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Parte Il A Orientagao a Queixa Escolar Apresentando a Orientacgao a Queixa escolar’ Batre de Paula Sousa Os desenvolvimentos tesricopriticos da psicologia esco: lar, notadamentea parti de década de 1980, apontam claramente ‘importincia de se investi no sentido de contribur para melhoria da cede escolar. Os psislogos vém ampliando e aperfeigoando intervensées junto as escolas, com o intuito de problematizar © reverter funcionamentosinstiucionais produtores de fracasso es colar ¢ de encaminhamentos de alunos para atendimento psicoldgico no sistema de saide mental, clinicar-ecola ¢ outros espagos einsttugSes externos 3 escola ais atsagdes de cunho institucional, no entanto, frequen: temente ndo dio conta de sofrimentos e facassosindividuais cue, embora atravessados pela insiigdo, permanecem crsalizados. Porém, ainda ha nds que, para serem desatados, necesstam de uma abordagem que eprofunde 2 compreensio das relagbes em que individuo e instiuigto se constiuem mutuamente,euidando deo negar nem a um, nem a oto, (© pensamenta dialético desvela-nos uma relagio entre ndividos e insituigbes que aponta a necessidade do psieslo- i desenvolver fremtes de trabalho diferenciadas, nos planos ‘Rta como com rsion revo cic e Cal Banc Angee. + clog do ergs de RoeslgsEaclar ds Universidade de Sao acl, ete em psn elt cordenadors do cus deApeiseamen (o"Oserago 8 Quen ese” Aro SOmnsonQeen 4 ‘macro ¢ microestnaural, se pretende atuar no sentido de uma transformagéo social profunda. Assim, as intervengées instiucionais ¢ individuais, fundadas em wis mesma concep: ‘sio de Homem e de Sociedade, em que estes dois planos ‘Buardam uma telagio de interdependéncia, de mtua determi nagio, tenderéo 2 complementar-se e a potencializar uma 8 ‘outra — e nio a competr A dissociagio destes planos — macro e microesttnural — tno campo da psiologia aparece, por exemplo, na asessoria a psicélogos que atuam na sade, desenvolvida no Servica de Psi- cologia Escolar do Instituto de Psicologia da Universidade de Sao Paulo SePE-IPUSD), do qual fago parte. Eles percebiam que, por tris de uma grande parcela de sua demanda infanto-juvenl,en- contravamse cotidianos escolaes adoecidos adoecedores, dat procurarem nossa ajuda, ‘Assim, em 1992, psicdlogos e outros erabalhadores de sas- de mental de equipamentos da Secretaria Municipal de saéde (nidades Bisieas, Centros de Sade © outros) da regito sul da cidade de Sio Paulo, A procura de novos rumos no atendimento Aas queixas escolares, realizaram sm estado sobre sua demands infancojuvenil, Revclowse que as qucixas escolaes consttuiam aproximadamente 65% da mesma (Morais, 2001). Tal fra apro- -xima-se, provavelmente nio por acaso, com os 709% encontrados nna pesquisa de Souza (1996) junto a cliicasescola de instt ‘es de ensino de psicologia da Grande Sia Paulo. Ficava, entio, cevidente a providade que a queixa escolar deveria ter nas ages de snide mental e em nossa formas ‘A partir das conttbuigGes de arto (1984; 1990) e de nosso convivio com as escolas, a visio erties que tinhamos no SePE- [DUSP acerca dos funcionamentos ecolars catidianos prodstores de fracasso, levava-nos a incentivar ¢ assessorar os psicdlogos ‘que nos procuravam em suas experitncas extramuros das Uni dades Bisicas e Centros de Saide, partindo para intervir nas escolas, [No entanto, ess tipo de asessoria evidenciava uma lacuna ro conhecimenta do Servigo ¢ da psicologia escolar: o atend mento as queixa escolares no Ambito da clinics, com o foco no individuo em sua relagio com a insitugio escolar. Era preciso desenvolver uma abordagem que superasse as dificuldades das pritcastradicionais, que se fundam numa eoneepgio de indivi duo abstrata, desconsiderando seus pertencimentos socais para além do grupo familiae Era preci inclu a escola na investigacfo © a interven: so, Perguntas como “em que tipo de classe ests? Quantas professora teve este ano? Onde se senta na classe? Qual a fequé sia com que ocorrem falta de professores? Em que momento dt carreira escolar emergiu a gueiea em questo?” precisavam ince- frat o rol de perguntas posiveisinecessrias ao atendimento A interlocusio com a escola, 4 semelhanga com a que se tem com of pais, necessitava ser inttoduzida Era preciso ainda, er um olhar para as pertengas sociais (camada socioeconémica, grupo