You are on page 1of 79
MICHEL FOUCAULT A VERDADE E AS FORMAS JURIDICAS 3 edigio MAU (©Copyright 1973 by Deparaments de Leva da PUC Rio Aeditora utiliza aeads30 ea supesiio Final do teat cooedenada pelo Departamento de Lsran x PUC Rio para pubicagio nos Cader: da PUCHiono16, 1974, trad eliza por Rebert Cabral de Melo Macade Edward Jain Monies sper ial do texto fi wabalho| tke Edu Poe de Aen Nove, Cleanice Berardinelli, Roberto Basi, Vera ‘Maria Palmeie de Paulo, Kita Chabica Mastar, Maria Tra Hora Sampaio Fernandes Cape Drvga Ava Lopes CIP-BRASIL. Catogasio-ne-fone Sindicato Nasional dos Editors de Livros, I Fier Foucault, Michel, 1926-1984 ‘Aver eat fora uiicas/ Michel Foucault, (uadugo Rober Cabral de Melo Machado e Eduardo Jardim Moras supevisio final do texto Léa Port de Are Novas. e¢ -].— Rio de Janczo = NAU Eto, 2002, 160p. Trad de: La wi t es formes juridiques Confess de Mickel Fouesult na PUC-Rio de 29 228 de mito de 1973 ISBN 85.85936-48-7 |. Dineito — Filosofia, Tilo 96.0291 cpu 3401 ego «1996 1 reimpreo + 1998 2wediio 19991 eimpresio «2000 2 empress» 2001 edigo « 2002 SAY) eliors Taepa Lda ‘Av Now Sen Eng Pao de Froatia — R} — CEP 26650.000 Tilefa: 21-2542 4272 — email nau@alernex.com br de Pima, 155 — Cento [io encontran een lira ped via fx ou ema ‘Esa obra foi compora pela Elnora Trarepa Leda ern Agramond empresa na {Grain Vous em mata de 2002 cm pelo se 0 gh pars. ils ape fare supreme 250 gn! pura ap 1. Conferéncia 1 TL Conferéncia 2 IL. Conferéncia3.. IV, Conferéncia 4. V. Conferéncia 5 VI. Mesa redonda Sumario 29 33 103 7 © que gostaria de dizerthes nestas conferéncias sto «coisas passivelmente inexatas, alas, errdneas, que apresentarci a titulo de hipétese de trabalho; hipéeese de trabalho para um trabalho futuro. Pedira, para tanto, sua indulgénciae, mais do «queisto, sua maldade. Ist ¢, ostaria muito que, aofim de cada conferéncia, me fizessem perguntas,crticas e objeges para que, na medida do possvel na medida em que meu espicito rio € ainda rigido demas, possa pouco a pouco adaptar-me a clas; e que possamos assim, a0 final dessas cinco conferéncias, «er fico, em conjunto, um trabalho ou eventualmentealgam progres. Apresentarei hoje uma reflexio. merodolégica para introduzir ese problema, que sob o titulo de A Verdede ¢ at Formas Juridicas, pode-thes parecer um tanto enigmstico. ‘Tentarei apresenta-Ihes 0 que no fundo é 0 ponto de conver- géncia de tés ou quateo séries de pesquisas existentes, jé exploradas,jéinvencariadas, para confronti-ls ereuni-las em una pide pags. no digo egal mas plo menos, Em primeiro lugar, uma pesquisa propriamente histé- rica, ou seja: como se puderam formar dominios de saber a partir de pritcas sciais? A questio é a seguinte: existe uma tendéncia que poderiamos chamar, um tanto ironicamente, de marxismoacadémico, que onsisteem procurardeque maneira conslBRes dos homens o seu reflexo e expres. Paeceme ue ea forma deans tadiional no marabme univers rio da Franca e da Europa, apresenta um defeito muito grave: o de supor. no fundo. quo sie -umano, 0 ito de onbecimento, as propria formas do conhecimento 50 ero mod datos prbvae dein ivamene, eqs condighes ‘que depositar-se ou imprimir-se nest sujelto defintivamente dado. Meuobjnosd motion pac pole cg ned hniindeeberquene rome Caer eto mr coneten some eee ee arocienenovadenite cee ee er era nie deco mento tem uma histéria, a relagio do sujeito com 0 objeto, ou, mais claramente, a propria verdade tem uma histéria, Meee stamens de mover one ple formar no scelo XIX, um certo saber do homer, da Oi id de nines eel se sseah dene ee einer pice eee Sa eeamaectnptice fone, ae er a inion an vj fe coer eeee pera, ne pn ena Raeere eee Retiac re deuce decoe Meee eae etnnsndos dna: dosberon Cee tia vemmieneren sujeito de conhecimento dado definitivamente, € um dos (segundo eixo de pesquisa é um eixo metodoligico, {que poderiamos chamar de anilise dos discursos. Ainda aqui ‘existe, parece-me, em uma tradiclo recente mas jd aceita nas universidad uuma tendéncia a trataro discurso i sonzne rapier rage de domi. tna Dats as osueto a sus unidade e tober. Temantndo #wadigo floss pane de Doar, pparando ir maislonge, vemosquea unidadedo sujeito humano ‘eraassegurada pela continuidade que vaido desejo ao conhecer, 19 doinsinc 20 ber, do corp ivedad, Tudo io aseguva ¢ einen fo eho. Set verdade que, por um lado ineansmes do sin, o jogs do deseo aonamenas de naturcia ones distene. 0 confinent. ells aio ‘se tem mais necessidade da unidade do sujeito humano. Pode- =xitte-Bisem que o texto de Nietusche que cite, consagrado 8 invented conheinen, me areca em rua coma Ora, quando Niewsche diz que © conhecimento € 0 resultado dos insineos, mas no € um instineo, nem deriva diretamente dos intintos, ue quer dizer ele extamente,€ ‘como concebe este curioso mecanismo pelo qual os instintos, sem ter nenhuma relagio de natureza com 0 conhecimento, podem por seu simples jogo, produzit, fabricar, inventar um Conhecimento que nada tema vercom eles? Fisa sepia sie de problemas que gostaria de abordar. Existe um texto da Gia (Ciéncia (pardgrafo 333) que podemos considerar como uma das andlises mais estritas que Niewsche fea dessa fabricaci destinvensio do cnhecimento. Nese longo texto initulado — "Que signifies conhecer” — Niceachevewoma um estode Spisioza, onde este opunha wirelligere, compreender, a ridere, ine dear: Spnsra disque oqo compre 2 cont. gulbermos feivamente compreendé4as em Sue narureva, em sua esti «porta em sua verdade, Cnexrs sitio que nos abstenhamos de rir delas, de deploi-las ou de -devesti-las. Somente quando estas paixdes se apaziguam pode- sos enfim compreender. Niewsche diz que ito no somente wa E verdad; mas € ratamenteo consio que scone | Intelligere,compreender, nio €nada mais que um certo jogo, ou 20 _melhor, 0 resultado