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FRONTEIRAS s FRONTEIRAS ‘elte Bezerra Catedrético de Geografia no Colégio Estadual de Sergipe A expansao do homem no globo, condicionada por uma série de cir- eunsténcias e para atender a exigéncias de varias ordens, verifica-se mercé de duas razdes fundamentais: a miultiplicagéo da espécie e a liberdade de movimentos. ‘A area a ser acrescida a um territério ¢ a rapidez com que se dé a sua ‘ocupacio, estio'na dependéncia nfo s6 do mimero de habitantes, como do seu desenvolyimento eultural, da mesma maneira que da natureza das terras @ serem conquistadas, solo, coberta vegetal, fertilidade; por fim, da maior ou menor acessibilidade da tegido ¢ sua relativa distincia do ponto de partida, -Primitivamente, os acidentes geogréficos naturais, como as elevadas ‘montanhas, os rios caudolosos, ot as extensas florestas, constituiam entrave ab- soluto & migracdo dos grupos némadas, de modo que cada civilizacio, que em Spocas reeudiadas adqueria gréu de desenvolvimento relativamente nJtavel, permanecia totalmente insulada do contacto com outros povos. A histéria nos fornece fartos exemplos; com as civilizacées: antigas, circunscritas aos vales dos rics (Yang-Tsé, Tigre e Eufrates, na Asia; Nilo na Africa), ou a regides ferteis (Mesopotamia, planaltos persas, etc.). > ‘TTais civilizagbés, em sua expansio ‘territorial, estacavam diante de um daqueles obsticulos, grandes acidentes geogréficos. Jamais as civilizagdes pré-colombianas da América,’os Incas na A. do Sul e os astecas na A do Norte, tiveram conhecimento ima da outra, Tao somente povos adiantados da antiguidade se entregavam A navegacdo para, em costas longinquas, fun~ darem colénias. Assim aconteceu & Grécia, onde as montanhas terciérias que a envolvem eram no sé intransponiveis, como até inatingiveis para os helenos, cujos deuses habitavam os montes do Pindo e da Tesséilia; a Roma, onde os ‘Alpes serviam de barreiras, s6 posteriormente transpostas; e mais antigamen- te aos fenicios, apertados entre as tadeias do Libano e a costa mediterranea, ‘© que condicionou seu espirito de navegadores, Quando a densidade de populagio no globo era bem inferior, © os gru- pos humanos viviam insulados; a-nogdo de fronteira continha em si a nocéo de obstdeulo, de separacdo. Tal idéa conservou-se até bem pouco tempo, pois em nossos dias ainda vemos exemplos de paises peauenos ou fracos, tais certos paises balednicos, que se acobertam nos limites oferecidos por grandes aci~ dentes geograficos, embora estes nao sejam, hoje, um empecilho ao avango, por ventura, dos povos vizinhos. e > + ee 3 4 ® igs + * sespSotie, defésa, portanto, guiou o aproveitamento d ies ack ¢ coon 308 como separacéo entre estados, quando éstes se viram mais ins dos outros, pela expansio da humanidade no globo, ¢ isso ereou a de fronteiras naturais, em oposigéo a8 quais vieram as “fron- teiras artificiais, quando tracadas a esmo. > 3 ie ae z concepsao de fronteira natural, que’ implica a idéa de separacio ou es _fnsulamento entre dois povos vizinhos, ndo péde, todavia, subsistir hoje. Sob > | © Pont de vista histérico-geografieo, as fronteiras evolveram de frontet zonas para fronteiras-faivas ¢ destas para frontetras-linhas. A ocupagao eres “_eente dos tersit6rios, isto & o avango constante do ectimeno, a par com 0 do- minio franea do komem sobre a Terra, condicionado pela eivilizacdo; fez com 3 aeulos para: servirem de ligacio hao mais constituissem. impedimento A _expansio humana; as florestas se tornassem vulnerdveis ¢.¢s_péntancs e. chai . “extingwissem pela drenagem. ae ae ! Bee da importincia econtimica do Rend, Daniibio, Parana e Paragusi, Amur, Tigre e Eulrates sfio hoje objetivos de granc oe id no evitam a distenso da expai Tages as casi a transhuméneia através das jevadas..montanhas do istema pone da Asia, o que tambem eae no Caueaso. Popu- européas transitam livremente na regio dos Carpatos © acto, sem falar nas estradas de ferro. que viscam os Alpes em todas, as diregdes, 3 a promiscuidade de individuos que periencem a varios Estados. Nao mais.o io, porém o entrelacamento cada. vez maior entri wptkiae © Qs mapes,eintigos néo-sios. mostram. com sxatiltve, toncadn aabetcs ioe, da Pérsia ou'do