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3 METODOS DE PESQUISA EM PSICOLOGIA SOCIAL’ Hartmut Giinther A psicologia social estuda a relacdo recipro- ca entre 0 individuo e seu meio social: de um lado, trata do impacto que as pessoas exercem em seus amigos, familiares, colegas e até em desconhecidos. Por outro, estuda a maneira como cada um de nos é influencia- do pelos outros no que diz respeito a nossos sentimentos, experiéncias e comportamen- tos. Essa relagio reciproca entre o individuo um dado meio social sempre diz respeito a algum objeto, espaco, ideia, pessoa (a si préprio, ao meio social ou a terceiros) so- bre os quais se tem atitudes, experiéncias ou disposigdes comportamentais. Este cap{tulo trata de algumas das maneiras de se estudar esse tridngulo e de se chegar a explicagSes e compreensies dos fenémenos da interagdo social. Como o contetido deste livro sugere, a psicologia social estuda um grande mi- ‘mero de assuntos e envolve um niimero di- versificado de abordagens metodolégicas. Entretanto, podemos afirmar que séo trés 0s caminhos principais para se estudar e se compreender 0 comportamento humano® no contexto da psicologia social empirica: 1. observar © comportamento que ocorre naturalmente no Ambito da vida real; 2. criar situagées artificiais e registrar o com- portamento diante de tarefas definidas para estas situages; Nao é distante, somente parece como se fosse. (Berra, 1998, p. 100)? 3. perguntar as pessoas sobre o que fazem, pensam ou experienciam acerca de algo no passado, no presente ou no futuro. Cada uma dessas trés familias de téc- nicas para conduzir estudos empiricos - ob- servagio, experimento ¢ levantamento de dados ~ apresenta vantagens e desvantagens distintas (Kish, 1987). Tais vantagens esto ligadas & qualidade e & utilizagéo dos dados obtidos e devem ser consideradas pelo pes- quisador quando este for escother o método mais apropriado para um determinado obje- tivo de pesquisa. Nao obstante as variagdes dentro de cada uma dessas trés grandes reas, podemos afirmar que 0 ponto forte da observagio é 0 realismo da situago estu- dada; que o experimento possibilita tanto a randomizagao de caracteristicas das pessoas estudadas quanto inferéncias causais; e que olevantamento de dados, especialmente por amostragem, isto é survey, assegura melhor representatividade e permite generalizacao para uma populagao além da estudada, No presente capitulo, apresentamos um tour d’Rorizon dessas principais manei- ras de estudar a relago reciproca entre o in- divide 0 mato toca. Como fo condo, consideramos uma série de pesquisas sobre um mesmo tema —comportamento pré-social ~ para demonstrar 0 uso de diferentes mé- todos dentro da psicologia social, bem como PSICOLOGIA SOCIAL: PRINCIPAIS TEMAS EVERTENTES 59 seus pontos fortes ¢ fracos. Apés delimitar 0 fio condutor, comportamento pr6-social, ini- ciamos com observagées gerais sobre pesqui- sa social e tecemos algumas consideracdes sobre procedimentos qualitativos e quanti- tativos. A seguir, trataremos de andlise de contetido, de observagées, de experimentos e de levantamento de dados. Concluimos o capitulo com algumas consideragées sobre a divulgacao dos resultados de pesquisa. 0 FIO CONDUTOR: COMPORTAMENTO PRO-SOCIAL ENQUANTO OBJETO DE ESTUDO ~ O que faria se encontrasse um milhio de délares? ~ Procurava encontrar a pessoa que perdeu o dinheiro e, caso fosse pobre, devolveria. (Berra, 1998, p. 59) © comportamento pré-social assume muitas variantes. Pode ser material ou espi- ritual, pode basear-se em altruismo, egois- mo, reciprocidade ou aprendizagem de normas sociais (Aronson, Wilson e Akert, 2002). E facil verificar que as pessoas va- riam quanto a sua disposicao para ajudar © outro. A variagéo esta no ato em si: pas- sar o sal na mesa fora do alcance do outro, entregar um objeto que caiu despercebido, oferecer o assento no 6nibus lotado, deixar um pedestre passar, desviar 0 caminho para dar carona a alguém, doar sangue, dar con- forto ao préximo, interferir em uma briga para proteger aquele que parece ser o mais fraco, para citar apenas alguns atos de aju- da. Mas a variabilidade também esté na ra- pidez da resposta, na disposicéo de ajudar a “qualquer” pessoa, ou somente determi- nados individuos, na disposigao de ajudar sob “qualquer” circunstdncia, ou somente em determinadas situagdes. Além do mais, a decisdo de ajudar dependerd 1. de fatores individuais: género, idade, educagao; 2. de fatores circunstanciais: hora, local, tempo disponivel; 3. de fatores sociais: a presenca de outras pessoas, isto é, alternativas de ajuda; ‘4. da avaliagdo do custo pessoal, por exem- plo, no caso da interferéneia em uma briga, qual a chance de ser bem-sucedido ou de apanhar por sua vez, ou, até a ex- pectativa de retribuicdo furura? Até este ponto, fizemos uma reflexio emnivel desenso comum a respeito do tépico em questo. Podemos prosseguir discutindo © assunto com amigos ou colegas sem che- garmos a conclusdes que possam nos permi- tir entender, predizer e controlar 0 compor- tamento em questo. Para realizar pesquisa de maneira sistemética na psicologia