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Thorwald Dethlefsen Rudiger Dahlke Uma Visao Nova da Cura como Ponto de Mutagao em que um Mal se Deixa Transformar em Bem Cultrix rien Titulo original: Krankheit als Weg - Deutung und Be-deutung der Krankheitsbilder. Copyright © 1983.C. Bertelsmann Verlag GmbH, Munique. Todos os direitos reservados. Nenhuma parte deste livro pode ser reproduzida ou usada de qualquer forma ou por qualquer meio, eletrénico ou mecanico, inclusive fotocépias, gravagbes ou sistema de armazenamento em banco de dados, sem permissdo por escrito, exceto nos casos de trechoscurtos citados em resenhas criticas ou artigos derevistas. A Editora Pensamento-Cultrix Ltda. ndo se responsabiliza por eventuais mudangas ocorridas nos enderegos convencionais ou eletrOnicos citados neste livro. Dados Internacionais de Catalogacio aa Publicagio (CIP) (Camara Brasileira do Livro, SP, Brasil) Dethlefsen, Thorwald ‘A doenga como caminho: uma visfonova da cura como pontode mutao em que um mal se deixa transformar em bem | Thorwald Dethlefsen, Radiger Dahlke ; tradugdo Zilda Hutchinson Schild. SdoPaulo : Cultrix, 2007. Titulo original : Krankheit als Weg, 14* reimpr. da I* ed.de 1992. ISBN 978-85-316-0406-5 1. Doengas~Aspecios psicologicos 2. Manifestagdes psicologicas de doengas 3. Medicina psicossomitica 4. Psicologia clinica dasatde I.Dahlke,Radiger II. Titulo 07-1078 CDD-616-08 NLM-WM 460 indices para catdlogo sistematico: 1. Doengas : Manifestagdes psicossomaticas + Medicina psicossomatica 616.08 0 primeiro nimero a esquerda indica a edigHo, ou reedicto, desta obra. A primeira dezena a direita indica 0 ano em que esta edigdo, ou reedi¢do foi publicada. Edigdo Ano 14-15-16-17-18-19-20 07-08-09-10-11-12-13 Direitos de tradugao para a lingua portuguesa adquitidos com exclusividade pela EDITORA PENSAMENTO-CULTRIX LIDA. Rua Dr, Mario Vicente, 368 — 04270-000 — Sao Paulo, SP Fone: 6166-9000 — Fax: 6166-9008 E-mail: pensamento@culirix.com.br http://mww:pensamento-cultrix.com.br que se reserva a propriedade literéria desta traduso. Sumdario REE: onsomsivecnmucnesweneaarrenoncaeaaass waReaaNTTAT 7 1° Parte Condigées prévias para a compreensao da doenga e da cura 1. A doenga e os sintomas . 1 2. Polaridade e unidade 21 3. A sombra .. 41 4, Bem e mal . 47 5. O ser humano esté doente . 57 6. A busca das causas........- * 61 7. O método do questionamento profundo 71 28 Parte Interpretacao e significado dos sintomas das doengas 1. A infeccdo 2. O sistema imunoldgico 3. A respiragao 4. A digestdo 5. Os érgios dos sentidos 6. As dores de cabeca .... 7. A pele 8. Os rins . 9, . O coracao e a circulacao . 11. O sistema motor e os nervos . 199 12. Os acidentes 211 13. Os sintomas psiquicos . . 219 + 233 » 241 - 249 Lista das correspondéncias psiquicas dos érgios e palavras-chave para as partes do corpo .........22.00eese0eeeeee 261 aa You have either reached a page that is unavailable for viewing or reached your viewing limit for this book. tante resistencia. Todavia, esperamos que ao mesmo tempo ele chegue as maos daquelas pessoas (muitas ou poucas, nao importa) que 0 usarao como ajuda durante o caminho. Foi exclusivamente para elas que o escrevemos. Munique, fevereiro de 1983 Os autores aa You have either reached a page that is unavailable for viewing or reached your viewing limit for this book. aa You have either reached a page that is unavailable for viewing or reached your viewing limit for this book. aa You have either reached a page that is unavailable for viewing or reached your viewing limit for this book. por exemplo, a ascensdo da coluna de mercirio num tubo de vidro nao tem por si sé nenhum significado; somente quando interpretamos tal fato como a expresso de uma mudanga de temperatura € que 0 processo se torna significativo. Quando as pessoas deixam de