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i | | -RUDOLE ALLERS: a It PSICOLOGIA DO. oe “CARATER I TRADUCAO DE N. L. RODRIGUES { Rudolf Allers PSICOLOGIA DO CARATER Trad. de N. L. Rodrigues | __ Nada se havia publicado, | até hoje, em portugues, sobre | @382 nova ciéncia em formagiio | ji mundialmente conhecida p Jo nome de Caracterologia. Existe, € certo, muita coisa, sobie “formagio do cariter”, inclusive uma verdadeira enxur- tada de mediocridades tradu- zidas, pois, além do mais, o tema seduz e atrai o interesse popular. Um livro a que se da © titulo de “como adquirir per- sonalidade”, ou coisa parecida, logo tem milhares de leitores. E nio nos referimos ao éxito permanente das obras de Smi- Tes, citadas aliés pelo antor de | Ora, aqui estamos em pre- senga de uma obra que tanto satisfaz 4 curiosidade natural | edespertada pelo assunto como a estimula e enriquece, pois é obra de ciéncia escrita por um especialista, melhor diremos, por um dos fundadores e cer- tamente 0 maior entre todos os divulgadores da Caracterologia. Neste PSICOLOGIA DO CARATER, Rudolf Allers em- preende uma “investigacio pe- netrante” sobre “o carter do homem, sua esséncia e suas condigbes de desenvolvimento”. ‘A primeira parte do sew livro 6 dedlicada A “natureza do ca- iter” e aos “métodos da Ca- racterologia". a parte teéri- ca, Embora menos extensa, pois o autor. prefere dar um sentido mais pritico a sua obra, visando, sobretudo & educagao © “tis necessidades da vida pri- tica cotidiana”, & suficienternen- te desenvolvida para instruir 0 leitor sobre 0 concelto da no- va ciénefa ¢ sua importincia na ordem da aplicagio, Gemelli, 0 prefacindor de PSICOLOGIA DO CARATER, antoridade dus mals respeita- das em todo 0 saund; dé a Alles uma posigaa "ait tacadissima entre 08 teéric, 08 pesqui dores da psicoloyig moderma, Acha que o professor de Viena soube nhorear-se das conclusées de Freud ¢ de alguns de seus discipulos, prin cipalmente Adler, superando-ag com pesquisas préprias ¢ ze. tificando-as tendo em vista ou tras tendéncias atuais da cién- cia, inclusive as que tomaram expressio através da chamada “Gestalttheorie” ou do “beha- viourismo”: “O presente livro”, diz Gemelli, “é uma obra origi- nal e forte, que pode ser con- siderada como contribuigio pes- soal de singular valor”. Acresce que Rudolf Allers é catélico. E as aplicacées que sugere da Caracterologia inte- ressam aos educadores e aos proprios sacerdotes, 0 que leva Fr. Agostinho Gemelli o.f.m. a recomendar enfaticamente o seu livro, com estas palavras: “A Divina Providéncia quis, em sua sabedoria, que eu empregasse minha _atividade cientifica no dominio da psi- cologia. Por outro lado, mitiha vida de sacerdote permite-me ajuizar, do ponto de vista da experiéncia com almas, a im- portincia da valiosa contribui- cio que representa o livro de Allers, para o conhecimento do cariter. Acredito-me por- tanto, duplamente justificado, ao recomendar este livro aos educadores_catélicos e, acima de tudo, aos que sio chama- dos a essa tarefa por uma mis- sfio sobrenatural, isto 6, aos pa- dies”, RUDOLF ALLERS PSICOLOGIA DO CARATER TRADUCZO DE N. L. RODRIGUES A Livearia AGIR Editore 1946 Wlarcio Aguiar Sena +f igneires:o PREFACIO Nao tenho o habito de escrever prefacios. Esta apresentacao € reco- mendagio de um autor, como a costumam fazer alguns (0 prefacio de uma nome mais ou menos conhecido é considerado, por muitos autores, 0 vid- tico mais seguro para seus livros, quando estes iniciarn sua viagem pelo mundo) parece-me uma das coisas mais intiteis ¢ antipdticas que possam existir. Inutil — porque os entendidos séo capazes, por si mesmos, de achar 0 livro, que pode ser util para o fim particular que desejam ; eles podem, muito bem, descobrir, na imensidade de obras impressas, 0 autor que se tornard seu amigo, cujos pensamentos sio afins dos seus ¢ com quem se podem pér de acordo. Antipdtica — porque tenho a impressio de que um tal prefécio quer dizer, mais ou menos, o seguinte: “Meu caro leitor : no és bastante inteligente e culto para poder escolher, por ti mesmo, o que te convém. Por isso aqui estou, para te dar a orientacéo necessaria” . Por essas raz6es, recuso-mme, sistematicamente, a escrever prefacios. Acontece, mesmo, que, por tal motivo, tenho-me indisposto, pelo menos temporariamente, com alguns amigos. Agora, porém, ocorreu o que me parecia inteiramente incrivel: ter, eu proprio, o desejo ‘de escrever um prefacio ! O Dr. Ruvotr Atters, de Viena, de quem admiro o talento e os trabalhos cientificos, pediu licenga para dedicar-me a nova edicio de seu livro. Nao sé aceitei, satisfeito, esta dedicatéria, como acreditei ver, nela, uma ¢erta significagéo. Por isso, solicitei ao autor que me fosse permitido, num prefacio, explicar os motivos de tal dedicatéria. Era, Por certo, uma rentincia a meus antigos hdbitos. Movia-me, porém, 2 vacio das almas — ¢ s6 isso fez pender a balanga. Como se sabe, aquela psicologia chamada comumente experimental . {designagéo alids inadequada: se a quisermos distinguir, por meio de “um qualificativo, da exposicio filoséfica das’ questdes psicolégicas, de- ‘vemos chamé4-la empfrica) apresentou, nos ultimos anos, o fato interes- santissimo de terem surgido, dentro dela, intimeras direges inteiramente diferentes. A velha psicologia, que se dedicava, quase exclusivamente, aos problemas de psicofisiologia — isto ¢: as modificacSes apresentadas pelo organismo sob a influéncia da vida psiquica, ou inversamente, as INDICE ANALITICO prejicio -- Pagina Introdugaio T. A NATURFZA DO CARATER & 0s Mé-TODOS DA CARACTEROLOGIA Significa io da palavra “carter... io da natureza do cariter ... bilidade do cariter .. ‘ io da _conduta 7 o 7. ambiente, heranga . : 3 8. Cardter © atitude valorativa individual. 