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Copyright ©2015 Celso Castro Julia ODonnel Direitos desta edi reservados 8 EDITORAFGV ua Jomalista Orlando Dantas, 37 2223-010 — Fo de Janeiro, RI — Brasil Tes: 0800-021-7777 — (21) 3799-4427 Fa (21) 3799-4830 ema edtoraetgvbr — pedidoseditoraatovbr wed site werwfovbreditra Impressono Bras /Prnted in Brazil “Todos 05 lets reservados. A reprodugSo no autorizada desta publicacio, no todo ‘ouem parte, constitu vilagio do copyright (Ll no 9610/98) (0s conceitos emits nese lio 530 de nteiraresponsabldade dos autores ‘edge, 2015; 1reimpeessi, 2018 Reviséo de originals Fernanda Villa Nova de Mello Editoragioeltrnca FA Eltoracao Revist: Fatima Crone Aeiis de Beltran CCapa:aspectoresign ustragio de capa: Fesouza Casto, Ceo Introdugéo as ciéncias soci / Celso Castro, Julia Donnell Rlode Janeiro Eedtora FOV, 2015. 226 p- (Colegio FGV Universita) Incl bilografa ISBN; 978 85-225-1556+ 1.Giénclas socials. Donnella I Fundacio Getlio Vargas Titulo 0-300 2 Intropugho As Ciéwcias Soctats SECAO 1 — A perspectiva das Ciéncias Sociais © Papalagui mora, como o marisco, numa casca dura ¢ vive no meio de pe- dras, tal qual a escalopendra (uma espécie de centopeia] entre fendas de lava, ‘com pedras em volta, dos lados e por cima. A cabana em que mora parece-se ‘com um bai de pedra em pé, com muitos compartimentos furos. A gente desliza para dentro e para fora da casca de pedra apenas por um lugar ue o Papalagui chama entrada quando vai para dentro, ¢ saida quando vem para fora, embora ambas as coisas sejam absolutamente uma s6 ¢ a mesma ‘Neste lugar existe uma grande folha de madeira que se tem de empurrar com forga para entrar na cabana. Mas isto € s6 para comesar: tem-se de emputrar ainda oueras folhas para estar, de fto, na cabana. ‘Quase todas as cabanas sio habitadas por mais pessoas do que as que moram ‘numa s6 aldeia samoana; [..]. E muito comum nem saberem 0 nome umas das outras; ese se encontram no buraco por onde entram e siem, cumprimentam-se de mé vontade, ou resmungam qualquer coisa, tal qual insetos hosts, dando a impressio de estarem zangadas por terem de viver perto umas das outras, Este é um trecho de um discurso de Tuiavii, chefe da aldeia de Tiavea, ‘em Samoa (Polinésia, Pacifico Sul), recolhido pelo artista alemao Erich ‘Scheurmann (1878-1957) e publicado originalmente em 1920. Samoa foi uma colénia alema até passar & tutela da Nova Zelindia em 1920 ¢ final- ‘mente se tornar independente em 1962. Tua — europeu ou homem branco — que conheceu durante uma viagem & aa seus conterrineos sobre o mundo cotidiano do Papalagui Europa. Ele descreve a vida numa metrépole, com seus prédios ¢ aparta- ‘mentos, ruas € bondes, ruidos e confusio, bem como um tipo diferente de sociabilidade: a convivéncia andnima e pouco amistosa entre vizinhos ¢ a divisdo de tarefas entre homens ¢ mulheres. Ele ndo usa, porém, as palavras que aprendemos a usar para d ses elementos: “edificio”, “apartamento”, “quarto”, “rua” etc. Tuiavii procu- ta traduzir aquilo que viu para os conterrineos na linguagem samoana, que nao tinha essas palavras, ¢, claro, nem essa mesma experiéncia urbana. O texto perm de-ver com out por meio de nos oto automitico’ Infancia, ¢ a par sio diferentes de 0 esforgo de “des sada: na forma c rnaquilo que cons Trata-se daqu imaginagio social lentes da nossa p sociolégica seria preender sua exis social. Com isso pela dindmica da privada. Essa é, ¢ volvimento da ca entre as diferente podemos voltar € familiar ¢ amp realidade social a Nesse mesmo que A imaginasio s de modo renov que poderiamo cexemplo de cor assinalar que 0 des didtias, € u licitas mas exist porqué da exis relacionado a u também a um ias Sociais asca dura; ¢ vive no meio de pe- = centopeia] entre fendas de lava, A cabana em que mora parece-se empartimencos ¢ furs. ca de peda apenas por um lugar vara dentro, ¢ saida quando vem jolutamente uma s6 ¢ a mesma ira que se tem de empurrar com ra