interpretar os aconteci- mentos deste mundo e o decurso do seu destino, sua vida mergulha na insignificancia e na falta de sentido. Para poder interpretar algo, € preciso ter um quadro de referéncias exterior Aquilo cuja manifestagao queremos interpretar. Assim sendo, os acontecimentos do nosso mundo material ¢ formal tornam-se interpretaveis quando usamos algum sistema de referén- cia metafisico. Apenas quando o mundo visivel das formas “se transforma numa alegoria” (Goethe), é que ele se torna significativo para as pessoas. Assim como a letra e o ntimero so os portadores formais de uma idéia subjacente, tudo 0 que é visivel, tudo o que é concreto e funcional é na verdade, a expressdo de uma idéia, o mediador do invisivel. Resumindo, podemos denominar esses dois 4mbitos de forma e contetido. O contetido se expressa na forma, e a conseqiiéncia disto € que as formas se tornam repletas de significado. Caracteres escritos ou letras, que nao transmitem ne- nhum significado, continuam sem sentido e vazios para nés. Nem a mais exata andlise desses caracteres alteraria esse fato. Nitido e compreensivel para qualquer pessoa é este inter-relacionamento também na arte. O valor de uma pintura nao se baseia na qualidade da tela e das tintas; os com- ponentes da pintura s4o meros veiculos e mediadores de uma idéia, que éa pintura interior do artista. A tela e as tintas possibilitam que o invisivel se torne visivel, o que de outra forma nao seria possivel, e s4o, portanto, a expressio fisica de um contetido metafisico. Esses exemplos muito simples sao a nossa tentativa de construir uma ponte para a compreensdo do método usado neste livro, ou seja, contemplar os temas doenga e cura, interpretando-os. Mas com esta postura, estamos deliberada e indubitavelmente deixando para trés o campo da “medicina cientifica”. Nao fazemos questdo de ser “cientificos”, visto que nosso ponto de partida é completamente outro. Nao obstante, nao se deve concluir que a argumentago ou a critica cientifica nunca seréo usadas no nosso modo de analisar os fatos. Adotamos o abandono intencional do enquadramento cientifico pois este se limita exatamente ao campo funcional e, dessa forma, impede que o significado e 0 sentido fiquem claros. Uma abordagem como a nossa nao se dirige a racionalistas e a materialistas inveterados, mas é dedicada as pessoas dispostas a seguir a trilha intrincada e nem sempre légica da consciéncia humana. Sao de grande ajuda, nessa viagem através da alma humana, os pensamentos imaginativos, a fantasia, as associagées, a ironia e um bom ouvido para perceber o que é dito nas entrelinhas. Nosso caminho exige também a capacidade de aceitar os paradoxos e as ambivaléncias, sem sentir-se imediatamente na obrigacdo de eliminar um dos pdlos para que haja clareza. Tanto na medicina como na linguagem comum se fala das mais dife- rentes doencas. Com esse desmazelo lingiiistico se constata com nitidez o 13, aa You have either reached a page that is unavailable for viewing or reached your viewing limit for this book. aa You have either reached a page that is unavailable for viewing or reached your viewing limit for this book. aa You have either reached a page that is unavailable for viewing or reached your viewing limit for this book. medicina moderna e cientifica, o nimero de pacientes nao diminuiu, nem mesmo na mintscula proporgdo de 1%. Sempre houve, e continua havendo, um grande numero de pessoas doentes; s6 os sintomas € que mudaram.Ten- ta-se dissimular este fato decepcionante por meio de estatisticas, que se referem apenas a um determinado grupo de sintomas. E assim que se noticia orgulhosamente, por exemplo, a vitéria sobre as doengas infecciosas, mas n4o se menciona ao mesmo tempo que outros sintomas aumentaram de intensidade e freqiéncia. Uma visao honesta s6 ser possivel quando, em vez