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oF Hoffmann Peat wel ue pata Digitalizado com CamScanner Copyright © by Editora Mediagao 2001 Nevhuma pane det aa pe sr reproduc Cicada em autonrase expen o Fn Diregio Editorial: Jussara Hoffmann, Assistente Editoris Eugenio Brauner Revisio de Texto: Rosa Suzana Ferreira ‘Capa: Roberta Martins Editoragdo: Daniel Ferreira da Silva “As ilustracdes do livro so adaptagdes de fotografias tiradas pela autora ao fazer o Caminho de Santiago de Compostela na Espanha DADOS INTERNACIONAIS DE CATALOGAGAO-NA-PUBLICAGAO BIBLIOTECA SETORIAL DE EDUCAGAO da UFRGS, Porto Alegre. BR-RS H699a_— Hoffmann, Jussara Avaliar para promover: as setas do caminho / Jussara Hoffmann. - Porto Alegre: Mediagio, 2001. 144 p. 1. Avaliagdo da aprendizagem. 2. Promogio escolar. I. Titulo. cDU-371.26 Bibliotecéria: Jacira Gil Bernardes - CRB- 10/463 ISBN: 85-87063-46-4 ISBN-13; 978-85-8706-346-5 Faca seu pedido diretamente &: Editora Mediacao vanspalis: ‘Av. Taquara, 386908. Pens Porto Alegre/RS 309188" Beal Printed in Brazivimpres? el, Digitalizado com CamScanner Sumario Introducao BUSCANDO CAMINHOS .... Capitulo | RUMOS DA AVALIACAO NESTE SECULO.. ‘A avaliagio a servico da agio Para onde vamos? Uma ago que se projeta no futuro .. Regimes seriados versus regimes nio-seriados Provas de recuperacio versus estudos paralelos. Consethos de classe versus “conselhos de classe Uma atividade ética As reformas educacionai: A participacao das familias . A educagio inclusiva Capitulo 2 OUTRA CONCEPCAO DE TEMPO EM AVALIACAO aprendiz determina o préprio tempo de aprendizagem.. Cada passo é uma grande conquista Todo aprendiz esta sempre a caminho 47 E importante refletir a cada passo ... 30 A auto-avaliacio como processo continuo... ~ 52 Capitulo 3 AS MULTIPLAS DIMENSOES DO OLHAR AVALIATIVO Delineando objetivo: Aprofundando e ampliando 0 olhar Aanalise qualitativa: multiplas dimensées . O plano epistemologico Os contetidos ei Cendrio da avaliacdo: atividade: Pergunear mais do que responder .. Tansformar respostas em novas perguntas Digitalizado com CamScanner Capitulo 4 - AVALIAGAO E MEDIACAO ‘A dinimica do processO Mediando a mobilizaga© Qual o papel do educador ‘A investigacio de concepgoes Como mediar 0 desejo © a nec’ Mediando a experiéncia educativa Estratégias de aprendizagem Atividades diversificadas ou diferenciadas? Mediando a expressio do conhecimento .. Tarefas gradativas e articuladas ... Respeito as diferentes formas de expresso Uma postura reflexiva do aluno e do professor Capitulo 5 REGISTROS EM AVALIAGAO MEDIADORA Instruments a servigo das metodologias Critérios de correcio de tarefas ‘Alguns cuidac a ———. aboracto de tarefas avaliativas Questées dissertativas Questées objetivas Revo de testes e tarefas ossiés, portholi Digitalizado com CamScanner H A pouco tempo atras, fiz com Nelson, meu marido, o Cami- nho a Santiago de Compostela, na Espanha. Caminhamos muitos dias de mochila nas costas e parando apenas para dor- mir ao final de cada trecho percorrido. Como tantos que vivem essa experiéncia, tive muito tempo para pensar e aprendi mui- tas coisas ao enfrentar situagdes bastante diferentes da vida que se leva numa grande cidade, trabalhando muito, sempre com muita pressa. Em varias ocasides, pensei em avaliacao, construindo al- gumas relagGes entre o que estava vivendo e os principios que defendo para esta pratica. Do diario que escrevi pelo caminho, retirei algumas passagens. Elas servirao de abertura para os ca- pitulos deste livro. Deixo para os leitores a construgao das suas pr6prias relagées entre tais passagens e cada capitulo que, com certeza, serao muitas e diferentes das que pude estabelecer. Levamos varios meses nos preparando para fazer o caminho. Nao € nada facil a decisao de aventurar-se ao desconhecido. E preciso muito preparo e acreditar que valera a pena. Lemos, de inicio, muitos livros de outros peregrinos. Coletamos revistas, ma- pas, folhetos e solicitamos material 4 Associagao Brasileira dos Amigos do Caminho de Santiago de Compostela em Sao Paulo. As leituras nos mostraram que era