comegar: tem-se de empurrar is pessoas do que as que moram n nem saberem o nome umas das ntram e saem, cumprimentam-se tal qual insetos hostis, dando a ver perto umas das outras i, chefe da aldeia de Tiavea, do pelo artista alemao Erich almente em 1920. Samoa foi va Zelandia em 1920 e final- undo cotidiano do Papalagui heceu durante uma viagem ‘com seus prédios aparta- m como um tipo diferente de o amistosa entre vizinhos e a jemos a usar para designar es- rto”, “rua’ etc. Tuiavii procu- s na linguagem samoana, que -sma experiéncia urbana. i I i I | Unipape I~ 0 munoo pas CitNctas Soctats. — O texto permite, através desse feito as vezes cémico, fazer um exercicio de ver com outtos olhos nossa realidade cotidiana, aquela que é construida por meio de nossa socializagio, o mundo no qual vivemos em modo “ loro automético”, E esse mundo que aprendemos como “natural” desde a infincia, ea partir do qual passamos a julgar as pessoas e sociedades que sii diferentes de nés. Nesse sentido, podemos entender que nao é simples 0 esforgo de “desnaturalizar” nossa visio de mundo, pois est muito arrai- gada: na forma como o vemos, nas palavras que usamos para descrevé-lo, naquilo que consideramos o comportamento “natural” et Trara-se daquilo que 0 socidlogo americano G Wright Mill chamou de ‘maginagio socoldgica. uma forma de vet 0 mundo que permite ie além das \eites|da)inoseapropria|ORREIeAela. A primeira conquista da imaginagio sociolégica seria o entendimento de que os setes humanos sé podem com preender sua existéncia ao se perceberem parte de determinado contexto social. Com isso vemos que nossas ages influenciam e sio influenciadas pela dinamica da sociedade, o que nos péinite Olhar além dalestera da vide ptivads. Essa é em suma, a promessa da imaginacio sociolgica: @7ESEAB volvimento da capacidade de mudar de perspectiva, de estabelecer relacées ‘entre as diferentes esferas que compéem o humano e social. Acraves dela podemos voltar a ser surpreendidos com a realidade, estranhar o que nos € familiar © ampliar nossos questionamentos, passando a refletir sobre a realidade social a partir de novos pressupostos. Nesse mesmo sentido, © sociélogo Anthony Giddens (2005:25) diz que A imaginagio sociolégica, acima de tudo, QigedenOs que Pensemos FoH dae ‘S0S5a8 tina familiares dennossas VidASEORICIANB, «fim de que a observemos de modo renovado. Considere o simples ato de tomar uma xicara de café. O ‘que poderiamos dizer, a partir de um ponto de vista sociolégico, sobre esse exemplo de comportamento aparentemente tio desinteressante? Poderiamos assinalar que o café possui um valor simbélico como parte de nossas ativida- des didtias, é um ritual e convida & socializagéo. Segundo, o café é uma droga liciea; mas existem outras drogasilicitas. Os sociélogos estio interessados no porque da existéncia de el contraste.E, por tltimo, o habito de beber café esté relacionado a uma rede internacional econémica de importagio e exportacio, ‘também a um passado histérico, 4 _—__Inrnonugio As Crénctas Soctats fem grande me- de afastar 0 olhar de nossa perceber melhor suas caracteristicas. Aquilo hecido, Através do conhe- Portanto, vemos que a imaginagdo sociolégica consiste, ida, num exercicio de estranhar, de relativizan, propria sociedade e, assim, que é familiar nao nos é necessariamente conl timento produzido pelas Ciéncias Sociais, podemos refleir crticamente sobre nossa propria realidade sociale perceber melhor seus mecanismmos € caracteristicas. Temas para discussa a As observagoes de T Papalagui? 