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Bom dia, bem vindos à unidade de alergologia do hospital Santa Margarida eu sou o Dr.

João
Gil chefe de serviço. Estes são os estagiários João D’arte e Inês Santos e este é o nosso
estudante prodígio do 5ºano de medicina, Joel de Oliveira.

Nesta plateia estão presentes alunos do 3º ano de medicina, por isso esperamos que hoje
façam uso dos vossos conhecimentos sobre o sistema imunitário. Como isto não é uma cadeira
para meninos coloco-vos já uma pergunta: O que é uma alergia? (espera uns segundos)
Hmmmm! Parece-me que alguém vai chumbar no exame final. Preparem-se para me ouvir
mais um ano.

Uma alergia é uma reacção excessiva do sistema imunitário face a agentes ambientais em
regra inofensivos para a maioria das pessoas. Estes antigénios ambientais são designados de
alergénios. Uma alergia é, por isso, uma hipersensibilidade do sistema imunitário.

Existem quatro tipos diferentes de hipersensibilidade. No entanto, hoje falaremos apenas da


hipersensibilidade imediata e tardia.

Como o seu nome indica, a hipersensibilidade imediata ocorre imediatamente depois do


contacto do paciente com o alergénio. Este tipo de hipersensibilidade está, geralmente,
associada à imunidade humoral.

Num primeiro contacto, o alergénio é reconhecido pelos receptores específicos para esse
antigénio que se encontram na superfície dos linfócitos B. Os linfócitos B são, assim,
estimulados, diferenciando-se em plasmócitos, que vão produzir anticorpos da classe IgE
específicos para aquele alergénio. Estas imunoglobulinas vão ligar-se aos mastócitos e
basófilos, que contêm no seu interior histamina/ que armazenarão no seu interior grandes
quantidades de histamina.

Neste primeiro contacto podem também intervir linfócitos T. Nesses casos, o alergénio é
fagocitado e digerido por macrófagos, sendo que os fragmentos resultantes migram para a
superfície destes leucócitos (ex-monócitos), ligando-se às proteínas MHC, receptores que se
encontram na membrana dos macrófagos. Estes fragmentos com poder antigénico são
reconhecidos pelos receptores específicos dos linfócitos T auxiliares (linfócitos TH), que ficam
activos. Os linfócitos TH vão, então, estimular a diferenciação dos linfócitos B em plasmócitos,
ou seja, a produção de anticorpos, através da libertação de mediadores químicos designados
de citoquinas. Este é um exemplo de cooperação entre células B e T.
Na segunda exposição ao mesmo alergénio, este é reconhecido por anticorpos IgE específicos
presentes na superfície dos mastócitos e basófilos, que existem em grande quantidade,
estimulando estas células a libertarem grandes quantidades de histamina a partir dos seus
grânulos corticais. A histamina vai funcionar como um mediador químico desencadeando uma
resposta inflamatória intensa. Esta reacção consiste num aumento da permeabilidade dos
capilares sanguíneos, consequentemente, vasodilatação. Esta substância está também
envolvida no mecanismo de quimiotaxia, atraindo vários leucócitos para o local da infecção.
Em resultado da reacção inflamatória excessiva, poderá haver obstrução das vias respiratórias,
bem como a produção de mucos e secreções, que se manifestarão em espirros, tosse,
dificuldades respiratórias, entre outras manifestações alérgicas.

Esta é uma resposta imunológica rápida, manifestando-se até 30 minutos após a exposição.
Para além deste processo de reconhecimento e acção dos mastócitos, é novamente
estimulada a diferenciação dos linfócitos B em plasmócitos, sendo, assim, produzidas ainda
mais imunoglobulinas IgE específicas para aquele alergénio aumentando, assim, a
concentração de imunoglobulinas específicas para aquele alergénio nos humores do
organismo.

