You are on page 1of 85
ANDORRA (pega. om 12 quadros) Max Frisch , sie dial ANDORRA Feed saarllal pie ores rox calll Colecao ‘Gorvea «Ba Eudinyr Fraga © 6 Sabin Vong, Patt a Nata Max Prisch nascen em Zurmqus, om 1911. Hstudante de azyuitcetura, teve de interromper © curso, por morte do pal. Consayrass, entBo, a0 jornalismo, tendo realizado Intmeras viagens Sela Turopa ¢ pela América, Don atoritos dessa fase iu sun vida nada resto, hoje: Max wrisch dese frulu-oe, 2a allure em que um amigo Ihe pro: poreions condigbes para regressar aos estos, once! © curso do arguitecto, mas nto se man. tém multo tempo afestado da criagso iteréria. 0s Dificis, seu primetvo romance, leanca grande Sxito, 0 mosine Aucedendo A pega de teatro Santa Gris. Stiller, outro romance, mazes a sia cod- sugrarto, © quo as ulteriores obras teatrais onfininam em absoluto, Hoje, Max Frisch 6 um os maiores dramaturgos © comedibgratos con: emporsneos, consorvando-se constantemente 6 feu nome noo eartazes ay principais cidadce feuroptias. A astrela de Andorra prolongou-se por trés ins, dada a extraareinésta autacla de pibleo, Criagto de vanguarda do teatro contem- orisoo, atinge, no final, a grandeza da tragédia sroga. De Max Frisch apresentaremoe, em breve. também na coleegao . Entra 0 carpinteiro, tipo de homem po- Cato, ¢ ates dele Andei com um avental de moro de cozinha. Barblin continua calendo. Carpinteino: Onde esti a minha bengala? Axper: Aqui, mestre, Canpintemo: Estas gorjetas sfio uma macada, E € que nem dio tempo a uma pessoa para quardar o porta-moedas — Andei entrega-the « bengala e revebe ume gorjeta qe enfia na , Ouve-se a masica enquanto 0 earpintcito se afasta em diceegd0 a0 plano onde esta Barblin. Esta ¢ obrigada a reti- rar 0 balde, jd que o carpinteiro nflo faz mengio anDoRRA 8 de desviae-se Andti move-se em direcelo & sjuke-boxs limpando um prato. Depois desapa- rece. A miisiea extingue-se no mesmo momento. Barouin: Ainda nfo te foste embora? Soupavo: Estou de license, Banouin: Que mais queres saber de mim? Soxpav0: Quem é 0 teu noivo? Barblin continue 2. cair. Toda a gente caiando a casa dos pais porque amanhi € 0 din de S80 Jorge, e 0 saco de cenrvio dando voltas is vielas porque amanks € 0 dis de Sto Jorge: nfo parem de eaiar, vir- Gers, ho pacem de caiar a casa dos vossos pais, Queresios uma Andorra branca, virgens, tuna Andorca branca como a nevel Baroumn: © saco de carvio — mas quem € 0 saco de carvao? Sornano: Bs virgem? (0 soldado rt Parece que nfo gostas de mim Bansuix: Nao, 80 gosto. Sovpano: Jé outras disseram o mesmo, mas todas acsbam por me cair nos bragos, baste «que me agradem das pernas ao cabeo. Barblin mostraclhe a tingua. E da sua lingua vermelhal 4 wax FRISOH O soldado tira um cigarro e levanta os olhos para a casa Onde fica o teu quarto? Entra em cona um padre, que empurra uma bicicteta Papas: Isso mesmo, iso mesmo, rapariga, gosto, disso, Havemos de ter uma Andorra branca, virgens, uma Andorra branca como 2 neve, oxala esta noite nd cala um aguaceio. O soldadt Fi, © teu pai esta em casa? Sonoano: Oxsla esta noite nfo cain um agua ‘eirol A igreja dele nfo € to branea como finge ser, isso est mais que provado: a igreja dele 6 feita de terra como as outras casas, terra vermelha, e sempee que cai um aguaceiro, ‘a caiadura fica emporcalhada como se Ihe ti- ‘yessem matado um porco em cima, a caladura franca como a neve da vossa igreja branca © soldado estende a m&o paca ver se chove: Oxalé esta noite nfo caia um aguaceirol © O soldaco rie sei. Que veio c& fazer aguele? Bil lr : ANDORRA 6 Bansuin: 8 verdade, senhor abade, o que andam f dizer pra al, que os fardas pretas do lado de li nos vo assaltar porque t@m inveja das nos sas casas brancas? Que um dia destes, multo, cedo pelas quatro, vao entrar pelos n03s05 campos dentro, a torte ¢ a direito, com tan- gues e tanques pretos © pSra-quedas que caem do cu como gafanhotos cinzentos? Parone: Quem diz isso? Banoum: Peider, o