de observar sin- tomas, comegarmosa analisar a ”doenga propriamente dita”. Essa tendéncia de observar sintomas no diminuiu até agora e € provavel que também nao diminua no futuro. A doenga esté tao profundamente arraigada na existéncia humana como a morte, e nao sdo alguns truques funcionais iné- cuos que vao elimind-la do mundo. Se compreendéssemos a grandeza e a dignidade da doenca ¢ da morte, também poderiamos ver, desse segundo plano, como sao ridiculos os nossos titubeantes esforcos para combaté-las com as nossas forgas. Podemos evitar essa desilusio na medida em que argumentarmos que a doenca e a morte no passam de meras funcées. Assim, nos € possivel continuar acreditando em nosso poder e em nossa grandeza. Vamos resumir mais uma vez: a doenga é um estado do ser humano que indica que, na sua consciéncia, ela nao est4 mais em ordem, ou seja, sua consciéncia registra que ndo hd harmonia. Essa perda de equilibrio in- terior se manifesta no corpo como um sintoma. Sendo assim, 0 sintoma é um sinal e um transmissor de informacdo, pois, com seu aparecimento, ele interrompe o fluxo da nossa vida e nos obriga a prestar-lhe atencdo. O sintoma avisa que, como seres humanos, como seres animicos, nds estamos doentes, isto é, 0 equilfbrio de nossas forcas animicas interiores est4 com- prometido. O sintoma nos informa que est# faltando alguma coisa. Por isso, antigamente, costumava-se perguntar a um doente: “O que esta Ihe fal- tando?” [Em alemdo: Was fehlt* Ihnen?] Este sempre respondia explicando © que sentia: “Eu sinto dores.” [Em alemao: Ich habe Schmerzen.] Hoje per- guntamos logo de inicio: “O que o senhor sente?” Bssas duas perguntas polares “O que esté lhe faltando?” e “O que o senhor sente?” sio muito significativas, se as examinarmos mais detalhadamente. Ambas so feitas a uma pessoa doente, e, para alguém nesse estado, a consciéncia sempre capta a falta de alguma coisa, pois se nada lhe faltasse, ela estaria sadia, ou seja, perfeita e integra. No entanto, quando algo falta 4 sate, ela nao est sadia, esta doente. Essa doenca se manifesta no corpo como um sin- toma. Entdo, 0 que se tem € a comprovacdo de que algo nos falta. Falta consciéncia, e portanto, tem-se um sintoma. * Em alemao, o verbo fehlen tanto tem o sentido de sentir como de faltar alguma coisa. (N.T.) 17 aa You have either reached a page that is unavailable for viewing or reached your viewing limit for this book. aa You have either reached a page that is unavailable for viewing or reached your viewing limit for this book. aa You have either reached a page that is unavailable for viewing or reached your viewing limit for this book. ainda mais clara: A doenga é a polaridade; a cura é a vitéria sobre a po- laridade. Por tras da polaridade que, como seres humanos, registramos, existe a unidade, a dimensao abrangente, em que os opostos ainda estao indife- renciados um do outro. Também chamamos de Todo a esse nivel do ser; por definicdo, ele engloba tudo, raz4o pela qual nada pode existir fora dessa unidade, fora desse Todo. Na unidade nao existe nem modificagéo nem desenvolvimento, visto que a unidade independe de tempo e de es- paso. A Unidade Total esta na paz eterna; é o ser puro, sem forma e sem atividade; que fique claro que tudo o que se disser sobre a Unidade sera através de termos negativos, ou seja, implicard negar de fato alguma coisa: sem tempo, sem espaco, sem modificagao, sem limites. Toda afirmagao positiva provém do nosso mundo dividido e, por isso, nao pode ser utilizada para mencionar a Unidade. Do ponto de vista de nossa consciéncia polar, essa Unidade parece um Nada. Embora correta, essa formulagdo muitas vezes cria nos homens associagées falsas. A maioria dos ocidentais, em especial, se decepciona quando descobre, por exemplo, que na filosofia budista o almejado estado de consciéncia