de um certo jogo, de uma certa composisio ‘ou compensagio entre rider, tr, lugere, deplorar, e detestari derestar Niche din gues compreenenoporgic prt algumas coisas. niche, deve considera ques pie, ou eat tsps =r dear lone temo cron fad sce une nein ade pannor de objeto, desc identificar com cle, mas, ao contririo, deconservar ‘0 objeto & distancia, de se diferenciar dele ou de se colocar em_ sup com le dese pte dl lor, ndoplonns ss oceseanaonne dente poste Porat or ens imal que eto dca ‘merito eo produzem tém em comum o distanciamento do ‘orcs ditidsoharnanemaesbeepae séassemelhara cle, masao contriio, uma Sea ‘se afastar dele e de destrui-lo, maldade radical do conhecimen- CChegamos assim a uma segunda idéia importante. A de {que esses impulsos — rir, deplorar, derestar — sio todos da ‘ordem das mas relagdes. Atrés do conhecimento, na raz do conhecimento, Nietaschenio colocaumaespéciede afcigio, de impula onde palate qucnarbagvardebjcioscorhecen € presungosis, 2 _ Seesses ts impulsos — rit, deploraeeodiae— chegam 4 produairo confecimenco nio é segundo Nictsche, porque Se apaiguatmr Como Cm Spnvaa ou se reeoncTaten, Fegaramautaunidade ao conto porgelutramenee sisporqueseconffomraram-F porque esses impulsossecomba- «eiam, porque Tetaram, como diz Nietsche, prejudicar uns 08 outros, € porque estio em estado de guerra, em uma ‘stabilizagio momentinea desse estado de guerra, que eles chegam 2 uma espécie de estado, de corte onde finalmente 0 conhecimento vai aparecer como “a centelha entre duzs espa das’ 'Nio ha, portanto, no conhecimento uma adequagéo 20 objeto, ulmi rebgterde-asimilagso, as, a0-contreo, aa sligio de daeanctaedominagio; ndohé noconhecimentoalgo Como flicidade ear, matin ehostldade: no Kui ap ST TE RET grades es cignalmente apresentados na filosofia ocidental foram inteiramente questionados no texto ctado de Nietasche Afllosofia ocidental —¢, desta ver, no € preciso reer ‘nasa Descartes, pademos femontara Patio — sempre aic- terioiro coahecimiento pelo Togocentiamo, pelaseindhancs, pela adeguagio pels enieude pals unidade. Taos exes grandes temas si0ag0%apostos em questao, Daisecompreende porque é a Spinoza que Nietsche se rfere, pois Spinoza, de todos os filsofos ocidentais, foi quem levou mais longe essa concepsio do conhecimento como adequacio, beaitude € uunidade, Nictsche coloca no cere, na riz do conbecimento, algo como 0 6a aode ‘Compreende-se, entéo, porque Nietasche afirma que © flgsofo éaquele que mais facilmenteseengana sobreanatureza doconhecimento por pensi-lo sempre na forma daadequaci 2 do amor da unidade da pacifcagio. Ora se quisermos saber o que £0 conhecimento no ¢ preciso nos sproximarmos da formate vida, de existencia, de ascetismo, propria a0 AlGsofS. ele apreendE To em Sar esa Brice, verso prezader quais sio as elagbes de lura ede poder. Fésomente inessas relagoes de luta ¢ de poder — na maneira como as coisas ttt, os homens ente i se oda, Tita, procram seentiocompreendet como uma anise dese tipo tot introdi, de manciaefcar, em uma histra poles do conhecimento, dos fates de eonbecimento e do suo do conkecmen, Mas. anes gosaiade responder uma possivelabjeso: “tudo so ato bonito mas no eth em Nise; fol ea delice, sua obsessio de encontrar em toda parte relagtes de poder, em introduzir essa dimensio do politico até na histéria Ao confecimenco ou na hisria da verdad que the fez acreditar que Nise dia iso" Eu respondeia dias coisas. Prmeiramente,tomel este texto de Nietsche em fungio de meus interesses, nfo para mostrar queeraesaaconceponieuscheanadoconhecimen- to pois h inimeros textos Batanoccontaditéries ent 2 we wspcto — mas apenas para mostrar que esteem [Niewche um certo nimero de lementos que poem 8 nossa dlisposigio um modelo para uma anise histbriea do que ew chamariaa politica da verdae. Eur modelo queencontarnos efeivamenteem Nieascheepensomesmo quecleconstuiem 2 sua obra um dos modelos mais importantes paraacompreen- so de alguns elementos aparentemente contraditérios dasa concepgio do conhecimento, ‘Com eeio, se admitimosser isto que Niewsche enter de por descoberts do conhecimento, se todas esas relagbes ‘sto por tis do conhecimento que, de certa forma, é apenas seu resultado, podemos entio compreender determinados textos de Nietsche. De inicio, rodos aqueles em que Nictsche afitma que ‘ni hd cohecimento em si, Mais uma ver preciso pensar em Kant, aproximbTor ¢verficar todas as diferengas. O que a critica kantiana colocava'em questio eraa posbiidade deum conhecimento do ems, um conhecimento sobre uma verda- le ora ealidade emai. Nieosche di em A gerealogia de ioral: “Abstenhamo-n0s, senhores filésofos, dos tenticulos dlasiogbescontadiGvias as como razio pura, expiivaidade absoluts;conhecimente ems" Ou, ainda, em A-vontade de poder Nietasche afirma que nao hé-seF em-si, como também ‘dese algo totnentedfeence do que Kant comprecndia porconhecimentoem-si, Nictache quer dizer que nso uma hatuteza do conhecimento, uma essincia do conhecimento, coidigbes univers pata ocoahecimento, mas que o conhe- iniento & cada vez, o resultado hist6rico ¢ pontual de condi- Cm fcoau um acontcimento que po ser colocado sob 0 signo do confecer. O eonhecimento nfo é uma faculdade, ‘nem ana estrutura univers. Mesmo quando utiliza um certo ‘nimero de elementos que podem passat por univers, ese conhecimento sr apenas da ordem do resultado, do aconte- cimento, do esto 4 ‘Assim podemos compreender a sie de textos em que Niewasche afiema que 0 conhecimento tem um cardter perspectiv. Quando Niewsche diz que o conhecimento & Sempre uma perspectiva, ele no quer dizer, no que seria uma riscura de kantismo e empirismo, que 0 conhecimento se enconta limitado no homem por um certo niimero de condi- és, de limites derivados da natureza humana, do compo hhumano ou da prépriaestutura