soldado. Porque ¢ que ele bebe tanto de ha um tempo. para ca? E depois insulta toda a gente. Es- guece-se até do respeito que deve a si préprio, sempre com agueles disparates, Bansuin: Nao sei o que o pai diz na estalagem, Pape: Vé inimigos em cada canto, N&o se in- dignou a nossa gente quando os fardas pretas do lado de la fizeram ressurgir os velhos tempos da matanga de criangas em Belém, nfo orya- rnizimos mesmo peditérios para os refugiados? Pois ele diz que nfo somos melhores do que esses fardas pretas. Porque anda ele a Max PRISON repetis constantemente aquilo? As pe mecam a levai-Iho a mal, 0 que n8o ¢ para admirar, Um professor nfo devia falar daquela maneire, E porque ¢ que ele acredita em todos 0% boatos que ouve na estalagem? Pause ‘Ninguém pensa em perseguir 0 vosso Andsi — Barblin para de tcabathar e escuta com atencio, até agora ninguém tocou num s6 cabelo do vvouso An Barblin retoma o teabatho- Vejo que és meticulosa, trabalhas como uma mulher, que {8 nfo és nenhuma criangal Bansuin: Fiz dezanove. Papas: B ainda nfo tens noivo? Bacblin cala-se, Espero que nfo te deixes levar por esse Peider. Banouin: Esteja descansado. Prone: Tem um olhar sujo. Pause. Ele astustou-te? Para se der ares, natural- mente, Nao vejo raz#o para nos asseltarem. (Os nossos vales so estreitos, 05 nossos campos pedregosos e ingremes, as nossas azcitones fo terra, Que podem eles pr nosso centeio? Mas para consegui-lo, ‘curvar-se sobre a terra e corti-lo com passo a passo. Andorra € uma terra’ ‘mas uma terra pobre. Uma terra pacilica, terra fraca — uma terra devota, ¢ te Deus, nfo ¢ verdade, minha filha? Barblin continua ealando, Nao € verdade? Ouve-se 0 toque das ave-marias, brove, ono. padre afasta-se silenciosamente, Banotm: E se eles vem apesar de tudo, sen bade? o primeira plano, & diveita junto da «ji Alguém, atcés @ Andei com 0 Tuental de mogo de. cozinha Aicuém: Onde esté o meu chapéu? Awon: Aqui, meu senhor. Arouis: Que fim de tarde sulo ‘que vamos ter trovoad REE MAX PRISOH Andi entrega-the 9 chapéu ¢ recebe uma gorjeta que enfia na , mas nip carcega no botio: em vez disso assobia © consulta a lista dos discos enquanto Alguém’ rceua, ficando parado idiante de Barblin. que continua a caiar fe nio reparou na sada do padre. Bagauin: # entio verdade o que andam a dizer, senhor abade? Deixem chegar os fardas pre- , @ vero como os judeus so logo apanha- dos. Amarram-nos aos pelourinhos, dio-lhes im tiro na nuca. Isto ¢ verdade ou no pas- sara de um bosto? E se algum deles tiver noiva, dizem, tosquiam-na como se faz aos ‘lies tinhosos. AxGuén: Que palavras sio essas? Barblin volta-se ¢ assusta-se, Axcuin: Boa noite Barouin: Boa noite. Axcuéa: Bela tarde, hoje! Bacblin pega no bald Axcués: Mas abafada Banoun: Esta abafado, esta Aicuis: Paira no ar qualquer coisa Bansuix: Que quer o senhor dizer com isso? us: Uma trovoada, Tudo eapera do vento, 0 folhagem e as persianss © 0 p6. E, ETAT a TT AnDoRRa 9 Wiudo, nem uma nuvem no céu. Mas a coisa ‘ente-se. Que silencio pesado! Até os mosgui= fos 0 adivinham. Silencio seco © podre, Pa- rece que h& trovoada no at, trovoada rij, Fazia bem & terra... Bacblin entra em casa. Alguém continue o seu fouminho, Andri poe a tocar na xjuke-box> 0 mesmo disco, depois desaparece limpando um prato. Vé-se a Praga the Andorra. O carpine feiro © a professor estéo sentados: diante da cestalagem. A misica acaba. Proresson: ‘Carpnyreiro: que se trata do meu filho JA The disse: 50 Mbras O carpinteiro bate com uma: moeda na mesa. Tenko que me ir embora © carpinteiro forna a bater com # moeda. Mas ele tem de ser forgosamente carpinteiro? Nao ¢ fécil aprender 0 oficio de carpinteizo quando isso nfo nos esth na massa do saagie, E como the havia isso de estar na massa do sangue? Eo que me parece, Porque aso fas dele um corrector, por exemplo? Porque ato vai ele para a bolsa? Claro, isto € apenas uma opinito Prorsssor: Donde veio aquele pelourinko?

You might also like