2 Podemos exercitar « atual? a Podemos imaginar § de nés, com os qui mhecidos? conhecime' —Am do surgi ue aquil ganda me pecifico p s informa pos remo cultura, ada 20 ¢s as Sociai apreendi 1a Euro pessoas. para ou om os i to proc ara trds sr conh EDawe ssem afirmadas como xe isso tenha ocorrido acirramento de crises cas. e, com eles, as Cién- dickens) ide de tijolos vermelbos, naga e as cinzas 0 tives- de um vermelbo e um pagem, Era uma cidade antemente serpentes in- Tinha um canal negro € nensaspilhas de eificios rremecidos e onde os ém- colicamente, semelbante essa gente, cada dia era siltimo e ao préximo. néveis da indistria, que da vida a espalharem-se nao diremos em que me- nem ouvir falar. ente laborioso. [..] Fatos, tos, fatos, fos, por toda nntificando elementos do ias Sociais. Untpape I = © munvo pas Citnetas Sociats SECAO 3 — A especificidade das Ciéncias Sociais* Asociedade, objeto da ciéncia Quando falamos em “Cincias Sociais’ nos referimos a um conjunco bas- tante amplo de disciplinas (no Brasil, em geral, a Sociologia, a Antropolo- sia, a Cigncia Politica) que, normalmente, se propem identifica eexplicar fendmenos relativos ao conjunto de pessoas interligadas no que chamamos Sociedade”. Como vimos na segéo anterior, esse campo de conhecimen- to voltado a0 estudo dos aspectos propriamente sociais da vida dos seres humanos surgiu no final do século XIX, no contexto do crescimento das cidades ¢ do advento do mundo moderno, ¢ relaciona-se, portanto, a um processo de multiplicagao e complexificagio do mundo social. Nao pode- fmos esquecer, no entanto, que as Ciéncias Sociais surgem num momento fem que as ditas Ciéncias Naturais jf se encontravam bastante estabelecidas é legitimadas em torno de campos como a Biologia, a Quimica ¢ a Fisica, Sque se dispunham a investigar (¢ a revelar) causas ¢ fendmenos relaciona- dos 20 corpo humano e & natureza, valendo-se de métodos ¢ procedimen- ‘2s baseados no principio da objerividade claro, assim, que as Ciéncias Sociais surgem diante do desafio de Fi Se cstabelecer como um ramo de conhecimento que, a despeito do carder strato ¢ fluido de seu objero —a sociedade —, pretendia ser reconheci- 1B como uma ciéncia legitima. Mas como alcancar tal legitimidade cien- IGica se, diferentemente das células, éromos e drgios que sio objetos por ncia das Ciéncias Naturais, a sociedade e 0 mundo social nao podem Gaalisados em laboratérios? Como desenvolver objetividade cientifica 1 — 0 cientista social — um objeto do qual o priprio observador 1c — isto é, a vida social? Essa questo percorreu grande parte dos ‘empreendidos pelos primeitos cientista sociais, preocupados em ir a legitimidade das Ciéncias Sociais. Iuitas as maneiras encontradas por diferentes cientistas sociais Tesponder a essas questées. Cada qual procurou debater (¢ defender) fetetocin: Schut (1979); Simmel, (1983) 4 Inerropvgso As Crieras Soctats a legitimidade cientifica do estudo da sociedade, apresentando métodos ¢ reflexes que, no seu conjunto, revelam um grande investimento em com- provar a especificidade de seu objeto e, consequentemente, a necessidade do desenvolvimento de métodos préprios para sua compreensio. A partir dessas consideragées podemos partir para a pergunta que per- meia toda essa discussio: quais sio, afinal, os prineipios cientificos que embasam o estudo da sociedade e, portanto, a legitimidade das Ciéncias Sociais? A frase do flésofo Alfred Schutz (1979:267) nos dé um bom pon- to de partida: “as principais diferencas entre as Cigncias Sociais ¢ as Natu- rais nao tém de ser procuradas numa légica diferente que rege cada tamo do conhecimento”. Isso significa, em linhas gerais, que tanto as Ciéncias Naturais quanto as Sociais partem de um mesmo compromisso com o principio légico do conhecimento e, ainda, que ambas compartilham do mesmo rigor na utili- zagio dos métodos de investigacio. Ou seja, apesar de diferentes, cada um desses ramos de conhecimento é igualmente valido como estudo cientifico. Mas essa constatagéo deixa ainda em aberto a questio sobre a especifcidade das Cigncias Sociais, ou, em outras palavras, sobre como o objeto de estu- do desse ramo de conhecimento pode ser tratado de forma cientifica, Alfred Schutz dé outra pista ao afirmar que, apesar de dividir com as Ciéncias Naturais principios da légica e do rigor metodolégico, as Cién- cias Sociais, por possuirem um objeto