preciso preparar-se para a longa jornada, caminhando cada dia por mais tempo durante os meses anteriores a peregrinagao. Percebemos que precisariamos de equipamento adequa- do, tais como, botas, roupas para chuva, mochilas e outros. Es- tudamos os mapas com atencao, anotando detalhes de cada trecho em termos de hospedarias, distancias e dificuldades. As experiéncias narradas por outros peregrinos foram es- senciais para minorar a nossa inseguranga frente ao des- conhecido. E foi encorajador sabermos que teriamos a compa- nhia um do outro nessa aventura. EE Digitalizado com CamScanner _.,, SO7inh. lo a B Avaliar para promover as setas do carinho Esse € um trajeto que dificilmente se percorre Mesmo os caminhantes solitarios acabam se reunjn tros peregrinos, porque a troca de experiéncias € a ¢ oO sao importantes, Em primeiro lugar, porque sao Varias as 4 ficuldades do trajeto, principalmente pelo esforco fisico, i bs © qual 0 preparo anterior nunca é suficiente. Caminhar dias inteiros, carregando mochilas pesadas s6 se aprende” ; minhando, Em sequndo lugar, porque se tem uma grande vontade de expressar sentimentos ao longo dos trajetos 5 final de cada dia. Sem dtivida, ha algo maior que move a todos que fazem 0 caminho: 0 inusitado, a dimensao do sonho, 0 desejo de superacao, a vontade de chegar ao destino almejado, 4. cada passo, as dificuldades vao se tornando motivos de jubilo. ca. minhar por dias inteiros é uma grande conquista ¢ os trechos mais penosos se tornam os mais importantes. Por isso os peregrinos precisam tanto conversar uns com Os outros, para contar seus feitos, das bolhas nos pés, dos trajetos ingremes, da beleza das paisagens e, Principalmen- te, para compartilhar do sentimento de conquista. Essa € a ousadia, afinal, que faz 0 caminho ter um sen- tido, que faz a nossa vida valer a pena: a de avancar sempre, superando-nos e€ as nossas insegurancas pela coragem de enfrentar 0 que ainda nao conhecemos. on ™MPaNhig ao Nao é nada facil a decisao de aventurar-se ao desconhecido. E preciso muito preparo e acreditar que valera a pena, Editora Mediagio Digitalizado com CamScanner Introdugo € BUSCANDO CAMINHOS Avaliar para promover é um titulo que poder suscitar diferentes interpretagées, diferentes “leituras”. O termo “promogio” sempre esteve atrelado a decisées burocraticas da avaliagio tradicional, significando 0 acesso a outras séries ou graus de ensino. Minha intencio é resgata-lo em seu sentido original, de acesso a um patamar superior de aprendizagem. de acesso a um nivel qualitativamente superior de conhecimento e de vida. Avaliar para promover uma educacdo digna e de direito de todos os seres humanos. Neste livro, pretendo dialogar com o leitor, para que, juntos, possa- mos reforgar as setas dos caminhos em avalia¢io,a partir do engajamento em ages educacionais comprometidas com uma escola do presente e do futuro. ‘Avangamos (lentamente, é fato), mas houve conquistas importantes, nos ultimos anos, em termos de uma maior reflexio ¢ de um maior nume- ro de experiéncias em avaliacao mediadora por escolas e professores. que resultaram, como revelou o iltimo censo escolar, na diminuigio da repeténcia ¢ da evasio escolar no pai ‘Apesar dos avangos, continua muito grande a polémica em torno da avaliacio. Contribuem, para isso, muitos fatores. A Lei de Diretrizes e Bases encaminha a novas regulamentacées sobre a promogio dos estu- dantes, sugerindo a revogacao das priticas classificatérias excludentes. Em conseqiiéncia, intimeros pareceres, resoluges € normas oficiais somam- se 4 LDB, acarretando miltiplas e, por vezes, confusas interpretacdes dos preceitos legais.A sociedade e os professores ficaram inquietos diante das Feformas educacionais, temerosos, principalmente, quanto as alteracdes em avaliacdo que “podem colocar em risco” a tradicional escola brasileira (classificatoria e elitista). Participo intensamente, como estudiosa na area, dessa inquietagao coletiva, Alegro-me em dizer que oS reflexos desses esforgos, embora Editora Mediagao Digitalizado com CamScanner 7 =, | 10. Avaliar para promover:as setas do