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ee och Cele RULLLC diversidade de Penner Rieke emia A do principio de que uma relacao dialética deve Peele Re Ree ROR Pinel sos ered k RUC pe alee mati | ae a Ce Pe ure eT UAL) EY ee. aojeo caanco came Andréla Custodio Marcos Marcionilo ‘Ana Stahl Zilles [Unisinos) Carlos Alberto Faraco [UFPR Egon de Oliveira Rangel [PUC SP Gian Maller de Oliveira [UFSC, Ipol] inane Monteagudo [Universidade de Santiago de Compostela) Kanavilit Rajagopalan (Unicamp] ‘Marcos Bagno [U"8] ‘Marla Marta Pereira Scherre (UFES] Rachel Gazolla de Andrade (PUC-SP] 1s Muchail (PUC-SP] [unB) pron: ‘Conseino Enon salma Tannu! Stella Maris Bortoni-Ricardo CAP-BRASIL.CATALOGACKO NA FONTE SINDICATO NACIONAL DOS EDITORES DE LIVROS, RI cisig Maingueneau, Dominique {que Maingueneau ;organiza- va ;tradugao Adail Sobral..et Doze conceitos em analise do discurso / Dor fo Sitio Possenti, Marla Cectia Perez de Souza-e-Si Sip. sio Paulo :Parabola Editorial, 2010. (Uingualger] :41) inclu bibliografia 1SBN 978-85-7934-014-7 .guas.|.PossentiSirio.lI.Souza-e-Silva, 1 Anise do discurso.2.Linguagem e lin itos em analise do discurso.¥. Série. Maria Ceclia Perez de II Titulo. 1V. Doze conceit 10-3226, COD: 401.41 cou 8142 oe Direitos reservados & Pardbola Editorial Rua Sussuarana,216 - Alto do Ipiranga (04261-070 Sao Paulo, SP pabx: [11] 5061-9262 | 5061-8075 | fax:[11] 2589-9263 home page: www.parabolaeditorial.com.br e-mail:parabola@parabolaeditorial.com.br ‘Todos 05 direitos reservados. Nenhi ta obra pode jos. Nenhuma parte desta obra pode sc repeat or une fa aulequer meios (eletrOnico ou mecénico, incluindo fotocépi els (etn fotoc6pia e gravacdo) Ou rquivada em qualquer sistema ou banco de dados sem permissio or escrito da Parébola Editorial Ltda, (ser 178-85-7934-014-7 © do texto: Dominique Maingueneau (© da edicao brasileira: icdo brasileira: Parébola Editorial, Sdo Paulo, agosto de 2010, APRESENTAGAO... UM | AFORIZAGAO — ENUNCIADOS SEM TEXT. * Tradugdo: Ana Raquel Motta Introdugio. Da sobreasseveragio & aforiz Enunciado destacado e texto... Conclusio. Referéncias bibliograficas ‘pois . Tradugdo: Helena Nagamine Brandao Autor de- versus autor ‘As trés dimensdes da nogio de autor Uma ontologia auctoral.. Internet. Conclusio Referéncias bibliogréficas EERES__] Campo piscursivo — A PROPOSITO DO CAMPO LITER{RIO. Tradugao: Fernanda Mussalim Referéncias bibliograficas... YOUNES . [QUATRO] Crérica (andtise) — As CONDICOES DE UMA ANALISE CRITICS DO DISCURSO ....-sss00 Tradugdo: Roberto Leiser Baronas A dimensio critica da andlise do discurso Referéncias bibliograficas — [CINCO] Ernos — Ernos & apne RELACIONAMENTO... aseneee Tradugdo: Luciana Salazar Salgado Antincios, ethos e sites de relacionamento.. Quando nao se retinem todas as condigdes Um ethos emergente .... Para conclu seve Referéncias bibliogrificas DE ENTAGAO DE SI NOS SITES GENER — Histonicipabe DE UM GENERO DE DISCURSC! Tradugao: Strio Possenti Introduga0 4 ; , , AUTOR — (A NOGAO DE AUTOR EM ANALISE DO DISCURSO .. © SERMAO gio distintos 7 os = ivos de cor Aco 0, Gonclusio oer ificas Riefentncaas bibliogrsl PE RGENERO, CFSERO B INTENTS 6 Otranto pipergenere ‘s no — Ht Mana hi Je generoe D dade a Tipe RCE SE Traduca Ac nogies Formas de text! Conclsio bi Referencias bibhogr His Foo parse DE ACTOR — NAO HA AUTOR SIME IMAGEM ss TO Mhugin: Adail Sobral Problemas de autor ” A imagem de autor... ‘Algumas facetas d Diversidade no espago € Conclusao 0 yecanen ager de autor. no tempo « Referencias bibliogrificas ls INOVE _] Panaroria — A ranaroria & SUAS SoMDRAS 1s er Traduca: Décio Rocha Paratopia e discurso constituinte so 135 Os tropismos.. e 161 A atopia veces 165 A publicidade 15 Condlusio. 10 DE ] Pouirosts — PoLironta, PROVERDIO E DESVIO . _ 1 Tradugdo: Maria Cecilia P. Souza-e-Silva Enunciagio proverbial e polifonia. re Tlustragai - eee iv Referéncias bibliografic: 16 [ONZE] Recistno — As TRES FACETAS DO POLEMICO «1.0 18 Tradugdo: Sfrio Possenti . Os registros.... 1S? A dimensio ent Ke A dimensio sociogenérica. 1s A dimenso semantic . 13 Conclusio.. vere ay Referencias bibliograficas . SITUAGAO DE ENUNCIAGAO — SITUAGKO DE ENUNCIAGAO E CENA DE ANALISE DO DISCURSO... : Nelson Barros da Costa O plano da enunei O plano do texto Sintese Referénci bibliog Dominio MANGUBIAU Doze conceitos em andlise do discurso IMAGEN ID AUTOR agio hd autor sean tmmagena Oat [) Jens entice doapdta a ances deste p> Prinbomiia taaqyie’ Cosmdimamdkteypaicto Su ha sevmacennaftors andl vcennommmudtnmastocarsthsTTe) “nth nemaemetr awe aD fey. AMS rrn ONL CHORE TS 140 propriamente dita, uma realidade instil e fluida que nao Pertence pry, priamente nem ao autor nem ao ptiblico ou ao texto, mas resulta da ing racio entre instancias heterogéneas. Parece-me, contudo, que essa ney de imagem de autor pode ser feeunda para a andlise do discursy, que se natureza se dedica a trabalhar em fronteiras e eruzamentos, Toda a die dade consiste entio em nao passar de um “textualismo” que recusa 6 gy nao é imanente ao texto a um “sociologismo” que nos faria voltar, sob nova roupagem, a oposi¢o imemorial entre texto e contexto. Além disso, as pr. blematicas do “ethos” e da “postura” nutrem a mesma ambigao, a primeira ao centrar-se na enunciagao e a segunda ao privilegiar as estratégias de po- sicionamento em um campo. Mas essa é uma imensa vereda que se abre, por menos que avaliemos ai versidade e a complexidade dos fendmenos envolvidos. A reflexao sobre aen- cenagio do produtor literério — sua “apresentagio de si” (Goffimann) e sobre a representagao que se tem