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AOL 28-5 EXCELENTISSIMO SENHOR MINISTRO PRESIDENTE DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL ‘SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL, ‘Coordenadoris 38 Registro « iformactes Processueis 19/12/2003 4 16488: ‘ADI - 3096 en Ge © Procurador-Geral da Repiiblica, com fundamento no artigo 103, inciso Vi, da Consttuigto da Repiblica, vem, perante esse Colendo Supremo Tribunal Federal, ajuizar AGAO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE, em face da expressio “exceto nos servigos seletivos e especiais, quando prestados paralelamente aos servis regulares”, do art. 39 e do art. 94, ambos da Lei n? 10.741/03, Estatuto do ‘doso, porquanto contrariam, respectivamente, a0 disposto no art. 230, § Peart. 5°, caput, da Constituigao da Republica 2 Eis o teor dos referidos arts. 39 ¢ 94 da Lei n° 10.741/03: “Art. 39, Aos maiores de 65 (sessenta e cinco) anos fica assegurada a ‘ratuidade dos transportes coletivos piiblicos urbanos ¢ semi erpanos, exceto nos servicos seletivos e especiais, quando prestados paralelamente aos servicos regulares. “Art. 94, dos crimes previstos nesta Lei, cuja pena méxima privativa de ‘iberdade no ultrapasse 4 (quatro) anos, aplica-se 0 procedimento previsio na Lei n° 9.099, de 26 de setembro de 199% & Pr bsiciariamente, no que couber, as disposigdes do Cédigo Penal e do Cédigo de Processo Penal. 3. O presente ajuizamento, no que diz respeito ao art. 39 da Lei n® 10.741/03, atende solicitagdo de ALTAMIRANDO EMERSON ARAUJO. Acompanha © presente um exemplar do ato normativo impugnado, em obediéncia ao artigo 3°, I, da Lei n? 9,868/99. 4. A Constituigdo Federal, no § 2° do art. 230, concede que aos maiores de 65 anos de idade garantida de gratuidade dos transportes coletivos urbanos. Vale ressaltar que o legislador constituinte origindrio ao inscrever tal garantia ndo Ihe fez qualquer ressalva ou the impés limites, verbis: Art, 230. A familia, a sociedade ¢ o Estado tém o dever de amparar as pessoas idosas, assegurando sua participagdo na comunidade, defendendo sua dignidade e bem-estar e garantindo-lhe o direito a vida, 6) § 2. Aos maiores de sessenta e cinco anos & garantida a gratuidade dos transportes coletivos urbanos. 5 Estatuto do Idoso, ao regulamentar o direito de gratuidade a0 transporte piiblico, no seu art, 39, estd restringindo 0 acesso gratuito dos maiores de 65 anos, aos servigos seletivos ¢ especiais de transporte urbano, limitando, assim, o alcance da norma constitucional inscrita no § 2° do art. 230. 6. Ha possibilidade de leis ordindrias limitarem direitos previstos na Constituig&o, desde que outra norma constitucional faga tal restrigdio; ou desde que haja expressa autorizagdo para que a lei o faga; ou ainda que a restrig&o ao direito decorra de limites constitucionais ndo-escritos, ou limites imanentes' 1 Contudo, 0 caso sob anilise ndo se enquadra as hipoteses de mencionadas de limitagao de direitos, isto porque ndo existe qualquer previsio na Carta Maior que possibilite a restrigo da garantia de gratuidade aos maiores de 65 anos de {dade ao transporte coletivo urbano, quer derivados do préprio texto constitucional, quer decorrente de sua autorizagiio para que lei ordindria o faca. ' CANOTILHO, Di 1196/1197 10 Constitucional ¢ Teoria da Constituicdo, 3* ed, Coimbra: Almedina, pp & Tgualmente, néo hé limitagdo decorrente de principios ndo escritos na Constituigao: “a restrigdo sé seria legitima quando (se) fosse exigida para realizagao de bens juridicos que devessem ser considerados (no caso) como mais valiosos e acrescente-se ~ sé na medida em que essa exigéncia se imponha ao direito fundamental”, 9 ‘A norma inscrita no § 2° do art, 230 da Carta da Repiiblica ¢ objetiva: © transporte coletivo urbano deve ser gratuito para os maiores de sessenta ¢ cinco anos se verificando no corpo da norma constitucional, qualquer outro principio que colida com a referida regra. A exclusio do transporte seletivo ¢ especial estaria retirando parcela do direito garantido aos maiores de 65 anos, na Carta da Repablica. 