caminho timidos, sio positivos e alentadores. Passo a passo,a discussio professor por professor escola por escola, em cada comunidade, em o pais."E preciso mudar a escola e a sociedade para mudar a avalnggoe? defendem alguns céticos. Nao creio.A avalingio & substancialmente’niny xo, capacidade tinica e exclusiva do ser humano, de pensar sobre ot atos, de analisi-los, ulgé-los, interagindo com o mundo e com os ou® seres,influindo e sofrendo influéncias pelo seu pensar e agir. Nao hi tone” da de consciéncia que nao influencie a ago. Uma avaliagio reflexiva anny” a transformagio da realidade avaliada. Humanidade subentende razio, critica, emo¢ao, intuicéo, po. sicionamentos pessoais frente a fatos e acdes do outro, Em tudo, ha sempre o que nos agrada e © que nos desagrada. Partimos para ims mudanga impulsionados pelo desejo de alterar o que nio nos satisfre Assim, creio, repensar os principios de avaliagio que regem uma institu 40 educacional pode ser, sim, um primeiro passo para transformé-la, porque exige discuti-la em seu conjunto: valores, organizacao curricular preceitos metodolégicos, visio politica, comunitdria.Ao discutir a prati. ca avaliativa, cada professor enuncia concepgdes préprias acerca da vida, da educacio, do educando. Dessa forma, ao reunir professores, alunos, a comunidade para discutirem avaliacao, desencadeiam-se e dinamizam-se processos de mu- danga muito mais amplos do que a simples reformulacao de praticas. Uma reflexio conjunta sobre principios que fundamentam a avaliacio nas escolas favorece a convivéncia com diferentes perspectivas individu- ais, ampliando a compreensio coletiva sobre as dimensdes do ser es- cola, do ser educador e do ser educando. O avaliar para promover fundamenta-se em tais reflexdes. Mais do que nunca, percebo a grande maioria dos educadores imersa nessa discussio, inquietos pelas criticas de mal julgar os alunos, pelas criticas de uso abusivo de sua autoridade. Nunca esse poder incomodou a tantos. Retorno seguidamente, em encontros de professores, aos velhos tempos e aos meus primeiros estudos. Percebo 0 quanto ainda é necessé- rio “desafiar 0 mito” da concepgio classificatéria, que reduz a avaliagao a0 controle e julgamento de resultados finais (Hoffmann, 1991). Trabalhando intensamente com a formagio de professores, percebi o avango em ter- mos de discussdes sobre esse tema, mas mudancas ainda timidas em ter- mos das praticas, que permanecem ainda de julgamento, burocriticas, em muitas instituig6es educacionais. ‘Apés a publicacio do meu primeiro livro,as dificuldades enunciadas AMPlia-se auxilig Editora Mediagéo Digitalizado com CamScanner Jussara Hoffmann 11 pelos professores para efetivar a pritica mediadora provocaram-me a es- tudos, pesquisas, e reconstrugio de minha propria pratica, buscando me- Ihor delinear principios e metodologias a partir da contribuigio de tedri- cos, colegas e alunos, e pelo privilégio de poder conviver com professores de todo o pais, de todos as instincias educacionais. Desses estudos, resul- taram duas novas publicagées: Avaliagio mediadora, em 1993, e Avaliagao na pré-escola, em 1996. Vivi como professora, orientadora de estigio, colega, aluna e asses- sora educacional, a dificuldade em vencer a distancia entre os principios concebidos de uma avaliagio mediadora e 0 conservadorismo da socieda- de, de instituigées e de professores, Senti uma grande inquietude ao tentar buscar respostas a tantas perguntas feitas, estabelecendo “Pontos e contrapontos” entre o pensar e 0 agir dos educadores, em 1998. Mantenho a percepsao, apés vinte anos de estudos e pesquisas, que a avaliacio mediadora é uma pratica que esta por ser delineada, mas, hoje, com maior numero de defensores - um processo a ser construido pelo didlogo, pelo encontro, pelo confronto, por pessoas em processo de humanizacio. As inquietagées em torno da avaliagio educacional ampliam-se a medida que se apontam novos rumos para educacio, revelando o tremen- do descompasso dos processos seletivos ainda vigentes nas escolas. Apos dez anos da publicagio do primeiro livro, elaboro, como mais