Fgito, uma vez que a fronteira-zona era representada Por espago desocupads e quasi eu desconhecido apenas perturbado, ve~ 228 por outras, por grupos némadas. Cresceu a populagio do globo e surgitt ‘conhecimento, entre povos: vizinhos, isténtia de cada um deies, Nao "se relacionavam, porém,.e a fronteira-faixa conservava a idéa de’ separac: reforgada cada vez mais pela situsgdo. de animosidade que viesse a existir, oa Belo receio que tinham os povos sedentérios, do ataque de visinhos ndmadas, “estes sempre de estégio eultural.inferior ao daqueles. Déste modo, os acidlentes geograficos naturais eram aproveitados como. garantia, chegando-se mesmo & © coneretizacio de fronteiras de defesa, conforme usaram os chineses contra 1s incursdes dos tartaros, ao construirem sua célebre grande muralha, para pro- . tego 20s campos de lavoura. Tambem 03 romanos, na Esedssia, procuraram abrigo contra as invasies dos povos.do Norte, 20 ) levantarem os famosos Valx lum Adriani e Vallum Antonini. é ee rosseguindo na ampliacio do ectimeno, as populacées, “sempre: -densas, acabaram, como se observa nos tempos atuais, por erearem as “pres= See "em virtude da exiguidade de espaco. Reduzidas a sim- as fronteiras perderam o cardter de separacio e hoje sic méros li- eonvencionados, onde nao existe solugao de continuldade entre os habi- tantes dos estados vizinhos. Ch ene oh ae J4 Frederico Ratzel tivera a concepeao da fronteira orgdnica, resultante dos limitesaté onde o organismo vive, povo 0a grupo étnico, logrou desenvol- ver-se. Desta maneira,asfronteirasniio tém linhas definidas, apenas expritzem 8 movimentos dos povos, yariando extraordinariamente no tempo e no e3- Pago. Com este ponto de vista, a nogio de fronteira correspondera aos limi- tes de alcance, aos extremos da atividade dum povo, sem as nogdes de con fins ou de contiguidade com outros povos. Caimos, assim, na concepgio da frontetra social ou de civilizaséo, como um desenvolvimento ou ampliagao das idéas ratzelianas sobre fronteira orgénica. Sendo vejamos. Supam distingue as fronteiras em fisicas e politicas. As primeiras se re- Jacionam com a estrutura material ou a prépria natureza do Estado. As se- gundas tém correlagéo com os limites do movimento dos povos. © propésito do Estado ao estabelecer suas fronteiras, diz Supam, é triplice: 1.9 estabelecer uma separacéo efetiva; 2° obter protecdo contra hostilidades; 3° permitir faceis intercomunicagdes com vizinhos. Com efeito, é rarissimo encontrar-se uma fronteira que nao satisfaca pelo menos uma das trés condigées acima, em- bora tambem seja dificil atender aos trés objetivos ao mesmo tempo. Os an- Sopaseperatia discutem qual deles 0 preferivel. Holdich achava que as fron teiras de insulamento e defesa seriam as de mais vantagem, atitude de espi- rito inglés, possivelmente pelo cardter insular de seu pats. Lyde, ao estudar es tipos de fronteiras da Europa, preconizava a fronteira favoravel ao. transite, ponto de vista que reflete o expansionismo germénico. Sob aspecto bem diverso do de Supam, o prof. R. Kaindl encata o as- sunto. Para ele o problema é de fronteira cultural, e chega mesmo a estabele- cer a fronteira cultural entre as civilizagdes da Europa Central e Oriental, tomando como fundamento a questo de Iinguas, religides, costumes, calendé- ios, tipos de habitacdo, ete. Mas os partiddrios de tais' fronteiras se detém com grave dificuldade a resolver. Si a base € 0 critério etnogrético,. proble~ ma seré 0 que se deve entender por raga, quantas e quais so elas, ea ques- tao por esse lado € insoluvel, Idénticas objesdes serao.feitas para 0 eritério Tinguistico, religioso, ou mesmo juridico. Em principio, certo que existiram estados isolados totalmente dos terri- t6rios adjacentes: diferenciagdio de clima, civilizagio, idioma, economia; pos- teriormente, no entanto, tais motivos desapareceram, porque, se alguns povos conservaram estabilidade através do tempo, outros sofreram extremas varia~ Ges. Nos Alpes Orientais, por exemplo, verifica-se a promiscuidade de racas e.povos e tipos de habilitacdo, havendo apenas grupos solitétios de alemes, ao este e ao sul da grande massa germénica. Esta observacéo @ ainda melhor apreciavel nas costas orientais do mar