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Dicionario de Estudos . Narrattvos ALMEDINA DICIONARIO DE ESTUDOS NARRATIVOS AUTOR Carlos Reis EDITOR EDIGOES ALMEDINA, S.A. Rua Fernandes Tomis, ns 76, 78 ¢ 80 3000-167 Coimbra Tel.; 239 851 904 - Fax: 239 851 901 wwwalmedina.net - editora@almedina.net DESIGN DE CAPA EBA. EDITOR EDIGOES ALMEDINA, S.A. IMPRESSAO F ACABAMENTO. PAPELMUNDE Setembro, 2018 DEPGSITO LEGAL 446385/18 Toda a reprodugao desta obra, por fotocépia ou outro qualquer proceso, sem prévia autorizacao escrita do Editor, ¢ ilicita e passivel de procedimento judicial contra o infrator. GRUPOALMEDINA ALMEDINA, ee BIBLIOTECA NACIONAL DE PORTUGAL ~ CATALOGAGAO NA PUBLICAGAO REIS, Carlos, 1950- Dicionério de estudos narrativos ISBN 978-972-40-7621-8 CDU 82 \ aq leitura, Ce Wns Db! daleitur, teses” (Nannie amelty ~ —_ tr nt m alarg' ais, com uma postulacao a . tes de e ‘ Des deve set relacionados inidd de (v); desse ponto de vista, danarra sonalista da "# . do a sua feiga on jista da narrativ Je, acentuan’ ieerad = textua’ ‘ roprieda\ le ~gigmemente integrada nas oe dac idade” (Rudrum, aie 266), “ conjuga-se como impulso interdisciplinar ) tes de pensamento e de orrendo de corren ituras formalistas e alegadamente final dos anos sessenta [do século wee” abi . passado], um certo ndmero de teorias pos-estruturalistas a camino a “yma nova série de questdes, de indagagoes, de métodos e eval lorizagbes que consistentemente abordaram problemas jdeolégicos, evidenciaram a tos histéricos & afirmaram a inerente posicao do leitor, examinaram contex' : impossibilidade de alheamento em relacao a tais diligéncias” (Richardson, 2000; 170). Isto nao impede que se reconhecaa pertinéncia de um “formalismo sensivel ao contexto, com métodos renovados”, como prevencao contra um “am contextualismo com métodos inadequadamente controlados” (Meister, 2005: XV-XVJ). raticas linguisticas, sociais & aquele alargamento Por outro lado, $ dos atuais estudos narrativos, dec : atitudes metodolgicas que superaram le objetivas do relato; “tendo-se iniciado no [com A.C ML] CONTO 1. Género narrati i ‘ativo com larga tradicao histérica e cultural, o conto é um , telato quase sem} ipre breve, onde se nai g rra, sem grande complexidade, envolvendo ae ime concenttrada, uma historia persona; mume! i ies aoe s seurendo num tempo também i relativamente pequeno de lefinido ‘a0 muit teferido, por isso, epee eobretndas Por confronto com oo Ne shory) nian easerae 6 ouma historia curta (cf, a desi; : nea (v), send verificavel e sxscottvel di um aspeto decisivo, end em ingles, short dtivida de que esta limi © condicionar a sua cm ora soja historicamente tendem a ser observad; itagao de extensao ar, Posicao. Assim, “nao h4 adas; um reduzido tastou outras limitacées que elenco de Personagens, um esquema 67 Conto temporal restrito, uma ago simples ou pelo menos apenas poucas agdes separadas, e uma unidade de técnica e de tom (..) que o romance é muito menos capaz de manter” (Bonheim, 1982: 166). 2. Considerado por André Jolles ([1930] 1972) uma forma simples (a par da saga, do mito, da lenda, da anedota, etc,), 0 conto enrafza-se em tradigdes culturais que faziam do ritual do relato um fator de aglutinacao comunitaria e de seduco (os contos das Mil e uma Noites, por exemplo), Na sua forma mais genufna, 0 conto concretiza-se em situacdes narrativas elementares: nelas, um narrador, na atmosfera magica instaurada pela expressdo “Era uma vez...”, suscita, num audit6rio fisicamente presente e que pode até interpel4-lo, o interesse por agdes contadas num tinico ato de narracao, no raro com fungao moralizadora. Componentes importantes desta simplicidade sobrevivem no conto popular (cf. Reis e Lopes, 2011: 82-86), um subgénero narrativo cujas origens se encontram em espagos predominantemente rurais. Daf resulta, em grande parte, a dimensao de oralidade que é prépria do conto popular, semelhante a de outros textos da literatura tradicional: provérbios, cangées, jogos de palavras, etc. Todos eles comungam de uma feicéo comunitéria, que explica © anonimato da sua autoria e a relativa (mas nao total) instabilidade que por vezes os atinge. 3. A aco, a personagem e o tempo sdo as categorias da narrativa mais claramente condicionadas pelas propriedades materiais do conto. Elas fazem com que seja praticamente imposstvel o tratamento de figuras muito proble- maticas ou a insercdo de intrigas secundérias; por outro lado, é isso que, em boa parte, favorece a raépida captacao da atenco do leitor, no imediatismo de uma leitura que dura pouco; essa atencao é mais intensa quando, como ocorre no conto policial inaugurado por Edgar Allan Poe, existe uma intriga com um mistério a resolver. Noutros casos (p. ex., em contos de Tchekhov), um simples incidente do quotidiano, com algum significado humano, pode desencadear a aco. Esta caracterizacao do conto, incluindo o princfpio da concentracao semantica e discursiva que nele vigora, justifica a comparacao que Julio Cort4zar formulou: “O romance e o conto deixam-se comparar analogi- camente com o cinema e com a fotografia, na medida em que um filme é, em principio, uma ‘ordem aberta’, romanesca, enquanto uma fotografia conseguida pressupée uma estrita limitagéo prévia, em parte imposta pelo reduzido campo que a camer abarca e pela forma COMO 0 fotsgrafy usa esteticamente essa limitagao” (Cortazar, 1971: 404). 