social, devemos delimitar nosso assunto e chegar a perguntas mais especificas. O processo de delimitagao implica que escolhemos entre as, possiveis raz5es mencionadas anteriormen- te para realizar uma pesquisa sistemética. Por exemplo, qual a relacdo entre género e ajuda, levando em conta 0 esforgo neces- sério, as circunstdncias e o esforgo exigido? Importante, como primeiro passo, serd uma revisio da literatura sobre o tema. Uma busca realizada em janeiro de 2008, usando somente a palavra-chave helping behavior, produziu 2.286 referén- cias a artigos em revistas cientificas no site wwwscirus.com; aproximadamente 11 mil referéncias diversas no site Google scholar; 934 referéncias a artigos no Psychinfo da American Psychological Association ¢ 16 no site wwwscielo.org, neste caso, com o ter- ‘mo equivalente em Portugués. Esse exemplo aponta que 0 uso do termo-chave relacio- nado ao conceito global de comportamento pré-social j4 nos rende muitas indicagées. Repetir a busca com outros termos, tais como pro-social behavior ou altruism, deverd resultar em mais referéncias, além de dupli- catas. Antes ¢ além de delimitar as referén- cias assim obtidas, seja em termos do tipo de ajuda, do contexto, das pessoas envolvidas, entre outros aspectos, é importante escolher 6s termos-chave com cuidado: embora, nes- te exemplo, ajuda, caridade, cortesia, apoio 60 TORRES, NEIVA& COLS. € seus correspondentes em outras linguas facam parte do conceito mais amplo chama- do comportamento pré-social, comecar com um termo em vez de outro pode nos enca- minhar em diregées bastante distintas. Cabe salientar que ndo é aconselhdvel limitar a busca a estudos em um determinado inter- valo de tempo (p. ex., 08 titimos 10 anos) e rotular o que foi publicado antes de uma de- terminada data de “velho” ou superado. No caso conereto, a0 usar 0 limite de 10 anos estar-se-ia ignorando estudos importantes realizados na década de 1960, como, por exemplo, os estudos de Berkowitz e Daniels (1964), Bryan e Test (1967), Darley e Latané (1968), Epstein e Hornstein (1969) ou Latané e Darley (1968). ALGUMAS OBSERVACOES GERAIS ‘SOBRE PESQUISA SOCIAL ‘Voce deve ter cuidado quando nfo sabe para onde vai, porque pode ser que nio ‘chegue Ié. (Berra, 1998, p. 102) Fenémenos sociais podem ser estuda- dos a partir do referencial teérico e com mé- todos de diferentes dreas do conhecimento. A pesquisa social baseada em miiltiplos mé- todos tem uma longa tradigéo nas ciéncias sociais. Em 1933, Lazarsfeld, Jahoda e Zeisel publicaram um estudo sobre os desempre- gados de Marienthal, um vilarejo perto de Viena, Austria. Os autores, respectivamente, socidlogo com doutorado em matematica aplicada, psicdloga social com doutorado em psicologia geral e cientista social com um doutorado em ciéncias sociais e outro em direito, faziam parte do centro de pes- quisa em ‘psicologia econémica. Neurath (1983) observa que 0 que tornow esse tra- balho um classico “foi a entdo relativamente nova combinacao entre quali- tativa e andlise de dados qualitativos” (p. 124). Enquanto Mayring (2002) cita partes do estudo de Lazarsfeld e colaboradores como exemplos de diferentes vertentes da abordagem qualitativa, o préprio Lazarsfeld insistiu na combinagdo de varios métodos (vide Lazarsfeld, 1944, p. 60). © conceito exemplar deste capitulo, comportamento pré-social, interessa tanto psicologia, pelo viés do comportamento em nivel individual, quanto, por exemplo, sociologia, no que se refere ao comporta- mento cooperativo entre grupos, ou, ainda, ciéncia politica no contexto de assistén- cia internacional. Entretanto, nfo apenas resultados encontrados em éreas de conhe- cimentos correlatos acerca de um mesmo tema contribuem para uma compreensio mais aprofundada. Igualmente importan- te é estar aberto para abordagens teéricas e metodolégicas diversas de uma mesma rea. Duas palavras-chave caracterizam a abordagem metodoldgica implicita no es- tudo de Lazarsfeld e colaboradores: multi- método e triangulacdo. O primeiro termo dispensa definicao, e o segundo é definido por Vogt como “usando mais do que um mé- todo para estudar a mesma coisa” (1993, p. 234). Podemos acrescentar, com Sommer € ‘Sommer (2002, p. 6), que usar procedimen- tos miltiplos é melhor do que usar apenas ‘um, que miiltiplos olhares dentro de uma rea como a psicologia social ndo somente so desejdveis, mas se fazem necessédrios, vez que constituem operacdes convergen- tes (Webb, Campbell, Schwartz ¢ Sechrest, 2000). ‘Comecamos o capitulo com uma refe- réncia a Kish (1987) e a seu alerta de que, ao escolher um ou outro método de pesqui- sa, 0 pesquisador estard, necessariamente, fazendo um compromisso em relagdo ao re- sultado final de seu trabalho: aceita as van- tagens e as desvantagens de um método em vez destas de outro método. implicito nessa € a recomendagio de se utili- zar mais de um método ao estudar um tema qualquer, visto que, por si s6, cada uma das abordagens se mostra incompleta. Brewer Hunter (1989) afirmam que pesquisa de ‘campo, levantamento de dados, experimen- tagéo € pesquisa néo reativa constituem os principais métodos das ciéncias