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A corporeidade e a criatividade na Educagdo Infantil ea busca e a vivencia de direitos deve consagrar todos os graus de escolarizagio e todas a8 disciplinas que compdem a ideia de curriculo escolar, a conporcidade nio foge aeste fim, le- vando-nos a entendé-la como principio bésico que deve pautar a ago do professor de Educagio Fisica na Educasio Infantil ‘A corporeidade pode ser entendida como corpo em movimento aque busca a vida num determinado tempo histérico e cultural. Dat ele- ger a corporeidade como um dos eritérios para 0 conhecimento da area dda Educasio Fisica na educasao institucionalizada nos predispoe a ten- tar superar a dicotomia hist presente na educagio entre conheci- mento sensivel ¢ conhecimento racional. Nébrega (2005, p. 80) ja afirmava que: A nosao de corporeidade, abrangendo o corpo vive esignificante, “fundado na facticidade ¢ na cultura, supera a dicotomia biold- gico-cultural e expresia a unidade do ser no mundo. E, pois, 0 conceito mais coerente para estruturar 0 conhecimento do corpo na Educagao Fisica ‘Aleieura do corpo nada mais € do que um processo de conscienti- ‘zac, de afirmagao da personalidade, da individualidade, do sentido de pertenga & etnia humana. E isto deve ser ji, de maneira adequada, um dos propésitos da Educasao Infantil, mediante a presenga da Educaslo Fisica, procurando evitar a utiizagdo banal do conceito de corporeidade. 50 entendimento de corporeidade leva-nos a considerar que a realidade do corpo vai muito além das dicotomias corpo e mente, natureza e cultura. A corporeidade mostra, segundo Merleau-Ponty (1992), o sentido de con: ia como um processo encarnado, en- contrando ai o sentido de percepsio, A crianga, aluna da Educagao Infantil, é corporeidade signifi- cante € no pode perder essa importante caracteristica. Mas, a0 Criongas exploram movimentos om diferentes posicées do corpo na lira 51 52 analisarmos a vida humana nas mais variadas dimensGes, vemos que isso se perde. Assmann (1994, p. 72) jé nos alertava: Nao é verdade que, num sentido muito real, temos imensa difi culdade em ser nosso corpo, porque jé nos inculearam, de mil ma- neiras, que tems tal ou qual corpo? Ou seja, mais do que da sua werdade e real substincia, nossos corps so corpos que nos disseram aque temos, corpos inculcados eensinados, fitos de linguagens, sim bolos e imagens. As culturas, as ideologias, as organizagées sempre inventam um corpo bumano adequado econforme. Claro esta que a Educasio Fisica, ao intervir sobre o corpo € © movimento, deve buscar trabalhar com vivéncias de satide, de bem-estar, de desenvolvimento de capacidades orginicas, mas deve tornar mais amplo seu campo de referencia, abordando questes de ética ¢ estética do movimento, de beleza e harmonia de gestos, de possibilidades de identidade do ser humano com a sua cultura (Nébrega, 2005). Optar, por meio da Educacio Fisica, pela introdugio da arte de se movimentar, recorrendo ao jogo como elemento fundamental para a.asio dessa érea de conhecimento junto a Educasio Infantil, é con- tribuir para que a corporeidade do aluno seja edueada, em primeiro lugar, para 0 conhecimento da condigao humana. Ou, como jé evi- denciado em Moreira e¢ al. (2008, p. 140), Ocntendimento da corporcidade deve nos levar a reconbecer que todo desenvolvimento bumano significa o desenvolvimento con- junto das autonomias individuais, das participasées comunitd- rias e do sentimento de pertencer & espécie bumana. Dat a necessidade da essencialidade de uma ética do génera bumano. — A corporeidade e a criatividade na Educa¢do Infantil A corporeidade em movimento, propiciada na Educagio Infantil por intermédio do jogo, traz prazer ao ato de conhecer, de conviver, de estar na presenga de outros. Isto pode ser um dos critérios para definis, inclusive, 2 agdo dos professores de Educagiio Fisica junto @ Educagio Infantil. Recorrendo a Freire (2008), vemos que o autor afirma que a rea~ lizagio humana depende do reconhecimento de que nossa vida € uma vida de realizagio corporal. Para isso, a pritica mais adequada para cumprir esse designio é a pritica lidica. Por