48 9. Liberdade eee 49 10. Conhecimento do carater ... 53 + I. As Conpigors rt que st Oriciva 0 CARATER 1. Nota preliminar 65 2 A tendéncia primitiva ‘a autoafirmagio ..- 66 §$. Sobre © conceito de impulso 68 4. Vontade de poder 6 5. Sobre a vida espiritual a criancinha .....-+ ‘ wee 17 6. A viveéncia de depreciagho baseada na condigio corporal : 83 7. © conceito de compensagio : ; ne 88 &. Vivencias de depreciagio situativamente cond icionadas 1 9, Sobre a severidade, a autoridade, 0 castigo ¢ mimo bal 10, A vontade de associagho «++ +777" a0 - I Da fantasia € das exigéncias de compensagio = 12. Educagio para a sociedade «-+-+ TI, Sosan os Caractenss INFANTIS & 48 DIFICULDADES DE Epucagio A. origem reativa dos (agus de cariter -» © medo da. crianga s----77* Mentira, capricho, orgulho ---++"" Griangas armen Ba eeeese see |; Desvalorizago. ieee wasps {INDICE ANALITICO (© near, pe Cankren & 0 EvEtTO po EXEMrLo Ww. Nota pretiminar Fontes dos ideais Significa¢io do ideal - 6. Grandeza ¢ heroismo Sobre a humildade - 8. Uma objegio 9, Digressfio sobre a consciéncia 10. Resposta a objecio -- 1. © ideal do cardter «.- V. SoBrE A CARACTEROLOGIA DO SEXO 1. Observacées metédicas preliminares 2 A situacto ambiental da mulher 3. A formagio da mulher 4. © desencorajamento feminino e seus efeitos ... a 5. Maternidade oo 6 A educagio de meninos e meninas .......+ ‘VI. Os ANos Postertones pa INrANcia: A ESCOLA, ‘A PuBERDADE, O PROBLEMA SEXUAL 1. © jovem e 0 ambiente social ........ccceseeeeseeeteseeenereeees 2 A esséncia da puberdade .. 3. Influéncias escolares .. 4. A formagio de uma nova imagem do mundo na época da puberdade « 5. Dificuldades na puberdade ss 6. Modificagées do cardter 7. Sexualidade ..... & ‘VII. Caractenres Neuroricos © CaRACTERES NORMAIS 1. Principios gerais 2 Educagio dificil 3. Neurose 2.2... 4. A falsidade como traco fundamental da neurose .....5... 5. O egocentrismo da neurose . 6. Fins. neuréticos, tragos de cardter neurético ..... INDICE ANALITICO 313 Notas sows 0 Contrcimento we SM Avia - Entcacio —] vill. o do combecimento de possibilidad atitude pare com 0 3 0 gia eee opstculos 20 aperteigoaments prép Releo com a sociedad 5, Amor 20 préximo © médica € 6 COxausio -- préximo PREFACIO Nao tenho o habito de escrever prefacios. Esta apresentaco € reco- mendacio de um autor, como a costumam fazer alguns (0 preficio de um nome mais ou menos conhecido é considerado, por muitos autores, o vid- tico mais seguro para seus livros, quando estes iniciam sua viagem pelo mundo) parece-me uma das coisas mais inuteis ¢ antipaticas que possam existir. Inutil — porque os entendidos séo capazes, por si mesmos, de ~_achar © livro, que pode ser util para o fim particular que desejam ; eles podem, muito bem, descobrir, na imensidade de obras impressas, 0 autor que se tornar4 seu amigo, cujos pensamentos sio afins dos seus ¢ com quem se podem pér de acordo. Antipatica — porque tenho a impressio de que um tal prefacio quer dizer, mais ou menos, o seguinte: “Meu caro leitor : n&o és bastante inteligente e culto para poder escolher, por ti mesmo, o que te convém. Por isso aqui estou, para te dar a orientagdo necessdris Por essas raz6es, recuso-me, sistematicamente, a escrever prefacios. Acontece, mesmo, que, por tal motivo, tenho-me indisposto, pelo menos temporariamente, com alguns amigos. Agora, porém, ocorreu o que me parecia inteiramente incrivel: ter, eu préprio, o desejo ‘de escrever um prefacio! O Dr. Ruvour Auters, de Viena, de quem admiro o talento e os trabalhos cientificos, pediu licenga para dedicarme a nova edicio de ‘seu livro. Nao sé aceitei, satisfeito, esta dedicatéria, como acreditei ver, » nela, uma certa significacdo. Por isso, solicitei ao autor que me fosse permitido, num prefdcio, explicar os motivos de tal dedicatéria. Era, por certo, uma rentincia a meus antigos habitos. Movia-me, porém, a salyagio das almas — e sé isso fez pender a balanga. : Como se sabe, aquela psicologia chamada comumente experimental | (designagao alids inadequada: se a quisermos distinguir, por meio de um qualificativo, da exposigao filosdfica das questées psicoldgicas, de- | vemos chamé-la empirica) apresentou, nos ultimos anos, o fato interes- santissimo de terem surgido, dentro dela, inumeras direcSes inteiramente diferentes. A velha psicologia, que se dedicava, quase exclusivamente, aos problemas de psicofisiologia — isto ¢: as modificagdes apresentadas pelo organismo sob a influéncia da vida psiquica, ou inversamente, as RUDOLF ALLERS 8 |e. opuseram-se tantas re a Pe netodos de tratamento exis. vis i le iets numerosas © divergentes, que aram tio mos diante de uma se nao esta rn juRCHISON) tentow, a0 contrario, influéncias do