do conhecimento. Quando tan doce ppc do coca Nena desgnar owe que ashe confccnient sb a forma de wn certo nlimero de atos que Sto diferentes entre sie multiplos em sua esséncia, atos pelos quais o ser humano se apodera violen- tumente de" gap-nimia de SH apeee nero de sewage, lhes imp relagées de forgs. Ou sci, 0 conkecneo€ sempre uma earl eaaticacm que hofnem se encontrastuado, Fess slag cstraregica que va efi elito-de conhecimento por iso sera totalmente contraitrio imaginarumconhecimentoque no fosse em sta nacureza obrgatoriamente parc, obliquo, perpoctivo. O carter perspetivo do conhecimento ndo deriva da nature CStheinan Pose farce enpeoi dsc SAU PUNE SAI poe TS Se cere toe E por iso que encontramos em Nietsche a ida, que volta constancemente, dé que 0 Conhécimento € ao mesmo tempo o que ha de mais generalizantee de mais particular. © sas entfe si, isto sem nenhum fundamento em verdade. Devidoaisso, oconhecimento€ sempre um desconhecimento, Por outro lado, & sempre algo que vis, maldoss, isidiosa © 25 agressivamente,individuos, coisas, situagbes, S6hé conheci ‘mento na medidacm que, entte « homem eo que eleconhece édaordemdoduelsequefirsom ue ele seja sempre singular. definido nos textos de Nictesche que aparentemente se contra- dlizem: generalizantee sempre gingulr. eye porno, como avaves dos textos de Nietzsche podemosrestcuir nfo uma teotia geal do conhecimento, mas ‘um modelo que permite abordar o objeto destas conferéncias, ‘ problema da formagio de um certo mimero de dominios de saber a parts de relagdes de forge de relagbes politica ma sociedade. Reromo agora meu ponto de partda. Em uma cera concepsio que 0 meio universititio faz do marxismo ou em uma cera concepsio domarsismo queseimpésa universidade, hsempre no fundamento da andlisaidia de que as relagies de Fores as condigdsecondmicas, as relages sciis io dadas previamenteaosindividuos, mas ao mesmo tempo, eimpem 2 um sujeito de conhecimento que permanece idéntico salvo em relagio is ideologasromadas como eros. ‘Chegamos assim a esta nogio muito importante e a0 mesmo tempo muito embaragost de ideologia, Nas andlises marxistas tradicionais a idcologia & uma espécie de elemento negatvo aravés do qual e traduro fato de que relagio do sujeito com a verdade ou simplesmente a relago de conheci- mento & percurbada, obscurecid, velada pelascondigGes de existincia, por cages soci ou por formas poliicas que ‘impdem do exterior ao sujeito do conhecimento. A ideologia & amare, oestgmadestascondigbs politica ou econdmicas de 26 exitncia sobre um seco de conhecimento que, de dic, deveria ear abo a verdade © que pretendo mostrar ness confrécias é como de fio, a condites poles Sopra de etna noo cigset on obstiile pao tto de conedneno k ts por consguinssrelages de verdade, S6 pode haer eos dipos de sujeito de conhecimento, certas ordens de verdade, o vl-em que Tra sujet, os dominios de saber es relagBes com a werdade, Sé se desembaragando destes grandes temas dbsijtodz coabecimeno, so memmotempooriniio absolut, utlzando eventualmenteo modelo metacheano, poverermos fe una hstra da verdade Apresentarei alguns esbogos desta histéria a parti das pris jc de onde nasceram os models de verdade {ue cieulam anda em mos sociedade,seimpéem anda aa €valem no somente no dominio da poten, no dominio do omportamento quotidian, mas ata ordem da cic. At na eniaenconramos models de verdad euja for televadasestaturas politics que nioseimpsem do exer Sujeito de conhecimento mas qu 0 cas propia, conti tivas do sujeito de conhecimento. I Gostaria hoje de falar da histéria de Edipo, assunto que humane cnn conilcnrinene advo hast de Freud, a historia de Edipo vinha sendo considerada como iin Bie seu amas age Ta ms imamate Or mnie le de Dako © Guan, L Anti-CEdipe, publicado no ano passado, a referencia a Edipo cence pnd income liens Deleuze ¢ Guattari tentaram mostrar que 0 triingulo edipiano, pai-mée-filho, no revela uma verdade atemporal, cree ek eetaianana bs de ma dag Bis nn moter cca binoe lange edge ‘constitui, para os analistas que 0 manipulam no interior da ‘cura, uma certa maneira de conter o desejo, de garantir que 0 ee ee ee eee Sera nema hic; qe doje poms no interior da familia e se desenrole como um pequeno drama ‘quase burgués entre o pai, a mée eo filho. Edipo nio seria pois uma verdade de natureza, mas um_ ae ee eee anleeae a eee tae deere 2» Guattari, nfo € conteidosecreco de nosso inconsciente, mas a forma de coagio que a psicandliseenta impor nacuraa nosso deseo € & nosso inconsciente Epo é um instrumento de poder, éuma cera mancira de poder médicoepicanalitico se cexercer sobre o deseo eo inconsciente Confesso que um problema como este me atrai muito € «que eu também me sneotentado a pesquisar, por tris do que se pretende que sejaa istéria de Edipo, alguma coisa que tem 4 ver ado com a histéra indfinida, sempre recomegada, do nosso deseo edo nosoinconsciene, mas com ahistéiade um poder, um poder polio. Fago um paréntese para lembrar que tudo que tento dizer eudo que Deleuze, om mas profundidade, mostow em seu L Anis Cpe fr parte de um conjunto de pesquisa que io dizem respt, a0 contro do que se diz nos jorais, 20 «qe tadiionalmente se chara de estrutura. Nem Deleuze, ‘nem Lyotard, nem Guattari, nem eu nunca fazemos anilise de estrutura, nfo somos absolutamente estraturalias, Se me peu ou fio coq ous rem mor dae ce, dia que nfo faremos pesquisa de etrtura. Faria um jogo de palavrase dria que favemos pesquisas de dinasta. Dita, Fegando com as pelevas regs Mag Svmoveta que proce amos Fer aparecero qi na Riva de nova cultura perma- neceu até agora nndido, mals oculto, mais profundamente invesids a relagbs de poder Cuioamente a ots ccénbmicas de nova sociedade aio melhor conhecias, mais invetitariadss, melhor denacadas que as esraruras de poder politico. Gstaria