No entanto, os sintomas de alergia podem apenas manifestar-se decorridas mais de 12 horas


da exposição ao alergénio tratando-se nestes casos de uma hipersensibilidade tardia. Esta
reacção é mediada pela imunidade celular, não havendo, por isso, intervenção de anticorpos.
Nestes casos, o alergénio é digerido e fagocitado por macrófagos que, posteriormente, o
apresentarão aos linfócitos Th que reconhecem o complexo antigénio-MHC presente na sua
superfície. Os linfocitos Th vão activar e estimular a multiplicação dos lifócitos T citotóxicos.
Este tipo de linfócitos vai destruir as células infectadas por intermédio de enzimas destrutivas,
compostos tóxicos por eles produzidos. Os linfócitos Th vão também dividir-se em células de
memória que permitirão uma resposta mais rápida e vigorosa aquando de um próximo
contacto.

Os linfócitos Th libertam ainda citoquinas que atraem outros leucócitos para o local,
nomeadamente monócitos que se vão diferenciar em macrófagos que, ao digerirem os
antigénios podem provocar lesões nos tecidos.

Toda a produção, activação e a acção de células T, bem como de outros leucócitos não é
imediata, pelo que os seus efeitos só se manifestam várias horas após exposição ao antigénio,
daí ser designada de tardia.

A hipersensibilidade tardia está associada ao contacto directo e repetido com determinadas


substâncias. São exemplos desta hipersensibilidade, as rejeições de órgãos, alergias a lixívia,
cimento ou cosméticos.

Vamos agora fazer a distinção entre os vários tipos de alergénios existentes:

 Inalados – onde se destacam o pólen, ácaros e esporos de bolores


 Ingeridos – alimentos c.mp.e: crustáceos, soja, lacticineos assim como medicamentos
(antibióticos)
 Injectados – veneno proveniente de picadas de insectos ou mordeduras de cobras
 Via cutânea – veneno das plantas, pêlo dos animais, pólen e látex

(Quando terminar de falar dos vários tipos de alergénios, O Gil vai para trás da sala pôr uma
peruca e uma manta)

A hipersensibilidade do nosso organismo a determinados alergénios é responsável pela


existência de várias doenças alérgicas. As principais são:

Rinite alérgica – resultante da maior produção de muco nasal. A rinite alérgica manifesta-se
através de espirros, corrimento nasal e comichão frequentes.

Conjuntivite alérgica – caracteriza-se pelo inchaço, vermelhidão e comichão de ambos os


olhos, num determinado ambiente, local ou época do ano.
Asma – Esta doença alérgica é provocada pela obstrução das vias respiratórias fruto da
inflamação intensa que aí se desenvolve. Tosse, falta de ar e pieira constituem os sintomas
mais frequentes.

Dermatite – Também chamada eczema é caracterizada pela vermelhidão, descamação da pele


podendo ocorrer em varias partes do corpo como p.ex. na face, dobras dos cotovelos ou
joelhos.

Eczema de contacto. Estas manifestações têm origem num alergénio fixo à pele ou a uma
mucosa. De início, encontra-se localizado. Todavia, tem tendência a alastrar.

Tem origem num alergeno fixo á pele ou a uma mucosa. De iníncio encontra-se
localizado, todavia, tem tendência a alastrar, sendo o período de instalação muito
elevado, pode demorar meses ou até anos para que, após o contacto com o agente
alérgico, se manifeste. Tudo isto dificulta em muito o diagnóstico

Granuloma manifesta-se por um endurecimento na pele e resulta de antigénios persistentes


ou na presença de um corpo estranho, como ocorre na tuberculose ou na lepra.

(Quando o Joel acaba de falar – bip - finge que o telemóvel vibrou)

Bem, parece-me que temos uma emergência do foro alérgico em mãos. Agradeço que os mais
sensíveis se retirem da sala, mas aviso-vos já que esta é uma das vertentes do mundo médico
com que terão de contactar quando menos esperarem.

(Toda esta acção será rápida, uma vez que a paciente pode morrer dentro de minutos se nada
for feito)

(O Joel vai buscar a mulher, que respira com muita dificuldade e se encontra muito fraca, ao
fundo da sala, deixando que ela se apoie nele enquanto caminha até ao quadro, onde estará
uma cadeira, a fazer de marquesa, onde a mulher – o Gil – se sentará, com a ajuda do Joel )

Inês - Depressa, Joel, a máscara de oxigénio… (O Joel traz e a Inês coloca-a ao Gil)

(Mal a mulher se senta, o João começa a medir a pressão arterial. A Inês, após colocar a
máscara, que o Joel pode ter que segurar, ausculta a respiração nas costas da paciente)

Inês - A dificuldade respiratória está a agravar-se.