émnico e religioso, por exemplo) dos envolvidos os desdabramentos disco na vida e carrera exco- laze da criangs ou adolescenteatendido. A passagem de uma eianga pobre enegra pela escola tende a guardar diferensas signfiativas fem relagio 8 de uma rica ¢branca.O estigio de conhecimento que a psicolgiae outeascicias atingiram acerea da imporsncia dos fatores socials na constimsgio das subjetvidedes nfo nos permite ais ignorlos num atendimenta psicologico?. Impulsionadas portals necesiades, com wma demanda de stendimento de crancas eadolescentes com quexas escolar bs- tendo as nosas ports, apoiadas em nossas rferéncaetericas © em moss prétieas nas intervens6es nas escolas, das psicblogas dda equipe do Servigo de Psicologia Escolar da USP, Cinta Copit Va, por erempl,o capo “Hania soi: hums pti, de ‘fod ows Coes Flin c"ar cua dea sane cp ead 0 ‘epag eld Hath Ferandc de Sous. Aro SOmnsonQeen 4 Freller ¢ ex, partimos para desenvolver ua abordagem em stendi- mento psicoligico a que chamamos Orientao A Queina escola, ‘Trata-se de wma abordagem que parte de wna determinada concepgio da matureza e da génese da quetza escolar. Entendida como aguela que te, em seu centr, o processo de escolarzacao, ‘Trane de wom emergente de wma rede de rele que tem como Dersonagens principats, via de rena, a cnancaladolescente, sua es- cola e sua familia. O condo principal em que surge e€sustentada 40 universe escolar ‘Assim, nosso objeto de investigasiolintervengio é esta rede «como as relagbesentte seus integrantes desenvolvem-se. Cons derando que um momento & construido ao longo de wma hist {gue Ihe ds sentido, conhecere problematiar tal hstriaincluise necessaiamente no atendimento [Nosso objetivo é conquistar wma movimentacdo nesa rede dingmica que se diecione na sentido do desenvolvimento de to- ddos 0s seus partcipantes — dai nossa contraposigho 3% prétias| adapraconistas, que entendem a superasio da queixa escolar como ‘uma madanga apenas da crancaiadolescente portadora da ue 1a, abrangendo também sua familia, mas deixando intocada a Escola, Nesta concepsio, sma crianga que se rebels contra aulas sem sentido, autoritarismo © atos de humilhagio, mostrando-se agressva e apreendendo pouco os conteddos pedagigicos ue Ihe ‘io impostos nestascondigSes, éfrequentemente considerada res: Ponsivel por suas aitudes de recusa ea meta de sew atendimento € sua adaprasiolsubmissio, Ao longo de sua vasta obra, D. Winnicott — outros auto- res que nele se inspitatan* — indii-nos que a intervengio no ambiente concreto — ¢ ni apenas em suas representagoes no _universo simbélico do individuo — far parte do ambito da agio terapGatica, © ambiente ndo se restringe ao universo familiar, mas Tipe eanalns KHAN, Masoud. Quando «Prmavers Chega So Palo: inclui outros grupos ¢ instiuigdes com participacio importante na formagio e desenvolvimento do psiquismo, A escola costuma ser um destes:exerce fungéo estruturante da subjervidade, que se forma no apenas nas fases precoces do desenvolvimento, © é pleno de potencialdades terapéuticas e também patologizanes Data importancia deo psidlogo fazer do ambiente um objeto de inervengio, em seu trabalho focado na pessoa em sofrimenco ‘ue o procura Ainda refletindo sobre a importincia do ambiente, Adeparamo-nos com 2 obra de Jurandir Freire Costa, Ondem Me ica e Norma Familia (1979). Nel, 0 autor analist 0 papel do Movimento Higienista na introdugio da economia de mercado ro Brasil, Revela o career palitio-ideologica da atuagio dos hi- pienista na produgdo do seatimento de ineompeténcia dos pais, ‘onigio importante para o desenvolvimento de um mercado de trabalho para or especilistas, dente cles os picSlogos. ‘Mostranos como, a partir da autoridade adguiria por meio do grande sucesso no combate a doengas como a tuberculose © © célera,utlizando-se de medidas higignica e vacinas, os profissio- ras da sade passam a encampar Seeas cada vez mais diversas da via e do comportamento humana em sus atuagio, pasando ata: tar questies de fundo cueural como senda da mesma narareza dos fenémenos bioguimicos. Relacionamento familiar e fikragem da Agua passam a ser compreendidos a parc das mesmas categris ‘Asim, costumes que esraturam a familia colonial, como a relagio dos escravos pela eas, sio combaidos pelos higieisas aque, 2 partir de antigas ideas racists revetdas de aura cient, ‘aractrizam