de mostrar nea rie de conferenciardeque ‘maneira relagies politicas se estabeleceram ¢ se investiram profundamente na nossa cultura dando lugar a uma sie de fendmenos que nio podem serexpicados anio ser que os selacionemos nos estruturas econmicas, is telagdesecond- 30 micas de produsio, mas relagbes poiticas que investem toda a rama de nossa exiscéncia Pretendo mostrar como a tragédia de Fipo, a que se pode ler em Sofocles — deixarei de lado o problema do fundo imitico a que ela se liga — & representativae, de certa maneira, instauradora de um determinado tipo de relagéo entre poder ¢ saber, entte poder politico e conhecimento, de que nossa Givzagao ainda no se ibertou Patece-me, que hi realmente um complexo de Edipo na nossa civilizagao. Mas ele nao diz regia cate Heago-e Income Se came complexo de Edipo, ele se di nao ao nivel individual, mas coletivo; nao a propesto de deco einconscente, mas de pode ede saber E ta eptie de eomplee que eu gars de naa ‘A tragédia de Edipo é fundamentalmente o primeiro cesemunho qu teros da pias judciras grea. Como todo mundo sabe, ata sede uma histria em que pessoas — tm soberano, im povo — ignorando uma cera verdade, conseguem, por uma seiedeteeicasde qu aatemos deseo triruma verdadequecolocaem questo propiasoberaia do soberano. A tragédia de Edipo é, portando, a histéria de uma Sik phe aes pty es dssidjoea. Por estado o princi problema que secloca ode ber a qucera na Grécaaraicaa pesquisa judicira da verdade.. (© primeto estemunho que temo da pesquisa da verda- deno procedimento julio peg mona Hada Tra te dana dacontaio ene Anlocoe Menelau durante os jogos que se realaram na ocasio da morte de Pétroco, Entre ese jogs houve uma corrida de eros, que, como de costume, se desenolava em um ctcuto com ia volta, 3 pasando por um marco que era preciso contornar © mais préximo possivel, Os organizadores dos jogos neste lugar alguém que deveria se o esponsivel pla regulari- dade da cortida que Homero, sem o nomear pessoalmente, diz, seruma estemuha fotop aquele que stil paraver.Acortida se desenrola eos dois primeiros queestiona frente no momen- toda curvasio Antilocoe Menelau. Ocorreumairregularidade quando Antiloco chega primeiro, Menelau introduz uma contestagioe diz a0 juiz ou iri que deve dar 0 prémio, que Anxiloco’cometew uma irvegularidade. Contestagio, litigi., como estabelecer a verdade? Curiosamente, neste texto de jo se faz apelo aquele Que Viu, & famosa testemunha aye cara junio x0 marco e due deer SS QUEENS ‘cu, Nose convoca oseu testemunho.e nenhuma pergunca he {felta, Hi somence concestagio entre os adversirios Menelau « Antiloco, Esta se desenvolve da seguinte manetra: depois acusagio de Menelau — "eu cometeste uma iregularidade” — ¢ da defesa de Anifloco — “ew néo comet itregularidade” — “Menelaulanga um desafio: “Pac tua mio dieitana testa do teu, ham colocado Homero, cavalo; segura coma mio exquerda teu chicore «jura diante de ‘Zeus que nio cometeste irregularidade”, Nese momento, fale Sane a eof ae ee eo coineteu Iregularidade.— Tis uma maneira singular de produzir a verdade, de cstabelecer a verdade juriica: nfo se passa pela testemunha, mas por uma espécie de jogo, de prova, de desafo langado por uum adversirio a0 outro. Um langa um desafo, 0 outro deve accitar o rsco ow a ele renunciar. Se por acaso tives acito 0 risco, se tivesse realmente jurado, imediatamence a responsabi- lidade do queiria acontecer, a descoberc final da verdade seria 2 cranspotaaosdeuses Esra Zeus, pusindoe alo juramento, mnesado a verdad tis eliebstantearcaicapriteada prov da verdad em que ota exabelecidaudicatamente do por uma gags asic Vamos eainbenr rencontre na Alka Made Mali Eeevidence que, quando Edipo e toda a cidade de Tebas procurama verdad, ose modelo qucutliza Ossculos passaram. E, entretanto, interessante observar que encontra- ‘mos ainda na tragéia de Séfocles um ou dois restos da prtica { cxabelecinento da verdad pla prov, Pine, na cena entre Creonte e Edipo, quando Eaipo critica seu eunhado por ter uncado a resposa de Oral de Delon, endo: “Ta Invenase ade simplesmente pts omar eu poder pare ‘me substitu”, E Creonte responde, sem que procure estabe- Teer vetdade aan destin “Bem, vamos jr E euvoujarar qe noi nenhum compl conta is do tm prongs de Joes, gue acl 8 ogo, qe € como que responsivel pela regulatidade do jogo. Creonte responde a Eudipo segundo a vethaférmula do ltigio entre guerreiros. orem ac em sogndo gar que cots psa encontramosesse sistema do desafio eda prova. Edipo, ao saber que a peste de Tebas era devida & maldigso dos deuses em cconsequéncia de conspurcagio eassassinato,responde dizendo gue se compromet # ear a pasoa que Wer comet exe Grime semsabernatralmentqucele mesmo ocomeers Ele ts exim implcado pel prop jurament, do medo como nastvaidadesene guerteos aaa osadvesrse inl fm nos juraments de promensemaldigo, Estes rex da se fosse 0 caso, que teria com seu ra 3 velha tradigioreaparecem algumas vere aolongo da pega Mas, na yerdade toda a tragédia de Edipo se fundamenta belecimento da-verdade que gostariadeexpot see ameeme aie eee mecisismo de verdade obedece inicialmente a-uma lei, uma especie de pura forma, que poderiamos chamar de lei das metades. E por metades que se ajustam ese encaisam que adescoberta da verdade procedeem Eaipo, Edipo wanda consulta o deus de Delfos,o ci Apolo. Arresposta de Apolo, quando a examinamos em detalhe, édada em duas partes. Apolo comega por dizer: "O pas est atingido por uma conspurcasao". A ese primeira resposta falta, de certa forma, uma metade: hé uma conspurcacio, mas quem conspurcou oto que conspurcou? Poreanto,hénecesidade de se fazer uma segunda perguntae Edipo forca Creonte a dar a segunda resposta, perguntando aque édevda aconspurcagio. ‘Asegunda metade aparece: 0 que causoua conspurcacio foi