Ou altamente si residentes, embora a prestacao desses « cubsidiados para tod siauada pelos bovernee proviviciaisGuteaiem nee * ad ciais ou locais, seandaias 2. Considerando os padrées intern; s internacionais, t maior proporsao de forga de trab: eeu. je trabalho empregad ais paises tém a EABREEG, 2° GkbEE, reall UUe meine tee 3. Grande dependéncia do setor publico gos educacionais e sociais; cerca de 90% Ee Pa prover os servi. questao nos demais paises europeus varia de 40 a iG rcentager Em Unidos é de 45% a 80%; nos Estados 4. A organizacao da Seguridade Social ocorre por meio d temas nacionais coordenados, que tém total caanangauiloncael pagamento de beneficios relativos a licengas AS ianinan Be ee rlespesas com os filhos, pensdes € pelos servigos de Te a 5, Um nivel comparativamente alto de confianga entre cida- daos ¢ Governos: As sociedades nordicas sao mais valiadas 20 Fetado” do que nos demais paises europeus. 6/08 sistemas de’ Seguro Social sio abrangentes ov Snivt. sais, cobrindo populace didadao residente tem direito a receber um provento basico de apo- sentadoria por velhice, quando alcanga a idade prevista em lei, mesmo na auséncia de qualquer trabalho remunerado anterior; 0s peneficios para o custeio das despess ‘com 0s filhos sao pagos @ todas as familias, independentemente do seu nivel de renda; todos Be ieaidentés tem direito aga melhores S177 igos médicos dispont- ca- s inteiras ou suib-grupos. Por exemplo: todo veis, independentemente da sua renda, status social ou outr aioria dos paises euro- tacteristicas pessoais. Isso. contrasta com ami do a uma efetiva peus, onde 0 gozo desses direlto% 6 condiciona participagao no mercado de trabalho. 7 Um nivel avangado de igualdade entre homens e mulheres, resultante, sobretudo, de leis promulgadas desde a década de 1970; todos os beneficios sio essencialmente metros” com relagao 20 sexo, de modo que as mulheres $40 tratadas como individuos com necessidades e direitos proprios, ¢ N40 apenas como vitivas e Maes. Os mercados de trabalho nérdicos s40 caracterizados POT altos in © EstaDO DE BEM-ESTAR SOCIAL NO SECULO XXI_ 198 dices de ocupagao feminina, niveis remuneratérios quase iguais para homens e mulheres que exercem a mesma fungao eum sistema bem- estruturado de suporte as trabalhadoras-maes. 8. Os sistemas de Seguro Social sio desvinculados de aspectos ocupacionais ou de classe social. Assim, os que recebem saldrios altos encontram-se incluidos no mesmo sistema que aqueles com remuneracao baixa ou mesmo inexistente. 9. A tributagao generalizada constitui 0 principal meio de fi- nanciamento do Estado e tem o efeito de redistribuir a renda. Como resultado dos sistemas de Seguro Social universais e redistributi- vos dos paises nérdicos, as suas taxas de pobreza encontram-se dentre as menores no mundo. Os beneficios minimos nao sao eleva- dos, mas generosos se comparados com aqueles presentes na maio- ria dos outros paises. 10. Hé uma maior énfase no provimento de servigos — ao in- vés da transferéncia direta de renda — em comparagao com os demais paises europeus. Tais servicos incluem uma extensa rede de creches, asilos e assisténcia domiciliar para idosos e doentes em estado grave. 11. A énfase, tradicional e forte, no pleno emprego constitui uma meta em si mesma e uma condicdo necessdria para gerar 0s recursos econémicos necessarios ao custeio do Estado de Bem-Estar Social. 12. Um forte apoio popular. Questdes como bem-estar das criangas, satide ptiblica, protecdo dos idosos, dentre outras, sao apontadas como prioritérias nas pesquisas de opiniao e nos perio- dos eleitorais. Nenhum partido politico que almeje um amplo su- porte popular pode se dar o luxo de ignoré-las. O fato de os paises nérdicos poderem ser descritos através das caracteristicas acima elencadas nao significa que eles se torna- ram “paraisos do bem-estar”. Como ocorre com qualquer nacao, eles se deparam com uma série de velhos e novos desafios. Mas em comparagao com outros paises desenvolvidos, eles enfrentam ni- veis bem menores de criminalidade, uso abusivo de alcool e de drogas, pobreza e questées relacionadas. Além disso, problemas as- sociados 4 mono-parentalidade e ao desemprego tornam-se menos graves, em virtude do suporte dado pelas sociedades nérdicas as pessoas por eles atingidas. O ESTADO DE Bi : EM-ESTAR SOc AL NO Sécus LO XX1 if ; : 199 ; oe conjuntura comparativamente favors éncia da: iS Ses ft ae auiencia das insituigdes e poiticas soca avorével € wina conse: yvernos centre ii Z 8, Bid gove trais. Demais disso, 0 espitito co ‘aS Tegides e dos litério dos paises nérdicos — expresso, por exemple ore Bua ner iT ex: ‘i sari © ticas de redistribuigao de renda — certament mplo, em suas poli- maior estabilidade e coesio social © contribui para’ uma 5. DESAFIOS ATUAIS A década de 1990 foi um periodo de consideravel turbulé econémica, resultando, inusitadamente, em altas taxas de sits Social. A Suécia e a Finlandia foram atingidas mais sence enquanto que a Noruega obteve maior éxito no entertainer es ses problemas, gracas, em parte, as substanciais receitas advindas da exploracao do petréleo e do gés. Islandia e Dinamaxca ocupam uma posicdo intermedidria nesse contexto. Nos utltimos anos, todos os Governos n6rdicos intensifica- ram os seus esforcos para ajudar os desempregados a reencontra- tem um trabalho remunerado. Algumas pessoas podem ser leva~ das a interpretar essa tendéncia como uma concessao a ideologia neoliberal. No entanto, ela esta em total consonancia com a tradi- Gional énfase nérdica no valor do trabalho e na intensa participa: cao na sociedade. Os politicos que tocam demasiadamente alto 0 frompete do neoliberalismo tendem a encontrar resisténcia nos paises nérdicos. Desse modo, as estruturas basicas dos Estados de Bem-Estar Social nérdicos permaneceram intactas, em grande parte gracas aos amplos compromissos politicos e ao suporte sufi- ciente dos eleitores. ‘A essa altura, 6 impossivel dizer se as pequenas modificagdes nos sistemas de Seguridade Social na Suécia e na Finlandia, e, em extensdo ainda menor, na Dinamarca, podem prenunciar uma espé- cie de mudanga fundamental. Todavia, até o presente momento aS instituigdes e os programas dos Estados de Bem-Estar Social nordi- cos tém permanecido quase intactos, nao obstante os Sérios desa- fios dos tltimos anos. Dessa forma, ainda apropriado falar-se do ‘modelo nérdico” de sociedade.

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