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UNIVERSIDADE DO VALE DO RIO DOS SINOS UNISINOS Reitor Pe. Aloysio Bohnen, $3 Vice-reitor Pe. Marcelo Fernandes de Aquino, SI IL EDITORA UNISINOS Diretor Carlos Alberto Gianotti Consetho Editorial Antonio Carios Nedel Carlos Alberto Gianotti Fernando Jacques Althoft Pe. José Roque lunges, S} Werner Altmann ETICA AMBIENTAL Eorrora Unisinos 2004 © 2004 José Roque Junaes 2004 Direltos reservados 8 Editora da Universidade do Vale do Rio dos Sings EDITORA UNISINOS ISBN 85-7431-228-2 Impressio, primavera de 200 Reviséo Introducéo Renato Deltos 7 Rul Senger SUMARIO : 1. Tendéncias atuais de ética ambiental __ Eéitoragio a Décio Remigius Ely IL, Duas visées da Terra como ecossistema tsabel Carballo integrado 3 HL, 0 paracigma ecolégico Prepress que parol por ulquerinsio, das 3 rapitecus cireben ater poses : ‘ : cuotnantSta, oecres Pra nw ietoaa em 1V, Visio antropolégica condizente com o aug ue de 2s ec nua se aes e Fol feito 0 depésto legal. V. Concepgao ética correspandente ao enfoque ecolégico Editora de Universidade do Vale do Rio dos Sinos macgger oe EDITORA UNISINGS ‘Av. Unisinos, 950 VI, Teologia creacionis i 93022-0090 Sao Leopoldo RS Brasil a! clonista emupersnectiya. ecolégica 93 “Telef.: 51,5908239 . Fox: §1.5908238 VIL. Teses e balizas para uma ética ambiental editoratunisines.br 99 José Rogue Junces, Conclusai Alfabetizacao ecolégica 107 Glossario aut Bibliografia 117 INTRODUCAO, Buracos na camada de oz6nio, aumento gradativo da temperatura, degelo das calotas, polares, mutacées climaticas, desertificac3o de imensas regides, desaparecimento de espé- cies vegetais e animais sao alguns dos proble-—~ mas que ameagam 0 ecossistema Terra, ‘Crescem, em contrapartida, a consciéncia ea sensibilidade ecoldégicas. Florescem organi- zacées n&o-governamentais que lutam pela ecologia. Criam-se fundos para a preservacao de ecossistemas e para a protecio de espécies ameacadas de extinggo. Surgem parques de preservacao e protecdo ambiental. A preocu- .» pacao ecoldgica recebe embasamento juridico <— por meio de leis em defesa do meio ambiente. = Os governos sao pressionados a assumir politi- <- cas ecoldgicas e considerar o ambiente natural em seus planejamentos. Os problemas ecolégicos nao dependem | de uma simples sotugao técnica; pedem uma | resposta ética, requerem uma mudangca de | paradigma na Vida pessoal, na convivénc social, na produgo de bens de consumo e, AvOXO Pr CONT ERR a EINAS | Ks José Roque Junces eo. Sf principalmente, no retaclonamento com a na- 4S] tureza. Apontam para uma mudanca de rota na organizagao econémico-industrial e politico-so- cial da sociedade e a conversao das atitudes de consumo e de relacionamento com o ambiente natural e social. Trata-se, no fundo, de mudar a visio de mundo dos contemporéneos. A preo- | cupacio ecolégica no traz apenas novos pro- | blemas, que pedem uma solugao, ela introduz =>} um novo paradigma de civilizaco. A ecologia | formula criticas radicais 8 racionalicade mo- \_derna e ao sis -onémico capitalista. (G debate ecoldgicojexpée quesiées fun- damentais para ética, Discute o proprio pon- to de partida e a abrangéncia dos sujeltos de < consideeashuntasetioas ‘Assim foram surgindo WS \enfoques ‘antropocéntricos pu biocéntricos)na | \eiscussio ética da ecologia. Os primeitos div zem que o ser humano detém um protagonis- mo no mundo. Buscam a soluc3o para os pro- blemas ambientais na perspectiva do papel central do ser humano em relagéo & natureza. Os biocéntricos defendem que o ser humano é apemastm elemento a mais no ecossistema da natureza, um elo entre muitos na cadeia de re- produco da vida. Por isso, 0 protagonismo pertence a vida e a crise ecoldgica precisa ser equacionada numa perspectiva biocéntrica. PAYGEL. & ETICA AMBIENTAL s Ps Dessa maneira foram se perfilande duas grandes tendéncias de ética ecolégica, que se exeluenrentre si. Uma, que tem como pontode © Partida o ser humano em sua moralidade. De- fende que néo existe ética sem antropocentris- mo, pois somente o ser humano pode agir mo- ralmente ¢ tomar decisées. A ética ecolégica é interpretada a partir do que comumente se en- tende por(ética como saber depraticay A ten- déncia biocéntrica entende a ecologia como conhecimento e prética de preservaco do || meio ambiente, compreende a ética a partirdo |} aradigma da ecologia, paradigma que pre- ten ética, porque supera aS» concentracao antropocentrca de toda a daca ( ocidental. Apresenta-se como a unica postura coerente de defesa da natureza e preservagdo do meio ambiente. Em suma, a primeira ten- déncia acentua a ética, encuanto a segunda & acentua a ecologia ao expressar sua proposta de ética ecolégica, Antropocentrismo ou biocentrismo?