proprio, devem investir também em ios e dispositivos especificos para dar conta do universo que pretende investigar. Ainda segundo 0 autor, essa diferenga de método sé pode set devidamente compreendida se analisarmos a fundo a especificidade (e a complexidade) do objeto de estudo do cientista social Ea partir dessa proposta que Schutz apresenta o que acredita ser a dife- renga fundamental entre as Ciéncias Naturais e as Ciéncias Sociais: o fato de que, nestastltimas, 0 campo de observagio do cientista — a realidade social — tem um significado prévio para ele proprio e para as pessoas que sio objeto da investigagio, Isso significa que: 2 nas Ciéncias Naturais, o cientista pode definir sozinho 0 que é rele- vante para o estudo, construindo seu objeto de acordo com o que Ihe ade, apresentando métodos € srande investimento em com- equentemente, a necessidade ra sua compreensio. stir para a pergunta que per- 6s prinelpios cientificos que , a legitimidade das Ciéncias 79:267) nos dé um bom pon- as Ciéncias Sociais ¢ as Natu- diferente que rege cada ramo as Ciéncias Naturais quanto so com o principio ligico do ham do mesmo rigor na utli- apesar de diferentes, cada um yélido como estudo cientifico. . questo sobre a espeificidade sobre como 0 objeto de estu- tado de forma cientifica que, apesar de dividir com as g. rigor metodolégico, as Ci o, devem investir também em nta do universo que pretende renca de método s6 pode ser a fundo a especificidade (ea sta social. senta o que acredita sera dife- is ¢ as Ciéncias Sociais: 0 fato 4o do cientista — a realidade proprio e para as pessoas que definir sozinho o que é rele- eto de acordo com o que Ihe 25 Untpape I~ O munDo pas Crtweras Sociats parecer mais apropriado. Isso porque o mundo da natureza nao & previa- mente interpretado por scus elementos, jé que ele “nada ‘significa’ para as moléculas ¢ dtomos af existentes” (Schutz, 1979:268); \cias Sociais, por sua vez, a realidade a ser observada pelo cien- tista (a realidade social) tem um significado previamente determinado plas pessoas que nela vivem, pensam e agem. Assim, o cientista social constrdi seu objeto de estudo baseado nas construcées feitas por aqueles que vivem no mundo social a ser analisado. E nesse sentido que Schutz afirn que o cientista social tem o desafio de interprecar construtos de segundo grau, ou seja analisar as interpretacées dos varios atores (inclusive dele pr6prio) sobre a realidade social que se propéc estudar, As Ciéncias Sociais como ciéncias da compreensdo En linhas gerais, podemos dizer que as Cigncias Sociais se caracterizam Por buscar entender os principios pelos quais as pessoas organizam suas Fidss no dia a dia e, de maneira mais ampla, como se estrutura a vida em Seiedade. Para isso, como vimos anteriormente, o cientista deve contar Sem mécodos apropriados para analisar tais principios, jé previamente espretados c experimentados pelos atores que povoam 0 mundo social. Podemos afirmar, por essas razbes, que as Ciéncias Sociais lidam pre- mntemente com 0 universo da compreensdo (e néo da explicaséo, © no caso das Ciéncias Fisicas e Naturais), ou seja, que se baseiam no ito de compreender 0 mundo social que, a0 mesmo tempo, essa sio se fandamenta na compreensi que as pessoas tem sobre esse © mundo social, por elas vivido e experimentado diatiamente. Parece fcado, mas se pensarmos separadamente em dois niveis da compre- "2 questio fica mais clara: primeiro nivel, a compreensio éa “forma particular de experiéncia jexcio da qual o pensamento do senso comum toma conhecimento Sando social e cultural” (Schutz, 1979:269). Ou seja, é 0 principio 26 I rrnopugio as Crtnctas Soctats {que orienta as pessoas no mundo social no qual estéo insridas,fazendo com que integrantes de uma sociedade interpretem a realidade a0 seu redor, agindo sobre ela de acordo com seu ponto de vista 9 num segundo nivel, a compreensio & 9 método do cientista socal, ou ‘sia € 0 meio pelo qual ele busca apreender