denominado “Nir- vana” significa o mesmo que Nada (literalmente, dissolugao). O ego dos homens sempre deseja algo que lhe seja externo e é com grande desagrado que apreende ser de fato preciso dissolver-se a fim de tornar-se uno com tudo o que existe. Na Unidade, o Tudo e o Nada passam a ser Um. O Nada renuncia a qualquer manifestacdo e limitacao e assim foge da polaridade. A origem primordial de todo Ser é o Nada (0 Ain Soph dos cabalistas, 0 Tao dos chineses, 0 Neti-Neti dos hindus). Ele é 0 tinico que de fato existe, sem comego e sem fim, de eternidade a eternidade. Podemos falar sobre essa unidade, porém nao podemos imagind-la. A unidade € 0 oposto polar da propria polaridade, consistindo numa idéia que desafia os nossos pensamentos; na verdade, até podemos senti-la e experimenté-la até certo grau, por meio de determinados exercicios ou técnicas de meditagao, que nos ajudam a desenvolver a habilidade de, ao menos por pouco tempo, unir polaridades com a nossa consciéncia. Con- tudo, ela sempre escapa a uma descricdo oral ou a uma anilise intelectual, pois o nosso raciocinio precisa exatamente da polaridade como pressuposto. Nao é possivel o conhecimento sem a polaridade, sem a divisdo entre sujeito e objeto, entre conhecedor e conhecido. Na Unidade nao ha conhecimento, s6 ha ser. Na Unidade nao existe desejo, nao existe querer e esforco, nao ha movimento; portanto, nao existe algo exterior pelo qual ansiar. Trata-se do antigo paradoxo: sé podemos encontrar a plenitude no Nada. Voltemos outra vez ao Ambito que podemos experimentar com segu- ranga. Todos temos uma consciénciqupolarizada, que cuida para que o mundo nos pareca polarizado. E impoftante reter em nossa mente que nao € 0 mundo que é€ polarizado, e sim a consciéncia com a qual estamos no mundo. Como exemplo das leis da polaridade em agao, imaginemos a respiragdo que da a todos nés uma vivencia direta de polaridade. A ins- 22 aa You have either reached a page that is unavailable for viewing or reached your viewing limit for this book. aa You have either reached a page that is unavailable for viewing or reached your viewing limit for this book. aa You have either reached a page that is unavailable for viewing or reached your viewing limit for this book. Nés sentimos subjetivamente a polaridade de nossa consciéncia na al- ternancia de dois estados de consciéncia claramente delineados; mais pre- cisamente, os estados de vigilia e sono. Somos capazes de ver estes dois estados de consciéncia como analogias interiores para a polaridade dia/ noi- te da natureza. Por isso, costuma-se falar em nossa consciéncia diurna e nossa consciéncia notuma, ou nos lados claro e escuro da alma. A divisio entre mente consciente e o inconsciente est4 intimamente associada a essa polaridade. Assim, acontece que durante o dia nés pensamos naquele 4m- bito de consciéncia em que passamos nossas noites e no qual surgem os sonhos provindos do inconsciente. Mas literalmente falando, a palavra in- consciente nao é um termo adequado, visto que o prefixo in nega a palavra consciente que 0 segue — uma negativa que nao corresponde aos fatos. (Compare un-hdfflich [des-respeitoso], un-schuldig [inocente] etc.) Inconscien- te nao é o mesmo que sem consciéncia [desmaiado]. Durante o sono, estamos de fato num estado diferente de cons-ciéncia. Nao se pode falar de forma alguma de uma consciéncia que ndo existe. O inconsciente, portanto, nao significa em absoluto auséncia de consciéncia; na realidade, trata-se de mera classificacao unilateral por parte da consciéncia diurna, que esta ciente de haver algo ali que nao € capaz de atingir. Mas por que, entdo, nos identificamos tao naturalmente com a consciéncia diurna? Sempre, desde a divulgagao da psicologia profunda, nos acostumamos a imaginar nossa consciéncia de forma estratificada, estabelecendo