exemplo, quando as criangas precisam realizar um jogo coletivo, cuja solusio de pro- bblemas requer cooperaso, isto demanda tentativas, didlogos entre todos os envolvidos, fatores estes que desenvolvem consciéncia sobre a habilidade de cooperar. O ser humano deve se realizar buscando ser aquilo que ele é. Diz mais 0 autor que, infelizmente, nas escolas, as criangas nao sto tratadas como ctiangas (Freire, 2008). Aqui também aparece a importincia da Educagio Fisica na Educagio Infantil, quando propde uma pratica prazerosa respeitando as caracteristicas do ser crianga, tratando-a como tal, por meio da instrumentalizagio do hidico. ‘Nunca é demais lembrar, e por isso a importincia do trato com ‘tema corporeidade, que eu nao existo porque penso ou porque cla~ boro imagens do que sou, mas eu existo porque vivo e essa vivéncia nijo se faz. sem corpo. Assim, corporeidade ¢ a expresso da minha existéncia no mundo, na cultura, na histéria nada posso realizar ou conceber se nao existiz corporalmente. Ter o sentido de corporeidade como principio para 0 trabalho na Educagéo Infantil é recuperar 0 compromisso da elevagio da 53 54 Capitulo 4.2 Criangas dangando em aula de ‘Movimento, concepsiio de humanidade jé exstente no mundo gre8° & sua era clissica e perdida a0 longo do tempo. A erianga grega c= educada na Agora (local de reunifo ¢ de reflexdo dos fildsofos na Grécia Clissica) ¢ no Ginisio (local e momento em que s¢ aprendia ¢ vir vyenciava a Gindstica) com a mesma intensidade. A Educagso In- fantil pode ser 0 primeiro passo na diregio da recuperagio desse sentido de educagio de um corpo unitirio, indivisivel, hominal em gua esséncia ¢ humano em sua existéncia. "A Educagdo lafantil, por meio da aco da Educasio Fisica, pode colaborar para a superagio do racionalismo modemo, 0 qual criow métodos gindsticos visando adaptar corpos as exigéncias da socie- dade industrial emergente, controlando energias corporais em funsio do aprendizado intelectual. oe 7 2 soccer amg A corporeidade e a criatividade na Educagiio Infantil A Educagao Infantil, permeada pela area da Educagio Fisica, pode contribuir para a luta de deixar a crianga ser crianga por mais tempo, impedindo métodos educativos que sc destinem a trans- formé-las em adultos precoces. Educagao como direito de todos os seres humnanos, como vivén- cia da corporeidade deve também nos propiciar a preocupagio com 4 criatividade, elemento bem presente nas criangas na Educagio Infantil. Uma aprendizagem focada mais nas fruigdes do que nas ferramentas ou nas utilidades deve ser completada com priticas Pedagogicas criadoras, as quais desenvolvam um novo sentido de teoria e pratica, ambas num sentido de unidade, de dependéncia muita. A pratica criadora possibilita a reflexio sobre o trabalho pe- dagégico, proporcionando a construgao de novas praticas educativas, ocasionando 0 aparecimento de uma politica para uma sociedade mais justa e democritica. As priticas criadoras estruturam-se em quatro categorias: com- promisso ético, politico e democritico; postura reflexiva; competén- cia técnica, e relagio entre professor e aluno. Silva (2010, p. 76) ainda nos alerta: Compreender essas caracteristicas significa perceber que nao estou referinde-me a um modelo ideal de professor, mas de sujeitos em formagiio, num processo que ndo esgota em um curso, mas se am= lia a partir dele, considerando saberes constitutdos bistorica~ ‘mente por esses decentes, seus valores e experiéncias, Das priticas criadoras pode-se passar também para a importincia da criatividade no ato educativo na Educagao Infantil. Aqui também as priticas motricias podem contribuir. A motricidade das criangas 55 ETS ean | RP Capiulo 4.2 liberdade de agi troca de regras nos jogos; busca de novas possibilidades de so- pode vir acompanhada da criatividade, que possibilitar lugio de problemas; flexibilidade ante os modelos determinados de agi; clima lidico e descontratdo; realizagao dos desejos; cooperacio, accitagio e respeito. Cao (s/d) indica que a criatividade pode contribuir para 0 desenvolvimento de algumas condutas que representam valores para a qualidade humana, Diz a autora que estes