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Consideragées sobre estratégias de materializagdo do projeto ético- politico na intervengao profissional Jonatas Lima Valle? O percurso teflexivo que propusemos para este artigo € resultado de um estudo iniciado em 2010 para o desenvolvimento da dissertagéo de mestrado realizada no Programa de Pés-Graduagao em Servigo Social da Universidade Estadual do Rio de Janeiro." Trata-se de um estudo sobre a dimensao politica da pratica dos assistentes sociais, que, no Brasil, expressa uma tensio provocada por duas demandas antag6nicas e desiguais entre si: a demanda institucional — pela conservagiio do status quo e a demanda ética (presente no Cédigo de Etica de 1993) — pelo compromisso de contribuigao no processo de emancipacao da classe trabalhadora. Sao demandas antag6nicas por expressarem projetos so- cietérios inconcilidveis e desiguais por exercerem pressdes diferentes sobre os profissionais. Por conta desse tiltimo ponto, buscamos pensar essa dimensao politica a partir da contradigao que advém do assalariamento, que subordina 0 projeto ético-politico ao projeto institucional, relegando suas possibilidades de materializagéo a partir da autonomia profissional.'“Para isso, procuramos tecorrer, principalmente, a referéncias teéricas ligadas ao projeto ético-politico le buscarmos retomar debates essenciais que do servigo social brasileiro, a fim d tradigdes que condicio- auxiliem a compreensao dos principais fenémenos e cont haram o surgimento de nossa profissio. 1? Amey : Assistente social em exercicio nos ambitos 13 A dissertagio, intitulada Entre o principio da em brea eco-pltico prfissinal na busca de cari aleria Fort e foi defendida em 2012. stan cnt “possibil Jariva que 0 profissional, na con: Pe meiderando Kimies jrogdo Bs 8 : da sua vontade, Como OS da satide ¢ da educagéo. nancipagao eo fardo da hos para a incervenga0, institucionalizagao: dilemas do teve como orientadora a Prof® Jogicamente cot Ng Entendemos autonomia profissional como Timites postos pelas instituigdes trabalhador assalariado, tem de imprimir 'mpostos por condigdes que independem npregadoras” (FORTI, 2010, p. 175). er a tona alguns elementos capazes de nos i : mit; je certa forma, perpassam a tealidade TMitiy . 05 ase; dos campos de intervengao, Qu Assis, * SUestie, Problema. yisualizar questoes 8674'S 3 socials brasilei ct Cl ste 9 decorrer des : san eri : ; dados colhidos 2 partir de questiondrios ¢ entrevistas tealizadas _ 5 vinculadas a variadas unidades ptiblicas de satide do Eatng = . : 9 em processo de formaga0 continuada. No entanto, antes de de Ri ep expos desta pesquisa empirica, as brevemente a debate de duas categorias centrais para O coon Social & “GUestao social” e a, as sociais. Nossa finalidade € enfatizar uma sutil diferenga no trato dog nites sociais, que sera decisiva para um debate ovocados pela intervengio desta profissao, Em relagao a “questéo social”, devemos destacar que, para além da “nova dinamica da pobreza” apontada por Netto (2007, p. 153), a “questo social”, “ag atingir todo o cotidiano do operdrio, transforma-o num cotidiano de softi- aesato, de luta pela sobrevivencia” (IAMAMOTO, 2008, p. 66, grifos nossa). Esse cotidiano de sofrimento, também inerente a esse fendmeno, expressa uma face subjetiva e, ao ser experimentado coletivamente pela classe trabalhadore, é “denso de conformismos e rebeldias” (IAMAMOTO, 2008, p. 161, arifos nossos). Na medida em que “os conflitos que podem dar ao levantamento da populagao subalterna [..] tm como ponto de partida o descontentamento s0- al” (PASTORINI, 2004, p. 112, grifos nossos), podemos dizer que a “questo social” — por seu potencial “rebelde” — est4 profundamente relacionada a lutade que, MK tizarmos assistentes socia politic: servigos prestados pelos assiste acerca dos impactos politicos pr classes e, por isso, as possibilidades de transformagées societarias. Essa questo se tornou central quando, na segunda metade do século XIX os trabalhadores atingidos pelo amadurecimento da face objetiva da “questie ciel ~ marcada pela “nova dinamica da pobreza” — passaram @ conectats le manci ii SI bri “« a sci eae cada vee mais sistemitica, seu “cotidiano de sofrimento” & cS cla de = i classe. O progressivo amadurecimento da “rebeldia” expresso nes lutas produciu uma série de demandas © ee : arte nandas contestatdrias e conquistas por P* classe trabalha . ee hadora que, aos poucos, punha em xeque a estrutura capitalist Tal EXO ex! ' i hegemonic de 7 luas demandas imediatas: da burguesia — cdan “a nee a clase tabahadora ~ de melhor sun condi ae dores contida na “questa expectativa de despolitizar a “rebeldia” dos "c? questo social”, uma das estratégias tomadas pela bur ara manter Sua hegemonia foi a de amenizar a situagao de pauperismo em que qu os trabalhadores viviam. Para isso, buscou, por meio do Estado, sofisticar — di eira relativamente articulada, peer