uma dis- tingao entre mente consciente, mente subconsciente e mente inconsciente. Essa separagdo em superior e inferior nao € obrigatéria, embora cor- responda a uma sensagdo simbélica de espago, que localiza o céu e a luz num pélo superior, ea terra e a escuridéo num pélo inferior. Se quiséssemos apresentar um equivalente grafico desse modelo de consciéncia, poderia- mos fazé-lo através da seguinte figura: limitado subjetivo “Mente consciente” “Subconsciente” “Inconsciente” objetivo ilimitado 26 aa You have either reached a page that is unavailable for viewing or reached your viewing limit for this book. aa You have either reached a page that is unavailable for viewing or reached your viewing limit for this book. aa You have either reached a page that is unavailable for viewing or reached your viewing limit for this book. qual subdivide o circulo (que significa a totalidade ou a unidade) numa metade negra € noutra branca. Cada uma por sua vez, contém um “em- briéo” da polaridade oposta, na forma de um ponto da cor contratia. Da mesma forma, a unidade é dividida por nossa consciéncia em duas pola- ridades, mutuamente complementares. ESQUERDO DIREITO Logica Percepgao da forma Linguagem (sintaxe, gramAtica) Percepgao da totalidade Sensacdo do espaco Formas arcaicas de linguagem Hemisfério verbal: Leitura Misica Escrita Olfato Calculos Padrao total Contagem Subdivisao do ambiente Visdo abrangente do mundo Pensamento digital Pensamento analégico Pensamento linear Simbolismo Dependéncia do tempo Atemporalidade Anélise Holismo Conceitos légicos Inteligéncia Intuigao aa You have either reached a page that is unavailable for viewing or reached your viewing limit for this book. aa You have either reached a page that is unavailable for viewing or reached your viewing limit for this book. aa You have either reached a page that is unavailable for viewing or reached your viewing limit for this book. e “falta de engajamento social”. Entretanto, por infelicidade, esses criticos nunca estudam detalhadamente esses ensinamentos, antes de atacd-los. O resultado € que apresentam uma apressada mistura de seus proprios pontos de vista e de alguns conceitos que nao apreenderam bem, tirados unica- mente de outras doutrinas: chamam ao resultado dessa mistura de absurdo, “criticismo”. Esses mal-entendidos vém de longa data. O préprio Jesus ensinou esse caminho tinico que leva da dualidade 4 unidade, e nem Ele foi inteiramente compreendido pelos priprios discipulos (com excegao de Jodo). Jesus cha- mou este mundo de “polaridade” e chamou de Unidade 0 “reino dos céus” ou a “morada do meu Pai”. Também chamou a Unidade simplesmente de “Pai”. Ele enfatizou que tal reino nao é deste mundo e ensinou o caminho até o Pai. No entanto, todos os seus ensinamentos foram primeiro inter- pretados num sentido essencialmente material, referente a este mundo. O Evangelho de Sao Joao nos mostra, capitulo por capitulo, esses mal-enten- didos; Jesus fala do templo que reconstruiria em trés dias; os discipulos acharam que estava se referindo ao Templo de Jerusalém, quando na ver- dade ele se referia ao proprio corpo. Jesus falou com Nicodemo sobre o renascimento do espirito; contudo, este pensou que ele estivesse falando do nascimento de criangas. Jesus mencionou 4 mulher, perto do pogo, a Agua da vida, e tudo em que ela pdde pensar foi na agua de beber. Estes exemplos podem ser multiplicados 4 vontade, e todos mostram as diver- géncias entre os pontos de vista de Jesus e os de seus apéstolos. Jesus tentou fazer as pessoas enxergarem o significado e a importancia da uni- dade, enquanto seus ouvintes se apegavam, febril e temerosamente, ao mundo das polaridades. Nao conhecemos nenhuma exortag4o de Jesus no sentido de melhorar o mundo ou transformé-lo num paraiso. Ao invés disso, em tudo o que disse Ele tentou