o significado das agées dos individuos. Neste segundo nivel hi, portnto, um duplo movimenne ° Pesquisidor desenvolve a prépria compreensio sobre a compreensio {tue 3s pessoas tém do mundo social. E nesse sentido que Schutz afiema, conforme mencionado, que o desafio do cientista social é 0 de interpre- ‘ar construtos de segundo gran, Desse modo, a especifcidade das Ciéncias Socaisesté no fato de que suas claboragées ¢ seus conceitossdo necessriamente bascados nas labors, Ses € conceitos que os indviduos fazem sobre suas experiéncias dire, Essa afirmagdo deixa em aberto, {eos cerca? Serd que podemos falar em objetividade das Cincias Sociais, hia Vez due seu universo de esto €Fundamentalmentebascado nos sig. nificados subjerives que os individuos conferem ao mundo social? Para responder a tis quests, Schutz retoma a diferenciagio entre os dois nives de compreensio, Segundo 0 autor os construtos de spade gra ~_ através dos quais as Ciéncias Sociais desenvolvem anilises sobre 0 mun- do socal — seriam constugoes cienrfficas, ou seja, fits “de acondo con 3 repras de procedimento validas para todas as ciéncias empiticas’ Inve significa que essas construgées correspondem 4 claboragao de esquemas A tpifcagio ¢ clasiicagio que permitem que o cientisa social ana « compreenda as agdes subjetivas dos individuos, Portanto, apesar de as Cincias Socaistrabalharem com uma meto- dologia bascada sobre o mesmo principio de seu objeto — o Principio da (ubrensdo 0 fto de clas se paurarem em elaborages de segundo grau (ou seja, em compreensbes sobre a compreensio dos individuos) Ihe. pos: al no qual estao inseridas, fazendo de interpretem a realidade ao seu n seu ponto de vistas € 0 método do cientista social, ou eender o significado das ages dos portanto, um duplo movimento: ompreensio sobre a compreensio E nesse sentido que Schutz afirma, do cientista social éo de interpre- éncias Sociais esta no fato de que ssariamente baseados nas elabora- sobre suas experiéncias didrias. entanto, uma importante questio ais enquanto conjunto de postu- 0 € possivel estabelecer principios objesividade das Ciencias Sociais, ndamentalmente baseado nos sig- sferem ao mundo social? z retoma a diferenciacio entre os stor, os construtos de segundo graw esenvolyem andlises sobre o mun- ts, OU seja, fetas “de acordo com sodas as ciéncias empiricas”. Isso ndem & elaboracio de esquemas m que o cientista social analise € iduos. is trabalharem com uma meto- » de seu objeto — o principio da jem elaboragées de segundo grau censio dos individuos) Ihes pos- 27 Usipabe I~ © weno pas Citctas Soctais sibilia manter cientificidadc. Iso porque, a partir dessas compreensdes de Segundo grau, o cientista pode trabalhar com sistemas te6ricos e hipéteses gerais que, como em qualquer metodologia cientifica, permitem observar diferentes fendmenos através de principios comuns. Ainteracéo social Uma ver estabelecidas as especificidades das Ciéncias Sociais como campo de conhecimento eos principios metodolégicos através dos quais 0 mundo Social pode ser cientificamente observado, é preciso atentar paras peculia- fidades clo objeto de estudo do cientista social. O que é, ainal, a sociedade? Quais sio os elementos constitutivos da realidade social a ser compreen- Sid pelo pesquisador? De que maneira podemos relacionar, para efeitos Bsricos c metodolégicos, os individuos e a sociedade que formam e pela ‘geal sio formados? O socidlogo alemio Georg Simmel, considerado atualmente um dos Feadadores da Sociologia, articula uma resposta a essas questées em rorno Pe claboracdo de um conceito crucial: 0 de interagio. Em termos gerais, podemos definir a interagdo como um proceso no sduas ou mais pessoas agem numa relagéo reciproca em determinada si- Assim, diferentemente do comportamento, que inclui tudo que um iduo faz (se cocar, estudar, brincar), 4 interagio tem um componente Imente social que faz. com que as agées sejam bascadas em trocas erfeades com as demais