fisiolégico sob outras psicologias, quantos pontos tem. Estas novas diregdes se torm it erguntam, muitos (como Bunter) se pert : americano (M' crise da Psicologia. Um D cposium — rages a Uma resolver a questo, convocando para um ” presentantes das diversas cor- cont — todos os ¥ soma disponivel de délares — tod » sapinio © exPUSESSE SUAS con. diversos, sistemas inteira. rentes, a fim de que cada um desse S ose como de validez abso- cepcdes. Métodos diversos, pontos de "vista and mente diferentes — tos, pore “Pr epcaes, cm ra2ko das quais a , desde as 0 ee plc ati lutal E eles se extender, de Feo aeeeine disciplina filosbfica, ou aif ny, SPRANGER), até 0 ex. melhor ; uma das “ciéncias do espirito” (Di-tTHEY, es i ae tremo oposto das puras concepgées materialistas, que le : DU cau a afirmar que nos achamos diante de uma renascenga do materia. ancia do “behaviourismo”. Entre esses lismo. Tal é, por exemplo, a essé , i : : dois extremos, hé toda uma escala de tonalidades diversas: a psicolo- gia da “Gestalt”, a do pensamento, a personalistica, a analitica, a do psicologia pode ser, por reflexo condicionado, etc. Estas orientagdes e concepgées sé puderam aparecer, porque a velha psicologia era, no fundo, 0 produto de um processo de abstragio: se- paravamse, do conjunto da vida psiquica, determinadas fungées ¢ pes quisavam-se suas leis. Isso foi um bem para o desenvolvimento da psi cologia. Mas, por esse processo, escapava ao pesquisador o essencial: 0 estudo da vida psiquica em seu conjunto, na visio de uma unidade que 6, verdadeiramente, uma unidade dirigida para um fim. Por isso, sur- giram as tentativas de compreender ¢ explicar a atividade psiquica pot meio de uma sintese. Os empreendimentos da “Gestalttheorie” ¢ do eit fe ems tipicos dessa tendéncia. Sua importincia eles realizada e ics: Mais ibeohioitvel nigie? ee te _ ser atribuido a Sicmunn Freup, de ti hay tS mérito, que deve blema da unidade da vida psiquica perpen cnc e aut € de ter tentado explicar o contetido das personalid: ades normal ¢ mb i d devese reconhecer que ele nerhida. Quer se aceite, ou nao, sua teoriay tentado antes, ainda no domini linear uma psicologi Pet de ‘ogia, abstrato, na fe ee one y de modo bie Psiquicas, mas na prépria unidad? Bido ¢ apreciado. de modos diverne us UM grande movimento, JY *805, que terminou pela fundacio 4 mar, cada vez mais, em nossos dias ° PSICOLOGIA DO CARATER 9 aspecto de uma ciéncia independente. Nesta disciplina, nfio sé se da importancia (e grande importincia) ao vasto dominio de fatos que com- preende as relacdes entre a personalidade humana e a constituigéo or- ganica (ou entre a atividade psiquica ¢ as glandulas de secrecdo interna), como também, mais ainda, a esse problema essencialmente psicoldgico : dar a explicacio da origem do cardter humano, da personalidade, e es- clarecer sua evolucao e transformaées. Assim se transformou, cada vez mais, em ensino sistematico, esse movimento que havia comecado como aplicacio de um método. Pode-se mesmo dizer que estava de tal modo ao alcance do fundador da psicandlise transforméla num sistema, que ela j4 tomou a forma de uma filosofia. De fato: as duas ultimas obras de Freup (Die Zukunft einer Illusion e Das Unbehagen in der Kultur) sdo, sem divida alguma, de contetido filoséfico. Considere-se, porém, 0 fato de se terem afastado da psicandlise propriamente dita, pesquisa- dores que, por sua vez, erigiram seus préprios sistemas — como, p. ex. ADLER, que tomou como ponto de partida o que Freup negava. (Sabe-se que, segundo Freup, apenas ao passado devia ser atribuida uma signifi- cacio decisiva na formagao do cardter, enquanto que, para ADLER, 0 futuro torna-se decisive, por intermédio das finalidades determinantes impostas ao carater). Pode-se, entio, concluir, com fundamento num estudo dessas concepcées — quer em seus criadores, quer na grande mul- tid#o dos que as empregaram e desenvolveram de varios modos — que o essencial nao é tanto o sistema, como o esforco para atingir a signifi- cacao da origem do cardter e dos fatores importantes que a ele se ligam. Cabe a ALLERs o mérito de se ter orientado, desde cedo, nessa dire- cdo e de ter contribuido, nesse sentido, com pesquisas préprias. Ainda que tais pesquisas nao o tivessem colocado num lugar proeminente, elas atestavam, contudo, a magnitude de seus trabalhos preparatérios.!. O presente livro, porém, ¢ uma obra original e forte, que pode ser con- siderada como uma contribuigao pessoal de singular valor. Para ter uma idéia da natureza e importancia dessa contribuicao, devemos lembrar-nos de que todos aqueles que se opunham a uma con- cepcao materialistica da vida, nio podiam dar sua aprovacao aos primei- “ros trabalhos de Freup, e, muito menos, aos ultimos. Imperava neles uma concep¢io fatalistica do desenvolvimento do carater humano, que, na verdade, parecia muito afastada dos momentos fisico-quimicos e mor- 1. Ver: “Psychologie des Geschlecktslebens”” (1922); Uber Psychoanalyse (1980); Charakter als Ausdruck, in: Jahrb. der Gharakterol, Bd. 1 (1925); Begriff und Metho- dik der Deutung in: Scuwanz, Psychogenese und Psychother. kérperl. Symptome (1925) ; Medizin. Charakterol, in: Handb. der Biol. der Person’ (1927). pment, seus