dele — é recente, e sem dtivida serdo necessirios anos até que seus varios aspectos sejam explorados sistematicamente. Vou limitar aqui minha reflexio ao discurso literario, embora conven cido de que, com certos ajustes, a maioria dos procedimentos que seri evidenciados também tém validade para outros discursos. PROBLEMAS DE AUTOR O fato de esse tipo de pesquisa ser recente pode ser explicado pelo da estética dominante, que, como tentei mostrar em diversas ocasi0e® Particular em Contre Saint Proust (2006), implica uma cisio tunda™ entre 0 “Texto”, necessariamente maitisculo, e seu “contexto”- ‘2 on a ue Sea ae barasio entre uma disciplina intitulada “hist6ria liter a estude sanstancine — tuda as “circunstancias” da criago, e o estudo imanente de €°* " miatico, estilfstico, narratol6gico...). Tal em varias a le « ‘i linguist sPordagens mais recentes que recorrem a teorias dae" ica: basta ver o . “ fi 4 ver com que obstinagaio se costuma separar 0" igura puramente textu; : cextrate A distingao quase sagr. n res (0 foi por outro lado Pr in © 0 “escritor”, que seria uma figurt NP ada “ . . no “evs ‘ada entre o “eu profundo” do criador € © uso iy OM MGUEMAINGUEKEAY Doze conceitos em anillise do dise 141 em Contre Saint-Beuve, de M. Proust, por sua vez, condena ja ‘ aquilo que “imagem de autor”, que no por fio se deixa apreender pela oposigéo Texto/ Jo plano eem particular a “ego profundo”. em nenhum ontest0> saxo decorTert do ea ge podemos iniciar hoje uma reflexiio cave a imagem de autor, isso vee medidaem que, sob ainfluéncia das corrente soe andi do scars, vem se desenhandlo wana nova pasagem eos literdrios, e para bem além deles. A encenagao do escritor nao Caprentida af como um conjunto das atividades que permaneceriam fora do recinto sagrado do Texto, mas como uma dimensao constitutiva do dis- curso literdério. Além disso, essa questao apenas prolonga em outro nivel de ‘onplexidade o pr6prio principio de “cena de enunciagéio” das obras (Main- queneau, 1993, 2004): enunciar em literatura nao é apenas apresentar um mnundo ficcional, mas igualmente configurar a cena de fala que é ao mesmo tenpo acondigio e o produto dessa enunciagao. 5 pragmaticas ¢ es- A primeira dificuldade, e talvez a maior quando se aborda a nogao de imagem de autor, € que ela mesma se baseia no termo “autor”, que, como se sabe, é simultaneamente incontorndvel e inapreensfvel. M. Foucault desta- coua complexidade dessa nogao num famoso texto de 1969 no qual deslo- ce essencialista “O que 6 um autor?” para uma “fungao autor”. as tenn ‘ discussao, lembro que distingo (cf. aqui 0 capitulo “Autor”, sos distintos, mas estreitamente ligados, desse termo. on mers seep, de certo moro a mais clara, é a do “garante™ da Pifcamente f me a responsabilidade por um texto. Isso ada tem de es- Pi qualquer i oo uma vez que “ser o autor de um texto” é algo valido ° lnguistca, 0 “gars exto. Como sucede com a categoria de “enunciador” Mem am in ane ante” opera na fronteira: nao é o enunciador do texto ‘Sse distinggg, Em ten, came € osso, mas uma instancia hibrida que frustra Vitis trabalhos oria literaria, a questo do “garante” tem sido objeto de €m particular acerca do paratexto (titulo, preficio, nome imboraae eas ‘ando sg Possan Se fala ect anoreee tradugdes para este term, como Raor (jé consagrado, raid) pea © due niko 6 o caso uqui), abonar on avast, optamos por Santi, doa J usado em O discurso literdrio, e que sugere, mais do que a . da fianga, a responsabilidade [nota do tradutor] O10 m@ IMAGEM DE AUTOR a . do autor...), mas igualmente de debates no referente a articulacy narrador” e “autor implicado” (Booth, 1961). wo entre Nos termos da segunda acepgiio, “autor” di raria, referindo-se a um es ‘signa um ator da ¢ ren lite tuto socialmente identificado a que se + ~ sregary determinadas representag6es estercotipadas historicamente variaveis. Q E au tor entra em redes, tem relagdes com editores etc No caso da terceira acepgao, o autor é 0 correlato de uma obra, ur “auctor”, Sua fungao nao consiste em responder por um texto singular, mas por um agrupamento de textos referidos a uma entidade que ¢ identificavel que até pertence ao Thesaurus literdrio, quando alcanga notoriedade. Se por definigao todo texto tem um “garante”, apenas uns pouces individuos alcangam 0 estatuto de “auctor”. Uma das singularidades da produgao l- teréria em comparagao com outras, como O jornalismo ou a polit é que toda pessoa que nela publica é potencialmente “auctor”. Mas para que ut individuo seja plenamente “auctor”, € necessario que terceiros o instituam como tal, mediante a produg&o de enunciados sobre ele e sobre sua obra, em suma, conferindo-lhe uma “imagem de autor”. autor obrigam-™m< A problematica da imagem de autor e a fortiori a do Em 0 discurs a realizar algumas retificagdes de meus préprios conceitos. . literdrio®, contestei a divisio tradicional do escritor em duas figuras: uma seria criadora de uma obra e outra que teria uma existéncia social. ee evocamos essa divisiio em relagio a M. Proust. Com tal finalidade, Les distinguir entre trés instncias: a “pessoa” (0 individuo fora da ae ria), “o escritor” (0 ator no campo literiirio) € © “ins enuncia 0 texto como desempenha o papel de mini ria). Essas trés inst@ncias nfo sao apresentadas em s de cronologia ou de camadas: elas se atravessam mutua a tant critor” instance istro da instituiga? " : om tell equéncla, sejaem te a pans’ amente num PS war son du sens. Baris: CRO" ah goridadle* 7 Cf, para “auctor”, p. ex., Paul Audi, De la re-fondat es pcibul ue " dea jae revista, corrigida