um desafio, esse novo texto. Ele se constituiu, como todos os outros,a partir de estudos e deba- tes sobre avaliagao com muitos e muitos professores de todo o pais.E da certeza de que, mais do que nunca, estio buscando novos rumos e é preciso apontar-lhes algumas direcdes. Tenho a certeza de que esto em jogo os valores mais profundos dos professores quando discutimos sua pratica avaliativa, Muitos se sen- tem acuados, emparedados, até mesmo amedrontados quando sao leva- dos a discuti-la. Precisamos respeita-los em suas incertezas e temores. Nao se podem embasar tais discussdes em certos e errados, em po: ¢6es radicais do “sou a favor ou contra”, mas principalmente promover encontros e estudos para que todos tenham a oportunidade de expres- sar seus anseios, compreender as perspectivas alheias, refletir sobre as proprias crencas. O grande dilema é que nao ha como “ensinar melhores fazeres em avaliagZo”. Esse caminho precisa ser construido por cada um de nos, pelo confronto de idéias, repensando e discutindo, em conjunto, valores, principios, metodologias. Editora Mediagio Digitalizado com CamScanner 12. Avaliar para promover: as setas do caminho Para quem se propée a seguir por esse caminho, faco ainda algumas consideragées, citando as palavras de Valifia Sampedro: E importante nao ter pressa, permitir-se bastante tempo para observar tudo 0 que se passa ao nosso redor e sobretudo cuidar de ter tempo para refletir sobre o que esta vivendo. Jé foram escritos muitos textos sobre o signi ficado e a relevancia dessa trajetéria, Todos eles podem representar grande a- juda a quem se propée a fazé-la, Mas o que Ihe dard verdadeiro sentido sera vive- la com espirito de simplicidade e acolhimento, como uma aventura que pode conduzi-lo a um profundo descobrimento de si mesmo (Elias Valifia Sampedro, E| camino de Santiago, 1993). Editora Mediagio Digitalizado com CamScanner ™m dos aspectos mais fascinantes do Caminho de San- tiago é 0 fato de todo o trajeto estar demarcado por setas amarelas que quiam os caminhantes. O trajeto completo do Caminho Francés ultrapassa oitocentos quilémetros. As setas foram criagao dos peregrinos, mas foram oficializadas em 1984 e, hoje, sao reforcadas periodicamente por um grupo de voluntdrios. Além deles, muitos que fazem o caminho re- forcam e criam novas setas, com fitas, pedras e de outras maneiras. As setas estao por todo o caminho, a tal ponto que é dificil perder 0 rumo. Elas estao desenhadas nos muros das casas, no chao, nas arvores, nas pedras, nas cercas... Basta procurar por elas de trechos em trechos ou nas encruzilhadas do caminho. O que elas dizem de mais forte € que estamos indo na direcgao certa. Sequindo-as, muitos peregrinos, a pé, a ca- Editora Mediagio Digitalizado com CamScanner “= 14. Avaliar para promover:as setas do caminho valo, de bicicleta, cada um do seu jeito e a seu tem; a Santiago ha milhares de anos. As setas também nos dizem que fazemos parte de um, experiéncia da humanidade, que muitos outros ja viveram He estao vivendo. Mesmo 0 peregrino solitario sente-se acompa. nhado, porque elas indicam que outros jé passaram Por ali e outros tantos passarao. De inicio, chegamos a duvidar que elas estarao demarcando 0 caminho todo o tempo, por tan. tos e tantos quilémetros, e temos de confirmar nos Mapas og trajetos ou perguntar a direcdo as pessoas dos vilarejos. Mas com o passar dos dias, aprendemos a confiar de tal maneira nas setas que nao precisamos mais procurar por elas, como se viessem ao nosso encontro, e magicamente, nos acom- panhassem, Nesse momento, entao, o desconhecido, 0 i- nesperado, nao assustam mais, porque temos a confianca de que as setas nos manterdo no rumo certo. PO, Chega Quando seguimos as selas, 0 desconhecido eo inesperado nao assustam mais, porque se tem a confian- a de que elas nos manterao no rumo certo. Editora Mediagao Digitalizado com CamScanner IG RUMOS DA AVALIAGAO NESTE SECULO Nas ultimas décadas, a atengio dos educadores, dos politicos e da sociedade voltou-se para a dimensio social e politica da avaliacio por representar, muitas vezes, praticas