sociais. Indicando a possibilidade de, sempre que PSICOLOGIA SOCIAL: PRINCIPAIS TEMAS EVERTENTES 61 possivel, adotar-se uma estratégia de pes- quisa multimétodos, estes autores ~ como Kish - apontam que: interpretar os resultados de qualquer um desses métodos ¢ tarefa incerta na melhor das hipéteses. A maior fonte de incerteza € que qualquer estudo que utiliza apenas ‘um tinico tipo de método de pesquisa [...] deixa de lado hipéteses rivais nio testadas [J que colocam em questio a validade dos achados do estudo. (p. 14) Sommer e Sommer resumem diferen- tes abordagens (veja Quadro 3.1) e apon- tam, ainda, as seguintes vantagens de se utilizar de mais de um método como pesqui- sador: quando um procedimento nao pode ser utilizado por razGes fora do controle do pesquisador, ou por falta de recursos, em termos de tempo, dinheiro ou ntimero de pessoas para realizar um determinado estu- do, a utilizagao de mais de um método ofe- rece flexibilidade ao lidar com dificuldades. Mesmo havendo diferentes maneiras de se usar os métodos para pesquisar fend- ‘menos sociais, hd alguns pontos em comum que precisam ser levados em conta para se aumentar a probabilidade de se chegar a re- sultados titeis. Agregando as consideragées de Grunenberg (2001), de Mayring (2002), de Miles e Huberman (1994), bem como as de Steinke (2000) acerca de critérios de qualidade de pesquisa social, seguem algu- mas exigéncias ~ formuladas em termos de perguntas ~ para uma andlise sobre até que ponto uma pesquisa pode ser considerada de boa qualidade (Giinther, 2006). As perguntas da pesquisa séo claramente formuladas? © primeiro passo para conduzir uma pes- quisa é definir e delimitar a pergunta de pesquisa. Quanto maior a clareza sobre 0 que se quer saber, maior a chance de se QUADRO 3.1 ‘OPGOES DE PESQUISA SOCIAL Problema Abordagem Técnica de pesquisa Obter informagso confiével sob condigbes Estudar pessoas em —_Experimento laboratorial, controladas ‘um laboratério simulagao Descobrir como as pessoas se comportam —Observé-las Obsorvagdo sistomatica em pablico Descobrir como as pessoas se comportam — Solicitar que Documentos pessoas na sua vida privada ‘mantenham um dirio Descobrir o que as pessoas pensam Perguntar &s pessoas Entrevista, questionério, escalas de atitudes Identiicar tragos de personalidade ou Administrar um teste Testes psicolégicos habilidades mentais ‘estandardizado dontiicar padroes om material escrito Tabulagto sistemética Andlise de contoddo ou visual Compreender um evento nfo usual Investigacéo detalhada Estudo de caso edemorada Descobrir o que as pessoas fizeram Avaliar documentos Pesquisa de arquivos no passado ublicos Referéncia: Sommer e Sommer (2002, p. 6) 62 TORRES, NEIVA& COLS. obter éxito em uma pesquisa. Uma revi- sao de literatura sobre o assunto em ques- to ajuda no inicio de qualquer pesquisa. Considerando-se nosso exemplo de com- portamento pré-social, uma pergunta ge- ral poderia ser: quem ajuda quem, como e sob quais circunstincias? Para chegar a perguntas mais especificas, pesquisdveis, 6 necessdrio operacionalizar as quatro partes dessa pergunta geral: 0 quem ajuda pode se referir a pessoas de determinado género, idade, educacéo ou nivel socioeconémico. © quem recebe ajuda, idem. O como pode variar em termos de prontidio, isto é, aju- dar de maneira espontinea versus solicita- do, generosa versus de forma avarenta. Jé as circunstéincias podem variar em termos de ambiente ou do tipo de ajuda necessé- ria, Desta maneira, podemos chegar a per- guntas do tipo: “Os jovens ajudam mais aos Jovens do que aos idosos em situagdes de emergéncia de rua?", “Sob quais condigées, desconhecidos intervém em um assalto?”, “Os motoristas com carros com adesivos re- ligiosos se mostram mais cordiais no tran- sito?” Operacionalizar variéveis ‘Apés ter-se delimitado a pergunta, seré ne- cessdrio operacionalizar as varidveis por meio das quais os conceitos serio pesqui- sados. No exemplo anterior, os termos jo- vens € idosos se referem a faixas etdrias, ¢ podem ser operacionalizadas em termos de idade em anos. O conceito ajudar é que pre- cisa de uma definicéo e operacionalizagao mais detalhada. O nivel de ajuda, no caso de um assalto, pode variar, por exemplo, en- tre: gritar para chamar atengao de qualquer um por perto, chamar alguém competente, como a policia, intervir pessoalmente. Outra varidvel a definir seria a rapidez, isto é, 0 tempo em segundos apés a verificagdo da existéncia de uma emergéncia. Outras varid- veis que precisam ser operacionalizadas sio “situagéo de emergéncia!”: estamos falando de quais emergéncias ~ agressio fisica, aci- dente, desorientagdo, agressio verbal? No caso de adesivos religiosos, que forma de cordialidade seria esperada? Explicitou-se a teoria que pode ser derivada dos dados e utilizada em outros contextos? Uma distingdo importante entre pesquisa de natureza qualitativa e explorat6ria ver- sus pesquisa quantitativa e inferencial é que um objetivo central da primeira consiste na tentativa de se chegar a uma teoria por meio de um processo indutivo. Uma pesquisa de cunho quantitativo e inferencial visa confir- ‘mar