* A. ecologia como paradigma veio para ficar, im; 4, RICKEN, Anthropozentrismus oder Biozentrismus? Segriindungsprableme der oxelogiechen Ethik, Theo Jogie und Philosophie 62 (1987), 1-21. 20 Jost Rogue Junces “© cando mudancas de mentalidade e de viséo do © mundo. Deve-se perguntar, no entanto, qual & 0 tipo de ética apropriado para a discussdo eco- ldgica. E possivel superar esse impasse da ética ecolégica? Existem aspectos n&o-expiicitados que dificultam o debate. Quando se fala de que & necessdrio superar a postura antropocéntrica, de que ser humano se esté falando? 5) Outra dificuldade desse debate é 0 pré- prio contexto em que se desenvolve: o Primei- Bl ne nce aaa. Corrs Seon: = ceria essa discussao num contexto de Tercelro 3S Mundo excluido, onde imperam a fome, a in- \ _justica e a opressao? Certamente, a controvér- sia apareceria sob nova luz, facilitando a sua % superacdo. A partir da pobreza e da injustica, == humanidade e vida ndo se opdem. As dificulda- des ecolégicas 56 sero equacionadas com a construcdo de uma sociedade justa e igualité- ria, onde a vida, em sentido amplo, seja valori- zada e preservada. KO ViRATO AMBc ETAL OIA sistent MUTT PLICD4: ) s pA ( buc(D, Ol Ly, (0 S0PRE O Meampier te // 1. TENDENCIAS ATUAIS DE ETICA AMBIENTAL 7/ A preocupacéo ¢ a sensibilidade ecolégi- cas surgiram como reaggo a uma mentalidade = predatéria da natureza. Para essa mentalida- de, 0s recursos naturais esto a disposicao do desfrute ilimitado do ser humeno\Q.devermo- , © ral é utilizar para proveito imediato e o mais naturals TISponivels. Essa atitude moral acom- panhoue justincous conquista de terras selva- gens € @ sua colonizagao e exploraco em vis- ta do lucro@ Go enriquecimento. E a mentali dade que inspirou a ocupagéo do territério brasileiro desde a chegada dos portugueses, que se mantém até hoje. A busca denovaster- © ras para a mineracdo e a agricultura chegou a —> longinquos rincées do Brasil durante os ulti mos dois séculos, Essa busce foi motivada pela ideologia do progresso, induzida pela possibili- © dade de exploracio descriteriosa dos recursos naturais. Esse processo socioeconémico tem sua origem no capitalismo. Os efeitos de injus- espialismo: wn 42 Jost Rogue Junces tiga social € destruicéo da natureza estdo pa- tentes e despertam reagBes no sentido de uma mudanca de paradigma. A ideologia do progresso parte do mito da sobreabundéncia da natureza; da crenga no carater llimitado dos recursos naturais e na sub-rogabilidade daqueles exaurivels; da total confianca na produc intensiva, no incremen- to do consumo @ no poder da técnica para re- solver os problemas ambientals. Para essa ideologia, 0 ser humano concebe-se como dono absoluto dos recursos naturais © como *Prometeu” na aventura de dominara nature- za entendida como caos no qual é necessario colocar ordem. Mas esta ordem imposta mos- trou-se como desordem, porque desestruturou 0 equilibrio ambiental responsavel pela repro- dusdo de vida. Esse antropocentrismo exage- rado expressa-se como ética do chauvinismo humano. [A discussao ética no ambito da ecologia surgiu como resposta a esse contexto e como reagdo a uma mentalidade predatoria da natu- reza. As posigdes subdividiram-se em duas Stendéncias: uma mais mitigada, céracterizada S© por um antropocentrismo débil, e outra mais Erica amaienraL 13 radical, inspirada por um ecologismo blocen- trista®, oO . QESPON SRRIU De be 1p HOMEM WcoMm.o 4, Antropocentrismo débil ou mitigade — /)/ E< C = ite Diferentemente de sua vers&o exagerada e chauvinista, 0 antropocentrismo dito débil ou mitigado admite a existéncia de deveres hu- ‘manos, a0 menos indiretos, em relagso-a atu- reza ou de uma responsabilidade dos humanos pelos recursos naturais diante das geracdes fu-- turas, Defende o estabelecimento de limites. regras para a interven¢So na natureza e 0 uso dos recursos core bem cos préprios 2 Aapresentacéo cas tendéncias esté inspirada em: S. BARTOLOMNEL, Etica © natura. Una “rivoluzione co- pernicana’ in etica?, Bar! (itil): Ed. Laterza, 1995. Pode-se consulter também: J. B, CALLICOTT, "Melo ‘Ambiente. Etice do meio ambiente’, in: M, CANTO- ‘SPERBER (Ed.), Dicionario de ética @ flocofia more), Vol. 2, S80 Leopeldo: Ed. Unisinos, p. 158-161, METAFORA- 14 José Rogue JUNcES seres humanos. Por isso os critérios para as ((estrighes so os interesses, as necessidades ou as preferéncias humanas € nao tanto a na- tureza em equilibrio ¢ harmonia, De acordo cam 0 tipo de interesses huma- hos podemos ter éticas de conservacdo e éti- cas de preservacio da netureza. AS primeiras estéio interessadas em conservar os recursos naturais, porque so limitados e as geracbes futuras também tém direito a eles. A natureza deve Ser protegida para satisfazer as necessi- dades materiais do ser humano. As éticas da preservacao querem a natureza para o cres mento humano ¢ o florescimento espiritual. Ela deve ser tutelada da intervencio destrutiva do homem para satisfazer necessidades huma- nas que ultrapassam os puros interesses ma- teriais, promavendo ideais de aprofundamento humano e espiritual. 