incompativeis com uma educacio de- mocratica. Intensificaram-se, a partir dai, os estudos @ as pesquisas na 4rea, 0 que jf no era sem tempo, observando-se movimentos universais nesse sentido. As dissonancias em torno dessa pratica ocorrem em paralelo dis- cussio sobre uma escola que parece no dar mais conta dos problemas sociais e que corre o risco de educar os alunos até mesmo para uma ultrapassada visio do presente. Diz Morin: Nova consciéncia comeca a surgir: 0 homem, confrontado de todos ot lados as incertezas, é levado em nova aventura. preciso aprender a enfrentar a incerteza, j4 que vivemos em uma época de mudangas em que os valores sio ambivalentes, em que tudo é ligado (2000, p.84). No seu sentido ético, de juizo de valor, nada mais natural que a avaliagio educacional seja sacudida na virada do milénio. Que escola que- remos? A quem ela pertence de direito? O que é aprender nesses novos tempos? No Ambito da educacao brasileira, as questées debatidas em avalia- 40, os preceitos expressos nos documentos legais, e as novas experiénci- as desenvolvidas em varias regides do pais, expressam igualmente essas tendéncias universais. Estudiosos contemporaneos (Arroyo, Demo, Estre- la, Hadji, Luckesi, Macedo, Perrenoud, Vasconcellos, Zabala e muitos ou- tros) apontam, em unissono, a preocupacio em superar o viés positivista e classificatorio das praticas avaliativas escolares, retomando-as em seu sentido ético, de juizo consciente de valor, de respeito as diferencas, de compromisso com a aprendizagem para todos e a formagao da cidadania. Os estudos em avaliacio deixam para tras 0 caminho das verdades absolutas, dos critérios objetivos, das medidas padronizadas e das estatis- Ediitora Mediagio Digitalizado com CamScanner 16 Avaliar para promover: as setas do caminho tar sobre o sentido essencial dos atos avaliativos de Wier. Tor sabre o objeto da avaliagio, de um agin consciente » es avaliadas e de exercicio do didlogo entre og ticas, para ale! pretacio de val reflexivo frente as situag6' envolvidos. os, tanto em relagao a avaliagao de curr. Os estudos contemporane culos e programas, quanto em relacao a avaliacao da aprendizagem, apon. tam novos rumos tedricos, tendo como diferencial basico o papel interativo do avaliador no processo, influenciando e sofrendo influéncias do contex. to avaliado. O que passa a conferir ao educador uma grande respon. sabilidade, por considera-lo indelevelmente comprometido com o objeto ‘ha avaliagao e com a sua propria aprendizagem do processo de avalar. Mudancas da avaliacao, nas escolas, precisam levar em conta tais tendéncias. Os professores, a0 inovar suas praticas, devem estar consci- entes das concepgdes que regem suas ages. A sua credibilidade profissi- Smal esté em jogo, porque toda a sociedade inicia a contestar os pardme- tros da avaliagiio educacional pela arbitrariedade e fragilidade teérica vari- as vezes percebidas. Os processos avaliativos tendem, em todos os paises do mundo, a adequar-se aos novos rumos, com praticas sendo repensadas pelos pro- fessores nas salas de aula, estudos e pesquisas desenvolvidos pelos tedri- cos nas universidades. Programas de qualificacao passam a exigir o engajamento de cada professor nessa discussao, pois os ensinamentos tedricos e a apresenta- Cao de novos preceitos metodolégicos nao iro garantr, por si s6,a com- preensao ea tomada de consciéncia sobre concep¢des formativas e me- Fiadoras em avaliacio, cujo significado revela uma alteraao radical de sua finalidade. E preciso um esforgo coletivo para delinear as setas dos caminhos |, na direcio do seu significado ético de contribui- da avaliagao educacional cio & evolugdo da sociedade. A compreensio dos novos rumos exige a porque Ihes reflexdo conjunta pelos avaliadores e todos os envolvidos, exige retomar concepcdes de democracia, de cidadania, de direito & edu- cao. Essa compreensao é um compromisso a ser assumido coletivamente: Compreender significa intelectualmente aprender em con} comprehendere,abracar junto, (..) inclui,necessariamente, um processo de empat+ de identificacio e de projecao. Sempre