um assassinate, Mas quem diz assassinato diz duas coiss. Diz {quem foiassssinadoe oassasino, ergunta-sea Apolo: “quem foi asassinado?” A resposta é: Laio, o antigo rei. Pergunta-se: wuem assassinou?” Nesse momento o rei Apolo se recusa a responder e, como diz Edipo,nfose pode forsara verdade dos ess, Fics, portanto,fltando uma metade, A conspurcagio correspondia a metade do assassinate. Ao assassinato correspondiaa primeira metade: “Quem fo assassinado”. Mas falta a segunda metade: 0 nome do assassino. Parasaberonomedosssssino, vai ser preciso apelarpara alguma cosa, para alguém, que no se pode forgara vontade dos deuses. Est outro, o duplo de Apolo, seu duplo humano, sua sombra mortal é 0 adivinho Tirsias que, como Apolo, & alguém divino, ios vag, o dvino advinho, Eleextd muito proximo de Apolo, também é chamado rei, dvagi mas é M4 pereciel enquanco Apolo é mori; esobreudo le € cao txbmerguhadona ocleenquan plo dene de So Be ‘meat desomibrada veda dineadulo codes la projetaem negro sobrea superficie da Terra. Besta metade que tcvainerogar ET txpond a lip duende, "Fone touem mu Lai Tor conseguime podemos diner que, dede a segunda cena de Edipo, tudo esti ditoerepresentado, Tem-sea verdade, jiique Edipo cfetivamencedesignado peloconjuntoconstitul, {os resposas de Apolo por um ado es sapose de Tiss, por utr. O fogs da metals ced compose conspurcagi, seiner em Bt mon, es nee Temos tuo. Man ora bm pr ds oc de predicio, da prescricao, Oadivinho Tirésias nao diz exatamen- tea Eo *Vowe te ques ea Ek drome ce expulicsa ci mesmo” Do mesmo modo, Apoto no havia dito tastamente: Hi conte por ieee rele ce mmerglhads fs pote” Apo dey Se guns gue spect atabe, precio liver a compris” Toso fd va fm da fur, da reser, de pei nada eee tale do prsents nade capo, Temos toda a read tana fra preci € procs que ¢exrcesieas meamo tempodaveiclocde vino. Aesaverdadeque deceafanmes comple coal, ti que tad for dois enteanco alguna ces gee tod csavela hina fomulada pele avis pled fot do fate Peeciumor ages doprgrace’ deen ‘munho do passado: testemunho presente do que realmente 35 sca segunda metade, passado e present, desta presti- io edesta prevsio édada no resto da pega. Ela também édada por um estranho jogo de metades. Inicialmente € preciso ‘stabelecer quem matou Lalo. Isto ¢obtido no decorrer da pest pelo acoplamenco de dois testemunhos. O primeito € dado tspontaneamente ¢ inadvertidamente por Jocasta ao dizer: Ves bem que nfo foste tu, Edipo, quem matou Lato, contra riamenteaoque dizoadivinho, Amelhor provadistoé que Laio foi morto por virios homens no entroncamento de tes cami- thos”, A este testemunho vai responder inquietude, jf quase acerteza de Edipo: “Matar um homem no entroncamento de trés caminhos é exatamente o que eu fiz; eu me lembro que 0 chegar a Tebas mateialguém no etroncamento de tes cami- thos”, Assim, pelo jogo desss duas metades quesecompletam, a lembranga de Jocasta a lembranga de Edipo, temos esta verdade quase completa, a verdade do assasinato de Laio. {Quase complet, pois falta ainda um pequeno fragmento: ode saber se ele foi morto por um s6 ou por vétios, o que als no éresolvido na peca ‘Mas isto ésomente a metade da histéria de Edipo, pois FEdipo nio ¢ apenas aquele que matou o rei Laio, & também quem matou o prdprio pai ecasou com a prépria mae, depois de o ter matado. Esta segunda metade da histria falta ainda depois doacoplamento dos testemunhos de Jocastaede Eaip. (O que falta é exatamente 0 que thes dé uma espécie de esperansa, pois 0 deus predisse que Laio nio seria morto por qualquer um, mas por seu filho. Portanto, enquanto nfo se provar que Edipo ¢ filho de Laio, a predigio nao estark realizada, Eta segunda metade énecesira para quea totalida- de da predicdo sejaestabelecida, na cltima parte da peg, pelo acoplamento de dois testemunhos diferentes. Um sera 0 do tscravo que vem de Corinto anunciar a Edipo que Polibio 36 mortew. Edipo, que ndo chora a morte de seu pais se alegra dlizendo: Ah! Mas pelo menos nio o mats, contraramente aoquediza predigi™. Eo eservo replica “Polibio no era teu pai “Temos, asim, um novo clemento: Edipo nfo ¢ filho de Polio. £ entéo que intervém o ultimo estavo, 0 que havia fugdo depois danaoqubaviaseccondide mondo Cerio que havia econdides verdad em sez ebana pastor de ovehas, que échamado para serierrogado sabe ueaconteceve dit "Comelto de ouoraacse mensige® timactianga quevinha do pale deocaa equ medic gue erase fle” Vamos que ila anda a hima cee pois Jocata no st presente pastes que fd um de tenes 40 tscravo. Mas, excetundo eta pequen difcaldad, agora Ciclo esti completo, Sabemos que Edipo era filho de Lato e Joma que ele fe dado Plo: que fi le, prmando set filho de Polio e voltando, para escapar da profecia,a Tebas, aque cle no sabia qu era st pri, que maou no etna, mentode ws camino oe Lise verdad pa, Oo ts echado, El se fechou por uma série de ener de nictades que se ajustam umas 35 outras. Como se toda esta long comple Fist da cana mesmo tempo exe egindo da proc, orlada pcs da roe tess cada om dois ccm segunda, cas Fagen parte novo em dois, e todos ees Taginentos teparidos em micas dienes Pa pret eemteuntano dase Woser pros de Jocasta € de Edipo, do escravo de Corinto ¢ do escravo do Cero para que tos eas mtads e meads de metdes viewem sjusarse umas Bs outa, adaparas,enaiarae € rcconsiopofl oral da hn ta forma, realmente impresionante no Elo de Séfocles, € apenas uma forma retérica. Ela ¢ a0 mesmo vee pou ¢ pollen Ea cote fangs ena do jes Gide per qu pertain qudetemumacgede ET Gat Tas pancum sberoqulgue ee erteara menaem outer nemo tg Grau doce da etd que pode ee eSiuaucsecare Opoderse mania, compe sa eee adele pag «one jogo ee pene Feurenos parserunedosos deur mesmo conus seerninet jen cajconigurogeléafomaranfes do poder A histria de Epo €a ragmentagio