1.1 Eticas conservacionistas As éticas de conservaco podem assu- mir o modelo do “bote salva-vidas” de G. Har- Erica aMBIENTAL 15 din’, que diante da crise ambiental compara a Terra a um mar tempestuoso com botes sal- va-vidas. Os paises ricos S80 botes com poucas PeSSOaS~ os paises pobres, botes com sobre- carga de gente, querendo embarcar nos botes ricos. Estes nao tém condicdes de acolher a so- brecarga, porque o bote iré afundar e todos pereceréo. Por isso é necessdrio tomar medi das coercitivas drasticas, que limitem as na- @es ricas em seu consumo eas nacdes pobres em sua populacao. E uma proposta que tenta pensar a humanidade como um todo, visando a sua Sobrevivé) ndio toma em consi- derago a preservacdo do ecossistema da Ter- ra: busca a sobrevivéncia da civilizagsio e nao da biosfera natural. Seow ———— 3. G. HARDIN, Living on a Lifeboat, Bioscience 24 (1974) 561-568. O mesmo aparece em trabalhos anteriores 1D., The Tragedy of the Commans, Science 162 (1968) 1243-1248; 1D., Exploring New Ethics for Sur- Vival, New Yok: Peguin Books, 1973; 10., The limits of Altruism: An Ecologist’s View of Survival, looming- ton/London: Indiana University Press, 1977; ID., Pro- ‘methean Ethics: Living with Death, Competition and Triage, Seattle: Washington Uriversity Press, 1980, MECHE 09 apy José Rogue Junces Outro modelo € 0 da “nave espacial” de K. Boulding’, que considera a Terra um sistema fechado, finito e auto-reprodutor. A Terra é considerada uma nave espacial, onde natureza e seres humanos esto intimamente relaciona~ dos. Um incidente na nave pord todos em peri: 90. Nao se pode sacrificar a estabilidade e inte~ gridade do nosso meio de transporte, a nave Terra, com a satisfagao de interesses privados. Por isso & necessario criar as condicoes para chegar a consensos que submetam as prefe- réncias individuais aos interesses do ecossiste- ma Terra. Diferente da primeira, que € deonto- Iogica, essa é utilitarista porque tenta maximi- zar os beneficios, em parte empiricos, mas também valorativo-espirituais. 4K BOULDING, Human Values on the Spacestip Earth, New York: Council of Churches, 1866; 1D., The Econo mics of Coming Soaceship Earth, in: H. JARRET (Ed.), Environmental Quality In a Growing Economy, Balti ‘more: Johns Hopkins University Press, 1969, TAL 17 K Erica ami 1.2 Eticas preservacionistas As éticas de preservacSo apontam para valores ndo-materiais da natureza, Para essas éticas, a natureza detém, antes de mais nada, um valor cientifico, pois fornece conhecimen- tos inestimavels para a pesquisa da verdade, para encontrar a exceléncia moral do ser hu- ‘mano, para fornecer normas de comportamen- to, Enfim, o estudo da natureza possibilita a formulacdo de uma ética natural. Em segundo lugar, a nafureza possul um aoe apoarue vercterns 0 ser humano, ocasionando experiéncias de va- lor e sentido para a vida, de prazer e fruigéo estética, de recolhimento espiritual, de pacifi cacéo interior, de formagéo pedagégica, de sensibilizacao ecolégica. As éticas que privilegiam significados ideais da natureza ndo_se preocupam tanto com normas, mas com o tipo de pessoa que se quer ser ou com 2 personalidade moral que se quer fazer suscitar. Preocupam-se com valo- res, isto é, com um ethos pratico, formador do carater moral da pessoa. Trata-se, em Ultima andlise, de éticas da virtude. Nie Se fAEOCUPF 18 José Rogue Junces v primero meas de ética preservacio- < nista vé a importéncia ce protegio da natureza = pave a formant macorsuldaeso gages. SY) de civil e cultural de um grupo nacional’. Esta identidade no depende apenas de iniciativas econémicas e politicas, mas ce simbolos que se escolhem e abracam. Simbolos podem ser tradiges culturais, juridicas e politicas, mas também elementos da natureza. Uma nac3o pode identificar-se por uma montanha, um rio, uma floresta, uma drvore, um animal etc. O tipo de configuragao natural e geogrdfica de um pais faz parte do sistema de orientacSo simbélica de um povo. Por isso € importante preservar a natureza e criar atitudes de defesa e apreco em relacso a cla, ogre modeld parte da importancia do co- nhecimento—ty natureza para a formacéio do aréter moral dos seres humanos. Conhecer a natureza nao é apenas um fato puramente in- To 5M, SAGOFF, On Preserving the Nature Environment, The Yale Law Jounal 84 (1974) 205-267; 1D., The Economy of the Earth, Cambridge: Cambridge Univer- sky Press, 1988, p, 124-145. [, Kdebimica i, 4 Ta Sinn Erica assent, 19 Ly telectual, mas que leva a uma redefinicso de si( = mesmo e do mundo. Considera a natureza em~ ‘seu valor