intersubjetiva,a compreensio pede abertura, simpatia e generosidade (Morin, 2000, p.94-95).. As praticas avaliativas classificatorias fundam-se na competicao € no individualismo, no poder, na arbitrariedade presentes nas relagoes en- tre professores e alunos, entre os alunos e entre os préprios professores. junto, Editora Mediagso Digitalizado com CamScanner Jussara Hoffmann 17 A medida que os estudos apontam para o carater interativo e intersubjetivo da avaliagao,alertam também para a essencialidade do didlogo entre to- dos os que fazem parte desse proceso, para a importancia das relagoes interpessoais e dos projetos coletivos. Quais sio os rumos contemporineos da avalia¢ao, defendidos pelos estudiosos da area? O que indicam as setas do caminho? AAVALIACAO A SERVICO DA ACAO Este primeiro principio estabelece a contraposicdo basica entre uma Concepgao classificatéria de avaliagio, de julgamento de resultados, e a Concepsio de avaliacio mediadora, de ago pedagogica reflexiva. Alertam 0s estudos contemporsineos sobre a diferenca entre pesquisar € avaliar em educacio. Enquanto a pesquisa tem por objetivo a coleta de informagSes e a anilise e compreensio dos dados obtidos, a avaliagao esta predominantemente a servigo da acio, colocando o conhecimento obtido, Pela observacio ou investigacio, a servico da melhoria da situacao avaliada. Observar, compreender, explicar uma situacio nao é avalid-la; essas aces Sao apenas uma parte do processo, Para além da investigacio e da interpre- tagio da situacao, a avaliacio envolve necessariamente ut mova a sua melhoria. Esse primeiro principio é o mais importante de todos para se com- preender as novas tendéncias, porque altera, radicalmente, a finalidade da avaliagdo em relagio as praticas classificatérias, seja da aprendizagem do aluno, seja de um curriculo ou programa, E fundamental frisar esse ponto: mudangas essenciais em avaliacio dizem respeito 4 finalidade dos procedimentos avaliativos e nao, em pri- meiro plano, 4 mudanga de tais procedimentos, Observe-se, entretanto, que a maioria das escolas e universidades iniciam processos de mudangas alterando normas e praticas avaliativas, ao invés de delinear, com os pro- fessores, principios norteadores de suas priticas, Em relacio aprendizagem, uma avaliagio a servigo da ago nao tem por objetivo a verificagao e o registro de dados do desempenho esco. lar,mas a observacio permanente das manifestagées de aprendizagem para Proceder a uma aco educativa que otimize os percursos individuals. No que se refere a avaliagiio de um curso, da mesma forma, a coleta de informacées nao tem por sentido a anilise do seu estado atual, rankings classificatorios, apresentacio de graficos estatisticos, mas a implementacao de programas que resultem em beneficio a escola ou a instituigao de ensino avaliada. ma acdo que pro- Editora Mediagao Digitalizado com CamScanner “a 1B Avaliar para promover a¢ setas do caminho Funda-se esse principio da avaliaglo na visio dialéticn do conke cimento, que implica o principio de historicidade: 0 conheciment fy), mano visa sempre a0 futuro, A evolugio, & superagio. Assim, desting. 7 a avallagio mediadora a conhecer, nfo apenas para compreender, maz para promover acdes em beneficio aos educandos. §s escolas, 4, universidades : © papel do avaliador, ativo em termos do proceso, transforma-se no de participe do sucesso ou fracasso dos alunos, uma vez que 05 percur. sos individuais serao mais ou menos favorecidos a partir de suas decisces pedagégicas que dependerio, igualmente, da amplitude das observacées Pode-se pensar, a partir dai, que nio é mais o aluno que deve estar pre. parado para a escola, mas professores e escolas é que devem preparar-se para ajustar propostas pedagogicas favorecedoras de sua aprendizagem, sejam quais forem seus ritmos, seus interesses e ou singularidades, Avaliar para promover significa, assim, compreender a finalidade dessa pritica a servico da aprendizagem, da melhoria da a¢io pedagégica, visan- do & promogio moral e intelectual dos alunos. O professor assume o papel de investigador, de