desta psa de que = posse integral, reunificada aureniiea a detencio do poder eas ordens dadas porte Ac meniagens, mension {queele enviae que devem rerornatautentificariosualigagio 20 poifer pelo faro de cada um deles deter um fragmento day Can sor carer Ragen. tu € 2 wae juildica, politics ereligiossdo que os gregoschamamatapiorov esi A istria de Eaipo al como érepresentada na tragédia de Séfocles, abedece a este o%uBodov: ndo uma forma retérica mas religiosa, politica, quase magica do exercicio do poder. Se observarmos, agora, nfo forma deste mecanismo.ou ojogode metades quese ragmentam eerminam porsesjustat, soe reget poduidoporee hsanenteripocn veremos uma série de coisas. Inicialmente uma espécie de deslocamento medida que as metades se ajustam. O primeizo jog de metaes que susan &0 dot! Apaoe do ditino [Uinho Tuc nel profs ou ds dees, Em 38 sequida, a segunda sie de metades que se justam ¢ formada por Epo e Joasa. Ses dois estemunhos se enconttam no meio da pega. Eo nivel dos es, dos soberanos. Finalmente, a ikima dupla de testersunhos que intervém,aikima metade aque ver completar a histéria no ¢ constituida nem pelos deases nem pelos rcs, mas pelos servidoreseescavos. O mais hhurildeescravo de Polibioeprncialmenteo maisescondido dos pastores da floresta do Citerdo vio enunciar a verdade lima e raze imo estemanho, “Temos asim um reulido curioso, O que havia sido disor teemos de profecia no comseso da pesavai se reito sob forma de testemunho pelos dois pastrcs E asim como pega pasa dos deuses aos escavos ox mecanismos de enuncado da Yerdade ou a forma na qual a vordade se enuncia mudam igualmente. Quando o dews eo adivin wrangell snes sta ue ape aca i no comeco da pega uma verdade em que Edipo ¢ 0 coro nao Pee eee foc oc dias henner doeenee pak me Sree Un as Toa career po raiment ama tama ie ea ee oe maces Sele eranaere near ia soi ands de ase Nove etl fate sean teas ae mer ae ed aie olor human Gaal docetcnanko Ea ee alice Homero nio faia referencia file do conflito edo ltgio omero ao fais erin 39 Flor do confi ¢ do lg centre Antiloco ¢ Menshau. 39 Pademos dizer, portanto, que toda a pega de Edipo ¢ “Tardrverdade do bio protein edivino para oahar, de ane forma empico ¢ qutdiao, dos pasores Huma ierlembranga ce dacuo dos omens so como que uma imagem emplrica da grande profecia dos deuscs. EIST aG PONT bee Os deveros ins para comprender ete mecanismo da pogresio da verdade em Exipo, De um lado estio os deuses, do outro os pastores. Mas entre os dois ha o nivel dos reis, ou melhor, nivel de Edipo. {Qual vu nivel de saber que signa seu bar? ‘Aste napeto€ prec refer algumas cis, Hab ualmente se diz, quando se analisa a pega, que Edipo éaquele (jr adarabi, quer cog, qu ina solos vendados ca ‘eSovia Boguead, pot munca hava mencionado epreia 40 ‘eresquecidoos prépriosgestos ao mataro rei noentroncamen- 10 dos ts caminhos. ipo, homem do esquecimento, ho- mem 2o siossber hone de inconsient pars reid Conhicemos todos os jogos de palavras que foram feitos com © nome de Eaipo. Mas, nio esquecamos que estes jogos so milkiplos e que mesmo os gregos ji haviam notado que em OiBixovs,remos a palava ola que significa a0 mesmo tempo ter visto e saber. Gostaria de mostrar que Eaipo, dentro desse :mecanismo do otifozov, de metades que se comunicam, jogo de respostas entre os pastores os deuses, no €aquele que nfo sabia, mas, 20 contrtio, éaqueleque sabia demais. Aqucle que unia seu saber e seu poder de ums certa mancia condenével © que a histéria de Edipo devia expulsar definitivamente da ised © titulo mesmo da tragéia de Séfoces€ interessante: Ecipo € Edipo-Rei, Oi8Cx0vs tépavvos, Edifcl eraduzir esta palavra sipawvos, A tradugéo néo dé conta do significado exato dapalavea. Edipo 0 homem do poder, homem que exerce um certo poder. Eécaracteristco que oto da pega de Séfocles no sea Edip,oncestuose nem Edipo, asain deseupai, mas Ealipo-Rei Que sigoifica a realeza de Epo? Podemos notar a importincia da tematica do poder no ecorrer de toda a pega. Durante toda a pega 0 que est em ‘questo éessencialmenteo poder de Edipo esto que faz com «que ele se sinta ameagado. Edipo.em todaatragédia, suncadiréqueéinocente,que talveztenhafeicoalgo masque foicontraavontade,quequando matou aquele homer, nio sabia que se tratava de Laio, Essa defesa 20 nivel da inocéncia eda inconscié pelo personagem de Séfocles em Edipo-Rei Somente em Epo em Colona se veri um Edipo cego € miseravl gemer ao longo da pega dizendo: “Eu nada podia, 03 nunca ¢ feta a dss me pegaram emma armadiha que eu desconbecia Em Edipo-Reicle no se defende de maneira alguma ao nivel de sua inocnci. Seu problema apenas o poder Poder andar fo poder? E este poder que esti em jogo do comeco a0 fim da esa Na primeira cna, é na condigo de sober que os habitantes de Tebas recorrem a Edipo contraa peste. “Tu tens ¢ pode, devs cura-ns da peste E ele responde dred: “Penh gandeinteresseem curios dapete,porgueesta peste quevosatingesmeatinge asim em minkasaberaise minha realeza”. £ interessado em manter a propria realeza que Edipo tqerbuscaasolugio do problema. quand comegaasesentir fmeacado pels resposas que suger em sua volt, quando © tricul o designaco adivnho dir de mancia mais arasinda aque € ele o culpado, sr responder em rermos de inocencia, Ezdipo diz a Tirésis: “Tu queres meu poder; tu armaste um compl conra mim, para me privarde meu poder’ o pai qua rer O ques ass perro prpro poe Ro momento da grande dspata com Crconte, dl Ihe pak a io det nies met dad-Ada gui Ediposetenreareaado porCreone to aie do poder eno one desuainoctncn ou clpabie dhe O queestiem questiocm todosests defrontamentosdo comego da pega €o poder E quando, no fim da pega, a verdade vai ser descoberta, quando o escravo de Corinto diz a Edipo: “Nao te inquietes, nao é o filho de Polibio", Edipo nao pensar