uma teoria ja existente, representando, assim, um processo dedutivo. Seja qual for a natureza da pesquisa, é importante espe- cificar qual a teoria que orienta nossa pes- quisa, no caso de investigagio quantitativa. No caso de pesquisa qualitativa, é mais im- portante, ainda, deixar explicito para o lei- tor onde esperamos chegar ao realizar uma pesquisa exploratéria. O delineamento da pesquisa consistente com o objetivo @ as perguntas? Como apontado acima, a escolha do delinea- mento de pesquisa, isto é, a opcdo por uma abordagem observacional, experimental, de levantamento de dados ou uma anélise de conteiido deve ser consequéncia da pergun- ta de pesquisa a ser respondida. Nao cabe modificar uma pergunta para que esta se adapte a um método preferido. Os construtos analiticos foram bem explicitados? Conceitos como altrufsmo ou disposigéo para agjudar so chamados construtos hipotéticos, isto 6, algo que existe teoricamente, mas no € observavel diretamente. Que alguém pode PSICOLOGIA SOCIAL: PRINCIPAIS TEMAS E VERTENTES 63. ser considerado altruista ou ter disposigao para ajudar é inferido a partir de observa- Ges de comportamento diretos — no caso, vendo este alguém concretamente ajudando alguém, ou indiretos — analisando as respos- tas numa escala de atitudes, por exemplo. Assim, a questo que se coloca é: 0 compor- tamento observado ou as atitudes expressas permitem inferéncias acerca do altruismo ou da disposigao de ajudar? Os procedimentos metodolégicos so bem documentados? Todos os passos de uma pesquisa precisam ser descritos e explicitados. Quem foram as pessoas observadas, entrevistadas, partici- antes dos experimentos? Quais foram os instrumentos e equipamentos utilizados? Quais foram os procedimentos para a cole- ta de dados? A descri¢do dos participantes precisa ser suficientemente completa para que se possa saber como foram recrutadas quais suas caracteristicas. O detalhamento dos instrumentos e dos procedimentos deve permitir que outros pesquisadores possam replicar 0 estudo. Hé de se observar, en- tretanto, que estudos fora do laboratério sempre sofreréo do fator “circunstincias sécio-histéricas”, razdo pela qual no sao to- talmente replicdveis (Gergen, 1973). Ainda assim, descrever 0 método usado em uma pesquisa permite ao leitor avaliar as inter- pretagées dos dados oferecidas pelo autor € considerar possiveis explicaces alternativas = veja “A discusséo dos resultados” a seguir. Os instrumentos sao fidedignos e validos? Ha varias maneiras de registrar comporta- icha de observacdo, check-list, esca- ides, testes de competéncia, para mencionar as mais importantes. Esses ins- trumentos tém em comum o objetivo de re- gistrar e, assim, refletir de maneira mais fiel © comportamento sob investigagao, Nesse sentido, precisam satisfazer dois critérios de qualidade: fidedignidade e validade, sendo que 0 segundo nio existe sem o primeiro. Fidedignidade Fidedignidade diz respeito & consisténcia da medicéo repetida de um mesmo objeto sob circunstancias semelhantes (Vogt, 1993; Yarenko, Harari, Harrison e Lynn, 1986). Uma balanca poderia ser considerada fide- digna se, pesando um mesmo objeto varias vezes, indicasse 0 mesmo peso. Medidas psicolégicas, que, por parte do medidor, exi- gem interpretagdo de eventos, como seria 0 caso de uma observagao, ou que, por parte da pessoa avaliada, permitem um processo de aprendizagem, como seria 0 caso de um teste de conhecimento, correm 0 risco de ser menos fidedignas. Medidas psicolégicas cuja aplicagio e interpretagao nio dependem da competéncia do aplicador e que contém re- gistros (perguntas, itens, observagdes) es- tandardizados tendem a ser mais fidedignas ~ veja Pasquali (1999) para maiores deta- Ihes, inclusive maneiras de como calcular 0 index de fidedignidade que varia entre zero eum. Validade Mesmo sendo fidedigno, um instrumento no é, necessariamente, vilido. Validade trata da correspondéncia entre 0 que um instrumento pretende medir e do constru- to hipotético que esté sendo investigado. Mesmo se o balango mencionado registre de maneira fidedigna o peso em libra, nao seria um instrumento valido se 0 objetivo fosse verificar 0 peso em quilogramas. Um teste de conhecimento nao seria valido como instrumento para averiguar inteligén- cia - (Campbell e Stanley, 1963). Hé de se salientar que, enquanto existem medidas quantitativas e genéricas do grau de fide- dignidade de um instrumento, a validade de um instrumento representa um julgamento G4 TORRES, NEIVA& COLS. essencialmente qualitativo e especifico para cada situacdo estudada. Adotaram-se regras explicitas nos procedimentos analiticos? Os procedimentos analiticos sd bem documentados? s procedimentos de andlise de dados preci- sam ser, igualmente, explicitos e explicitados. No caso de procedimentos quantitativos, tal detalhamento frequentemente esta impli- cito no procedimento estatistico escolhido. Entretanto, especialmente no caso de proce- dimentos qualitativos, como, por exemplo, uma andlise de contetido, a explicitacdo e a documentagéo de procedimentos analiticos séo indispenséveis. Novamente, tais explica- Wes fazem-se