transformative para o ser humano e 5 % n&o tanto em seu valor intrinseco®. Por valor ( transformativo entende-se a canacidade do conhecimento da natureza_de corrigit_prefe- réncias irreflexas ¢ ime¢ jecisbes es- clarecidas. A ecologia como ciéncia é um exemplo déssa capacidade de chegar a deci- , © sdes adequadas 20 meio ambiente, porque v8 ‘<> © Ser Rumano fazendo parts nie S dade_biética e depei la para sua so- «0 brevivéncia. Ensina a conhecer os niveis de in-> terdependéncia dos diferentes elementos de — um ecossistema, preservando o equilibrio e prevendo conseqiiéncias de uma intervencdo humana. Assim, 0 conhecimento ecoldgico , ajuda a esclarecer preferéncias e a fundamen- \ tar decistes etteas————— ] eet ee Ly CUR: WV GEN ADDU c | —— 0 Tried AMHEa (© 9.6. NORTON, why Preserve naturel Variety? Prince ton: Pnncator Unversty Press, 1987; Iby Eoltemo- logy and Enviromental Ethics, The Monist 75 (1992) 208-225, AN Px eve 2 EF [ “20 José Roque JuNcES “ Unttereeo modeipvtegta a fruigéo das “.. belezas naturals, sublinhando a conexao en- SSS tre a preservacao do belo natural e 0 aperfei- /-. Soamento do caréter moral dos seres huma ||” nos’, Defende o valor intrinseca da natureza e —. nao apenas 0 simbélico, a harmonia e o equili- = brio das belezas Raturais, protegidas por si < mesmas e n3o por seu valor instrumental, > Assim, a natureza merece tutela” moral en- © quanto tal. Essa preservacao possibilita mais qualidade humana, porque a contemplagio do (2 belo possibilita um ser humano melharem seu caréter. Esse modelo faz uma analogia entre o belo artistico e 0 belo natural para a criacdo de um mundo methor e para a elevacéo moral € espiritual dos seres dotados de consciéncia. 0 Ultimo modelo prega uma mutagSo da gestalt e uma ultrapassagem da ética. No pretende elevar e estender a sensibilidade mo- ral_do ser humano, mas modificar 0 modo de co-eetehuinen roan 7 £. C HARGROVE, Foundations of Environmental Einics, Englewood clifs: Prentice Hal, 1989; 10., Weak anthropocentrie Intansee Value, Tne Monit 73 (4992) 103-207. A fe SD MU ORR ETICA AMBTENTAL, 2 viver e sentir em relacéo ao meio ambiente, N&o visa chegar a um ser humano melhor e moralmente superior, mas 2 um ser humano novo e diferente, que tem com a natureza uma relac&o emotivo-afetiva, mais do que ético-ci- C} Vil, tico-intelectual ou ético-estetico, como / ) acontece nos modelos anteriores. Por Isso de~ signa-se como ecologia profunda (deep eco- logy) em relacdo 8s demais, tidas como super-\, ficiais. E defendida pelo filésofo noruegués ‘\\ Ame Naess®, Trata-se de uma superacdo.da \ ética_e uma reestruturagio dos paradigmas COSTES: SORE ETGIENIS © afetvos com N\ vistas @ um alargamento € mutagdo da sensibi- lidace humana. —F écologia profundg afirma que nao se pode reduzira crise ambiental exclusivamente a um conflito ético, pois ela requer_uma mu- danca de paradigmas conceltuais e de gestalt na percepgao da configuracao_do_muntto.-O modo de perceber 0 mundo e de entender o lu- gar do ser humano nele deve mudar. Portanto, fo00 [Viste >] NWORR BA. NAESS, Ecology, Community and Lifestyle, Cam- bridge: Cambridge University Press, 1989, x 22 José Roque JuNGES no se trata de uma ética cor racdo de nommas © Imperasvos. mas de uma sofa con versdo € exceléncia moral. O modelo de ser humano egoico, compreendido como individuo isolado e separado do mundo, transformando a (atureza em objetojque se encontra a seu dis- por, cria patologias ambientais corresponden- >tes a patologias psicolégicas, pedagégicas e sociais. E necessério superar a concepcso do ser humano coma espécie dominante « sepa- rada do mundo, despojando-se do seu isola- mento individualista e colocando-se no ponto de vista de todos. Trata-se de assumir uma perspectiva holistica, adotando formas trans- pessoais En atitudes junto a natureza. Assim surge um ser humano ecoico em vez de egoico, que se compreende essenciaiment® como um ser em relacéo.—§ ~-O modelo de ecologia profunda preocu- pa-se com uma mutago radical do paradigma de percepco da natureza por parte do ser hu- mano. Por Isso, ainda se encontra entre as éti- cas ecoldgicas que tém 0 ser humano como ponto de partida. Mas, a0 mesmo tempo, ela abre para 0 seguinte conjunto de éticas que Erica amacenral 23 privilegiam a vida como enfoque para a cons- trugéo do discurso ético, 5 VR, vr 2. Blocentrtsmo 1 DIAN TE As| tendéncias_antropocéntricas) defen- dem a respensabilidade-eo-ser humano para com a natura (or the sete) -STaUETD as blocéntricas;teveres diante da natureza (to the nature). Em outras palavras, titular de direitos. Os biocéntricos referem-se a deveres-dirates e nao apenas indiretos para com 0 meio ambiente, so criticos das posicdes antropocéntricas, postulando um valor intrin- sseco para a natureza e rejeitando uma diferen- ga