que ndo sendo fino de Polio, poder serfilho de um otro etalvez de Lao. Ele diz “Diss so para me envergonha, para fer 0 powo 42 acreditar que eu sou filho de um escravos mas mesmo que eu ‘ej flho de um escrao, isto ndo me impedixi de exerer 0 poder; eu sou um rei como os outtos”. Ainda aqui é do poder que se trata. E como chefe de justiga, como soberano, que Edipo, nesse momento, coavocara a iltima retemunha: 0 «scravo do Citerio.F.como soberano que cle, ameacando-0 de tortura he arrancari a verdade, F quando a verdade éarranca- da, quando se sabe quem era Edipo eo que fer —assassinato do pai ncesto com a mie — que diz o povo de Tebas? “Nos te chamdvamos nosso ti”. Isto signifcando que 0 povo de “Tebas, ao mesmo tempo em que reconheceem Edipo quem fi seu re, pelo uso do imperfeito — chamivamos — o decara agora destiuido da realeza (O que esti em questio €2 queda do poder de Edipo. A prova & que, quando Edipo petde o poder para Crconte, a “lkimas réplicas da pega ainda giram em rorno do poder. A ltima palavra ditigida a Edipo ances que o lever para 0 interior do palicio épronunciada pelo novo rei Crconte: “Nao procures mais sero senhor”. A palavraempregada é xpaze. O que quer dizer que Edipo no deve mais comandar. E Creonte acescenta ainds, Gxpéenoas, uma palavea que quer dizer “depois de ter chegado a0 cume” mas que é também um jogo de palavras em que 0 ‘a’ tem um sentido privativo: “no possuindo mais © poder”. axpdenoas significa a0 mesmo tempo: “tu que subiste até o cume eque agora ndo tens mais o poder” Depoisdisso 0 povo intervém esaida Edipo pea ima verdizendo: "Tu que eras xpénaros" isto é,"tuqueestavas no cume do poder". Ora, a primeira studacio do povo de Tebas 4 Ealipo era: rparivan O'Bix0%4" isto 6, “Edipo todo poderosol” Enere essas duassaudagies do povo se descnvalves toda a tragédia. A ceagédia do poder e da detencio do poder 8 politico. Maso que éeste poder de Edipo? Como se caracceriza? na fosofa greg da cpocs, Epo €chamado de faeries feet, oprimetrodoshomensaquelequetemaxpdea, aquele Gquedctemo poderemesmo depos. Tirano ndo deveagu ser caendide em seu sentido esto, tanto que Polio aioe todos or outros foram chamados também de riparvog Um eee nimero de caacersica deste poder aparece na tragédia de Edipo. Edipo tem o poder. Mas o obteve através de uma série de histras, de avencras, que fzeram dele inicilmente © homem mais miservel — criana expula, perdida, vance erance — e, em sguida, o homem mais proderoso. Ele conheceu um destino desigual. Conbeceu a miséria € a gloria. nee pono mat alt avandia rCredtava que fse filo de Polio © ete no ponto Bais Tizde, dre rebahaam, ora me elt creicram comig, dz ele ora me reabaram, ora me exalt — Esta alterndncia do destino é um trago caracteristico de Alois tipos de personagens. O personage lendro do hers. pico que perdu sua cidadaniae sa pitiaeque, depoisdeum certo nimero de provas,reenconta a léria €o personagem histrico do tirano greg do fim do Vi inicio do V sus, O crano eraaquele que depois de rer conhecido vias aventuras te chegado ao auge do poder estva sempre ameacado de perdé- To. Airegularidade do destino & caracteristica do personagem do irano tal como €desctto nos extos gregos desta epoca FEdipo éaquele que, pds ter conhecidoa mséia,conhe- cou gloria agucle que se tornou rc ps ter sid her, Mas, se ele se tormou rei € porque tinha curado a cidade de Tebas matando a Divina Cantora, a Cadcla que devorva todos 44 aqueles que no decifravam seus enigmas. Ele tinha curado a cidade, the havia permitido, como diz, que ela se reerguesse, {que la respirasse no momento em que havia perdido o flego. Para designar esta cura da cidade, Edipo emprega a expressio SOc, “reerguer”s &vSpBaony RORY “reerguer a cidade”, Ora, éestaexpressio que encontramosno texto de Solon. Sélon ‘que nio ébem um tirano, maso legslador, sevangloriava deter reerguidg a cidade ateniense no fim do século VI. Esta € também a caracterstica de todos os tiranos que surgiram na Grécia durante os séculos VIle VI. Eles nfo somente conhece- ramosaltosebaixos da sorte, mastambém desempenharam nas cidades 0 papel de reergué-a através de uma distibuigao econdmicajusta, como Cipselo em Corinto ou através de leis, justas como Sélon em Atenas. Eis, portanto, duascaracteristi- cas fundamentais do tirano geego tal como nos mostram 05 textos da época de Encontramos também em Eedipo um série de caracteris- ticas ndo mais posiivas, mas negativas, da titania, Varias cosas so reprovadas em Edipo em suas discussdes com Tirésias € Creonte e até mesmo com 0 povo. Creonte, por exemplo Ihe diz: “Esti errado; tu te identifcas com esta cidade, cidade em que no nasceste, imaginas que és esta cidade e que ela te pertence; eu também fago parte desta cidade, cla nao ésomente tua’, Ora, se consideramos as histrias que Herédoto, por cexemplo, contava sobre os velhos trans gregos, em particular sobre Cipselo de Corinto, vemos que se trata de alguém que julgava possuira cidade. Cipselo dizia que Zeus he havia dado acidade e que lea havia devolvid aos cidadios. Enconeramos ‘exatamente a mesmo coisa na tragédia de Sofoces Do mesmo modo, Fdipo é aquele que nao dé importan- «ia leis e que as substitu por suas vontades suas ordens. Ele 0 diz claramente. Quando Creonte 0 reprovava por querer focles ou mesmo anteriores, 45 exili-lo dizendo que sua decisio no era usta, Edipo responde: “Pouco me importa que sea justo ou ni; é preciso obedecer assim mesmo”, Sua vontade ser a lei da cidade. F por isto que no momento em que se inicia sua queda 0 coro do paxo ‘eprovat ip por depend dle aja ipo por ver dexpreadoa Ba justia, Epes, pporanto,reconhecer em Edipo um personagem historicamen te bem definido, assinalado, catalogado, caracterizado pelo fensamearo gegodo silo Viotiana, psdkrcomanbcnporumceospdeber Osan