valores podem estar em diversas esferas como: no Ambito Motor — ao explorar e vivenciar formas de expressio e possibilidades motricias pouco usuais; otimi- zando ¢ facilitando o desenvolvimento perceptivo-motor; ao explorar novos espagos, materiais ¢ relacionamentos com os demais alunos; por meio da espontaneidade corpérea. No Ambito Cognitivo - 20 desenvolver a capacidade criativa e 0 pensamento divergente; melhorando a capacidade de processamento, ordenagio e elaborago da informacao; potencializando a flexibilidade, a fluidez, a origina- lidade, a espontaneidade, a sensibilidade ¢ a adaptasio; ao adquirir habito de prever possibilidades ou situagées futuras. No Ambito Afetivo — 20 melhorar a autoestima; favorecendo a motivagio; a0 ser educado na liberdade, na autonomia, na responsabilidade e na tomada de decisdes; ao criar situagdes de alegria, desinibigio, prazer, amizade e bem-estar. Importante salientar que jé hé algumas experiéncias sistemati- zadas que esto se preocupando com a criatividade na sua relagio com a aprendizagem formal. Uma delas que aqui podemos mencio- nar é a desenvolvida pelo grupo Kon-traste, constituido por doutores, licenciados ¢ estudantes de Ciéncias da Atividade Fisica e Esportes no Instituto Nacional de Educagao Fisica da Galicia, 0s quais 56 ere errno A corporeidade e a criatividade na Educagao Infantil Criongas exploram integram a equipe de investigago da Universidade de La Coruiia, possibilidades de na Espanha. Esse grupo tem como missio apresentar técnicas cria- en — tivas para estimular 0 pensamento divergente inovador e a imagina- : fo plistico-transformadora. Identificam-se nessas técnicas: 0 carder lidico intuitivo das atividades criativas e imaginativas; 0 valor mo- tivacional das técnicas; 0 valor da novidade dos produtos criativos perante a rotina monétona do jé conhecido; o cardter da participasao discente alegre ¢ inovadora, ativa ¢ dindmica (Trigo, s/d). Ainda apresentando argumentos da importincia da criati dade como presenga pedagégica na Educacio Infantil, por meio da Educagio Fisica, reiteramos, mais uma vez como reforgo argu- mentativo, que cla propicia a liberdade de ago, a mudanga das re- gras de determinado jogo, a busca de novas possibilidades de 57 58 Capitulo 4.2 Criangas exploram «8 possibilidades de movimento com as fitas. solusio de problemas a realizagio dos desejos,a cooperaglo, a acei- tagdo e o respeito (Cao, s/). ¥ com base nestes principios, de direito, de prazer, de corporei- dade, de pritica pedagégica que estimule a criatividade, de jogo, que cestruturamos a proposta para o desenvolvimento do conhecimento do Infantil, ¢ pritica da Motricidade na Educ: A corporeidade e a criatividade na Educagdo Infantil isa Crianga explora 0s movimentot com uma fio SUGESTAO DE LEITURA NOBREGA,T. P. Corporeidade e educagds fisica: do corpo-objeto ao corpo-sujcito. 2. ed. Natal: Editora da UFRN, 2005. PARA REFLETIR Como proporcionar momentos em que a crianga possa viver a sua corporeidade? Sera que as atividades relacionadas ao conhecimento do proprio corpo tém respeitado a liberdade de ago das criangas? Como buscar novas possibilidades de situag6es-problema em que a corporeidade do aluno se expresse? 59 | propostas diferenciadas, Criancas aprimorando © equilibrio corporal em variando as posisées do corpo e explorando novas possibilidades de movimento com diversos materiais. A corporeidade e a criatividade na Educagéo Infantil E importante que © professor atente para outras formas de a corporal, pois sGo movimentos que vée auxiliar no dominio que ela poderd adquirir de seu corpo executando qualquer movimento. 