fun. guficienteme} pois, mais clara. arecett, Ae] onde se em conhecimentos ctno. + | trabalhos mais recen- pretende revelar a pretendia descre- apoio , quer em m de jdéias, SC jturais do Homem. am também satisfazer aos in- uuder: A Os ensinamentos di - ee o estreito monodeismo de sua f fo quiseram ace! a a signi! A vessigadtores que M80 Ven yimento do cardter ¢ significagio das desen' onhecido que @ designacao cm relagio a0 ¢ la vida. (Apesat de ser rect 9 fundador la psicandlise — significa outras coisas sibido” — Co AIA 30 ce limita & esfera SexUa)- Alguns dos que ae reanilse (especialmente fora da Austria) fizeram declaracées Basta recordar os nomes de June ¢ Rivers. de Freup, aqueles que m, recusaram as teorias a como o Cristianismo. £ facil com- teoria, smiltiplas formas d mi aderiram 4 aras a esse respeito. Mais que todos, poré acreditavam numa religizo revelada, mo io podia ser de outro modo. Sem divida, devem ser oreender, que i ; rxcetuados alguns pastores protestantes, que aderiram, com especial € peculiar entusiasmo, a psicandlise. ! Isso é, alids, compreensivel, ja que o Jinado a levar a religiéo a repre- protestantismo esté cada ver mais ind sentacées naturais. Da parte dos catélicos, porém, a oposi¢ao foi geral. ? Esta oposicao nao se apoiou sempre, na verdade, em bases racionais, desxconhecendo, muitas veres, em suas criticas, 0 fundo de verdade que pode ser encontrado cm qualquer teoria, mesmo errdnea. Mas ela se 1, Ver, especialmente, Pristex: Die psycholog. Entra igic de Ver, esp ; : ycholog. Entratselung der religiisen Glosso- lnlie (1925); Die prychoanalyt. Methode (1924); digi eel 1997) ‘ai iit und Hyster (1808, ly! hode (1924); Analylische Seelsorge (1927); Religio~ 2. Os motivos deste ponto de vis icis livrinho shbrio € Passio crops fob ee nr ae aio detuae cathy page oe ie ° D. Garsast, 8. J. (La Psicoanais, 1927). Nio geleniliet All ie Aron nce ‘Atdlicos, declaragées simpaticas ou favoraveis 2 entre on catélioos: P. Barner, 5° 1 rmse de psicandtise, ou de psicologia individual, rion a iene sid, — Psychology (1925), L. Bore, Moderne fidulaigand.'Di ; ¢ (1928); Lienrz, § i and Dibner dx menehehen Thad Cece aso Necro eS ha isteslebens i q ane Halo de Académicos Catélicos da Alemanha, s© ' importantes, que se apresentam, em relacke Vejam-se as cinco interessantes PSICOLOGIA DO CARATER i yiu mais que justificada pelas conseqiiéncias paradoxais a que chegou @ psicanilise, no tocante as questdes religiosas. > ALLERS, que se assenhoreou, com prudéncia ¢ discri¢o, das concep- goes de ADLER, mostra neste livro — como jé o fizera em trabalhos an- teriores — a utilizagio que podem fazer os catdlicos de todas esas pesqui- sas. Tais concepgées tiveram origem, realmente, na observacdo dos doen- tes, mas procuraram ver, na neurose, menos um produto do passado, do que um modo de reagir do individuo diante das condigdes ambientes, especialmente quando surgem, em seu caminho, obstdculos @ realizacao de um ideal. Todos principalmente por se tratar de fatos da experiéncia cotidians os complexos ¢ miltiplos fendmenos, a que se da a designaczo — em parte imprecisa e em parte incientifica ou inadequada — de “fenome- nos de obsess”, como : a psicastenia, os escrupulos, a psiconeurose, etc, possuem, muitas vezes, esta caracteristica especial: a de que sev con- ~ teido principal ¢ formado por um pensamento ou um ponto de vista religioso, ou por uma atividade pratica religiosa. Isto é compreensivel, pois que o contetido dos pensamentos obsessivos ¢, habitualmente, for- mado pelos momentos a que esté ligado um interesse particular. £ por isso, precisamente, que a religiéo empresta a neurose um cardter espe- cifico, j4 que, numa multidao catdlica, 0 ponto de vista religioso predo- mina sobre todos os outros interesses. Dai a importdncia dessas investi- gages para os catdlicos, principalmente para aqueles a quem esté con- fiado 0 cuidado das almas. | O mundo catélico interessou-se pelo resultado dessas investiga : Mas hd ainda um outro aspecto do problema que deve despertar, no mais alto grau, nosso interesse. Ninguém da téo grande importancia & questéo da cducac&o, como 0 catélico, £ natural. Para os catélicos 2 educacio sé pode ser sobrenatural e, portanto, um assunto da Igreja. Esta educa, mesmo quando transfere aos pais (ou, por intermédio deles, a0 Estado) aquela sua tarefa. £ por isso que o problema da educacio constitui o micleo central da vida catélica. Todos conhecem, porém, os obstaculos que nés, educadores, encontramos, a cada passo, em nossa jornada de esforcos educativos. Se um homem quer realizar um ideal, deve desenvolver em si mesmo uma personalidade e formd-la segundo esse ideal; se‘essa formacdo deve ser sobrenatural, os obstdculos do 3. Consulte-se, em. particular, além das obras clissicas de Freup ¢ da polémica Provocada pelo sett livro Die Zukunft einer Illusion, o livro de E. Jones: Zur Psychoe- nelise der christlichen Religion (1928). nUDOLF ALLERS ais diffceis de avaliar — g, Jeminentos © de nOssas inclinagies, aq 6 mundo exterior age M10 sentido de ide interior, pela influencia das limitada, que encobrem ay paixées, inclinagées, sentimen, ao mesmo teMpo, @ Expresso Vontade. f um dominio ex. s — sem distingao pre. ainda ™ aqueles ~ ain nosso cals 4 divisio da unid finalidade ax temporal leais. eterno’ € hémn obsttculos , ilo fruto de nosso cardte , aquele em gue suitas veres, de modo errad mail aquilo que roa empregamo f lo — palavras tals como: paixzo, corinto, tendéncia, emogio, sentimento, etc. Aquele que deve resolver insta ees ¢ conhece toda a dificuldade do problema da edu. arate que este € um dominio de investigagio dificil € experiencia m alegria, a tentativa de quem Por isso, devernos saudar, co 4 obre esse dominio e esclarecer nossas idéias tos so tan dolor empreende langar um olhar 5 sobre tal assunto. HA ainda um terceiro motivo para que nos interessemos, como catélicos, pela caracterologia. Se se comparam os modernos manuais de Teologia moral com os dos antigos mestres, observa-se uma_tendéncia, que nio deixa de ser perigosa. f que se encontra, hoje em dia, uma in- clinagio para esquematizar, para abstrair, para subsumir as ac6es hu- manas sob a ctiqueta de uma categoria qualquer. f uma conseqiiéncia compreensivel da destinagio pratica de tais manuais de ‘Teologia moral, ja que devem servir ao ensino dos estudantes de teologia e & sua prepa- racio para o dificil encargo de pastores de almas. Mas os velhos mes- oe com a sua velha casuistica — contra a qual parece facil, sem duvida, Eas cece lara - tinhamse, por certo, mos tanto na vida como na direezo fades undygrande ‘pele’: mais convenient indvidvalizr. Constantementa ine, eonnnee hun questio da responsabilidade moral, que a6 ie fe ae Ma apoio num estado cuidadoso do india se Tote ‘et, sespontida. GP Bastam estas consideracd HO:S. de seu: commortarntnt: Ses, Para se avaliar a importéncia que deve ter, para os catéli A toltcos, um live segura através desse domt, ‘© como este. Nele, somos levados por mao ini 5 ‘ demos adquirir uma idéia ge Pica? € erigado de dificuldades € Po i es inat ihe os neyo fomem. Os ae como das reagdes ao mundo, araro que € utili mentos catélico: eee i i > 8. de 1 it ments incontesively qa © aceitdvel, na imensa : ae vie en ‘ a Psicoandlise, da BGlo nu ty pee an gia individual ¢ PSICOLOGIA DO CARATER 18 gia. N3o estamos, pois, apenas diante de um livro, mas de em2, de uma doutrina. E posso afirmar, sem receio, que cla é instrugio. im, explicado, porque senti a obrigagio de responder, ¢s- um preficio, a0 pedido do Dr. Auters de me dedicar o livro. Divina Providéncia quis, em sua sabedoria, que eu empregasse Je cientifica no dominio da psicologia. Por outro lado, de sacerdote permiteme ajuizar, do ponto de vista da ex- com as almas, a importincia da valiosa contribuigéo que repre- so de ALLERs, para o conhecimento do cardter. Acredito-me, amente justificado, 20 recomendar este livro aos educado- de tudo, 20s que sio chamados a essa tarefa por ural, isto &: 0s padres. Fr.Acostino Gemetu, O.F INTRODUGAO Admite-se, em geral, que ¢ importante, por dois motivos, fazer do cardter do homem, sua esséncia e suas condigées de desenvolvimento, 0 objeto de uma investigacao penetrante. Primeiro, porque todos esto con- yencidos de que o fim da educagao nfo ¢ apenas a transmisséo de conheci- mentos tedricos e praticos, nem mesmo a de modos de vida, costumes € tradigdes, mas deve compreender também a formac’o do cardter. Mas, se esse problema da formacio do cardter deve ser resolvido de modo satisfa- torio, se deve ser exigido, como preliminar essencial do que se dedica a tal trabalho, 0 conhecimento dos métodos, é preciso que se tornem claras a esséncia do carter, as influéncias que o formam e as bases, a partir das quais se desenvolve. Em segundo lugar, as necessidades da vida pratica cotidiana exigem que se conheca o cardter de um homem. Em muitos — mesmo na maioria — dos casos em que se confia a um homem um en- cargo qualquer, sua aptidio profissional, em sentido estrito, nio é deter- minada apenas por sua preparagio ou cultura e pela posse de qualidades que o habilitam ao exercicio desta ou doutra atividade mas também, de modo essencial, pelo seu carater. Isso € to claro, que nao precisamos dar qualquer exemplo. O conhecimento do cardter (ou, como se costuma dizer : o conhecimento do homem) é, portanto, uma exigéncia de ordem cientifica e social. Aqui também, pressupde-se um fundamento, que torne ensinavel 0 “conhecimento do homem”, uma técnica que permita desen- volvélo. O interesse num conhecimento aprofundado de tudo o que se refere ao carater, ultrapassa, porém, aqueles dois motivos, por mais impor- tantes que sejam. A formacio do cardter est4 intimamente ligada a cria- fo da vida moral, e, em sentido amplo, da vida religiosa. £ impossivel a direcdo das almas, sem conhecimento do carter do dirigido, e, sem cle, a conversacdo ¢ também inimagindvel. Finalmente: todo homem zeloso deseja poder justificar suas ages, primeiro para consi Para com Deus. Ora, também para isso, uma,ciéncia e uma arte do cardter Sao, se nao indispensdveis, pelo menos’ de considerdvel proveito. Tais motivos se acham de tal modo entrelacados, que nunca foi pos- sivel separ ipletamente. E estranho, porém, que as primeiras ten- tativas’ de, ‘a €xposicdo mais ou menos sistematica dessas questdes tenha igo mesmo e, depois, RUDOLF ALLERS acy 3 Na maioria das vezes, 0. Na escrito as nos eset 0 iter, quando conside nos “Caractere; AS qMestdes de pedagdgicos ou ascéticos alas, Foran sido sempre feita de modo alepen formagio do cardter foram watadas % ag de natureat ¢ fundamentos 6 estudadas em apéndices As _psicologus. Sem : day i aoe nos de seu sucessor, LA BRUVERE, nem os Hevinog i velho ‘TROFRASTO ¢ P se at ale. SCHOPENTIAUER, Bans s, editou, eae Saunas, apenas um diselp io completa da Caracterologia. $6 ha uns vine ete a cee jor estes problemas se tornou mais vivo, £, anos aunis, € que o imei Peraces, o de se ter voltado novamente, com, sa aegis A ete Se ng assuntos nao pode, contudo, por certo, scr atribuida a um efeito dos pen. ae ere itui cto parcial dessa tendéneig samentos de KLAGES, mas constitul um aspec pa fee a Mespitral que caracteriza nossa épocs. Nao posso explicar aqui em por menor, todas essas coisas. Devo, portanto, limitarme a indicar, que o in. ¢ reavivado em re Novas aio & Caracterologia corre paralelamente as orientagées em Biologia, Psicologia ¢ Medicina, ¢, mais ainda, as que comegant a predominar em todos os dominios do espirito © até na mais remota problemitica filoséfica. U) prova do interesse, tomado _Pelo mundo cientifico em relagio as questées que aqui nos interessam, sio as obras de. Foerster, Kerscnexsreiver, Horrstany, Harnertin, Urrrz, F. Kraus, Kiinxet, e os intimeros trabalhos especiais das diversas escolas psicoldgicas ¢ dos circulos psicanaliticos ¢ de psicologia individual, como 0 Anudrio de Caracterologia — de que jt apareceram cinco volumes — ¢ muitas outras obras, ! Nao esta na intengio destas poucas linha histérica, ou critica, sobre a literatura da caracterologia. —Assinale-se apenas que, hoje em dia, voltase a falar, insistentemente nesse assunto ¢ que a ciéncia ¢ a prittica se tornaram vivamente conscientes da importin- Gia das quest6es ligadas a cle. Nao poderemos também tratar dos métodos de investigagio caracterolégica ¢ de seu material de fatos, nem tampouco de todos os problemas ligados a ex Posi¢io dos conhecimentos caracteto- dar uma vista de conjunto ensinamenteg ant amt slgumas obras que exptcm, na mailtia doa casos, apeaw boa sintese das catacterolore (oer Abate des Charakteres, Berti, 3926) dé uma farakter (Basiléia iegrL, inn importantes. Outras obras sio: P. Harsrxuty, Der © Perwntichkeit Das Wetted ony neasen. der Charakterkunde (Leiptig, 129 (Charlouenburg, 1885), oes vol, AL, Potsdam, 1998); A, Unere, Charakterolesi€. Hi. HARIMANS, Die Grundlagen dee pee nett Psicaniilise “9 melhor livia é 0 A? individuals 0 de: i Veen fet Pockoanalyse (Miinchen, 1 Sobre _psicotogl ‘ri Fese 8 F Kea, Cherekterenae fey SE Ee Om PSICOLOGIA DO CARATER 7 Jégicos. ‘Tudo isso pertence mais d caracterologia tedrica, ou, mesmo, a uma teoria da caracterologia do que a explicagées essencialmente orienta- das para a pritica ¢ a cla destinadas. Sem ditvida, nfio podem ser deixa- das de lado, inteiramente, as consideragdes tedricas. Um certo esclareci- mento dos conceitos com que devemos trabalhar, uma visio geral dos objetos das reflexdes que se impdem no podem ser dispensados, mesmo por um ensino que se dedica & prittica, principalmente quando tal ensino se refere ao carter. Por conseguinte, devemos tentar, primeiramente, uma definigzo ade- quada do termo “cardter”, ou, pelo menos, uma representagio de sua esséncia. $6 quando obtivermos tal representagio, poderemos investigar razoavelmente as condigées que contribuem para formagio do cardter — quer em sua expresso definitiva, quer em sua evolucio. I. UR ‘ZA DO CARATER GARACG OS METODOS DA ‘ROLOGIA 1. Significagao da palavra “cardter” E£ sempre util comegar pela significacio ¢ o emprego das palavras da linguagem comum. Por mais “incientificos” que sejam os conceitos da linguagem usual, n&o é, por certo, sem algum motivo profundo, que uma palavra, uma modalidade da expressio usualmente utilizada, adquire, ou adquiriu, um determinado sentido. Embora isso nao seja sempre verdade, acontece que, muitas vezes, a historia de uma palavra é também a histéria de um conceito. A palavra “carater” vem do grego. Ela se acha ligada a um subs- tantivo yépag, que significa: “a estaca” e a um verbo, xapéccey, que significa: cortar, chanfrar, etc. Xapaxrjp parece ter designado, originariamente, a chanfradura de uma estaca divisoria. Aquele sinal geral, conhecido no interior de uma comunidade, com que se assinalavam os limites entre as lavouras de Kleon e Timon, tornou-se finalmente 0 sinal com que se separou das terras adjacentes, o dominio da comunidade. A palavra designa, portanto, um sinal universalmente conhecido. Ainda que nao se conhecam os estddios intermediarios, é, contudo, visivel, que se“seguiu uma extensio do significado, no sentido de : sinal conhecido de alguma coisa. Deve ser observado que, de inicio, a coisa assinalada nao _era algo geral, mas uma coisa particular: a lavoura deste Kleon, o do- minio desta dds. Depois, encontramos a palavra designando @ mascara do ator, que, como se sabe, era, no teatro grego, imdvel e desti- nada a determinado papel. Dizemos, ainda hoje: méascara rigida, w gica, etc. As figuras do teatro grego eram, sem dtivida, mais ou menos tipicas. E nao foi sé no teatro grego : na “comédia d'arte” italiana, de que ainda hoje se conservam residuos, as