de tratamento entre seres humanos e tipos de tendancias éticas umas que privileglam “entidades individuals (biocentrismo mitigado), Sutras que acentuam totalidades @ processos naturais irredutiveis ads ~seus_comporentes (biocentrismo Gtobat ou ecocentrismo). wate A José Rogue JuNGES ) SNOVIQATS 2.1, Biocentrismo mitigado © biocentrismo mitigado defende que en- tidades _individuais detentoras de vida e de sensacbes_merecem-a-tuteia-morat-porque Ses de direitos, Existem diferentes modelos mitigados de biocentrismo. O primei- ro é defendido por T. Regan’. Parte do principio de que todo sujeito de vida merece considera s&0 moral. Sujeito de vida € aquele ser que Possui um™ponto de vista” sobre a sua prépria vida, a base da qual vida por suas sensacdes Pode aparecer melhor ou pior para quem a & vive, independentemente dos significados de & SS utilidade para os outros. Quem possul esse AS Ponto de vista € depositério de valor inerente, ANY sendo titular de direlfos inaliendveis e no so. \ frendo_alteragées ou interferéncias em seu Q) Curso vital. Sujeitos de vida exigem respeito BY) por razio de justice e no pogmotivos de com: g APA 9. T. REGAN, The case for Animal Rights, Los Angeles: ‘The Regents of the University of California, 1983; 1D., Does Environmental Ethics Rest on a Mistake? The Mo. nist 75 (1992) 161-282, Ertca aMBIeNTAL 25 paixdo. {do podem ser reduzidos a puros obje- tos. Ter um ponto de vista significa para Regan possuir ta-se de um biocentrismo mais radical, que & parte des conhecimentos cientificos da-ecolo- do reconhecimento da natureza como um A. conjunto interdependente e do lugar do ser hu- mano nesse conjunte, para chegar a normas Ny cir GSO ay mela amblenEeS beter que merecem consideragéo moral no tanto enti- dades individuais, mas os conjuntos sistémicos (ecossisteras, biosfera, cadeias alimentares, fluxos energéticos).. Um primeiro modelo de blocentrismo ra- ‘Zdical valoriza a vida enquanto tal,(ndo como propriedade de entidades individuals, mas de totalidades complexas e estruturais e de pro- cessos biéticos. A vida 6 um processo de tipo global no redutivel 20 valor dos organismos singulares. A vida dos individuos depende dos fatores que possibilitam a reproducao da vida nos ecossistemas. Nesse conjunto interdepen- dente de condigées bidticas pulsa a vida por meio de inter-relacBes que equilibram os pro- cessos vitais. Os préprics ecossistemas detém vida pelo equilibrio de suas cadeias alimenta- res e fluxos energéticos. Esse modelo do valor da vida inspira-se tica do respeito 4 vida) do tedlogo luterano ETICA AMBIENTAL, 29 e missionario na Africa Albert Schweitzer’”, defende uma moral-de solidariedade e de sim patia a toda forma de vida (humana ou ni humana) re qual'se encontra a"vontade de vi- ver", que, na verdade, pulsa em toda a Terra, conferindo a todo vivente uma aura de sacrali- dade. A*vontade de viver” & um contingum ir Giferenciado, que nao admite distingSes entre formas mais altas e mais baixas de vida. O principio do respeito & vida (Prinzip der Ehrfurcht vor dem Leben) expressa-se numa frase que se tornou paradigmatica da ética de Scnwetzer eu sou vida que quer viver em meio a vida que quer viver” (Ich bin Leben das leben will inmitten von Leben das leben will). & vida € 0 dinamismo sagrado que pulsa em toda a natureza. Por isso tudo o que tem vida é mo- ralmente relevante e deve ser respeitado. Schweitzer defende um tipo de ética da sacrali- dade e respeito 8 vida comparavel as religides hindufstas: Johnson e Goodpaster apresentam uma versio secularizada da ética da sacralidade da 12. A.SCHWEITZER, Kultur und Ethik, Monchen, s.ed. 1958, = --® ——— 30 José ROQUE JUNGES vida de Schweitzer. 0 discurso ético tem inspi- racao e fundamentacao mais biolégicas e eco- \6gicas. Substituem 2vontade de viver” pelo “interesse de bem-estar” dos seres vivos"?. Por serem entidades de bem-estar, os seres vivos nao dependem de um juizo de valor humano, 3S de um dado constitutivo da realidade vi- vente, Interesse de bem-estar tem aquelas realidades com unidade organica e auto-iden- tidade. Engloba tudo aquilo caracterizado por processos auto-referenciais ou autocentrados © regulado por esquemas homeostéticos de aco € retroacéo. Interesse de bem-estar nao €algo que se tem, mas se é. Deixar de ter inte- resse ce bem-estar é deixar de ser, pois 0 que é funcional para a exist8ncia do ser vivo faz parte de sua natureza. A vida é 0 préprio fun- 13. L. E. JOHNSON, 4 morally Deep World. An Essay on Moral Significance and Environmental Ethics, New York: Cambridge University Press, 1992; K. E. GOODPASTER, On Being Morally Consigerable, Jour- nal of Philosophy 75 (1978) p. 308-325; 1D., From Egoism to Environmentalism, in: K. E. GOODPASTER / K.M, SAYRE, Ethics and Problems of the 21” Century, Notre