pessoas envolvidas naquela situagio. Nesse » 0s individuos influenciam-se reciprocamente, Por exemplo, quan- js a um restaurante agimos de acordo com nossos pressupostos a do conjunto de significados que fazem parte desta situacio social s 0 cardipio, escolhemos o prato, somos servidos, comemos 2 conta, Além disso, nos vestimos de determinado modo consi spropriado, nos comportamos i mesa segundo habitos aprendidos fente ¢ falamos com os garcons e outras pessoas presentes no res- de determinada mancira, Todas essas ages se basciam naquilo }s que elas significardo para as outras pessoas que participam OU Sejay esperamos que nossas agdes scjam entendidas e “tes- 28 ~~ Inrnopugio as Citneias Sociats Pondidas’ conforme o contexto social. E claro que as coisas podem nao “funcionar’ do modo que imaginamos. Podem surgir desentendimmenes on mesmo conflitos a respeito do comportamento adequado a cada sits, S20. Com isso, os pressupostos que temos a respeito do que deve aconte, erg ca stuagio social podem ser modificados na propria ineracio social, Todos os dias interagimos com diferentes pesoas, em diferentes situa. Ses, Movidosporimpulsos (que podem ser pritcos,ertcos,religiososees) mabe Prepésitos (de dfisa, de ataque, de ajuda etc), estamos em per- Manente convivéncia com outros individuos, influenciando-os ¢ sendo resets criando uma verdadeira rede de relagdes entre individuos. Ea easy rede, resultado da unio entre indviduos em ineapds, que Simmel chars de “Sociedade” — uma unidade feta de individuos que, movides por seus impulsos e propésitos, estéo em constante rocesso de troca. Nessa visio, a sociedade no é algo que existe “acima’ dos individuos, sepa um mero “somatério” de individuos. Simmel afirma que aso, iedade existe onde quer que vitios individuos entrem em interagio, 0 que fovea que, para 0 autor, interagdo € a prépria eséncia da sovicdade, oy elemento central: Sociedade é asim, somente um nome para um circulo de individuos que ‘sto, de uma mancicadeterminada, ligdos uns aos outros por eft dae ‘elisSes mituas,e que por isso podem ser caractrizados como uma unlade — dt mesma mancira que se considera uma unidade um sistema de massas SriPoras us em seu comportamento, se determinam plenamente por meio de suasinfluéncias reciprocas (Simmel, 2006218} Essa petspectivaaponta ainda para uma visto acerca do lugar dos indi Wauos como elementos da andlise social: nio devem se considerados naes abstratos, isolados, mas sim agentes da interagio. Em ours palavras, os vam como elementos da reflexio socoldgica desde que relagio. E nesse sentido que a sociologia deve ser com. Preendida ndo como o estudo da vida dos individuos (o que caberis 4 Bias laro que as coisas podem nao xdem surgir desentendimentos amento adequado a cada situa- 2 respeito do que deve aconte- dificados na propria interagio pessoas, em diferentes situa- riticos, erdticos,religiososetc.) = ajuda etc.), estamos em per- 10s, influenciando-os ¢ sendo Somos entio recorrentemente atisfazer os mais diversos inte- ries entre individuos. Fa essa t interagdo, que Simmel chama ividuos que, movidos por seus rocesso de troca, existe “acima’ dos individuos, juos. Simmel afirma que a so- os entrem em interago, 0 que ia esséncia da sociedade, seu 2 um cfrculo de individuos que 5 uns aos outros por efeito das sracterizados como uma unidade 2 unidade um sistema de massas serminam plenamente por meio 18). visio acerca do lugar dos indi- o devem ser considerados entes eragio. Em outras palavras, os reflexio socioligica desde que que a sociologia deve ser com- ndividuos (0 que caberia 3 Bio- 29 Untpape I~ O munpo pas CrtNeras Soctats. — logia ou a Psicologia), mas sim como o estudo da realidade socal formada a partir das relagdes por eles estabelecidas ‘Tendo em vista que as situacdes determinadas por agées teciprocas en- ttre os individuos se fazem ¢ desfazem continuamente, de acordo com as situagées cotidianas de cada um dos agentes, fica claro que a