figuras e seu destino desenvolvem-se mum quadro para sempre fixo. E, mesmo numa época em que @ apresentacio individualizante comegou a tomar conta do palco, a velha tradicio no foi absolutamente afastada. Constituem uma prova disso © nome de Harpagon (i. ¢: 0 avarento) dado ao “Avare” de Mouiére € 0 RUDOLF ALLERS 20 i smo em tempo maj, Ainda m mais ¢ Hamlet aos atores: : x exemplo, quando Ixsry 4 Bee ‘ so dirigido por Hamlet 8° °° smo, por | 0 eas permanecem tais seal nhor gordo” ¢ do senhor magro”, recente, Pema sesris do “senor SOT op a forte infutnc , pela epoca de ‘cas do drama adquirit “carater’ da palavra “carate “earacteres" de TEOFRASTO jquiriram wagos cada vez mais ing}. sofreu uma transformagao no e¢ La BRUYERE tinham em estilo oficial : “Seq. +) Oca algo que pertencia especificamente Quando, porém, deste, as figuras tipi viduais, a significagao mesmo sentido. Se os sido descrigdes de tipos ( Ihe-Zo outorgados 0 titulo € 0 cal rater tornava-se, de agora em eee oe ‘inico homem e que era “caractel : ey eae mnudanga de significagio sofreu a palavra “pessoa”. Também ela, designava de inicio a mascara do ator, atraves a Susur a vor (personare) } ¢, mais tarde, aquele que se faia ouvir através da mascara. Ja que estamos falando em palavras, acrescentemos uma, com a qual se verificou um grave abuso, de que nao escaparam, sem diivida, os maiores mestres de nosso idioma. “Personalidade” (personalitas) nao pode, pela prépria forma da palavra, significar outra cois pessoal de ui ente ¢ a sua propriedade, se assim nos podemos de “ser uma pessoa”. Assim como “honorabilidade” exprime a qualidade de “ser honrado”, “personalidade” exprime a qualidade de “ser pessoa”, E absurdo, pois, igualar “personalidade” ¢ “pessoa” (ou carater) ¢, mais ainda, querer considerar a personalidade como parte da pessoa total, como por vezes acontece, une i apse incomes pee ea sina so pesoa. Também 0 qualifiativo "caractristico™ decieon anny neatidada a ico” designa uma qualidade, Dizer que a forma de » S¢ atribui uma propriedade penas, porque tal multi- rat M6; dizer que 'asag Por. isso, sentimos que é tio Oficial (ou da profissio do ohne eee alquer € caracte- i. Assim, hd qualidades cas, Oficial), como dizer : caracteristict da revolucio, etc. S caracteristicas da montanha, da grande cidade, 1. Observemos quer “através de un ‘s "* significa <-», fahitarisy, — SP880" (como Soar atravgs"* RO caso do - " = quer de mode gerth Exultec"™ 4 Onde se diz: tuba personal PSICOLOGIA DO CARATER 21 ‘A linguagem usual nos fornece ainda outro conhecimento. Podemos dizer : “Este homem tem um carter (tal ou qual)", como podemos dizer : “Este homem é (ou nao é) um cardter”. A esse duplo modo de expri- mir-se, corresponde um sentido duplo. Dizer que alguém € um card- ter” é um julgamento de valor, no qual se empresta 4 palavra “cardter” sentido especial..Dizer que “alguém tem um cardter” é inteligivel por si mesmo, mas a expresso “homens sem carater” pertence & categoria dos julgamentos valorativos. Vé-se, portanto, que possuir um cardter de qua- lidade qualquer € algo que pertence necessiriamente as qualidades essen- ciais de um homem. Verifica-se, contudo, também que, aparentemente, o homem e seu cardter no sio uma e mesma coisa. Nao se pode dizer : “Um homem tem pessoa’; ele ¢ pessoa e tem tal ou qual personalidade, no sentido que atras indicamos. Na palavra “pessoa”, o homem € eviden- temente compreendido em todo seu ser. O “carter”, ao contrario, (se € que devemos confiar nas licées da linguagem) deve ser alguma coisa do homem, ou da pessoa. Que coisa é essa, sera investigado depois, j4 que o “caréter pode ser uma propriedade da pessoa, ou uma parte (ou, pelo menos, um aspecto) dela, ou, entio, uma determinada maneira, segundo a qual a pessoa é vista, percebida e julgada. A questéo da natureza do cardter Defrontaremos agora uma questo, que é decisiva e fundamental para todas as nossas ulteriores reflexées — a da natureza do carater. Seria initil querer, contrariamente ao nosso propésito, consultar as opinides diversas dos autores. Elas so to contraditérias entre si, que teriamos sido colo- * cados novamente diante da deciséo de escolher e obrigados a justificd-la. Parece melhor, portanto, fazer uma tentativa independente, a fim de de- "terminar a natureza do carter. Eis o caminho que parece ser o mais Quando se quer conhecer o cardter de um homem, olhase, em pri- " meiro lugar, para o que ele faz. Na verdade, todos pressupomos, mais ou menos, que as declaragdes de um homem a respeito de suas concepcoes, intengdes e sentimentos devem concordar também com as suas agées. Entretanto, a experiéncia nos mostra que muitas pessoas, conscientemente (ou como veremos, muitas vezes, de modo aparentemente inconsciente), no se comportam de conformidade com os principios que apresentam em suas palavras. Que “as belas palavras” possam encobrir feias inteng6es, ¢ um fato constantemente verificado. De fato, porém, as mas intengdes sem- ” pre aparecem alguma vez, em qualquer tempo ou ocasiao. Por isso, sem- ALLERS RUDOLF i ; om esclarece plenam, ad conduga do omem eselavece Plenameny ensinonts qe 8 Og, cambém, aquilo que se cham, ana verdadeira OP deve, porém, tomar em sentido estrigg wr, Nflo