Dame: University of Notre Dame Press, 1979, p. 21-35) ErIca AMBTENTAL 31 cionamento. Os seres viventes tém interesse anfer-se no processo bioldgico da vida em desenvolvimento, pois faz parte da sua na- tureza. Tém interesse de bem-estar tanto as entidades como os sistemas. Outro modelo de ética biocéntrica global é a chamada Etica da Terra (Land Ethic), propos- ta em {1949 pelo americano Aldo Leopold, es- tudtoso de ecologia da Universidade de Wis- consin'*, Ele i6logo € por isso mais in fluenciado por Ds ie por Kant e Bent- ham, inspiradores dos principais paradigmas éticos modernos. O paradigma bioldgico de Leopold centra-se no altrufsma e no no egois- mo. Os seres humanos so ligados aos seus emelhantes por sentimentos de simpatia, que Hume e Smith chamaram de sentimentos To rais. Se estes sentimentos valem para a comu> nidade humana, pode-se também despertd-los em relago a uma comunidade ecolégica, Esse € 0 ponto de partida da ética da Terra, de Leo- 14 A. LEOPOLD, A Sand County Almanac with Essays on Conservation fram Round River, New York: Oxford University Press, 1966, A \e Wigro = 32 José Rogue Junces pold. Para ele, qualquer ética desenvolvida até agora apéla-se sobre uma Unica premissa: 0 individuo como membro de uma comunidade © de partes independentes, A écologia acrescen- sta que é necessdrio alargar 0s confins da co- munidade para incluir solo, 4gua, plantas, ani- mais e coletivamente a Terra. 7) Para Leopold, uma atitude é moralmente juste quando tende a preservar a integridade, a estabilidade ¢ a beleza da comunidade bidti- ca. Errado é fazer o contrarid.’ Sua ética esta fundada no sentimento e na pertenca a uma comunidade, tendo uma proposta mais holisti- ca do que os paradigmas modernos. Deriva va- lores éticos ambientais Ue fatos conhecidos da ecologia, da biologia evolutiva e da psicologia humana, Partindo de Hume, Leopold afirma que 0 conhecimento de fatos pode produzir dois tipos de conduta: suscitando paixao, res- peito, amor ou descobrindo a ligagdo entre causa ¢ efeito que avalia qualquer paixio. —~s Abiologia levou a humanidade ao conhe- cimento de que todas as formas de vida, inclu- sive a humana, dascendem de antepassados comuns. A biologia evolutiva mostrou o paren- tesco comum de todos os viajantes da aventu- loNatyao Erica AMBIENTAL 33 ra da vida, O conhecimento desse fato suscita amor e respeito, como quando conhecemos Parentes. A biologia ecoldgica faz tomar cons- ciéncia da existéncia de comunidades bisticas, ‘4s quals estamos ligados como membros, liga es nao menos estreitas do que com comuni- dades humanas. Esse conhecimento desperta sentimentos de lealdade e adeso, semelhan- tes aos que experimentamos em relagao a con- Juntos sociais e nacionais. Os pressupostos da ética de Leopold siioo conhecimento de que a Terra é uma comunida- de bidtica, 0 consequente despertar de senti mentos de amor e respeito em relacao a ela e, a partir disso, 0 surgimento de uma cultura da Terra. A ética da Terra de Leopold inspirou ou- () tros modelos. O primeiro é a ética ecoldgicade H. Rolston IIT", que parte de um pressuposto 15 H. ROLSTON INL, Philosophy Gone Wid: Essays in Environmental Ethics, Buffalo: Prometheus Bo9ks, 1986; ID., Environmental Ethics: Duties to and Valves ‘In Nature, Philadelphie: Temple University Press, 1988; 1D., Disvalues in Nature, The Monist 75 (1992) 250-278. 32 Jost Rogue Junces pold. Para ele, qualquer ética desenvolvida até agora apéia-se sobre uma Gnica premissa: 0 individuo como membro de uma comunidade SS de partes independentes, A ecologia acrescen- <= ta que € necessario alargar os confins da co- munidade para incluir solo, 4gua, plantas, ani- mais e coletivamente 2 Terra 7) Para Leopold, uma atitude é moralmente justa quando tende a preservar a integridade, a establlidade e a beleza da comunidade bidti- ca. Errado é fazer 0 contrarid, Sua ética estd fundada no sentimento e na pertenca a uma comunidade, tendo uma proposta mais holisti- ca do qué Os paradigmas moderos. Defiva va- lores éticos ambientais te fatos conhecidos da ecologia, da biologia evolutiva e da psicologia humana. Partindo de Hume, Leopold afirma que 0 conhecimento de fatos pode produzir dois tipos de conduta: suscitando paixéo, res- peito, amor ou descobrindo a ligagéo entre causa € efeito que avalia qualquer paixéo, —~s A biologia levou a humanidade ao conhe- atender as crescentes necessidades humanas, © desenvolvimento de tecnologias com impac- = to sobre o ambiente, 0 uso ¢ a exploracao de novas fontes de energia, o aumento exponen- cial da populacéo, o aumento da complexidade DADE © EE Erica AMBIENTAL 53 dos sistemas sociais pelo surcimento de clas- Ses sociais © pelo desaparecimento de modos alternativos de vida devido & massificacao cul- |<) tural. Tudo isso levou a um dissidio crescente entre a sociedade humana eo meio ambiente, a divistes e discriminagdes na sociedade hu- mana, Podem-se apontar vérios indicios desse reducionismo no modo de relacionar-se com a natureza. Os métodos de andlise e de inter- vengao no ambiente natural, processados pela clencia e pela técnica, s80 inadequados, por- ‘!