João D. - A pressão arterial está muito baixa (após utilizar aparelho de medição da tensão
arterial)

(Entretanto, o Joel começa a afirmar, com grande preocupação e repetidamente)

Joel - É um choque anafilático! É um choque anafilático!

João D. - Sim, Joel, mas não são as suas palavras que a vão salvar.

Inês - João, prepare a injecção de adrenalina.


Ele prepara e vai para a injectar no braço quando o Gil, tira a peruca, revelando, assim, que é o
chefe do serviço de alergologia e diz:

Gil - Então, não me estão a reconhecer? Sou o vosso chefe. Como estava na minha pausa para
café, decidi criar esta situação para testar a vossa capacidade de resposta a um choque
anafilático. Sim, senhor, estou a ver que tiveram um bom mestre… (bate-nos palmas e retira-se
para o lado do quadro, saindo do local onde estava a “cadeira-marquesa”)

Inês – O caso que acabaram de presenciar foi um choque anafiláctico, que, se não for logo
tratado, pode levar à morte do paciente.

Quando um alergénio específico é injectado directamente na circulação sanguínea, pode


desencadear reacções inflamatórias muito intensas em vastas áreas do nosso corpo. Este
fenómeno alérgico generalizado é designado de anafilaxia. A libertação quase generalizada de
histamina por parte dos mastócitos e basófilos determina um aumento da permeabilidade dos
capilares sanguíneos. Em consequência, o organismo experimentará uma brusca diminuição da
pressão arterial, que poderá ser incompatível com a manutenção da vida.

O tratamento para os casos de choque anafilático consiste na injecção de adrenalina,


hormona que anula os efeitos da histamina, ao estimular a contracção dos músculos
cardíacos.

Para evitar que situações como esta aconteçam, é fundamental consultar um médico
alergologista, pois só assim conseguiremos saber quais os agentes que despoletam uma
resposta imunológica excessiva por parte do nosso organismo.

Durante a consulta de alergologia, o médico deve procurar saber qual o historial de alergias do
paciente e a sua propensão genética para determinadas alergias. Deve também procurar
realizar um estudo aprofundado dos ambientes frequentados pelo paciente, pois esta
informação permitirá restringir o número de potenciais alergénios causadores de crises
alérgicas. Para além disso, esta consulta é vital para uma correcta e segura aplicação dos testes
alérgicos e, consequentemente, para a obtenção do diagnóstico correcto.

Geralmente, os médicos socorrem-se de testes alérgicos para confirmarem as suas suspeitas


relativas aos alergénios responsáveis pelas alergias do paciente. De entre esses temos, os mais
utilizados são o teste de punctura, intradérmico, de contacto e de sangue.

Teste de punctura:

 Este é um teste cutâneo que tem por base o contacto directo de pequenas
quantidades dos alergénios com o sistema humano. O contacto é permitido através de
uma picada no antebraço onde é colocada uma gota do alergénio diluído. Aguarda-se
até cerca de 20 minutos por uma possível reacção. Caso esta se desenvolva, é
manifestada por uma elevação avermelhada na pele acompanhada por um leve
prurido.
Teste intradérmico:

 Constitui outro tipo de teste cutâneo sendo muitas vezes posterior ao teste de
punctura visto tratar-se de um teste mais especifico e capaz de determinar com mais
exactidão a que alergéneo a pessoa é susceptível. Processa-se através da incisão de
uma pequena agulha no antebraço que liberta um determinada alergéneo. Tal como é
um diagnóstico mais exacto também constitui um teste mais sensível podendo até
provocar reacções indesejáveis. A reacção poderá manifestar-se nos 30 minutos
seguintes ou num momento posterior (após 48 horas) dependendo do alergéneo.

Teste de contacto:

 É utilizado quando se suspeita de alergias a nível da pele como é a dermatite ou a


urticária de contacto. Este método de diagnóstico é desenvolvido através da colocação
de um material contendo um determinado alergéneo em contacto com a pele sendo
este isolado através de adesivo. Este material permanece em contacto com a pele
cerca de 48 horas para que haja tempo suficiente para uma possível reacção. No caso
desta se manifestar a área sujeita ao alergénio apresentar-se-á com rubor e prurido.

