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7 7 iq i i A “Infores, infames! gritava rainha, 0. Amelia de Orleses, lenguanto atscava um dos ‘assassinos que etiravam contra seu marido, a rei Carlos I, seus fihos, com a Gnica “arma” que tinha nas méos: um ramo de flores. Autor descanhecido. 6. No site , ha um filme para ilustrar 0 episédio do regicidio, No fim do século XIX, Por tugal decidiu unir, por terra, ‘as colénias de Angola e Mo- cambique. Oprojeta, apresen- tado durante a Conferéncia de Berlim para discussa0 da divisS0 do continente africer o,recebeu.a recusaimediata da Inglaterra, que perderia territorios na regiao. A ten- 880 diplomatica criada pela ‘ocupacao portuguesa da érea fem questao resultou em um ultimatum estabelecido pe~ {os inglesas em 1890: ou os Portugueses desocupavam. 08 territérios em disputa, ou a Inglaterra declararia guerra a Portugal, Em crise, ‘coro portuguesa cedeu ds exigéncias briténicas, QO século XX chega a Portugal A crise politica do regime monérquico, iniciade pelo Ultima. tum inglés (1890), agravou-se com 0 assassinato, em feversirg de 1908, do rei Carlos Te de seu herdeiro, o principe Luls Feline, Em outubro de 1910 eclodiu a revolugao que pés fim & money quia portuguesa. O partida democratico, responsavel pela condu- 40 do pais nesse primeira mamento, enfrentou dura resisténaig dos setores burgueses, Associados a0 capital estrangeiro, og burgueses eram politicamente representados pelos partidos conservadores, Um golpe de estado liderada por Sidénio Pais, em 1817, dey inicio a um periodo de ditadura. 0 assassinato de Sidénio, em 14 de dezembro de 1918, porém, agravou ainda mais a instabilidade politica no pais, Os governos republicanos tivaram, de modo geral, uma feicsa progressiste: houve uma evidente ampliagao da participagéo politica, foram feitos investimentas na educagio, promovendo o ensino livre e levando a cultura as massas populares. O cendrig politico, porém, permanecia em estado de turbuléncia e os go- vernas parlamentares enfrentavam aposigao tanto dos setores de esquerda, quanto dos de direita. Uma reagéo burguesa contra a “corrupgéo" politica deu origem ao golpe militar de 1826. Favorecidos pela desarticulagao das forcas politico: -partidarias, 0 militares prometiam restaurar a ordem publica ¢ impor um duro controle 8 economia portuguesa. Para desenvolver @ nova politica econdmica foi convacaco Antonio de Oliveira Salazar, professor de Finangas da Universidade de Coimbra. Aas poucos Salazar foi conquistando maior poder dentro do governoaté que, em 1933, fez aprover uma nova Constitui¢do e iniciou a ditadura do Estado Novo, que sé chegaria ao fim em 1974. Modernismo portugués: primeiros passos 0 panorama de instabilidade interna fez com que 0 povo portugues ma nifestasse, de modo acentuado, um sentimento que sempre ocaracterizou: 0 saudosismo. Alembranga das antigas glorias maritimas que haviam tornado Portugal uma das poténcias mundiais no século XVI e @ lamentagao pelo desconcerto que dominou o pais apds 0 desaparecimento de Dom Sebastido serviram de bergo para o nascimento de uma reviste que representaria o primeiro momento do Modernismo portugués: Orpheu, langada em 1915. Nas paginas de Orpheu, o Modernismo Portugués toma forma Mais do que uma revista, Orpheu foi um marco: simbolo do nascimento de uma geragéo de escritores que trouxe para Portugel a esséncia cO movimento modernista. Nas suas paginas surgiram as grandes revelagdes literarias do inicio do século XX: Fernando Pessoa, Mario de Sé-Carneiro & Jos¢ de Almada Negreiros. Digitalizada com CamScanner LITERATURA V4 ‘8 da realidade. Ecos futuristas também se fezem presentes, j6 no primaire numero de Orpheu, nos Nersos da “Ode triunfal” de Alvara de Campos, um dos heterdnimos de Fernando Pessoa, e no"“Ultimatum futurista",de Almada Negreiros, Almada Negreiros: a ira contra a estagnagaéo portuguesa Um dos mais stivas e influentes artistas da geragso Orpheu foi José de Almada Negreiros, Entusiasmad com a poseibilidade de trans. formar a sociedade portuguesa por meio da arte, Almada destace-se nd apenas pelos textos que escreve, mas também por sua excelente Produgao coma pintor, revelando-se um homem perfeitamente sinto- nizado com as tendéncias mais modemnas da arte na Europa Em 1917, 0 escritor chocou o povo portugues com a divulgagao do “Ultimatum futurista’, no qual fazia um apelo aos javens para * Neste psine da Gare Mortima de Acantara, Aue gosumissem @ recuperacda da patria edo espitite portugueses, Seyeat tone deAimavalegreos, comprometidos pela fraquezae saudosismodas geracdes anteriores, fundamental da mor e das navegegtes ne Na exaltegao que faz da guerra como macanismo transfarmador. fica Kapila do ovo bslanasranojende evidente a influéncia das ideias do lider futurista Marinetti, Observe. °*820¢i80 Se ulgar interessante, explicar 90s alunesque os cea “a ras paineis que compéem a Gore de Alcantara foram inspitades em uma historia da