s€ A om ser examinado: 4 geval! vedo, Nio s6 devem ser ox 8 fated getalie ow ago eens wee eonceito de conduct oe ckss enor aGe - como também tog: ante 0 pecificane! . soe atitudes corporais e ty, aque recede, espectficalie™ © risionomias, atitudes corporais © tracey fe ovimentos, Besos, sla qual a pessoa se porta em diversas situa. os mo sira pela qual a . fo resto, além cat mani r prticulaidades compreendidas no conceitg = ‘a: todas as pa Z eee ges, Numa palayra fornecem wma base para julgar o cardter, Sinplo de “comportamento” £0} Todo comportamento, porém, é, por sua ae natureza, agio ¢ ado cc a a mn 4 i a le “comportar-s Na realidade, ha modos involuntarios c Ps arse": g ‘sto diante de uma viva impressio repentina, 0 gesto Involuntario que ai aoe imental, a vermelhidio da célera ou a palidez do trai uma comogio sentimental, a 7 mplos disso. Mas tais fenémenos podem também, num certo Jos sob o conceito da agio. Iriamos muito longe, se estender, aqui, sobre 0 assunto2. De momento, nos con- tentaremos com ter estabelecido, que as agées so uma fonte real de co- nhecimento, permitindo julgar o cardter’ e, em segundo lugar, com adi- mitir (como de fato se faz) que todo comportamento humano deve ser considerado como se fosse constituido de agdes verdadeiras. ao. medo sio exer sentido, ser colo Ha, na verdade, motivos bastante fortes, que nos obrigam a crer que, em cada instante do comportamento e da acio, participa o. homem in- teiro € que, portanto, a rigor, uma winica ack i yerian bg ‘a bomen deveriam bastar para que o conhecéssemos. A possibilidade van e. mio pode ser aqui discutida, Sem duvida, ha por um ‘®, certos modos de proceder i i fa P que revelam imediatamente a natureza de uma pessoa ¢, por pds bi clirta ean tro, observadores bem dotados, ou experientes, qué Vacio, so capaze ase “ . , s de for idéi: pessoas i ‘mai fe Apés ouvir falar um homem dura: r uma idéia completa das matt a - ” ™ Posso dei: horas". Com isso, ele queria 8 ce de tempo, a natu, entement empo, 3 mente, que, em to curto laps0 Podia. preyer, tlocutor se 1h a neal Ne tornara tio conhecida, que reza de seu inte + com Certeza, sua atitude : ¥ em todas as situagdes possivels ¢ temente ob. conhecimento interesante ater baseado ‘ei ee ‘ais motivos, apareceram rece” Je Vanes, 4 Mirror of Personality re a nat : ee PO thotherabie hare, © Método da. interpretacio, UPerlicher. Symptome (Viena, 1925) * PSICOLOGIA DO CARATER 23 diante de todas as questées possiveis. Porque, segundo GorTHe, ha, no ca- rater, “uma certa coeréncia”, de modo que, a determinados tragos pri ios. Se rios, seguemse, necessiriamente, determinados tragos secundd portanto, somos obrigados, em geral, para compreender um homem, ou Jo durante longo tempo — ou, mesmo, para que 4, seu carter, 2 observa nosso conhecimento seja realmente suficiente, a vida inteira — isso se di provavelmente, por causa de nossa inabilidade, ou de nossa incapacidade de aprender, por um tnico ato, o carter, ou 0 “caracteristico”. Como estamos convencidos de antemao, e de um modo geral, que € necessiria, para 0 conhecimento do cardter, a observacdo de miiltiplas agdes ¢ modos de proceder individuais de uma pessoa, segue-se, evidente- mente, que o cardéter deve ser alguma coisa que estd, por assim dizer, con- tido em cada agio isolada e é, de qualquer modo, alguma coisa de comum, que pode ser atribuida a todas as agées em particular. Antes de tentar a determinagio mais precisa do que seja esta coisa comum a todas as acées, é oportuno fazer uma observago. Ha, por certo, tracos de carter (no sentido usual desta expresso) que nao necessitam, para ser conhecidos, uma longa observacio, pois que, por assim dizer, saltam aos olhos de todos. Hi caracteristicas, como a severidade ou a dogura, a firmeza ou a fraqueza, que se podem, muitas vezes, “ler na fi- sionomia”. Sem duvida podemos, nfo raro, enganar-nos, pois que os tracos da fisionomia podem, como as acées individuais, ter significagdes miiltiplas. Muitos atos podem aparecer como efusio de bondade e ser um produto de calculo; muitos podem ter a forma de dureza, e mesmo da crueldade, apesar de ditados pelo amor. Uma atitude de indiferenca € rendncia pode servir de mascara para a suscetibilidade e a fraqueza; “um lobo na pele de um carneiro” exibird gestos cheios de bondade. A Jonga pratica, a agudeza da observacao e a atengio aos pormenores apa- _ rentemente despreziveis, podem, sem diivida, preservar suficientemente “ desses erros. Contudo, eles se repetirio sempre. A questio é, porém, a » Seguinte : Conheceremos realmente o cardter, ao apreender tais tragos de — “cardter” por um conhecimento fisionémico, ou em virtude da inequivo- _ cidade aparente de certos modos de agir ? Conheceremos realmente este cardter individual, esta determinada pessoa? Ou, pelo contrario, conhece- ™mos apenas que tal individuo pertence a um tipo de cardter e possui, em relacao ao carater, algo que aparece também noutras pessoas, 0 que nos habilita a declarar que tal ou qual pertence a determinado grupo? Eo que se passa, na realidade. Um cardter individual, pertencente tnica- mente e especificamente a alguém, mal pode ser encontrado, de ordinério, § s

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