encorajar as pessoas a darem aquele passo que os levaria a salvagdo; “salvagéo” significa cura e totalidade. Para comegar, esse caminho sempre provoca medo, pois também con- duz ao sofrimento e a angistia. S6 se pode vencer 0 mundo aceitando-se © que ele oferece; o sofrimento também sé pode ser anulado através da aceitacao, pois mundo e sofrimento sempre foram uma sé coisa. Os ensi- namentos esotéricos n4o nos ensinam a fugir do mundo, mas sim a adotar praticas para transcendé-lo. “Transcender o mundo", todavia, € sinédnimo de “transcender a polaridade” e isso, por sua vez, é igual a renunciar ao eu, ou ego, pois somente se atinge a totalidade quando, finalmente, se para de separar o eu do resto da existéncia. Nao deixa de ser uma ironia que um caminho, cujo real objetivo é a destruigdo do ego e a fusao do self (ou eu maior) com o todo, seja criticado como um caminho de salvagio egoista. Além do mais, 0 motivo para a existéncia desses caminhos de cura nao est4 na esperanca de um “mundo melhor” ou “numa recompensa pelos sofrimentos deste mundo” (0 pio do povo), mas na compreensdo de que o mundo material em que vivemos sé adquire significado na mesma pro- porgao em que tenha um ponto de referéncia além de si mesmo. 34 aa You have either reached a page that is unavailable for viewing or reached your viewing limit for this book. aa You have either reached a page that is unavailable for viewing or reached your viewing limit for this book. aa You have either reached a page that is unavailable for viewing or reached your viewing limit for this book. estard se valendo do modo mais seguro de impedir sua perfeicao e sua iluminagdo. Neste universo nao existe nada que ndo tenha raz4o de ser, mas grande parte dessas justificativas ainda nao pode ser entendida pelos individuos. De fato, todos os esforgos dos homens servem a um unico objetivo: aprender a conhecer melhor as interligagdes — ou, como costu- mamos dizer, tornarmo-nos mais conscientes — mas néo para modificar as coisas. Nada ha a modificar ou a melhorar, a nao ser o nosso proprio modo de ver as coisas. Ha bastante tempo os homens vivem uma ilusao, achando que sua atividade, que suas agdes modificam o mundo, o reformulam e, quigé, 0 melhoram. Essa convicc4o é uma ilusdo de éptica e se fundamenta na projecdo da prépria transformagio. Se, por exemplo, uma pessoa ler o mes- mo livro depois de intervalos longos de tempo, o lera sempre com outros olhos, como se fosse novo, dependendo de seu ponto de evolugao no mo- mento. Se nao tivéssemos tanta certeza de que nossos livros sao inalteraveis, poderiamos concluir, com a maior facilidade, que o proprio contetdo se modificou. Com essa mesma falta de compreensdo nds usamos os conceitos “evolugao” ou “desenvolvimento”. Acreditamos que evolugao é 0 resultado de acontecimentos e iniciativas e nao enxergamos que ela nada mais é do que a concretizacéo de um padrao constante e subjacente. A evolugdo nada produz de novo; o que ela faz ¢ tornar-nos progressivamente mais cons- cientes daquilo que sempre existiu. Aqui podemos usar outra veza analogia da leitura de um livro. O contetido e a histéria estéo contidos no livro durante todo o tempo, mas o leitor s6 pode conhecé-los pouco a pouco, a medida que o for lendo. Como conseqtiéncia da leitura, 0 contetido se revela passo a passo ao leitor, embora tenha existido ha séculos como um livro completo. O contetido do livro nao adquire vida pelo fato de ser lido; em vez disso, o leitor ou a leitora léem capitulo por capitulo, intei- rando-se de um padrao preexistente. Nao é 0 mundo que se modifica; 0 que acontece é que as pessoas manifestam em si mesmas os varios e sucessivos niveis e aspectos do mun- do. A sabedoria, a perfeigao e a consciéncia significam a habilidade de ver e de reconhecer a totalidade da vida, com toda sua validade e