e ampliada, No prelo, em que o autor propo authorship, depois de ter usado auctorialité. Autor & autoridade vén a hed tas”, de onde vem os dois sentidos de “autorialidade”, a de quevt atl on tefunda o sentido do dito ao assumir a posigdo de autor [nota do a tor gutest > 5 Edigao brasileira: Discurso literdrio. Trad: A. Sobral Sao Pa tradutor]. PALIMIIIE BAINEIIEMEAN Dore canceitos em andlise do discurso: 43 yalestrutura de né borromeano®, Nao h piografia, depois 0 “escritor”, que correlato de uma enunciagao: ne: ide inicio a BC NO espaco liter nhum dos tras ¢ Pessoa”. Dassived de a uma 80.0 “Inge Gri & ent ‘ fundamente on Divs, a Mas é possivel questionar agora a suficidneig dessa distines soa”, “escritor” e€ “inscritor”, A nogito de “inscritor”, tal re ne em 0 discurso literdrio, tem o iNconveniente de reunir em A Ine hina estreitamente ligadas, mas heterogéneas: a de enunciador @ 4 ee da instituicao literaria”, que “confere sentido aos contratos implic i cenas genéricas e que delas se faz 0 Sarante” (Mainguen 104, 1one aun 2004, 1087/2006, 36 -me interessante re t de itor” 136). Parece-mi remover da n Titor” 0 que se re. fere ao “garante”, A responsabilid: fungdes de nfveis distintos: a de e: O¢ao de “ins lade. O inscritor subsumiria assirn duas nunciador, isto 6, suporte eade agenciador do texto (que se manifes 0 peritexto: o prefacio, o titulo, a epigrafe etc. Por outro la em general nao é assinado nem pelo enunciador nem pelo escritor, mas pelo “autor”, aquele que o assume perante a sociedade. Com efeito, o prefic um género que gere a introducao do texto no mundo. “O autor-garante” de uma obra literaria aparece assim como um permu- tador. No século XVI II, tratando das epistolas dedicatérias, o escritor Charles Sorel escrevia, nao sem alguma razao, que o prefacio é a “obra-prima” do autor, tendo em vista ser ele um tipo de “portal” por meio do qual o piiblico acede & obra: ficio] ia, 6 af [= no preficio} Se os Autores tém alguma doutrina e alguma eloquéncia, és es i faga uma 7 he eles a fazem aparecer, a fim de que desde o comego se faga ual sie a avilhas : al rtal que promete mara weice asc Na ace Flores obrasprims dos 4 do edificio.[...] A nosso ver, [...] essas sto as verdaclira suas grandes a consultar suas grand ‘ : ario dedicar mai e trabalho a cons “ bém af Obras, ¢ as ver por inteiro, a fim de reconhecer tam! se [1667]. Genebre gre les e & sua engenhosidade (La Bibliotheque france Slotkine, 1968, p. 111-112 da paginagio original). as yatados entre side uuneira tl Re 2 cordaa fer > s cfreulos de 001 . que os 'a.& estrutura que consiste em trés ‘os, outros dois. anata brasao TF qual nt onto reer Coparcetey cme famnfia B ) [nota do traduto Tegou Para s1 wente Originaling ds com ico. Lacan uer um deles desfaz a ligagao dos, ¢ 6 7 Atico Gi Srromeu, foi usado pelo mnatemiticn Gault er ua prépria topologia RSI (real-simbélico- ann = 1MAGEM DE AUTOR A IMAGEM DE AUTOR Devemos agora abordar a imagem de autor propriamente dita, tividade multiforme do autor e, em pri ‘4 Nig é somente o produto de uma a meiry plano, de seus textos: na verdade, essa imagem é elaborada na confluencia dy seus gestos e de suas palavras, de um lado, e das palavras dos diversos pi. cos que, a titulos diferentes e em fungao de seus interesses, contribuem Para moldé-la. Mas, tratando-se do discurso literdrio, ligado fundamentalmente a uma memoria longa, a imagem de autor nao cessa quando se acaba a vida dos escritores, Os autores mais valorizados, aqueles cujas obras so incessante- mente comentadas, cuja imagem é a mais rica, sao os que se dest: m na memGria coletiva. Rimbaud nao se transformou em Rimbaud, e sé alcangou o “mito de Rimbaud” depois de morto. Nessas condigées, percebe-se toda a importancia das decisées dos interventores posteriores, que contribuem para constituir uma obra, quando nao a fabricam com todas as pegas. Para fazé-lo, devem basear-se numa determinada imagem de autor, e, mediante sua atividade editorial, vio modificé-la. A partir do momento em que uma decisio editorial institui um auctor, é elaborada uma imagem de autor. A falta de uma existéncia hist6rica verificdvel, o fabulista chamado “Esop” funciona como um nome préprio que indicia um corpus de fabulas da An- tiguidade, tendo-lhe sido atribuida uma biografia rica de episédios, com o testemunha a Vie d’Esope le Phrygien [A vida de Esopo, 0 frigio] que Fontaine colocou no inicio de suas Fables [Fabulas de Esopo). Mas esse é um caso extremo que se perdeu na lenda. Menos dist no tempo, a “obra” do duque de Saint-Simon ou da marquesa de Sévigné ee passaram a existir depois do desaparecimento de seu “autor”. 0 mesmo aplica a Pascal. Trata-se de um “auctor” hoje maior, mas que, dura a vida, foi garante de apenas uns Ppoucos optisculos cientificos. Ne eee Seu acesso ao estatuto de auctor resulta da ago de seus amigos «(Per Royal apés ‘ yal apés sua morte, Conhecemos, é claro, o exemplo dos Pensi®s pode” samentos], um conj > njunto de fray + , morte. meni a sua tl se evocar um exe ig) tos recolhidos ap6s ene 2005): a co plo muito menos ilustre, mas revelador (Maing * a correspondéncia de Pascal com o duque de Roannez e sua ‘DOMINIQUE MAINGUENEAY Doze. Conceitos em andlise do Aiea pec, 45 No célebre volume Pensées et opuscules [Pe a fildsofo L. Brunschvicg ( Hachette, 1897), 6s situk lo “Excertos das oo f senhorita de Roannez" (P. 20955, § ° ntadas em ordem cronolégica e Precedidas de una data (Setembro de 1656" waa l, “domingo, 24 de setembro de 1656" para a Hote), que dy g, pee de estar lendo a correspondéncia auténtica, E ase