coatropalepocgucdeainaufaiecbodcene mente o caso de Edipo. Edipo é aquele que conseguiu resolver povscpenament pristateofreocnip dicta Prcimtomosonpoleda eisvamene sttenslaie tim como Sion pode eur sade once ne sébio, assim também Edipo pode resolver o enigma da esfinge porque era 0096s. (O que € este saber de Edipo? Como se caractetiza? O saber de Edipo esti caracterizado no decorrer de toda a pega. [ipo diz a rodo momento que venceu os outros, que resolveu oeignadacings qurcuuaclaiepormedetone Se pen ncuconheineno oun ff, Ouse se ps Scarce odo deer lee dv aes enon, ‘ndpno. Estaéa palavra que Edipo mais frequentemente utiliza per dcigar que carr cn a ops Edipo resolveu 0 enigma da esfinge & porque encontrou. Se guicrsaiar dc nowt iba £ peters onan eupioxew. O que significa euplonsv? Esta aividade de encon- * tra € caracteriada inicilmente na pega como alg que se far sorinho, Edipo insite nso incessantemente, “Quando esol 46 ‘enigma da esfinge, néo me dria ninguém’, dizele 0 povo ¢ a0 adivinho, Ele diz 20 povor "No me pudeste ajudar de maneira nenhuma a resolver o enigma da exfinge; nao podias fazer nada contra Divina Cantora"-E diza Tirésias:* Mas que adivinko éu, quenem foste capazde iberar Tebas daesfinge? Enquanco todos estavarn mergulhados no terror eu liber Tebassozinho; nao aprendi nada com ninguéz no me servi de nenhum mensageiro, vim pessoalmente”. Encontrar € algo aque se faz sozinho. Encontrar€ também o ques faz quando se abrem osolhos. E Edipo éohomem que naoceseade dizet:"Eu inquire como ningueém foi capae de me dar informagoes, abr ‘0s olhos ¢ 05 ouvidos: et vi". O verbo oda, que significa a0 mesmo tempo saber ¢ ver, é frequentemente utilizado por Fdipo. o8txovs € aquele que & capar desta atvidade de ver € sabe Ele€ homem do ver, o homem do olhar eo sera até 0 fim, Se Fdipo cai em uma armadithaé precisamente porque, «em sua yontade de encontrar, ele prolongou o tstemunho, a Jembranca, a procura das pessoas que vam até o momento em que foi desenterrado do fundo do Citerioo escravo que havia assistdo a tudo e que sabia a verdade, O saber de Edipo ¢ esta espécie de saber de experiénca. E a0 mesmo tempo este saber de conhecimento, do homem que, sozinho, sem se apoiar no que se diz, sem ouvir ninguém, quer ver com seus Pr6priosolhos. Saber autocrtico do iran que, porsis6, pode «€ capiz de governar a cidade. A metifora do que governa, do ‘que piloa, ¢fequentementeutilizada por Edipo para designar ‘que le faz. Edipo 0 piloto, aquele que na proa do navioabre ‘osolhos para ver. Fé precisamente, porque abre os olhos sobre ‘o que estéacontecendo que enconta oacidente,o inesperado, destino, a rizn. Porque foi este homer do olharautocrtico, alberto sobre as coisas, Epo caiu na armadilha soli a Oe gosara de mostrar & que_no fundo, Eizo ot Seale a char saber-e-poder. poder-e-saber. E porque cle exerce um cero pode tirinico esolitiro, desviado tanto do oriculo dos deus que ele nfo quer ouvir, quanto do que dize quer 0 povg. aque, em sua sede de poder ¢ saber, em sia sede de governar cextemunhos daqueles que vim. ‘Vemos assim como o jogo das metades pe funcionare ‘como Edipo é, no fim da peca, um personagem supérfluo. Isto nna medida em que este sabe tirnico, este saber de quem quer ‘er com seus prbprios olhos sem escutar nem os deuseS nem os hhomens, permite o ajustamento exato do que haviam dito os ddeuses ¢ do que sabia 0 povo. Edipo, sem querer, consegue ‘stabelecer a unio entre a profecia de deus e a meméria dos hhomens. O saber edipiano, o excesso de poder, 0 cxceso de saber foram ‘tais que ele se tornou intitil; o circulo se fechou_ sobre ele, ou melhor, os dois Fragmentos da téssera se ajustaram, © dip em se poder waattorwetornou inl: Noe dois fraigmentosajustados a imagem de Edo se tornou monstruo- ‘2. Edipo podia demas porscu poder tirinico, sabia demaisem seu saber solitrio, Nest excess, ele era ainda 0 exposo de sua mie ¢ iemio de seus filhos. Edipo ¢ 0 homem do excess, hhomem que tem tudo demais, em seu poder, em scu saber, em sua familia, em sua sexualidade. Edipo, homem duplo, que sobrava em relacio a transparéncia simbélica do que sabiam os pastors e haviam dio os deuse. ‘A tragédia de Edipo est bem préxima, portant, doque serd, alguns anos depos a filosofia plaonica. Para Platfo, na verdade, o saber dos escravos, meméria empirica do que foi vist, seri desvalorizado em proveito de uma meméria mais profunds,esencal, que é a meméria do que foi visto no cé 48 ing, Maso importane go quevaserfundamentalmente desvalrzads,desqualifcao, tanto na agis de SOT una Rubles de Plato: 0 tana ox melo pen "age forma deur saber poco ao mesmo tempo pre tiado Cecio, Quem &visdo pla agli de Solel os pels flsofa de Plato, quando stuadas em uma dimemzo bitrs,quemvinds por tisde Edpo ons Edipoosiig, 0 tirano que sabe, o homem da téxvn, da youn, € o famoso sofista, profissional do poder politico € do saber, que existia ports dele quem fandamentalente vido por Pio por Soficles uma outa cepa de psonagerclo qua sia io0 personage do ano. Ese, os silos VTe VI, eso homem do poderedosaber, aqucle que dominaa ano pelo poder que exrcia quanto plo saber que posta, Fina men, cn gue exja presente no texto de Pao o oS Nis sciedadsindo-europeiasdo lee meditertnco,no final do segundo c inicio do primeir milenios poder politica era sempre detentor de um eto tipo de aber. rei € 08 ue o crear, pel fio de detrem o poder, derinham um saber aque no pode nao devia ser eomunicado aos outon grapes soci. Saber © poder eram exatamente corespondentes, correltvos, uperpstos. Ni pia haversber em poder. 0 podiahaver poder poco sem a detengzo de um cero saber especial. F esta forma de podersaer, que Dum, em seus cstudossobreas es Fangées,wolou, a0 mosrar que primeira fangi0; ado poder politico, eraa de um poder politico magico” °

You might also like