equilibrio. Para o observador poder reconhecer a ordem é preciso que ele esteja em ordem. A iluséo da modificagao surge devido a polaridade, que divide tudo o que existe ao mesmo tempo em uma coisa depois da outra, ou entao nas férmulas uma/e/outra e ou/ou. E a esse mundo de polaridades que os fildsofos orientais chamam “ilusdo” ou “maya”. A maior exigéncia que eles fazem aqueles que se esforgam para adquirir 0 conhecimento e a libertagao € o cumprimento da tarefa de desmistificar esse mundo de for- mas, reconhecendo que ele € uma ilusdo, que esse mundo na realidade nao existe. Contudo, os passos que levam a esse conhecimento (“despertar”) precisam ser dados neste mundo polarizado. No caso de a polaridade im- pedir que a Unidade se manifeste simultaneamente, esta sera restabelecida de modo direto no decurso do tempo, na medida em que cada pélo for 38 aa You have either reached a page that is unavailable for viewing or reached your viewing limit for this book. aa You have either reached a page that is unavailable for viewing or reached your viewing limit for this book. aa You have either reached a page that is unavailable for viewing or reached your viewing limit for this book. que no queremos viver, e tudo o que mo queremos deixar participar de nossa identificagao, forma a nossa sombra. A rejeigao da metade de todas as possibilidades nao as faz de forma alguma desaparecer, mas sim apenas as exclui da identificagdo pessoal ou da identificagao efetuada pela mente consciente, O “nao”, na verdade, fez desaparecer de nossa vista um dos pélos, mas nem por isso nos livramos dele. A partir desse momento, o pélo re- cusado continua a viver na sombra de nossa consciéncia. Tal como criangas que acham que, ao fechar os olhos, se tornam invisiveis, os homens acre- ditam que podem se livrar de uma metade da verdade pelo fato de nio vé-la. Assim, permitimos que um pélo (por exemplo, a competéncia) entre no raio Iuminoso da consciéncia, ao passo que 0 pélo oposto (a incompe- téncia) tem de ficar no escuro para ndo ser visto. Do no-ver chega-se logo ao ndo-ter e comecamos a acreditar no fato de que um pélo pode existir independentemente do outro. Com 0 termo sombra (este conceito foi desenvolvido por C. G. Jung) designamos, portanto, a soma de todos os ambitos rejeitados da realidade que o homem nao quer ver em si mesmo ou nos outros e que, por isso mesmo, permanecem inconscientes. A sombra é 0 maior perigo para as pessoas, pois elas a tém sem conhecé-la e sem saber que existe. E a sombra que providencia para que todos os nossos esforgos e objetivos se transfor- mem realmente em seus opostos. Todas as manifestagGes provenientes de sua sombra s40 projetadas pelo homem no mal andnimo que existe no mundo, porque ele tem medo de descobrir a verdadeira fonte de seus males dentro de si mesmo. Tudo 0 que o ser humano de fato nao quer, € de que nao gosta, provém de sua propria sombra, visto que esta € a soma daquilo que ele nao deseja ter. Entretanto, a recusa em aceitar uma parte da realidade e vivé-la, nao leva exatamente ao sucesso esperado. Os varios Ambitos da realidade obrigam os homens a se ocuparem intensamente com eles. Isso, na maior parte das vezes, acontece através da projegio, pois assim que recusamos determinado principio e o banimos, ele sempre gera medo e rejeigdo em nés, quando o encontramos de novo no assim chamado mundo exterior! Para dar sentido a essas interligacées, talvez seja bom lembré-los outra vez que 0 conceito de “principios” compreende ambitos arquetipicos do Ser, que podem se manifestar numa enorme variedade de formas concretas. Cada manifestacdo concreta € um representante formal daquele principio interior. Eis um exemplo: A multiplicagao é um principio. Nesse princi- pio abstrato, podemos observar as manifestagdes formais mais variadas (3 vezes 4, 8 vezes 7, 