s completes de Blaise Pascal [Obras comple ee oot pelo mesmo L. Brunschvicg, em colah ee (Hachette), os mesmos text AMeNtOS © OpFscule| editado AFECETH sob Poucas Cartas 40 apre. leitor um Contrapartida, nas fas de Blaise Pascal) Dora publica. com P. Boutrouxe § Sido reproduzidos entre os “optisculos” ao lado do “Discurso sobre a condigao dos grandes” ou da “Prece para pedir a Dens bom uso das doengas”. Podem-se identificar claramente duas Brandes estraté. om ' iais quanto a essas “cartas”: uma consiste em aproximar o texto de um ca a 0 de uma correspondéncia confidencial apresentada em pean a0 passo que a outra apaga tanto quanto Possivel 2 nena interacional para ver nelas a expressio de ae doutrina. a A we leitor Ié algumas cartas derivadas da esfera privada; no out settee em que o pensador articula sua doutrina. A coool de va _ es no depende dos textos em si mesmos, mas da imagem que s ‘iblico. fizer isso, na realidade, modifica-se a imagem do autor para o piblico. . a sas cartas. Por Essa indecisfio se explica: nao se dispde do a Ao volta de 1730, alguém copiou excertos delas em or a e doutrinais, teve- destacar dessa maneira determinadas Passagens fortemen exemplar, cujos Pensamentos deveriam ser piamente reunidos. dk uu: Pascal nao era as a uma imagem ansformou: P: is associado apenas a le mais associa ; ae tr 'gi0so, as 4 de ete ensador e de eseritor, correlato de ma O} g pensador e gran ar e “0 es al consti ‘ida por u ma série de decisdes editoriais. Jando se per Pp i decisées edito que 0s leitore: : jam pre s i lei 7 J, mas que lhe ol — ideias de Pascal, 0 ; lei jam pré6 ou contra as ideias oa ‘itores 5 a Tradig ado pela Trad Tecebam 0s textos como parte de um monumento leg “ — ivel dizer, & ria possive tragédia de Um exemplo bem diferente, extremo, seria Po arse que a trig Cido pela lteraters grega antiga. Até 1952, pensavs um caica, obra de ida areca, obra cde 0 imeira obra, aine on: “O es luilo, i fosse sua primeira Maze . re As suplicantes, fosse P} 1 grande he nde se reve. f *M autor, como o resume em 1921 0 g) Ofey — je preci Tec uma mistura de verdor ingénuo e de p Jenista P. mo seco, 0 R ono # IMAGEM DE AUTO 146 la um jovem génio que ainda nao domina todos os s US FeCUTSOS" ayy ' bau, 2003, 21). Mas a deseoberta de um papiro levon a peng te AE NE 56 tray na verdade de uma das dltimas tragédias de Esquilo. Era entio nee ' OSSArig, compatibilizar a nova datagio com uma nova imagem de autor, ue tnt inha sido interpretado como areaismo e inabilidade transforma-se co da habilidade superior de um autor em plena posse de Os doi POstumo, interg. gem: o primeiro modo condiciona obviamente o segundo, mas CM thanifesta, SUS mneios s modos de con strugiio da imagem de autor, vivo a intervengies postumas reinterpretam os tragos de gestos ou de palavras deixados pelo es. critor. O esquecimento é uma forma radical desse trabalho interpretativo, Ele permitird eventuais redescobertas, nem um pouco desinteressadas, sobretide quando se trata de criadores em busca de filiagio ou de valorizacao: deveese atribuir a certo ntimero de escritores do passado uma imagem de autor em conformidade com as exigéncias de seu proprio posicionamento no campo. Um exemplo tipico dessa luta para impor novas imagens de autor é aati- tude de M. Proust no que se refere a Gérard de Nerval. Em Contre Sainte- Beuve, Proust censura Saint-Beuve por ter construfdo uma falsa imagem desse escritor: Concorda-se hoje que Gérard de Nerval era um escritor do final do século XVIII e que o romantismo nao influenciou um gaulés puro, tradicional e lcd! que ofereceu em Sylvie um quadro ingénuo e sofisticado da vida frances idea : . ; sito lizada. Eis o que se fez desse homem que aos 20 anos traduziu o Fausto. vs! i iraco estrangeit Goethe em Weimar, dotou 0 romantismo de toda a sua inspiragdo estrangt ' emado. te que desde a juventude estava sujeito a acessos de loucura, acabou intem* : : do enter nha nostalgia do Oriente e terminou indo para lé, tendo sido encontral ‘2 ‘i , : panhias® cado numa viga de um beco imundo, sem que, na estranheza das 6O™ : “pi de st dos ambientes aos qua o distirbio & eid s a excentricidade de sua natureza € Io st c6rebro o tinham levado, se tenha podido decidir se havia comet 5 num acesso de 7 i" pantieit® loucura ou sido assassinado por um dee seus comp" Te bituais, duas Suposigdes que parecem igualmente plausiveis! (1987, atte! ti Proust pretende opor a essa imagem outra, a de Nerval com? ito. lack « as ” J, e sel Go. Arecordagio do “subjetivisma” exacerbado de Nerval es vém autenticar 0 romantismo de siden tit ae contraimagem de autor do a Prowt A um escritor paria, sua dis autor de Sylvie permite DOMINIQUE MAINGUENEAU Doze conceitos em andlise do discurso cua propria estética, fundada, como se sabe a a S8be, Na nogig da «. semelhantes génios, a visio interior OCHO de “vig bem cert, 4 bem fortes ALGUMAS FACETAS DA IMAGEM DE aurop Anocao de imagem de autor oferece assim duas fac conforme remeta a gest3o de um Thesaurus ree “en Herentes externos ou a uM processo que se confunde com a traj Pode-se retomar aqui a famosa férmula do grupo de nao se comunicar. Querendo ou nao, o escritor constr6i uma apre: 7 de si através de seus comportamentos verbais ou ni rs o que é ser escritor, de acordo com representagoe intervenientes 40 verbais, que mostrar es coletivas, modelos es- tereotipados que circulam numa época e num local determinados. Mas 0 autor produz inevitavelmente esses sinais ao levar em conta a imagem de sua pessoa e de sua obra elaborada por terceiros mediante seus discursos. Podem-se