esclarecedor, de organizador de experiéncias significativas de aprendizagem.Seu compromisso ¢ o de agir refletidamente, criando e recriando alternativas pedagdgicas adequadas a partir da melhor observacio e conhecimento de cada um dos alunos, sem perder a obser- vaio do conjunto e promovendo sempre a¢ées interativas. Nada mais natural que se perceba a inquietude dos educadores frente a0 compromisso da avaliagao embasada nesse principio. Em primeiro lu- gar, porque, a partir dele, elimina-se a dicotomia educa¢io e avaliacio. Muitos professores se queixaram, nas ultimas décadas, de “dar excelentes aulas” a alunos que,"por problemas deles”, nada aprenderam. Em segundo lugar, porque torna evidente o compromisso do professor e da escola em conhecer e respeitar as diferencas. No meu entender, ha sérios entraves em nossas escolas e universi- dades quanto 4 efetivacao de uma‘pratica avaliativa em consonancia a esse primeiro principio delineado. Ainda hé um enorme descompasso entre 0 pretendido e 0 realizado pela maioria das instituigdes educacionais. Com as exigéncias da LDB n° 9.394/96, a maioria dos regimentos escola- res é introduzida por textos que enunciam objetivos ou propositos de uma avaliagdo continua, mas estabelecem normas classificatorias e somauvas, revelando a manutencio das praticas tradicionais. Percebo, também, a enorme dificuldade de avangos no sentido da aceitagio, pelos educadores e pela sociedade em geral, de preceitos esta belecidos pela LDB sobre oportunidades de promogio do aluno na esco- la, expressas na sugestio de regimes nio-seriados, ciclos, programas de Editora Mediagio Digitalizado com CamScanner Jussara Hoffmann 19 acelera¢4o e outros. Tal resisténcia parece revelar o forte arraigamento da concep¢io classificatéria da avaliagao dentre os professores,apesar dos seus discursos simularem, muitas vezes, tendéncias inovadoras. Tanto as normas classificatérias ainda presentes nos regimentos, quanto as criticas as novas formas de progressio escolar, revelam o carater seletivo e burocratico que continua a prevalecer na avalia¢io educacional em nosso pais. Revelam também a necessaria tomada de consciéncia por educadores e leigos sobre os obsticulos decorrentes de uma avaliagao classificatéria 4 educacio de milhares de criancas e jovens do nosso pais. No conjunto das discussées que proliferam, emergem alguns contrapontos importantes; Avalia-se para aprovar e promover? Por que se consideram mais eficientes professores e escolas que reprovam alunos? Avalia-se para favorecer processos de aprendizagem? Por que se gasta tanto tempo e energia com registros de resultados e téo pouco para refletir sobre questées de aprendizagem? Avalia-se o desenvolvimento do aluno? Por que se somam resulta- dos parciais sem analisar processos? © Ensino Fundamental é direito de todas as criangas brasileiras? Por que se criticam alternativas de progressio continuada e se aplaudem pré- ticas seletivas e excludentes? Essas e outras controvérsias precisam ser discutidas, tendo por embasamento a finalidade da avaliacZo que iré nortear as metodologias, e nao 0 caminho inverso como vem acontecendo.A excessiva preocupa¢ao de educadores e leigos com a definicio de critérios, registros finais, apre- sentacao dos resultados e outras questées de carater burocratico da avalia- cao revela que os rumos que perseguem precisam ser debatidos e esclare- cidos, para que todos venham a agir conscientes do reflexo de suas ages. Para onde vamos? De uma avaliagio a servigo da classifica- > a uma avaliagio a servico da aprendiza- ao, selecio, seriagio... ‘gem do aluno, da formagio, da promocio da cidadania, De uma atitude de reproducio, de aliena- > 4 mobilizagio, & inquietacio, na busca ao, de cumprimento de normas... de sentido e significado para essa acio. Da intencao prognéstica, somativa, de ex- © a intencio de acompanhamento perma- plicagio e apresentagio de resultados fi-nente, de mediagio, de intervencio peda- nas... ‘g6gica para a melhoria da aprendizagern, Editora Mediagao Digitalizado com CamScanner

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