10. Destarte, tendo em vista a limitagio imposta pela lei ordindria, sem autorizagdo constitucional, o art. 39 da Lei n° 10.741/03 fere a norma inscrita no art. 230, § 1° da Carta da Repiblica, por limitar um direito ali ndo limitado. . O art. 94 do Estatuto do Idoso, por sua vez, também afronta as normas constitucionais ao determinar que aos crimes previstos naquela Lei, cuja pena maxima privativa de liberdade néo ultrapasse 4 (quatro) anos, sejam aplicados o procedimento previsto na Lei n 9.099/95. Desta forma, todos aqueles que cometeram os crimes previstos na Lei n° 10.791/03 serio beneficiados pelos institutos do procedimento da Lei n° 9,099/95. 12. ‘A norma ora impugnada esta criando uma discriminag&o para aos autores dos crimes descritos no Estatuto do Idoso, permitindo que Ihes sejam aplicados uum sistema juridico proprio tratado pela da Lei dos Juizados Especiais. Resta-nos avaliar se tal discriminagao ¢ proporcional. 13. Nos parece que a discriminagao instituida esta a afrontar principio da isonomia insculpido no caput do art. 5° da Carta Federal: Ant, ©. Todos so iguais perante a lei, sen distingdo de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros ¢ aos estrangeiros residentes * TEIXEIRA, José Eleares Marques. Restrigées ao Direito Fundamental e principio da proporcionalidade. Boletim dos Procuradores da Repiilica, ano V, n° $2, agosto, 2002, p.16 no Pais, a inviolabilidade do direito a vida, & liberdade, & igualdade, 4 seguranga e d propriedade, nos seguintes termos: 14, ‘Ao nos depararmos com uma discriminagio prevista na propria lei “tem-se que investigar, de um lado, aquilo que é adotado como eritério discriminatério, de outro lado, cumpre verificar se ha justificativa racional, isto é, fundamento légico para a vista do trago desigualador acothido, atribuir o especifico tratamento juridico constituido em funcdo da desigualdade proclamada, Finalmente, impende analisar se a correlagdo ou fundamento racional abstratamente existe”s, Por conclusio podemos dizer que “é agredida a igualdade quando o fator diferencial adotado para qualificar os atingidos pela regra ndo guarda relagdo de pertinéncia légica com a inclusito ou exclusdo no beneficio deferido™. 15. A escolha como critério discriminante tio-somente da idade da vitima de determinados crimes para garantir ao autor os beneficios de uma Justia Especializada, a dos Juizados Especiais, nfo é razodvel, ¢ flagrantemente inconstitucional 16. Note-se que, pelo texto da lei impugnada, poder-se-ia ter um agente respondendo perante o Sistema Judicidrio Comum e outro com todos os beneficios da Lei n° 9.90/95, mesmo que praticado crimes da mesma gravidade (pena maxima no superior a 4 anos). Apenas por um diferencial: a idade da vitima do delito, 17. De fato, houve erro sobre a pessoa visada (error in persona). O legistador assim agindo, ao invés de proteger o idoso, acaba beneficiando aquele que comete crime contra 0 maior de 65 anos de idade. 