necessérias para que o leitor ossa acompanhar, compreender ¢, se for 0 caso, replicar os passos analiticos. Os dados foram coletados em todos 0s contextos e tempos e com todas as pessoas sugeridas pelo delineamento? A preocupagao subjacente é a randomiza- ‘do de contextos, tempos e pessoas. Espe- cialmente no caso de pesquisa “exemplar”, a partir da qual queremos realizar inferén- cias acerca de outros ou “todos” os demais contextos ou pessoas, devemos selecionar alguns eventos ou pessoas que podem ser considerados representativos. Como foi feita tal selecdo — randomicamente, sistematica- mente, aleatoriamente, “a dedo”? Somente quando tal selecdo ¢ feita randomicamente podemos argumentar que nossos resultados podem permitir inferéncias para outros con- textos, tempos, pessoas além dos estudados. Caso contrério, sempre fica a pergunta, “serd que 0 que foi encontrado nao é um simples reflexo daquela situacéo, daquele tempo, daqueles participantes?” Se 0 procedimen- to que tivermos selecionado der margem a essa pergunta, a utilidade de nossos resulta- dos de pesquisa estaré comprometida. Randomizacéi Assim sendo, uma questi fundamental de qualquer pesquisa empirica é se os resulta- dos poderiam ter sido alcangados por acaso ou se so consequéncia de algum artefato de selegdo. 0 livro classico de Campbell e Stanley (1963) continua sendo a referéncia para verificar até que ponto um determina- do delineamento, especialmente experimen- tal, pode ser considerado verdadeiramente rand6mico ou nao, e quais as implicagdes de violar as pressuposigdes da r No caso de levantamento de dados, diferen- tes planos de amostragem (Kish, 1965) po- dem ajudar a tratar o problema da rando- mizacdo. No caso de estudos de observario, bem como que utilizar técnicas de andlise de contetido, existem possibilidades de rando- mizar situagdes, segmentos de observacdes ou de textos. O detalhamento da anilise leva em conta resultados nao esperados e contrarios ao esperado? A vantagem da abordagem experimental & a de permitir maior controle sobre os pro- cedimentos e as circunstdncias da pesqui- sa, excluindo, assim, varidveis estranhas e indesejaveis. Uma vez que tal delimitagao frequentemente resus em peaqust“etif- cial”, faz-se um contraste com a abordagem observacional, que inclui explicitamente “to- das” as varidveis de uma pesquisa (Giinther, 2006). Mas, mesmo no caso de experimen- tos, & necessério mostrar flexibilidade e re- gistrar eventos inesperados. O exemplo pri- mordial para tal flexibilidade é a pesquisa de Pavlov, pesquisador de fisiologia que es- tudou a salivagéo em cachorros. Quando se deparou com reagées inesperadas nos ani- mais, mudou o rumo de suas i PSICOLOGIA SOCIAL: PRINCIPAIS TEMAS EVERTENTES © 65 € chegou a estudar 0 condicionamento con- dicional, que seria chamado, posteri te, de condicionamento cléssico (Boring, 1957). Adiscusséo dos resultados considera possiveis alternativas de interpretagao? Foi afirmado anteriormente que, quanto mais especifica a pergunta, quanto mais detalhada a hipétese sob estudo, mais ex- pectativas para uma determinada classe de resultados. Mesmo assim, é importante nao fechar os olhos para explicagées alternati- vas, especialmente quando os resultados encontrados ndo correspondem ao espera- do. Por outro lado, é importante precaver-se contra resultados incongruentes em termos das teorias conhecidas. Nao vale argumen- tar que a ciéncia “tradicional” ou os méto- dos positivistas ndo conseguem dar conta dos resultados nao usuais encontrados. Os resultados estimulam aces - basicas e aplicadas - futuras? Existe uma longa discussao académica sobre a importéncia relativa da pesquisa dita apli- cada versus a pesquisa basica. Sem querer alongar essa temdtica neste momento, cabe citar a observagao de Lewin acerca do as- sunto: © maior calcanhar-de-aquiles da psico- logia aplicada tem sido o fato de que, sem ajuda tedrica apropriada, ela teve de seguir 0 método dispendioso, inefi- ciente elimitado de ensaio ¢ erro. Muitos psicdlogos que trabalham hoje em dia ‘um campo aplicado tém consciéncia agucada de uma cooperacio estreita en- tre a psicologia teérica ¢ a aplieada. Isto pode ser conseguido na psicologia, como aconteceu na fisica, seo tedrico nao trata dos problemas aplicados com pretensiosa antipatia ou com medo de problemas sociais; e se 0 psicélogo aplicado se der conta de que nio existe nada mais prético do que uma boa teoria. (1997, p. 288) Participantes da pesquisa Definida a pergunta da pesquisa e especi- ficadas as caracteristicas dos participantes, precisa-se refletir sobre 0 acesso & amostra de pessoas. Onde e como sero recrutados? No caso de observacdo do comportamento, em que locais serdo feitas as observagies? ‘As pessoas vio saber que esto sendo obser- vadas? No caso de um experimento, onde serdo recrutados 0s participantes? No caso de entrevistas, questionérios ou aplicacéo de escalas e testes, onde e como as pessoas sero abordadas ou recrutadas: na rua, em Iocais como shoppings, escolas, rodovidrias, ‘em seus locais de trabalho ou em suas ca- ‘sas? Caso as caracteristicas pessoais - como