0 tratamento do tempo no conto ¢ o niimero e a estatura das suas personagens obed cee a esta redugao de campo, expressao sugerida por Cortézar; contudo, ela nao prejudica necessariamente a densidade e o significado humano que no cong podemos encontrar. £ no lapso de poucas horas e entre duas personagen, apenas, que se desenrola 0 admiravel conto Missa do galo, de Machado de Assis; e se no conto de Eca, Singularidades duma rapariga loura, 0 tempo da historia é alargado, o seu tratamento no discurso leva a procedimentos de redugio compativeis com aquela unidade de efeito de que falou Edgar Poe, num texto famoso: “Necessitamos apenas de dizer (...) que, em quase todos 08 tipos de composigio, a unidade de efeito ou impressao é um ponto da maior importéncia. E claro que, para além disso, esta unidade nao pode ser Preservada por completo em produgGes cuja leitura nao possa ser comple- tada numa s6 sessao” (Poe, 1984), 4. A economia temporal do conto revela-se, entao, uma caracterfstica distintiva a ter em consideracdo. Dificilmente o conto contempla uma duracéo temporal motivada pelas demoradas elucubragées de uma personagem, naquela lentidao de movimentos autorreflexivos que se estende ao longo de um romance com forte carga Psicoldgica. Em vez disso, 0 tempo do conto deve entender-se como resultado de um fracionamento relacionado com a unidade de acao: “O conto constitui uma fragao dramatica, a mais importante e a decisiva, duma continuidade em que o passado e o futuro Possuem significado menor ou nulo” (Moisés, 1982; 21), Seo conto persegue a unidade de efeito de qu senum outro nivel: o da coesio temética que e numa coletanea de contos, mormente quando ela obedece a um Projeto de Ep nis peta oO ee SNE no Cons do escritor, quando muito podemos observar uma n° Organizativa gi certa evolucdo literdria, paralela 4 que na ficgao se evidencia, mas nao necessariamente a referida unidade coesiva. 'e Poe fala, ela pode projetar- ‘ventualmente reconhecemos 3. Em tltima instdncia, a questio da brevidad, pragméticos que ela suscita (Ié-se ou ouve-se um damente do que um romance) nao pode limitar-se material do texto. Certamente que “os contos contém © do conto e dos efeitos conto muito mais rapi- 20 critério da extensao menos palavras do que Tee TR eR ADEE RAM oo Cronica os romances, mas essa medida é enganadora porque se centra em sintomas e ndo em causas” (Friedman, [1958] 1996: 102). Para além disso, “uma historia pode ser curta porque a sua aco é intrinsecamente pequena ou porque, sendo longa, pode ser reduzida na sua extensao por meio de dispositivos de selecdo, de escala e/ou de ponto de vista” (Friedman, [1958] 1996: 115). CONVERSACIONAL, Narrativa ~ V. Narrativa conversacional. CORRENTE DE CONSCIENCIA - V. Monélogo interior. CRONICA 1. A crénica é um género narrativo (v.) em que se relata, de forma breve € em termos subjetivos, um episédio singular, um incidente ou uma acaio observados no quotidiano do cronista; para além de traduzir uma certa temporalidade hist6rica (cf. a etimologia, do grego cronos, “tempo”) e uma circunsténcia de vivéncia pessoal, a cr6nica visa normalmente o ptiblico alargado da imprensa escrita, da rédio, da televisio ou das redes sociais (p-ex, blogues). Pela sua natureza e pela sua fun¢do sociocultural, a cronica pode ser encarada como um género paraliterdrio e, por vezes, hibrido, No que toca & sua articulagao com outros géneros (por exemplo, com a epistolografia, quando o cronista adota a forma da carta, como, por vezes, acontecia no século xix). Num contexto em que sublinhou a dimensio literéria da crénica, José Saramago propés a seguinte definicao: a crénica “corresponde, em geral, um texto curto, consequéncia quer de uma inspiracao imediata e nao ecessariamente aprofundada quer de um didlogo deliberado com o quoti- diano ocasional, mas sempre exigindo do escritor, num caso como no outro, capacidade de medida e de concentragéio, a par de sensibilidade a estimulos que a primeira impressao poderao parecer de pouca relevancia, mas que virdo a ser, porventura, os que mais fundo hao de penetrar no espirito do leitor” (Saramago, 2009). 2. Numa outra acecéo, a crénica, tal como foi cultivada na Idade Média, Pode ser considerada um antepassado da moderna historiografia. Ness¢

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