a priori distinguir mais precisamente duas zonas principais da produgio de sinais que contribuem para dar forma & imagem de autor: uma zona em torno do texto; e uma zona em torno do ator, cujo comportamento se baseia em, e atua sobre as representagdes coletivas do que é a atividade de escritor. Retomando os termos empregados em O discurso literdrio, po- demos dizer que esse ator se dedica a um duplo trabalho: 0 de “regulagio © 0 de “figurac3o”, em fungdo da imagem que, mais ou coo consent mente, ele se esforga por impor. A “regulacao” torna posse reorient “s trajetéria de conjunto em que se situa toda obra singular: — um futu- dar sentido a suas atividades passadas e presentes em ne 70 projetado, Isso passa por géneros muito diversos: Gh ae pretiicios de 4 jomalistas, manifestos, debates, escritos sobre ne : Associa-se & essa obras de outros escritores, obras sobre outros ese do qual o ator se poe de “Tegulagdo” um trabalho de “figuragio” por MeO CT ag campoot algum modo em cena como escritor: viaj as concedidas ao, vive ata ‘a ou nao, Vi ao rosto ete 1e na televisao © 20 centro de uma cidade grande, aparece na ' Jo “escritor”, 0 ator do 5 e ven do incipio de Na reali ‘ iso distinguir 0" prio prinetp eciso dis . pr campo 7 seria prt acne ainda que © PYOP! ‘erario, eo que vem stificial- UN n6 b distingao 01 essa " rromeano torne vatAEM DE AUTOR 148 Zio somente através de seus te > Oscritor produz signos guragio” e de seus textos de “regulag: ativos: 60 caso das provocagées dos surrealistas, da hat, “xtos de « Jo”, mas também através de fi. alguns gestos signific: Mista alli de Hernani com os romanticos etc. Também as escolhas editoriais vor ASSOCIg er publicado por pequenas casas edlitoriais de vangtiaedy oy das ao escrito " por “grandes editoras”, publicar o romance na forma de folhetin nus jornal da massa ou em revistas de tiragem bem limitada ete. > A pessoa mantém relagdes bem variéveis com o “escritor” ¢ como “inscritor”. E impossivel abordar hoje o trabalho de Céline ignorandy que ele colaborou com os alemaes durante a Segunda Guerra, especialmente porque boa parcela de sua obra faz narragdes autobiograficas sobre esse periodo de sua vida. Se para alguns produtores, como Céline, Jean-Jacques Rousseau ou André Gide, a encenagao da prépria vida constitui a propria trama da obra, outros estabelecem barreiras entre uma e a outra, e outros ainda, na verdade a maioria, estabelecem acordos entre esses dois extremos De modo geral, ¢ af reside de fato toda a dificuldade, as relagdes entre essas instancias nao estaveis, e essa diversidade tem estreita ligago com a diversidade das épocas e dos tipos de sociedade. A imagem de autor de que se beneficiam hoje os escritores do século XVI ou do século XVII leva em pouca conta os dados biograficos. Em contrapartida, desde 0 comego do sé- culo XIX, a atividade literdria frequentemente se empenha em tornar impre- cisa a fronteira entre a vida da pessoa, as estratégias do escritor e a criagio a obra. Quanto a isso, como vimos, 0 Contre Sainte-Beuve refuta a si mesmo: Porque, tendo afirmado que nao se tem de levar em consideragio a vida de um autor para entender sua obra, Proust invoca elementos da vida de Nev! para modificar sua imagem e, assim, a maneira como convém ler sua obrt Quanto aos elementos que giram em torno do texto e contribuem pa" mae de autor, isto 6, aqueles que ndo resultam diretamente da ¢40” nem da “figuracao”, podem-se di inguir vérios planos. Em particular: > Apersonagem. No te: que facilita a “conte 14g pres de suas comédias mais conhecidas; Lp ‘Jeu de iogo do amor € do acaso], Les fausses confidences [fh Chega mesmo a Ocorrer de a identifies G0 do, dramas Pia pued ersonagens ser tio forte que se Passa a representar idea tela 6 €88€, POT exemplo, 0 caso da pe elo obrigat6rio de toda biografia de amour et du hasard [0 ‘uma de sy, ne fas vida do autor através s atravess Figaro, que serve soma de te seu criador, Beaumarcha taminagdo entre autor e personagem vale ignalmente, de mode etre ; ) MENOS ime diato, para as personagens de romance, e mesmo para dete , poesia, Meursault, confrontado com o absurdo, em 0 est m ou o poeta que vagueia melancolicamente nas Meditagées poéticas do poet . ras do poeta romantico Lamartine contribuem para o perfil das imagens de autor. sonagem do Fy is. Essa con Tminados tipos de ngviro, de Carns > A cenografia: além das Personagens, o “clima” da narrativa de que elas participam é essencial: a personagem Figaro s6 6 Figaro gragas ao rit- mo muito rapido da intriga e das réplicas; Meursault 56 est4 associado ao absurdo numa enunciagao em que ha uma obliteragao do narrador horo- diegético, na ruptura entre o “eu” do narrador e a narragao de suas acdes Entramos entao na problematica do ethos discursivo. » Os géneros também tém um papel na construgao da imagem de autor. O romance de Albert Camus e as coletneas liricas de Lamartine sao textos Cujo actante principal é um “eu”. Mas 0 fato de O estrangeiro ser um roman- ceedea personagem ter um nome diferente daquele do autor fazem on que a contaminacao de imagem entre a personagem € Albert aes tenha de automstico, Admite-se sem dificuldade que Albert Camus quis ilus- trar ama tese, no caso o absurdo da existéncia, mas as representagdes atvanls Pela leitura do romance nfo so automaticamente remetidas Ape ‘or Em contrapartida, quando se Ié num poema de Lamartine ver sssoa do au- s COMO Je suis d'un pas réveur le sentier solitaire; Jaime a revoir encore, pour la derniere fois, Ce soleil palissant, dont la faible lumiere Perce a peine a mes pieds Vobscurité des bois’ ~~ 19, versos 56: | “Sou jgate inulicativa via tina vez/0 30 fl pela dena pe tttomne”, Méditations poétiques, XX, da, mest AY qota do trad que a mada onirica o caminho solitério/Adoro Fev bosque ames a “faz, cujo frégil brilho/Mal perfura 0 obscure . 