género, idade, educagio, natureza do traba- Tho ~ sejam parte da pergunta de pesquisa, € necessério ter acesso a participantes com determinadas caracteristicas. Procedimentos, instrumentos e anélise de dados Mais do que simplesmente os participantes, ‘so 0s procedimentos e os instrumentos que diferenciam as técnicas de pesquisa que se- rio apresentadas a seguir. Néo somente pre- cisam ser escolhidas em fungio da pergunta specifica de uma pesquisa, mas também do que ¢ factivel, e do tipo de inferéncia que almejamos. O tipo de andlise de dados, por ssua vez, é consequéncia direta da pergunta, dos participantes e dos procedimentos. Andlise dos resultados © escopo deste capitulo no permite abor- dar, em qualquer nivel de profundidade, a andlise dos dados coletados durante a pes- 6G TORRES, NEIVA & CoS. quisa. Cabe fazer, inicialmente, uma distin- cdo entre estatistica descritiva e inferencial. A estatistica descritiva relata a distribuicao dos dados por meio de tabelas e gréficos. Tabelas apresentam frequéncias e percen- tagens em termos numéricos, enquanto gréficos permitem visualizar a distribuigao dos dados (Nicol e Pexman, 1999, 2003). Entretanto, a distribuico de frequéncias, as aparentes diferencas entre grupos ou even- tuais relages estabelecidas por meio de ta- belas e graficos necessitam de uma resposta seguinte pergunta: aqueles resultados sio sisteméticos ou se chegou a eles por acaso? Realizando poucas observagées em um tini- co local, dificilmente sera possivel fazer afir- magées sobre o comportamento das pessoas em geral. © mesmo ocorre se entrevistamos apenas nossos amigos ou pessoas que esto convenientemente disponiveis. E por meio de estatisticas inferenciais que podemos sa- ber até que ponto os resultados sao sistemé- ticos ou foram obtidos por acaso (Bisquerra, Sarriera e Martinez, 2004; Dancy e Reidy, 2006; Siegel e Castellan, 2006). ABORDAGEM QUANTITATIVA VERSUS QUALITATIVA ‘Noventa por cento do jogo ¢ 50% mental. (Berra, 1998, p. 69) ‘Apontamos acima trés caminhos prin- cipais para realizar pesquisa no contexto das ciéncias sociais: observagdo, experimen- tos e levantamento de dados. Antes de tra- tar cada um deles individualmente, convém ressaltar o que eles tém em comum. O que une os mais diversos métodos e técnicas de pesquisa inclufdos nessas trés grandes fam{- lias de abordagem ¢ o fato de todos partirem de perguntas essencialmente qualitativas (Giinther, 2006). Qualquer pesquisa parte da constatacéo de que as pessoas variam, se comportam de maneira diferente. Isso traz & tona a pergunta a respeito da razdo pela qual existe esta variabilidade. Como lidar com ela? Quais as suas implicagées? Estas perguntas exigem, por sua vez, respostas qualitativas. A variabilidade existe por essa ou aquela razdo. Tem esas ou aquelas im- plicagées. Na tentativa de se partir de uma ergunta qualitativa e de se chegar a uma resposta qualitativa, ha dois caminhos, ndo necessdria e mutuamente excludentes: 0 de procedimentos qualitativos e o de procedi- mentos quantitativos, Procedimentos qualitativos Procedimentos qualitativos tendem a ser in- dutivos e exploratérios: sem partir de hipé- ‘teses formais e explicitas, tenta-se construir um referencial te6rico a partir de dados coletados essencialmente por meio de ob- servages, incluindo, aqui, registros de com- portamento, tais como documentos, didrios, filmes e gravagSes que registrem manifes- tagées humanas observaveis. Em segundo lugar, a andlise desses dados costuma ser interpretativa, usando-se técnicas de andlise de discurso e de anilise de contetido (Bauer € Gaskell, 2002). Os pesquisadores que usam métodos qualitativos recorrem, frequentemente, & cléssica afirmacao de Dilthey (1894) “expli- camos a natureza, compreendemos a vic mental” (Hofstatter, 1957, p. 315). Querem salientar que visam compreender a vida mental e, portanto, utilizam métodos — qua- litativos - apropriados para a psicologia. Jé os pesquisadores que usam métodos quan- titativos, argumentam que explicar ¢ com- preender ndo sao processos antagdnicos, € que a vida mental faz parte dos fendmenos naturais. Procedimentos quantitativos Para explicar 0 comportamento humano no contexto da psicologia social, a abordagem quantitativa tende a ser dedutiva e confir- matéria, partindo de uma teoria. Parte de expectativas explicitas ou hipSteses formais para verificar a existéncia de diferencas ou relagbes nos fenémenos sociais, para testa- PSICOLOGIA SOCIAL: PRINCIPAIS TEMAS EVERTENTES 67 las desta maneira. Em segundo lugar, no se restringe a métodos observacionais, mas tenta, sempre que possivel, realizar a coleta de dados, em qualquer dado contexto, de maneira sistemética, e de tal forma que seja possivel recorrer a técnicas da estatistica in- ‘ferencial para questionar se os dados cole- tados e analisados, bem como os resultados aos quais se chegou dessa maneira sio, de fato, sistematicos ou se poderiam ter sido encontrados por acaso. Para 08 conclusdes cientificas, é desejével, se no necessdrio, que possamos apontar a contri- buigdo dos diferentes antecedentes ao com- portamento de nosso interesse e eliminar os acontecimentos