an racionali a série de servigos oe ace Prestagio de Iss0 se tornou possivel Por meio das politicas sociais, que, ao atingirem as condigdes objetivas de vida dos trabalhadores, necessariamente produzem tam- bémn uma serie de impactos nas maneiras de pensar e agir deles. Aqui nos inte- essa primordial mente © fato de que esses efeitos também produzem impactos politicos nesses sujeitos, o que, no plano da totalidade, direta ou indiretamente, interfere (fortalecendo ou degradando) na hegemonia burguesa. Na medida em que nao hé uma relagdo mecAnica entre o impacto objetivo e o impacto subje- tivo dessas politicas sociais, ndo podemos assegurar que elas, automaticamente, amenizam ou potencializam a “rebeldia” dos trabalhadores que atendem. Mas jsso nfo indica que esses impactos subjetivos sejam meramente obras do acaso, j& que uma série de determinantes — de cardter estratégicos ou acidentais —influen- ciam nesse resultado. Dentre eles, o que nos interessa enfatizar neste estudo é que se abre margem para uma disputa submersa, de carater pedagégico, pela adesio dos sujeitos envolvidos em prol de determinado projeto societdrio.'” Esse ponto possibilita que, ao menos de maneira superficial, as demandas dos trabalhadores por melhorias nas condigdes de vida se conjuguem com a demanda burguesa de reproduzir sua hegemonia. Assim, na medida em que a fase monopolista do capitalismo se assentava, @ burguesia passou a investir nesse campo de disputa, disseminando uma rede de instituigoes que, para via- bilizarem servigos socioassistenciais, contrataram, dentre outros profissionais, 0s assistentes sociais. Isso evidencia a existéncia de um projeto institucional do contrato de trabalho, subordina esses profis- s impactos politicos dos servigos prestados le modo essencialmente conservador no que, a partir principalmente sionais a contribufrem para que 0 Pela instituigo tendam a implicar di trabalhador-usudrio. 15 i a prvjtos politico-pedaasgicos paurados pelas 115 Isso significa que, ai , , significa que, ainda que de mate am expagos rela para dispura 0: INPACL® politicos Por esse motivo, as politicas erspectivas emancipatGrias também «1 z ieee Provocados por esse processo de materislizasSy c bis Hi nas ambi nfo dever se fdas boos ; sociais nao devem ser compreendidas como me SS ae entendidas como medidas “mas” em si mesmo® (FALEIROS, 2007, p. 59 60), a ybalhadora. podem prejudicar ou contribuie para estratceis de emancipagao da classe tra mancira desigual, a convocaga° dos assistentes sociais POF e85e projg duas fungdes intrinsecas 8 profissao. Uma de Cuno ag. i fere ao conhecimento especifico a respeito do arsenal de i sistencial, que se refer toda rede socioassistencial disponfvel e tem a finalida, a rerminedbs rnecessidades materiais do pablico-alvo, Bssq fungay da fungao, de cunho pedagégico, na medida er. que "a pe, fe servigos materiais é inerente ¢ da sentido e diregao 8 AGO socioeduca. s vJo-se em mediagao para @ agao profissional intervir nas relacdeg fungao politico ideolégica” (SILVA, 2009, p, 90), A funcio pedagégica € responsavel por incidir oe Consciéneia dos trabalhadores-usudrios, na tentativa de moldar suas formas “de ver, de agir, de se comportar e de sentir” (AMAMOTO; CARVALHO 2007, p. 40). Nesse sentido, podemos dizer que essa fungao Nessas condig6es institucional express? cursos circunscrit de atender a de se conecta & segun tagdio de tiva, constituins sociais, ou seja, cumprir sua define-se e consubstancia-se no terreno da elaboracdo ¢ difusdo de ideologia na organizacao da cultura [..] cons- tituindo formas de pensar e agir proprias de determinado modo ou sistema de vida, em que a formagao de subjeti- vidades e normas de conduta séo elementos moleculares (ABREU, 2002, p. 30). Em consequéncia disso, ha uma conexdo da fungao pedagégica profissio- nal com os complexos confrontos politicos da luta de classe na sociedade ca- pitalista que motivaram o surgimento das politicas sociais. Isso indica que essa fungio pedagégica sera requisitada pelo projeto institucional na perspectiva de conduzir esses impactos subjetivos de acordo com os interesses hegeménicos da burguesia. Por isso, “a natureza da atuagdo profissional, sob a aparéncia tech ficada, € de cunho mais politico ideolégico do que propriamente econ6mico ¢ eficaz entre a ‘clientela’, principalmente nessa esfera” (IAMAMOTO; CAR- VALHO, 2007, p. 43). Apes: inte x ae 4 pesar de a intervengdo profissional estar subordinada ao projeto instt cional, como 5 Sci a mo j4 apontamos no inicio deste texto, hé uma margem de autonomia esguardada a cada profissional, que nados momentos de 5 garante a possibilidade de que, em determi relacéo aos direct atuagao, eles possam intervir de maneira independen® em fonamentos institucionais. Essa questo ganhou uma impor tancia peculiar em ; Rossa categoria a partir do Movimento de Reconceitvas#?

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