\ que 0 conhecimento foi dividido em especiali- dades, fragmentando a natureza pela falta de um saber do conjunto. A ecologia surgiu justa- & Y mente para responder a essa necessidade de uma cultura sistémica. Essa fragmentacéo da 3 natureza corresponde a fragmentacao da pré: pria sociedade cividida em classes socials, es- pecialidades setorials e trabalhos e orientada a. produco econdmica, 1 ‘A tecnologia teve um crescente desenvol- vimento, motivado pela ideologla do progres- so, sem atender s suas repercussées sobre 0 ambiente. As conseqiiéncias desse desenvolvi mento preocupam e sociedade e a opinifio pu- lll Q54 José Roque JUNsEs © blica esté apenas acordando para elas. Aconte- ceu concomitantemente uma nitida separago S entre ciéncias naturais e humenas, entre ma- teria e espirito, entre ciéncia e f8, entre econo- = tia e ética, entre individuo e sociedade, difi- cultando uma reagéo critica. Essa separagio NS corresponde a0 processo de especializacao e -positivagéo do conhecimento cientifica, 0 aumento gradativo ¢a populacSo levou 2 uma maior procura de beens extraidos da na- Stureza € 2 um incremento da tecnologia < Assim, os mecanismos de adaptagio e equlli && brio da natureza foram destruidos e a prépria \S adaptacae cultural do ser nummano ao ambiente = foi quebrada, provocando resultados desastro- sos. O modo de os humanos perceberem a na- tureza e 0 ambiente passau substancialmente por dois momentos. A revolucao cientifica mo- revolugao clentifica m derma destruly-ocatdtereakerion de percep -cientifica das sociedades tradicionais, levendo a um vsao reducon le. Sob 0 estimulo da pesquisa em ecologia, 2 ciéncia dos sistemas e 0 enfoque estruturalista repropuseram uma viséo Integral da realidade natural e social. Assim, estamos diante da estamos diant a. ETICA AMBrENTAL 55 emergéncia de um novo paradigma de percep- go. e compreenséo da realidade, inspirado pela ecologia que pretende superar a visdo li- mitada.e estreita da racionalidade instrumen- talmoderng. E necessdrio assumir uma racio- nalidadeGialégica, bioempatica e holistica para acercar-se da realidade natural e social, para dessa maneira fazer frente aos desafios ambientais. © paradigma ecolégico ¢ uma critica radi- cal & autonor paclnssta slasmoserladas uma proposta de compreens%o da realidade em suas inter-relagées @ no como pura soma de entidades individuals. Amplia a pura pers- pectiva intersubjetiva dos humanos e tenta In- cluir também a consideracSo das interdepen- d&ncias e interligaces com os seres vivos e com 0s ecossistemas e a biosfera Um sistema vivente (ecossistema) ndo & a pure justaposi¢ao de seres vivos e fatores que possibilitam a vida, mas um complexo de interagdes de dinamismos vitals. A Terra (ecosfera) um ambiente diversificado e va- riado de subsistemas: litosfere, hidrosfera, at- mosfera e biosfera, Pela fotossintese das plan- S tas, pela alimentacao e evacuacao dos animais 56 José Rogue Junses € pela acéo decompositora dos microorganis- ‘mos instauram-se complicados sistemas de re- laces entre esses subsistemas. A matéria inorgénica, o calor e a luz solar so englobados nos processos da vida por meio de ciclos bio- geoquimicos e de fiuxos de energia auto-regu- lades para impedir e solucionar perturbacdes nos equilibrios, A dindmica essencial da vida soa absor- 80 € 0 consumo de energia, As plantas arma- zenam energia que vern do Sol, os animals co- mem ervas ou outros animals, acontecendo trocas de energia. Os microorganismos de- compéem os seres vivos que morrem, possibi- litando @ liberacgo de substncias quimicas (nitratos e fosfatos), que, por sua vez, so de novo absorvidos pelas plantas e recomeca o ci clo. A lenta evolucéo desse proceso global da vida deu origem & biosfera e possibilitou o sur- gimento de suborganizagées funcionais, iden- tificadas com as diferentes comunidades biéti- cas. © processo da vida é formado por subs- t€ncias quimicas nutrientes, que continuamen- te circulam nos seres vivos pela transformacao ou acumulacgo; pela energia que entra e & SD (ErIca amerenTaL 57 Processada pela fotossintese das plantas, transferindo-se para os animais pela alimenta- 0 e dispersando-se em energie calorifera; e, finalmente, pelos seres viventes, que so a chave de circulago de energia vital nas comu- nidades bisticas. e © ser humano & um elo desse proceso. Esté inserido no ambiente fisico, quimico e bio- '6gico, implicado como qualquer outro vivente os processos de circulagéo das substancias