1K mo w INAGEM DE AUTO! 150 O simples fato de se tratar de poesia lirica tipicamente romantica Provo. ca naturalmente uma imprecisao das fronteiras entre o actante da historia 0 enunciador do poema e a pessoa de Alphonse de Lamartine, Nao se tra, de um acidente, mas de uma consequéncia tanto do género (poeia lirie como do posicionamento romantico, que faz da poesia a expressio imediata dos sentimentos do escritor, Com efeito, seria necessdrio considerar outros fatores. Em busca do tempo perdido € narrado por um “eu”, assim como O estrangeiro, mas a identificagiio de Proust com o narrador é muito mais forte, uma vez que Camus escreveu outros romances cujo clima é bem di- ferente, enquanto Proust é em certa medida o homem de uma Anica obra > O autor-garante: entendo por essa expressao, de maneira restritiva a instancia que figura na capa, posta como responsavel pelo texto e pelo pa- ratexto. Ele também libera um ethos que contribui para a imagem de autor Mais precisamente, podemos distinguir: © O ethos advindo da enunciagio do texto propriamente dito: o autor é percebido pelo leitor como alguém bem documentado, cultivade. imaginativo, que gosta de capitulos curtos etc. Temos aqui “o autor implicado” de W. Booth. © Oethos discursivo advindo do paratexto: titulo, epigrafe, preficio. posfacio..... Por exemplo, num romance africano francéfono intitul do Le Cercle des tropiques [O circulo dos trépicos] (1972). a nt tiva € precedida de uma epigrafe assinada “o autor”; isso permite 2 leitor atribuir determinadas caracteristicas a esse “atte A dificuldade de escrever este romance nao foi construir minha hist blema durante meses foi o “eu” de Bohi Di... Ser um entre centenas de res de homens an6nimos do Terceiro Mundo cujo rosto ninguém conbes® © ne de repente murmura, como se estivesse se sentindo incomodado pot Pees © mundo: “Voces nada sabem de mim, nada, eu thes pego, escutew mut ce hung ria, a histéria que vou thes contar... Meu nome é Bohi Di, que eu! mt! natal significa o “filho da terra” (ea) » miller que ati? pe . ; “a @ O nome do autor propriamente dito: 0 nome aposte 2 ¢ antude imagens especific de juve s. Balzac, ao publicar um romance ee Alioun Fantouré, Le cercle des tropiques, Paris: Présence africaine, 19 151 sob 0 nome Lord R’hoone, buscou entrar G nero de seu texto, inspirado no rom, dia, os autores dos romances tendem a usar pseuddnimos ™ harmon “BOticg” ‘ais do ©, ANglo-saxse. cao Harlequin Propée nomes de a Mary Nichols, Karen Rose et autor, serao construfdas nan 4 COM 0 ge. HS. Hoje om Po da subliteratiey NOS. Agsin S Como Py ‘ntiment 7 ‘amy 8 femini ae bhie Macorn be r VETSOS Notre: de Autores © 9 produtor usa di imagens dife heteronfmia de Fernando Pe. Fentes: conhece-ge¢ case A 'ssoa ou, na Frang: Kacew, que conquistou 0 Prémio Goncourt du: “Romain Gary”, em 1956, e com o de “Emile 4, do escrito Bron 7 aS Vezes: COM 6 none Ajar”, em 1975, >» O ethos editorial, que é frequentemente negligenciado, ernbora de- sempenhe um importante papel. E 0 ethos que vem da colegio em que o livro é publicado, da qualidade do papel, da capa... Quando, no século XIX. osromances de Jules Verne foram publicados na colegio “Viagens extraordi- narias”, destinada a instrugao das criangas, a imagem de autor do escritor era completamente diferente daquela que prevalece hoje. Um leitor ca um texto na prestigiosa colegao La Pléiade, da Gallimard, com seu Pope tio caracteristico, nio pode perder de vista 0 fato de que ca reno ve so um grande escritor. Ler “Le bateau ivre” [O barco Pebadel ‘ « ' ve “ hesse quadro € estar sob uma tensio entre as represen i ee texto, do adolescente revoltado, e as que sao ativadas pela grande autor, do monumento da histéria da literatura. produto apenas da oad com ptiblicos we el i jue Se cl ces. Assimn 4} oe Mas, naturalmente, a imagem de autor nao ¢ 0 dade do escritor. Tal atividade entra em re ‘stratos mais ou menos homogéneos de Te ° cfreulo dos especialistas, as fontes tendem traf utor aglutina elementos nfo hierarquizados extra misturar: & 1 ‘ ys de muiltiplas tontes- PO OIVERSIDADE NO ESPAGO E NO TEM interes , imagen! NOS int . jor cuje Até agora agimos como se 0 autor P 1 isso, des wristtusse um dominio estavel. Ao faze srArico da nog Plano 9 caréter radicalmente histérico d# rOR pmo wIMAGEM DEAUT Oy 152 teira entre &s posigdes de enune Hagdo que um texto implica ¢ “Spago de produgao simbsliea de un regimes “auctoriai como padrao 0 BS DOsiCbes ny Ht sociedad determinada iat, » Seatindo os Tocais © as Epoeas, mio se prod sucker ° Sime que se instaurou na virada do século XVI p oe oo 0 78 , Dara ey culo XIX, regime que ainda domina nossas represent dos escritores. Ges da literatura e A propria categoria de “eseritor’, considerado comm, figur chave de um campo consistente e autonomo (que seria “a literatura’, ins lou-se na cultura apenas a partir do final do scenly XVIL Assinn, nie nig aa imagem de autor nao 6 um ponto fixo, sequer uma zona de contato entre instancias estivei : 6 uma fronteira mével, a resultante de urn jogo de equilibrio instivel em reconfiguragio permanente. Por exemplo, o papel crucial desempenhado pelos manifestos durante os séculos XIX e XX é indis deseja autdnomo: cada grupo se constitui de maneira ostentat6ria em tomo Jo do que é “a verdadeira” literatura. Essa