randémicos e os obtidos por acaso como possiveis explicacées. ‘A seguir, apresentam-se quatro abor- dagens de pesquisa, sendo duas de nature- za mais descritiva - a andlise de conteido € a observagao ~ e duas de natureza mais inferencial - experiment e levantamento de dados. ANALISE DE CONTEUDO Na realidade, nao falei tudo aquilo que eu disse. (Berra, 1998, p. 9) A anilise de contetido é uma entre vé- rias técnicas de pesquisa usadas para des- crever e sistematizar 0 contetido de comuni- cagbes pictéricas, escritas ou verbais (Vogt, 1993). A técnica pode ser utilizada com material visual (filme, video, desenhos, ilus- tragées, obras de artes plAsticas), com ma- terial impresso (jornais, revistas, livros, do- ‘cumentos pessoais) e com registros verbais (entrevistas e questionérios). Idealmente, nos dois primeiros casos, a selecéo do ma- terial 6 randémica, embora frequentemente sejam usadas amostras de conveniéneia, isto 6, material ao aleance do pesquisador. No caso de nosso projeto hipotético/ ilustrativo sobre comportamento de aju- da, imagine que colecionamos relatos de ocorréncias de ajuda nos jornais desde que comecamos a pensar em um estudo sobre esse assunto, mesmo antes de efetuar uma revisio sistemdtica da literatura especia- lizada. Recortamos artigos sobre pessoas que prestaram ajuda, avisamos a nossos amigos que estavamos interessados no as- sunto. Pedimos a eles que, sempre que en- contrassem algo interessante, recortassem tal noticia. Colecionamos nao somente ar- tigos sobre ajuda prestada, mas também sobre ajuda negada. Quando chegamos a ‘um niimero razodvel de artigos, decidimos comecar com a andlise do contetido desses Ressaltamos anteriormente que, quanto maior clareza sobre o que queremos saber, mais chance de éxito obteremos em uma pesquisa. Entretanto, em um primeiro momento de coleta de material documen- tal, podemos coletar “qualquer” material ‘que encontramos, 0 que nos encaminharia para mais qualitativos, ou, pelo menos, sem formular hipéteses espect- ficas. J4 em um segundo momento, quando sabemos de fontes confidveis para material documental, ¢ possivel formular hipéteses buscar trechos de textos, desenhos ou ima- gens de maneira sistematic Procedimentos Os sujeitos nesta modalidade de pesquisa ndo sao pessoas propriamente ditas, mas material produzido por ou sobre elas. Por exemplo, no caso de relatos na imprensa es- ctita sobre eventos de ajuda prestada ou ne- gada, os recortes constituem as unidades de andlise. Cada recorte descreve uma situacao € fala das pessoas envolvidas, do local, das circunstdncias do evento. Assim, cada relato pode ser classificado em termos de atribu- tos, tais como fonte (nome do jornal), data, confiabilidade da fonte e detalhamentos do conteiido. 0 procedimento em si consiste na anéli- se do contetido dos artigos. Giinther (2006) apresenta uma sistematizagio dos procedi- ‘mentos de uma pesquisa qualitativa. © instrumento para uma andlise de contetido pode ser um programa de com- putacdo por meio do qual se sistematize e 68 TORRES, NEVA COLS. analise o material coletado (p. ex., AtlasTI ou MAXgda). Vantagens desse método Observamos anteriormente que, “quanto maior clareza sobre © que queremos saber, mais chance de éxito em uma pesquisa”. Entretanto, e especialmente no inicio de um conjunto de pesquisas, existe menos clareza sobre o que pode ser investigado no decor- rer do projeto. Assim, nese momento ini- cial, uma abordagem mais aberta, especu- lativa, pode ser mais «til para se comegar a entender um dado assunto. Cabe aqui uma distingdo feita por Kidder e Fine (1987) en- tre a pesquisa qualitativa com a letra Q mai- liscula, que envolve observacao participante tro lado, refere-se & coleta de dados aber, mas que faz parte de uma pesquisa estrutu- rada em termos de objetivo e procedimento. Em outras palavras, a vantagem da pesqui- sa inicial, aberta, & a de dar apoio inicial a ideias para pesquisas subsequentes. Desvantagens Como frisamos anteriormente, ao tentar chegar a explicagées sobre fendmenos so- ciais, deve-se atentar & pergunta “mas sera que 0s resultados foram obtidos na base de eventos nao randémicos?” Quanto maior niimero de eventos arquivais usados para a anélise de contetido, maior seré a dificulda- de de responder a essa pergunta de maneira convincente. OBSERVACAO Voc pode observar muito coisa s6 olhan- do, (Berra, 1998, p. 95) ‘A vantagem da observagio & estar diante do comportamento que interessa, no precisando falar com as pessoas sobre seus pensamentos ou intengdes. Além do mais, nio sendo um intruso, vocé nao interfere ‘no comportamento, nem provoca reatancia has pessoas observadas (Webb, Campbell, ‘Schwartz, Sechrest e Grove, 1981). Em ge- ral, os estudos de observacao no exigem muito equipamento, mas sim tempo, jé que pode demorar até que surja o comportamen- to de interesse. A seguir, comentaremos trés tipos de observacdo: informal, sistemética e por meio de observarées informais que registramos o que acontece em torno de nosso meio social e ambiental. Sem catego- ras preestabelecidas nem hipéteses formais, esse tipo de observagio se aproxima