perspectiva delineada por Simmel leva & definigéo da sociedade como algo maleavel, sempre inacabado em permanente movimento, ‘Vejamos, por exemplo, a dinamica do dia de um estudante: a0 sair de casa para ir faculdade, tomar um café na padaria, pegar uma conducao ¢ entrar na sala de aula, Iniimeras microinteragdes, em diferentes situagées € com diferentes pessoas, foram estabelecidas ¢ encerradas. Assim, a0 to- ar a sociedade como resultado dessas intimeras ¢ continuas interagées, Simmel acaba por defini-la como um processo inesgotivel e ininterrupto; como um constante acontecer, ¢ néo como algo fixo ou acabado — dat ele preferir mesmo falar em sociagdo, para enfatizar a natureza procesual da vida social. As formas sociais Partindo do pressuposto de que as Ciéncias Sociais estudam a sociedade e que; por sua vez, a sociedade é 0 resultado do movimento ininterrupto de in- teragbes, podemos concluir, logicamente, que o cientista social deve se ocu- pardo estudo e da compreensio de tis interagées. No entanto, sabemos que 2 cada minuto incontives relag6es sio feitase desfitas, ligando, desligando ¢religando iniimeras pessoas pelos mais diferentes motivos. Iso nos leva aos Seguintes problemas: como desenvolver um conhecimento objetivo sobre a sociedade, uma vez.que seria impossivel investigar cada uma dessas int Seteragées na sua singularidade para, a partir de seu conjunto, elaborar uma acerca do todo social? Como, entio, abordar cientificamente esse -que se define por seu carer miiltiplo e fluido? SSmmel responde essas questées propondo que a Sociologia atue a par- tum método que separe, apenas para fins analiticos, 0 conteiido e as 'das interacées sociai 30 “—_— wrropucio As Crtncias Soezats 8 Os contesidos (ou matérias) da interagio seriam tudo aquilo que existe ‘nos individuos (como instintos,interesses,fnalidades,inclinagdes, esta- do psiquico etc.) ¢ que os leva a originar agées sobre outros individuos our ainda, a receber suas influéncias. Os contetidos seriam, em suma, ‘as motivagbes que provocam a intera¢do e podem se manifestar como fome, amor, trabalho, religiosidade, medo etc. No entanto, essas maté, fas nao tém significado social por si 6, abstratamente, Flas 6 adquirem, significado quando atuam como conteiido de interagdes entre sujcitos, As formas socaisseriam as diferentes manciras pelas quais os individuos organizam as interagées, de acordo com a motivacio (0 contetido) ¢ & situagdo; as configuragées momentineas de um complexo de movi- mentos. Simmel dé 0 nome de sociapao as formas através das quais os individuos estabelecem as interagbes do dia a dia. Assim, a sociacio ¢a forma, rcalizada de diversas maneiras, na qual os individuos constituemm ‘uma unidade dentro da qual se realizam seus interesses, Antes de passarmos & avaliagdo das possibilidades que essa diferencia- si0 entre forma ¢ contetido oferece ao estudo cientfico da sociedade, € importante lembrar que essa separasio existe apenas no nivel da abstragao analcica, Sempre interagimos de determinada forma, movidos por deter. tinado motivo, em relagio a determinada pessoa, grupo ou objeto, Por- fanto, na realidade concreta,essas duas instincias sio indissoctiveis: no existe forma social desligada de contetido, bem como uma matéria nio pode se expressar socialmente sem uma forma que a veicule. Voltando ao exemplo abstrato do restaurante, embora possamos ima- Binat formas geras pelas quais as interages se desenvolvem nessa situagao social, a atualizacio dessas formas — isto é, como efetivamente. acontecem, cm cada caso — & sempre singular. Cada vista a cada restaurante, por mais «ue possa guardar semelhancas,¢ diferente. Muitas vezes, como ji chama- ‘mos atensio, a interacéo modifica os pressupostos que tinhamos antes de entrar nessa situagéo, (Um interese, uma finalidade ou um motivo estdo sempre ligados a tuma forma momentnea especifica de interagio (uma forma ocia), “em

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