os negros—e fo ax condigbes em que vviam — como foca de doeneas, encobrind 0 racsno subjacente. Implant-se © conceit de vida intima do iceo familar, etranko aos costumes da fpoea, em que os filhose seus cuidados ganham importincia. Ox novos habitos desorientam os pais, que se veem despojados de soa competéacia acusados de responsives por maleficios e patologias ‘da fama de véviss naturerss, S50 instados a procurar e seguir as Aro SOmnsonQeen 4 ‘orientas6es dos especialisss, spostos detentores dkimos de todo © saber sobre este amplidisimo campo da sade. A paicandlse & também parce do saber competente a partir do qual se opera esa desconstrucio. Desse modo, prepara-se © solo para 0 cultivo do mercado de abalho dos especialistas, den- tre os quas figuram os psiedlogos. Costa (1979) oferece-nos a possibilidade de tomarmos cons- cigncia do quanto, ao desconsiderarmos a potencialidade do ambiente ¢ superestimarmos a necesidade de nossa intervensio rnos cuidados com as criangas ¢ adolescentes com dificuldades de escolarizagio, estamos a servigo de uma estrutura de poder em {que o luero sobrepde-se ao bem-estar ds coletividade, Ax contri Duigées do autor, portant, integram os fundamentos de nossa atuagio para além do mondo interno da erancafadolesence com, dificuldades escolares. Levando em conta concepges como as expostas, ‘serturamos nossa abordagem a partir de principios enicos como: - collier ¢ problematizar as versbes de cada participante da rede (rianga, fata escola); = promover a: cirewlagao de informagcese reflexbes pertines tes integragio ou confronto das mesmas dentro desta rede, propiiando releituras e buscando solugies conjuntamente, + identifica, mobilizarefortaleceras poréncias cotidas nes ta rede, de modo que ela paste a movimentarse no sentido «da supcragio da stuagio produtora da queixa Trata-se de uma abordagem breve e focal Breve, por dois motives essencias: primeitamente, porque nosso objetivo nio & pasar a integrar esta rede até a saperag da configuragio na qual a queixa emergu, mas fzé-lo apenas até 4 conquista de sua movimentagio no sentido de tal superasio a identifcacio de condigSes desse movimento sustentarse sem nossa participagéo. © segundo mosvo pause em Winnicor qu, em Cons tas Tinaputicas (1984), india que, Not pimstosenconteor com 0 terapeaa, este costa pelo paiente came objeto sujet vo. Into 6 o eerpeta tem uma exstéacia obeva, mas esta € tavolta pela subjeiidade do pacente.Seexta necentade €de- ¥idamenteacahida pelo terapeua,o pacente 0 consti como agucle que o entendee que & capaz de sjudélo, Ete momento tfemero€extemamente poderoro do porto de via terapétio, podendo produzir mudanyas profundas e bem manejado. E nes fe tmp, em que ease movininto ests presente, que operacios. © proceso odo (exceto o Acompanharieno) cosuna di rac entre doi rs meses. 1 focal, porque se contra na aueiaexcolar. Ist no sig fica que nos restrisjamos apenas aquilo que diz respeto digetamemte aca, mesmo porque uma abordagem asim resteica ‘Ho daria conta de osso objeto. Cansideramos um eampo bas tante amplo de investigagiovintervengao, porém com 0 olhae volado principalmente para as telagdes dos contcidos emer- fences em tal queixa, a partir da busca pela compreensso da mensagem que a queixa comunica Acolfer a necessidade do paciente de nos consi como terapeutas na condiga de objet subjetivo no significa uma pos. ‘ura passiva.Pelo contro, entendemos ie ui posters atv € especialmente imporante em atendimentospsicoldgcos qui sat caclares, Ela é mobizadora dor recursos dos atendios, se Assumida buseand-se uma rela horizontal com os mesos Una relagio que nfo os empobrece em fungio de um suposto saber, mas que os acompanha e com cles compara saberes, constuindo-os come inivios capazes de serem sujeitas de sua propria hts Tal posura rdaconse também & queso do tempo, que no caso das queasesolares tm uma espeidade que no pode et ignorada o rempo esol, 0 tempo do ano liv. Conguistar a si- Peragio da stung de fracaso dentro desesparimetoy, seta Aro SOmnsonQeen 4 possbildade exist sem violenar tempo psicolgico, deve cons tirse numa meta de trabalho terapéutico, uma ver que sabemos 0 “quanto avangar na eareia escolar sem a aqusigho dos conbecimen: tos e competincias correspondences ou enfrentar uma repeténcia|

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