18. Segundo bem enfatiza o Desembargador do TIDFT EDSON SMANIOTTO: “Pode-se conceder ao réu certos favores legais, como, por exemplo, a atenuagao da pena, o agravamento da pena-base de quem contra ele se volte, ou a suspensdo condicional da pena com critérios diferenciados. O que ndo se pode é estabelecer uma Justica Especial » MELLO, Celso Antdnio Bandeira de. Conteiido Juridico do Principio da Igualdade. 3* ed. 8* tiragem, $40 Paulo: Malheiros Editores, 2000, pp. 20/21 “Idem, p. 38 para julgd-lo, com o sistema juridico préprio segundo o qual todos ‘sdo iguais perante a Lei. Remeter a questio para ser dirimida no Juizado Especial Criminal, estabelece beneficios processuais com imediato reflexo no jus libertatis, de sorte que todos os réus, independentemente da idade da sua vitima, desde que tenham cometido crime com pena ndo superior a 4 (quatro) anos, poderiam se valer do mesmo critério especializante. E bem provavel que, apés muitas discussdes, vejamos a repeti¢do do que ocorreu com a edigao da Lei 10.259, de 12 de julho de 2001, quando, ao criar os Juizados Especiais Civeis ¢ Criminais no émbito da Justia Federal, acabou estendendo sua normatizacao, indiscriminadamente, a toda as Justigas Comuns Estaduais, em face de reiteradas manifestagdes jurisprudenciais que vieram a reconhecer na novatio legis, um novo conceito de crime de menor potencial ofensivo”® 19, Ante a inexisténcia de razoabilidade no critério de discriminagdo para enquadrar os crimes previstos no Estatuto do Idoso no rito da Lei dos Juizados Especiais, a norma ora impugnada viola o principio da igualdade previsto no caput do art. 5° da Constituigao Federal, devendo ser declarada sua inconstitucionalidade. 20, Assim, resta demonstrada a inconstitucionalidade material do art. 93 da expresstio “exceto nos servigos seletivos e especiais, quando prestados paralelamente aos servigos regulares”, do art. 39 da Lei n° 10.741/03, consubstanciando o fumus boni juris das alegagdes anteriormente expendidas. Relativamente a0 periculum in mora, & evidente 0 prejuizo irreparivel ou de dificilima reparago, uma vez que, como a Lei n° 10.741/03 somente produzira entrar em vigor em 1° de janeiro de 2004, com a produgao de efeitos pela norma alvejada, estar-se-4 permitindo que entre em vigéncia lei contraria as normas constitucionais. 2. Presentes os requisitos exigidos a concessdo da medida cautelar, com eficdcia ex nunc, nos termos previstos no art. 10, da Lei n.° 9.868199, e no art. 170, do Regimento Intemo do Supremo do Supremo Tribunal Federal, pleiteia-se a suspensio aad cautelam do art. 94 ¢ da expresso “exceto nos servigos seletivos e especiais, quando prestados paralelamente aos servigos regulares”, do art. 39 da Lei n° 10.741/03, por ofensa, respectivamente ao caput do art. 5° e § 2° do art. 230 da Constituigdo Federal. 2. Requer, ainda, que, colhidas as informagées necessdrias ¢ ouvido o ‘Advogado-Geral da Unio, nos termos do art. 103, § 3.°, da Constituigdo da Repiblica, seja determinada a abertura de vista dos autos a esta Procuradoria-Geral da Repiiblica, para manifestagdo a respeito do mérito, pedindo, ao final, julgue-se procedente 0 pedido, para que seja declarada a inconstitucionalidade da expresso exceto nos servigos seletivos e especiais, quando prestados paralelamente aos servigos regulares”, do art. 39 edo art, 94 da Lei n? 10.741/03, Estatuto do Idoso. Brasilia, 17 de degémbro de 2003 CLAUDIO FONTELES PROCURADOR-GERAL DA REPUBLICA ‘Carolina Longo Sone Smanioto PGR n° 1.00,000.009128/2003-34 + SMANIOTTO, Edson. 0 Estatuto do Idoso, Jn: © Magistrado em revista, ano III, n° XX, novembro de 2003, Instituto dos Magistrados do Distrito Federal, p. 17

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