nutrientes, de fluxo de energie e de manuten- 0 do equilfbrio. Mas o ser humano, diferente dos outros seres, desenvolveu um confronto cultural com 0 seu quadro vital, enfraquecendo sua relagéo dependéncia do ambiente bidti- co, Pela cultura, 0 ser humano cria um geren- ciamento do ambiente, conferindo a este iden- tidade prépria em harmonia com 0 ecossiste= ma natural ou comprometendo dramaticamen> te 0 seu funcionamento, As sociedades humanas desenvolveram a capacidade de intervir no ambiente e nos pro- cessos naturais, sequindo objetivos e modelos \ préprias. Por isso elas tém a responsabilidade ética de preserver a qualidade do ambiente em \ que ager no USO _dessa capacidade. Ja que eee ww, 58 José Roque Junces existe a capacidade de intervenc&o na nature- = \ Za, sua preservacéo é uma exigéncia ética, = ) porque depende da deciséo humana. Esta é a base da ética ambiental. Para os seres humanos, o.ambiente so tem o mesmo valor do que o ambi ral ) @ ambos concorrem_para formar o ambiente st humano. A estabilidade desse ambiente de- {SS pende de um equilibrio sadio entre as condi- = Ges sociais e naturais. Um desajuste entre so- ciedade e natureza origina uma crise ambien- tal. Os ecossistemas humanos (aldeia, vila ou cidade) nascem, amadurecem e entram em decadéncia, assim como os ecossistemas na- turais, segundo as relacdes entre o ambiente natural, @ realidade biolégica da populagéio e as expressdes sociais, politicas, econdmicas e religiosas do grupo. Nesse sentido, a crise eco- légica aponta para a decadéncia do atual para- <> digma de intervengéo no meio ambiente e de convivéncia entre os seres humanos e destes com a natureza. A situacdo de fome, pobreza e injustiga de \\L) multidées de seres humanos é a face social da _)-crise ecolégica. 0 mesmo sistema que degrada a natureza, reduzindo-a a mercadoria, avilta a T & (LE AMP SAFES 0 DA. TyviRuoy’ Sl Erica aMBIENTAL sot) existéncia das pessoas submetidas a uma luta didria pela sobrevivencia, porque nao partici- pam do mercado. As feridas infligidas ao meio ambiente sdo mais tragicas e devastadoras, quando acompanhadas de chagas socials que empurram grandes maiorias populacionais de paises pobres a uma procura desesperada de meios para satisfazer as necessidades basicas. Nessa crise civilizacional, 0 grito desesperado da natureza levanta-se em unissono com 0 gri- to angustiado de milhdes de seres humanos em respeito aos mecanismos de reproducdo da vida, da qual dependem, e aos diversos fatores naturais e sociais, que a possibilitam. A crise ambiental no tem soluc&o sem uma convivén-, cia social justa e um acesso igualitdrio ao: bens necessarins & sobrevivéncia. <0 aradigma ecolégico’syraiu para fazer) 5 frente a essacrise- Na0 bastam solucdes cos-) méticas; impée-se uma mutagdonapercepcso| © da realidade, especialmente na relacéo com al \, natureza e na construgdo do entorno social, « Isto exige 0 surgimento de uma nova comp! ensSo do préprio ser humano, um modo dif rente de construir o discurso ético e uma vist renovada da natureza como criacdo de Deus, i v José Roque Junce: debate entre antropocentristas e biocentristas Insere-se nesse contexto e implica questées de antropologia, de ética e de teologia da criacSo. Sem a explicitacdo dessas questées permane- ce 0 impasse € nao se chega a um discurso ét co consistente. Este € 0 abjetivo dos préximos i eapitulos. (> 0 paradigma ecolégico veio para superar © paradigma moderno da autonomia humana Solipsista, da aventura de conquista ¢ de domi- pe da natureza pela ciéncia e pela técnica, do juso desmedido e do desfrute imprudente dos & [recursos naturais, por im, questionara dicate: S | mia entre o regime da natureza e 0 regime da S | sociedade, a perspectiva da ética procedimen- >| e utltarista, IV, VISAO ANTROPOLOGICA CONDIZENTE COM © PARADIGMA ECOLOGICO. Nas criticas que posigdes antropocéntri- cas e antiantropocéntricas fazem uma contra a outra esta subjacente uma certa concepio de ser humano. O ponto de partida da argumen- tag&o e 0 objetivo da critica so antropolégi- cos. As duas tendéncias confrontam-se critica- Mente com a viséo moderna do ser humano. O ponto de referéncia € 0 ser humano auténomo ¢ empreendedor, vencedor das determinacées e auto-suficiente, dominador da natureza cad- tica_e conguistador do mundo_O-contexto.cul- tural do debate critico ¢ a modernidade. Nas posicGes antropocéntricas existe uma maior aceitagéo dos pressupostos antropalégi- cos da modernidade, apesar da critica ao modo como o ser humano se relaciona com o meio ambiente, 0 ponto de referencia & sempre o ser humano, e um ser humano auténomo e isolado em relagao ao conjunto de interdepen- [éncias do meio em que vive. Nao existe uma oeradga Cen DeRie eta 61 MiG OMPE

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