época vé ocidvel da existéncia de um campo literario que se de determinada defini igualmente proliferarem os textos autobiogréficos e os comentarios de escri- tores sobre sua obra e sobre a Arte. Como a concorréncia entre posiciona- mentos se exacerba e se teatraliza, situagdio em que as definigdes da atividade literaria sdo radicalmente incertas, 0 produtor é levado a multiplicar os tex- tos que vao moldar uma imagem de autor que se quer singular. Aquilo que deriva do trabalho de “figuragio” e de “regulacdo” experimenta assim um s. Nao estamos mais em um regime dis- desenvolvimento sem precedente cursivo em que determinado ntimero de normas se impée aos escritores: en tramos num universo em que 0 escritor deve constantemente legitimar seu proceso criativo elaborando uma imagem de autor A medida de sta obrt Quando consideramos os séculos imediatamente anteriores, cece uma multiplicidade de casos em que as categorias agora ustais S30 poneoore rantes. No século XVII, por exemplo, muito autores nao assinavam pre _ i mas “epfstolas dedicatérias”. Isso ocorre em conjugagio com de = i estatuto do escritor, que precisa do patrocinio de protetores ricos. ’et —— em matéria de responsabilidade auctorial, 0 equivoco & a rege. Maite dessa época, publicadas hoje sob tranquilizadores noe pro Ne a eram na origem: a primeira edigdio de A Princesa de Cloves nao tr Jas sob nonin clas. no © autor. Mesmo um autor reputado como Boileau teve publicad: i ; i rde, fe poonhe to varias obras que sé depois, por vezes bem mais tarde, foram te ‘DOMINIQUE MAINGUENEAU Doze conceitos em andlise do discurso ee Publicar um texto no século - de ato, Signifies Jo, Um enorme niimero de textos é icado ¢ . lo de m, acronimos transparentes ou ©Pacos, com Ds ‘a Mane} : . : eudoni Muitos dos que publicam uma obra Bo se himos piblicas que assumem a responsabilidade Aqui intervém varios fatores; eM particul: pressores, mas igualmente as Tepresentagdes sobr %s e para uma pessoa nobre, do ato de se confess; se propor-se como autor fosse um risco. Di paco do peritexto (dedicatéria, discursos de justificagio autégraf k . Jus igratos e ale, grafos...) que tematizam os problemas da autoralidade: administrase af Ae ae al distancia entre a fonte do texto e a incerteza reivindica por inteiro ou em parte o perite i Pi peritexto indicagdes equivocas: “Eu” sou /“eu” nao sou autor desse texto. E 0 caso de por exemplo, Charles Sorel, que chega a estabelecer um vinculo contingen- te entre os textos publicados e os textos de que se diz. o autor: xto, que 81,0 controle ter degradanty Titor, Tudo se Passa cq ‘0 advém a importancia do es amnG, Jamais houve a obrigagao de alguém se dizer Autor de Livros que ele mesmo tepudia ao dé-los a publico, & que so dados a piiblico como Livros estrangeiros com cujos sentimentos e métodos no se chega a acordo (p. 392). Essas miltiplas publicagdes que manipulam o segredo, a esquiv ran ‘am uma imagem de autor incerta, duvidosa, com que 0s eee Tratase de um jogo sutil em que determinado nimero de pesos como identidade do produtor, que, no entanto, nao se declara publica tora. E, ‘al ou 0 faz ulteriormente. Aqui, a nogao de “mé “ontudo, dificil avaliar até que ponto, e para que él do autor anénimo ou mascarado era desconhe Publ ara” pal red sara” parece Tec a identidade so- priblico, bid ora “de notoriedade acca: ora “de motores entemente, nao assinar © mi i ifravel. Frequ 'ca”, ora entrevista, ora indecifravel. Fred sing * io nar de outra maneira. 0 5 domiina, impr am que OFM de um texte Ao evocar dessa maneira o século XVI, am de producto de Os ativida * afastamos demais de nosso foco. A ati vy Cahiers du Cente a pro de 200 © sauctorialité au XVI 5 de va te Rea P44 Claudine Nédélec, Equivoques d ine}, aisponibili $200 mn -linel, bro lun. "hes Histons, 14 [on- g de dezem et be toriques, 33 (2004), PL Consultado em? ag peAvTOR usioce.! 154 = Propriamente dita é almente diferente 1 nte dita nao é fundamentalme: i le ent fi ente en: © 0 século XX. re - Ma i EO séc Mas as coisas se complicam singul: © século Xyyy . ae armente so eaciedades que misturam @ oraidade ea a a a se contente, contrario do que M. Foucault da a entender, wan mr oe em oper os grandes autores da Antiguidade as oo efeito, o problema a — (ea ee nie Cn a cangio de gesta’® _ em rune dos momentos e dos géneros lite tog nemo d es pie em Prine plano ° recitador, enquanto 0 roman. le do século XII, tem uma ligagio bem mais forte com a escrita e comega a afirmar uma concorréncia ent ae antigos e os autores contemporaneos. De todo modo, o Isen ni propoe — nem no significado nem no significante — designadores estiveis sapazes de remeter a um estatuto de produtor dos textos. A termos bem va- gos como “trovador” ou “poeta” adicionam-se miitiplas perifrases "aque gue da forma de romance”, “aquele que conta’, “aquele que rima’, “aquele que dé forma de verso”. .), cujo universo de sentido tem-se dificuldade de determinar exatamente. E que dizer di ntegrado ao proprio interior do texto? , da mengio do nome do sinatura autor, que é muitas vezes Jo poderiam ser remetidos& psieoogi ds ixam apre- ieada Fendmenos tio complexo: individuos: eles definem regimes de xs categorias contemporine agem de autor. autoralidade que no se as, tornando ainda mais del ender por ne a manipulagio do conceito de ima ategoria se tip? la descartar a o redutora des CONCLUSAO iterario que pretend Uma abordagem do discurso li autor corre 0 risco de ter uma concep¢ 1 que envolve trés pol o criador ajusta st para si do conj da imagem de jos, a saber: _ F in a trajetoriae™ fu is atividae® unto de su! de comunicagi > O polo da produgio, ja que da imagem que nao cessa de construir escritural ou nao. vin cont Zeulo XI : tos herdiens FT Posmas épicos em frances antigo (séeulo XI que narra Fel nda [nota do tradutor). ehriae 19 lo do texto, j4 que a formataga » op se de siren formatagao e a circulagio do imag : num tipo de discurso como a lit 8 textos depen- s pertence a um TI a literatura, e pertence a um Thesaurus passado, t Ira, em que assado, trat avasta malo! spente de uma dimensao essencial. a-se obvia- lo da recepgao, ja a a > 0 pol pao, ja que a decisio de entrar m ar num processe de comunicagae com um texto depende da imagem de aut soni . ; autor, que condie além disso 0 conjunto das estratégias de interpretagao. Q) i condicion: F agiio, Quando o he: ‘Admirdvel mundo novo, de Aldous Huxley, lé as obras de van her6i de s de Shakespeare ser saber quem € e quando viveu Shakespeare, nao se pode dizet lendo textos de Shakespeare. A, lo ime E , de imagem de autor é de manejo particularmente deli- rorias de i ai gorias de que em geral dispomos nao sio adequadas a como Mas essa nogiio cado, porque as cate; elas privilegiam entidades (ilusoriamente) estavei em detrimento das interagées entre instincias he- esses fendmenos: “o homem” ou “a obra”, terogéneas. Jmente muito mais confortavel adotar uma atitude de um escritor, um géne- 1s materiais so Seria indubitave! enidito, mediante a enumeragao das singularidades: a abundancia e a complexidade do recensear ao longo das épocas ¢ dos lugares ‘o da imagem de autor, em fungao das mil- pseudonimato, de autores inventados ou c. Tal procedimento é favorecido pelo geral subdivididos por autores ou mbora indispensavel, nao tem for des no podem tomar 0 lugar de o da atividade literaria. 1, uma época... De fato, impressionantes se se quiser todos os problemas de construga tiplas formas de anonimato ou de ees coletivos ou singulares et > de que os estudos literarios estao em a problema é que a erudigio, € tina na ae As descrigées de singularida ise das condigées de funcionament uadro mais ad er acum jue eles ituagdes, jequaado na andilise © passar dos a pode mobilizar e organizar 0 2 ticipam, near sobre os autores, as obras Teeusando ag ando articular invariant! ‘lleindo em tenn tradicionais de exterioridac ©¢ prions on termos de movimento e de interaga, °°" autor, — bem equipada para apreender questdes essa 6 uma imensa vereda que 8° abre. imenso sabe e os mundos de q io a diversidade das dade do texto © de tipo de abordag como a de it jo, esse ono = IMAGEM DE AUTOR 156 REFERENCIAS BIBLIOGRAFICAS AM R. (org.) 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Genedt a paratopia e suas sombras Tranucao: Décio Roci Caer a de retomd ue i: i i ur o conceito ae paratopia que Peay iT moo Teh WZ. 1 anos e qué desempenha um papel ess AT en aye erent een Lad I TCOn Rt RCO LULL Je paratopia, mas Py Rr c iversidade ny questionar: i MeSH TETRA Me Linco Aono Neeru i P 4 CAVCORTTTIE STII ook tenn cules rity pr iscurso se at (Coy eon TELCOS para dar eee Serrnsty ivas de nossa sociedade: G PC aria, i SRG Conan cine reer os cals CULL inal iy ee Peer eect eS Pence tt uals mod rat a 158 em delimitar tal(is) ou qual(is) tipo(s) ou género(s) de discurso, sem = preocupar em The(s) atribuir um Iugar no universo do discurso apreeng. de. Procuramos, por exemplo, fazer uma classific ‘AG iio Jevisuais, on nto nos perguntamos se € lextinn, do em sua globalid dos géneros midisticos te recortar tal ou qual unidade (por ex Quando procuramos considerar 0 universe do diseiirse, emplo, “o discurso universitérig® oy +, discurso racista”) em sua globalidade, tendemos principalmente a evocar grandes fungées ¢, identificagiio nao se baseia em critérios dy Jo ou de transmi: ordem psicossociolégica, cu ordem discursiva: fungdes de produ tos, de informacio, de diversio, de gestao de valores ete. Em contrapartida quando se fala de discurso que possui um estatuto paratpico, recorre-se 4 propriedades discursivas, isto €, propriedades que nao estao fundadas ne em critérios estritamente linguisticos, nem em critérios psicossociologicos fio de conhecimen. PARATOPIA E DISCURSO CONSTITUINTE Como no posso pressupor que todos tenham uma ideia precisa da nog3o de discurso constituinte, lembrarei resumidamente que seu estatuto deter- mina que eles s6 podem se autorizar por si mesmos, ou seja, nao podem ter outros discursos acima de si. Fiadores das miiltiplas praticas discursivas de uma sociedade, eles dao sentido aos atos de seus membros. Assim, 0 jornalista envolvido em um debate social recorrerd a autoridade do cientista, do tedlogo ou do filésofo, mas essa relacao nao poderia se inverter. Os discursos const- tuintes possuem um estatuto singular: zonas de fala entre outras ¢ falas que tém a pretensio de pairar sobre as demais; discursos limite que, assentades em um limite e tratando do limite, devem gerir textualmente os paradoxos que seu estatuto implica. Eles so simultaneamente auto e heteroconstituintes: um discurso que se constitui legitimando Tigorosamente sua propria constitu” Go pod 2 - g le exercer um papel constituinte em relacdo a outros discursos. Pode-se apreender a constituigdo dos discursos “constituintes” ses" duas dimensées indissociaveis: > a constituicad ars es ‘wicdo como agto de estabelecer legalmente, como P° so pelo qual o dis inet ia Pelo qual o discurso instaura sua legitimidade construindo sua P'OP™ emergéncia no interdiscurso; DOMINIQUE MAINGUENEAU Doze conceitos em anélic. a,

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