Teste de sangue:

 São realizadas análises clínicas a recolhas sanguíneas onde se analisa as Ige presentes.
Estas IgE são específicas e vão permitir conhecer as substâncias a que um determinado
sujeito é alérgico. Este diagnóstico é apenas realizado a sujeitos que podem
desenvolver uma reacção alérgica fatal ou que desenvolvem erupcções de pele
extensas e prejudiciais.

Depois de estes exames estarem concluídos e conhecermos a causa da alergia podemos


aconselhar o paciente.

Um dos primeiros tratamentos a prescrever é o uso de anti-histamínico e de corticóides que


irão reduzir o efeito das histaminas bloqueando os seus receptores. Deste modo, todos os
sintomas causados por esta serão diminuídos. No entanto, não se deve abusar destes
medicamentos, pois, têm efeito de habituação, o que reduz a sua eficácia, além disso, podem
ter efeitos secundários como sonolência ou prisão de ventre.

Para tratar a asma não se podem utilizar estes fármacos, por isso utiliza-se um
broncodilatador, que irá dilatar os brônquios e aliviar o paciente.

A melhor solução é evitar o agente causador de alergias, o que pode implicar deixar de ingerir
certos alimentos ou medicamentos, instalar filtros nos ar condicionados ou até deixar de ter
um animal doméstico. Por vezes, pode ser necessário mudar de emprego ou até de cidade.
Quando não se consegue evitar o contacto com o alergénio pode-se recorrer à imunoterapia
alérgica ou dessensibilização. Este tratamento consiste na administração do agente alérgico
em quantidades diminutas em doses gradualmente maiores até chegar a um nível de
manutenção. Esta dessensibilização permite atenuar ou até suprimir a alergia, tal deve-se ao
facto de serem produzidas menores quantidades de IgE.

No entanto este tratamento é caro e nem sempre funciona, por isso tem de ser utilizado em
último recurso.

Este tratamento pode ser perigoso, pois, alguns pacientes podem correr o risco de anafilaxia.
Por isso, os médicos aconselham os pacientes a ficar 20 minutos no seu consultório uma vez
que este tratamento pode originar reacções adversas.

As reacções mais graves requerem injecções de adrenalina.

Existem tratamentos alternativos como a acupunctura que alivia 50% das pessoas que
recorrem a ela, a homeopatia e naturopatia (dietas ajudam a evitar alergias), o ioga (combater
o stress, um factor agravante de algumas alergias) e a osteopatia (alivia alguns sintomas de
asma e sinusite).

(breve pausa, para dar a entender que vamos entrar na conclusão)

Nos últimos 50 anos o rápido avanço tecnológico e a melhoria dos níveis de vida,
transformaram por completo a nossa existência. Mas, este ritmo frenético de mudança está a
expor vulnerabilidades genéticas até agora desconhecidas.

É obvio que estamos expostos a um nível de toxinas a que nunca estivemos antes, pelo menos
em tempo evolucionário, como tal estamos sobre certos aspectos genética e evolutivamente
desfasados deste ambiente.

Modificámos o mundo à nossa volta, a comida que comemos e o ar que respiramos.


Erradicamos infecções e doenças que assolavam as gerações anteriores mas neste processo de
modernização do mundo podemos ter criado um diferente tipo de flagelo.

O nosso sistema imunitário, a nossa genética, aquilo que somos, tudo isso evoluiu ao longo de
centenas de milhares de anos ao passo que, as mudanças no nosso estilo de vida foram muito
súbitas. Há centenas de anos os nossos antepassados andavam nus pelos campos, estavam
provavelmente infestados por parasitas e os alimentos eram comidos crus. Hoje tudo mudou.

Esta convergência dos nossos genes, dos factores ambientais, das rápidas alterações no
ambiente doméstico, das mudanças no nosso estilo de vida motivada por uma rápida
modernização e da poluição existente forma a tempestade perfeita. A junção de todos estes
factores origina esta epidemia crescente que não se sabe onde irá terminar.

(após os aplausos…)

Calma… Não saiam já… Vamos ver se são alunos perspicazes… Inês, teste lá estes aspirantes a
alergologistas.

Estudo do caso

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