61 62 A importancia da motricidade para a crianga ara elucidar as questdes relacionadas & motricidade, vamos nos aler dos elementos centrais dos significados atribuidos ao termo construtdos por Kolyniak Filho (2007). Primeiro,a motricidade refere-se exclusivamente ao ser humano, diferentemente dé movimento que € um conceito fisico aplicado a qualquer corpo, bem como de motilidade, conceito da biologia api- cével a todo ser vivo que possui a capacidade de se mover. Assim, mo- tricidade pode ser caracterizada como um conjunto de possibilidades que o ser humano tem para movimentar-se, considerando-o como individuo ou como espécie. Segundo, a motricidade é resultante das herangas bioldgica e his- t6rico-sociocultural. Isto significa que as capacidades as habilidades motoras dos individuos sio resultantes de: um processo de aprendiza- gem que ocorre em um tempo ¢ um lugar determinado (hist6rico); um processo acontecido em determinado grupo social, processo esse por- tador/produtor de dada cultura. “Terceiro,a motricidade implica intencionalidade e, portanto, € pro- dutora e portadora de significados. Movimentamo-nos para alcangarmos determinados objetivos. As intengSes que estio por tris desse ato de se movimentar podem ser multiplas, algumas claras ¢ outras pouco defi- nidas, mas esto sempre presentes. A intencionalidade dos movimentos associa-se sempre aos significados que estes tém para os sujeitos e para (08 grupos sociais a que eles pertencem. Quarto, a motricidade representa a forma concreta de interago do ser humano com a natureza e com os semelhantes. A motricidade € a expressio das atividades humanas. As relagdes interpessoais ocorrem pelo movimento, da mesma forma que nenhum sentimento ou pensa- mento pode ser expresso sem a interferéncia do movimento. Kolyniak Filho (2007) ainda justifica a necessidade da inclusto do conhecimento sobre motricidade na escola, por meio inclusive da disciplina curricular EducagZo Fisica, porque esse conhecimento po- deria propiciar questionamentos do tipo: Qual a necessidade de exer cicios motores sistemdticos para diferentes pessoas? De que tipo e em que quantidade as atividades motoras sio adequadas para os seres hu- ‘manos em suas mais variadas faixas etérias e situagdes sociais? Por que as pessoas nao habeis em determinadas atividades motoras se ini- bem em praticé-las junto a outras pessoas? Qual o fundamento dos padrées éticos ¢ estéticos relativos ao corpo e a motricidade que estio presentes nos meios de comunicagio social? Como se manifestam 0 respeito, a solidariedade, a amizade, o amor, ou ainda a violéncia, a ‘opressiio, o desrespeito, nas relagées humanas intermediadas pelo corpo e pela motricidade? Acdvogar a motricidade como possibilidade da Educagao Fisica na Educasio Infantil € denunciar os métodos de confinamento e engorda aludidos por Freire (2010), quando diz que a metodologia mais fre- dquente nas escolas ¢ a do traseiro, com criangas confinadas em salas € 63 64 Capitulo 4.3 carteiras, mais iméveis que porcos ¢ galinhas em seus habitats de en- gorda. Diz mais o autor, que essa metodologia propicia 0 controle cor- poral e quem tem o controle deste passa a controlar ideias & sentimentos. “Quem fica confinado em salas apertadas, sentado e imé- vel em carteiras, milhares de horas durante boa parte da vida, aprende a ficar sentado nas cadeiras, de onde talvez nunca mais venha a se er guer” (Freire, 2010, p.114). Vemos que quando a Educagio Infantil nio leva em considera~ sentarem uma dessas imagens e solicitar que os outros colegas da classe deem sugestées sobre como formi-los. E importante que a classe toda defina uma forma que sera utilizada na aula para identifica essas ima- gens, Escolher outros trios de alunos a que todas as imagens sejam ATIVIDADES RITMICAS E EXPRESSIVAS definidas evivenciadas. Apés essas vivencias, questionar os alunos como poderiam realizar a atividade com todos juntos, oferecendo dicas ¢ es- aso para realizarem as imagens que forem sugeridas. Quando nao aeontecerem sugesties dacas pelos alunos, o professor poe propor una atividade, oferecendo pistas, por exemplo, dizendo que é preciso rea- lizi-la em circulo ¢ observando como elas fariam isso, E importante «Re ele posse apenas dar dicas, mas nio dizer como fazer até que se chegue a0 objetivo proposto na ativdade. Por exemplo, em trios, r= presentar o elefante. Suge ima crianga no meio, de frente a classe, 47a tomba colocando os bragos estendidos em frente ao nari, os ou- tros dois estatio 2o lado, lateralmente a classc, com os brasos abertos em formato de meia-lua, representando as orelhas. Com todas em cfr-

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