40 vezes 348 etc.). Essas formas exteriormente diferen- cidveis de expressao sao todas representagées daquele nico principio da “multiplicagao”. Além disso, devemos entender muito bem que o mundo exterior se fundamenta justamente nos mesmos principios arquetipicos do mundo interior. A lei da ressondncia afirma que somente podemos entrar em contato com aquilo que nés mesmos vibramos. Essa idéia, extensiva- 42 aa You have either reached a page that is unavailable for viewing or reached your viewing limit for this book. aa You have either reached a page that is unavailable for viewing or reached your viewing limit for this book. aa You have either reached a page that is unavailable for viewing or reached your viewing limit for this book. maiores desafios que temos de enfrentar. E por isso que 0 autoconhecimento tem sido considerado a missao mais dificil e importante por todos os que estéo em busca da verdade. Conhecer a si mesmo ndo significa descobrir © eu €, sim, descobrir o self, visto que este € oniabrangente, enquanto 0 eu divide e define constantemente a totalidade, impedindo-nos de conhecer © todo que compée o self. Por outro lado, aqueles de nés que estiverem preparados para lutar, no sentido de serem mais honestos consigo mesmos, a doenga pode tornar-se um maravilhoso auxilio ao longo do caminho, pois a doenga nos torna pessoas honestas! Nos sintomas da doenga vivemos de maneira clara e visivel aquilo que sempre banimos da psique ¢ que queremos ocultar. A maioria das pessoas acha dificil falar livre e francamente sobre seus problemas mais profundos (se € que de fato os conhecem). Contudo, elas falam abertamente sobre seus sintomas para qualquer pessoa. Mas nao ha maneira mais clara de contar aos outros quem de fato somos! A doenga nos torna honestos e, impiedosamente, traz 4 tona os abismos da alma que vinhamos tentando ocultar. Essa honestidade (involuntdria) também éa base para a simpatia e a dedicacdo que se manifestam diante das pessoas doentes. A honestidade faz com que o doente seja simpatico, pois é quando esta doente que o homem mostra como ele é. A doenga compensa todas as unilateralidades e traz o doente de volta ao centro. Ai desaparecem de stbito parte das manipulagées do ego inflado e de sua pretensdo de poder; muitas ilus6es sao destruidas num instante; de repente os caminhos de vida sio questionados. A honestidade possui uma beleza que, em parte, se torna visivel nas pessoas doentes. Vamos resumir 0 que foi dito. Como microcosmo, o ser humano é um reflexo do universo e contém em sua consciéncia a soma de todos os prin- cipios de vida. O seu caminho através do mundo das polaridades o obriga a manifestar esses princfpios latentes, de tal forma que com a ajuda destes possa tornar-se progressivamente mais consciente de si mesmo. Mas co- nhecimento pressupée polaridade e esta, por sua vez, obriga o ser humano a um ritmo ininterrupto de decis6es. Toda decisio divide a unidade em dois pélos, um que € aceito e outro que é rejeitado. O aspecto aceito da polaridade é expresso no comportamento e € integrado no nivel da cons- ciéncia. O pélo abandonado € expulso para a sombra e continua exigindo atengo, visto que parece sempre estar voltando “de 14". A doenca é a mais especifica e comum expressao desta lei geral, segundo a qual os as- pectos da sombra sio precipitados na forma humana, e nela s4o somati- zados como sintomas. Por meio do corpo, todo sintoma forca o ser humano, apesar de seus esforcos em contrério, a manifestar algum dos principios que, deliberadamente, havia optado por nao viver; isso restabelece o equi- librio. Nessa medida, um sintoma é a expressio fisica de alguma coisa que esta na consciéncia humana. O sintoma torna os homens honestos porque torna visivel o que eles reprimiram. 46

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