Adridtico. Lavradores e pastores des cem das montanhas Dindricas e se acham, s vezes, quanto a ntimero ¢ quali- dade, em posi¢ao mais vantajosa do que os proprios habitantes sedentdrios da costa, embora estes exercam sébre aqueles sua influéncia cultural. Por seu lado, os habitantes das costas, eles préprios, vieram das terras interiores e se adaptaram ao novo ambiente. Os pastores albaneses, por exemplo, locali~ zados nas elevagées, foram pouco a pouco baixando para as depressées seden- térias, Da mesma sorte, causas geograficas levaram os bilgaros e sérvios a pe- . r 100 — netrarem na Macedénia. Déste modo, como estabéleceram-se limites definidos entre tais povos? Compreendé-se agora porque sio eles retinidos sob a de- » nominagao de slavos do Sul, constituindo 9 rein de apés guerra, a Tugoslé~ ia, euja: populagio € formada de sérvios, monteriegtinos, bésnios, _crodias, slovenos. <8 Re Sieger 14 nos fala de fronteiras segundo a’natureza, quando cores: pondem a grandes obstaculos as comunicagées e a0 estabelecimento de grupos humanos (cristas de tmontanhas, pantanos, desertos, etc.). Fronteiras tomadas _ 4 natureza, quando se aproveita uma linha natural, facilmente distinguivel, que mio seja um estdrvo: um rio ou lagée, um bosque, ete. Finalmente, ele tambem nos fala de fronteiras orgénicas, entendendo como tal as resultantes de conveneao entre paises limitrofes, que as consideram como as mais titeis, em- bora nfo baseadas precisamente em acidentes “naturai Nestas cireunstancias, comenta Krebs, as primeiras vio perdendo a importancia, & medida’ que eu- menta a populacio; a regularizacin € internacionalizagao dos rios ea abéiura de novas estradas restringem o valdr dgs segundas; enquanto a expansiio dos povos e as permutas na distribuigdio das populagées rompem o equilibrio que dantes mantinha uma fronteira do terceiro tipo. Estas causas atiam de tal modo que eliminam, muitas vezes, por inteiro, 0 valor dos tratados, e passam a signifiear marcos antiquados, pois que, com o tempo, as conversagses nfo Jogram deter a marcha dos movimentos naturais. ‘ Deniro nas fronteiras sotiais, ainda poderiamos estabelecer, como qui- zeram alguns, as fronteiras econémicas. Possuira tais fronteiras um estado eujo terrifério tenha capacidade para atender as exigéncias de seus habitantes. A permuta e o intercmbio de produtos que caracterizam as relagdes econd= micas entre pafses, nao nos deixa exemplo de-um estado em tal situagio, Ad- mitindo-se, porém, que um estado se bastasse a si mesmo sob ponto de vis- ta de sua economia, é evidente que as associagées humanas néo posstiem ex- clusivamente uma vida material, e sim, mais amplamente, uma vida cultural, ea teoria nfo.péde subsistir. Por fim, vém as fronteiras politicas. Alguns dio a elas a feigao excl sivamente estratégica, representando-as eome. limites fixados por tratados e convengies, com o intuito da defesa do pals, pela separagio nitida e perma- nente entre estados, No’entanto, tais fronteiras politicas deveriam se basear no Direito Publico, na justica, na equidade; mas muitas usurpagdes e abusos de fortes. sobre fracos so mascarados com esta rotulagem; 6 0 que nos di 0 exame através da geopolitica, Mas o prisma da antropogeografia propriamen- te dita nos leva a definir a fronteira politica como o término da expansao de um agrupamento humano, em fungio da capacidade da populagio de um es- tado, até onde este organismo se péde desenvolver. Tal fronteira seré condi- cionada pelo poder expansionista de vim povo; seré, na expresso de Delgado de Carvalho, o limite da sua forca politica. Em yerdade, conforme doutrina Artur Dix, toda fronteira’ é creacio do Estado, a cujo poder se ajustam os _ sucessivos avancos e rectios, como fenémenos histéricos. Norberto Krebs observa que os elementos antropogeogrificos mostram, em sua’ area de distribuigdo, pontos de saliéncia que erescem e pontos de * * a pe es retvocesso. Disemos melhor, regiGes nucleares ie “aim feito, 6 interessante observarmos que as confederacées ute pouies temps exis. ‘tentes, como a da Alemanha do Norte ou a que originew os Estados Unidos, do mesmo modo que as federacdes, resultaram de reuniio de tertitérios

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