mais dos estudos qualitativos. Tais observacées sto importantes na fase inicial de qualquer pesquisa e constituem a base para formular perguntas sisteméticas acerca de determina- do comportamento. Em estudos de observagio sistematica, utiliza-se algum esquema de categorias para ‘os comportamentos de interesse. Os comportamentos podem ser enumerados em termos de frequéncia, de intensidade, de pessoas envolvidas (s6, em diade ou grupo), das caracteristicas das pessoas, etc. Os re- gistros podem ser realizados em planilhas, check-lists, gravados ou filmados, Havendo dois observadores, € possivel verificar até que ponto hd concordincia entre ambos, Enquanto que em estudos de obser- vagdes informais ¢ sistematicas as pessoas observadas podem nem saber que so ob- jetos de estudo, a observagio participante explicita que os sujeitos fazem parte de um estudo e que esto sendo observados. O pes- quisador toma-se parte da vida dos obser- vados. Quando tal delineamento ¢ factivel, o estudo se torna mais ético, 4 medida que as pessoas do estudo sabem que estio sendo observadas e por quem estio sendo observa- das. Entretanto, a presenca explicita de um observador pode provocar reatancia entre 08 sujeitos da pesquisa, ficando a duivida de até que ponto as pessoas observadas estdo se comportando de maneira auténtica e no encenando algum comportamento que acre- PSICOLOGIA SOCIAL: PRINCIPAIS TEMAS EVERTENTES 69. ditam ser o esperado por parte do pesquisa- dor. Especialmente no caso de uma observa- do de duracdo mais longa, recomenda-se a observacdo participante, jé que a presenga demorada de um estranho desconhecido pode provocar desconfianca e reatdncia, pois os observados tendem a se acostumar com 0 a presenca do pesquisador conhecido € 0 ignorarem mais facilmente. Exemplos de estudos observacionais Conforme comentado anteriormente, os estudos observacionais sio custosos’ em termos de tempo, jé que podem demorar até que o comportamento de interesse pos- sa surgir. Diante desse problema, Silva e Giinther (2001) criaram “oportunidades de ajudar’ em um énibus lotado, no sentido de verificar quem entre os passageiros sen- tados se ofereceria para segurar um pacote de um passageiro em pé. Outros estudos que criaram “oportunidades de ajudar” para poder observar mais sistematicamen- te eventuais comportamentos pré-sociais so os de Levine e colaboradores (Levine € Norenzayan, 1999; Levine, Norenzayan e Philbrick, 2001). Um estudo hipotético No caso de um estudo hipotético sobre com- portamento pré-social, podemos pensar em observar 0 comportamento dos pedestres em um determinado trecho que apresenta irregularidades, talvez buracos, impedi- mentos por causa de uma construgio ou de carros mal estacionados. Qual seria o comportamento de ajuda no sentido de dar preferéncia a pessoas com problemas de lo- comocéo, ajudar maes com carinho de bebé € situagées semelhantes? Seré que existem alguns padrdes de cortesia ou ajuda? Procedimentos. Os sujeitos desta pesqui- sa seriam as situagdes de encontro e de inte- ragio de pessoas estranhas entre si no ponto problemético. O registro consiste em anotar © niimero de pessoas, suas caracteristicas (sexo, idade aproximada) seu comporta- mento na situagio, Para tanto, uma ficha de observagdo que permita anotar os dados relevantes de uma maneira que no chame atengdo serd preparada. Preferencialmente, haverd dois observadores independentes, 0 que permitiré estabelecer a fidedignidade das observagées pelo estabelecimento do grau de concordancia entre as observagies dos dois pesquisadores. Vantagens e desvantagens ‘Como apontado acima, a vantagem de estu- dos observacionais é o realismo da situacao estudada, algo nao alcangdvel em estudos experimentais, de levantamento de dados ‘ou aqueles que utilizam material arquival. Hé de se destacar, ainda, que comporta- mento nao acontece em um vazio, isto é, depende nao somente de fatores internos, subjetivos, mas do contexto social e fisico, ‘o que Barker e colaboradores (Barker, 1968; ‘Schoggen, 1989; Sommer e Wicker, 1991) chamaram de behavior setting. Entre as des- ‘vantagens, deve-se mencionar 0 alto custo de tempo, especialmente, em se tratando de comportamentos de pouca frequéncia. Em segundo lugar, a falta de controle sobre o surgimento da situagao de interesse signifi- ca auséncia de randomizacao e generaliza- ao. Além do mais, quanto mais complexo © comportamento e/ou a situagéo dentro da qual 0 comportamento acontece, mais trabalhoso sero o registro e a andlise dos dados (Scott, 2005). Cabe ainda mencionar alguns livros que tratam especificamente de técnicas ob- servacionais. Fagundes (1993) apresenta um texto didético de observacao sistemética, en- quanto Danna e Matos (1996) se propéem a ensinar, de maneira bésica, como observar ‘0 comportamento humano. Esses dois livros concentram sua atengdo no comportamento imediato das pessoas sendo observadas, jé 0 artigo de Pinheiro, Elali e Fernandes (2008), considera a interacdo entre as pessoas ¢ 0 ambiente, inclusive os resquicios do com- portamento das pessoas no ambiente.

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