tradiqao ae fa colenstciecec ps ean ane AS GERACOES PORTUGUESAS DO SECULO XX. ‘Mas imagens, as oa ‘otis representa o capitan, ansogo para avstar Be terra, cored ples magers dodishoe da mor EU NAO PERTENGO a nenhuma das geracBes revolucionsrias. Eu pertencoauma te,» trate espera var micas coun tol» m : Miteria do anjosotre 9 deménio, shando alma igeragdo construtha. ‘ do capitdo; e 0 encontro festive das familias em Eu sou um poeta portugués que ama 2 sua patra, Eu tenho a idolatra da minha io" 9 encanto esa ds risen profissdo e peso-a. Eu resolvo com a minha existéncia o significado actual da palavra somente s phincve poval da coed oleae poeta com toda a intensidade do privilégio. Eu tenho 22 anos fortes de saide e de inteligéncia, José Sobral de Almada | ia | Negreiros (1883-1970) nas- ‘ceu em Séo Tomé e Principe, € preciso ciaro esprito da ventura contra sentimentalismo literério des passadistas. caer Ae eee E preciso criar as aptiddes pré heroismo moderne: 0 heroismo pt date. ond eataliat repel tt E preciso destruir este nosso atavismo alcodlico e sebastishismo de beira-mar. antag Gani (1 Escola Internacional de Lise 5 AMLMENTE: 6 preciso criar a patria portuguesa do século XX. boa, comecou a divulgar seus DIGO SEGUNDA VEZ: é preciso criar a patria portuguesa do século XX. textos edesenhos Foi pintor, DIGO TERCEIRA VEZ: & preciso criar a pitria portuguesa do século XX. escritor, poets, dramaturga, censaista. Fol o grande sobre- Ld vivente da geracdo de Orpheu | i i imo todas as qualidades © sempre manifestou uma Povo: r aquele que tiverreunidono seu maximo to : cree eerie eniaresiae Sve AMADA NEGREIROS Jos de acral i ona, eae cea eats : ‘Nove Aguilar, 1997. p, 648-655. Fragmental ema alee nen ca Nome de guerra tremancel, ‘Mtaviemo: heranga de coracterlstlcaspsicologices intelectunis ou comportamentas. entre outros, Sebastlanismo:crenge na voita mistica de 0, Sebaetio, rel de Portugal rescionarismo; teimosia, Vanguardas culturais europelas. Modernismoem Portugal 39 (( Digitalizada com CamScanner | gactes sobre a canstituigao A NEGRETROS, Almada. Autorretrato, . d. Crayon, Detaihe, A Mério de SéCarneira, 8.0. Mario de Sa-Carneiro (1830-1916) era filho de uma abastada familia da alta bur- guesia lisboeta e, depois de uma tentativa de cursar Direito, mudou-se para Paris. All, mergulhou na boémia literaria dos cafés e escre- veu intensamente, sempre ‘atormentada por problemas de ordem intima. Os versos de “O outro” resumem bem a esséncia de sua poesia, ‘sempre voltada para es inda- - daidentidade:"Eundo sou eu nem sou 0 outro/Sou quel quer coisa de intermédio:/ “Pilar da ponte de tédio/Que _vai de mim para o outro.” | Mario de Sé-Carneiro suici- dou-se em 1916, em Paris. Ao despedirse do amigo, Pes- ‘80a escreveu: “Bénio naarte, néo teve [..] nem alegria nem felicidade na vida. $6 a arte L.J por instantes 0 turbou de consolagéa, S80 assim os que 0s Deuses fadaram seus”. tena cena modernista portuguesa, porém, ficara registrada nos inimen” manifestos, ensaios, erdnicas e textos de prose doutrinaria que pied ao longo dos seus 77 anos. pat Mario de Sa-Carneiro ea fragmentagao do “eu” Um pouco mais de ol - eu era brasa, / Um pouca mais de azul ~ «lém, lamentase 0 eu rico do poema *Quase",resumindo em belas ine ‘a imensa frustragao que marcou a vida de Mario de Sé-Carnolrg. no Ao contrério do entusiasmado e combative Almada, S6-Carnelroan om suas obras, nao a necessidade de traneformar a realidade, man le que sera 0 grande drama do homem do século XX: a fragmenteys e identidade, a atligso do individuo que se ve sufocado pela multidio's get? inovagoes tecnolégicas. 0 autor persegue esse tema tanto nas lsat et rosa quanto na poesia que escrevou, A ease respelto, s80 celebs versos de “Dispersao", * Disperséo Perdi-me dentro de mim Porque eu era labirinto, E hoje, quando me sinto, E com saudades de mim. Passei pela minha vida Um astro doido a sonhar. Na &nsia de ultrapassar, Nem dei pela minha vida... Para mim é sempre ontem, No tenho amanha nem hoje: O tempo que aos outros foge Cai sobre mim feito ontem. LJ Eu tenho pena de mim, Pobre menino ideal... Que me faltou afinal? Um elo? Um rastro?... Ai de mim. Desceu-me na alma o crepusculo; Eu fui alguém que passou. Serei, mas jé ndo me sou; Nao vivo, durmo o crepusculo, Alcool dum sono outonal Me penetrou vagamente A difundir-me dormente Em uma bruma outonal Digitalizada com CamScanner LITERATURA Perdia morte ea vida, =a E,ouco, no enlougueco.. Fernando AntenioNeguat ‘hora foge vivid, ‘Pessoa (1580-1935) nas- Eu sigo-a, mas permaneco, eu em Lisboa, mes fl edu 7 cada na Africa do Sul, onde {eve acesso a um universa culturot mats vaste da cue | 8 partuguta. Retornou Lis toon a08 7 anos, para cursor Letras, mas ogo abendonou | ‘ unversidade, Autodata, dedicou-se a estudos de | natureza iosdtca, ition © , maio de 1913 Sotura de poesia moderna, | Deve 0 sagundo lugor erm tumeoneiven doSecretar ado | da Propagarida acional com Menzagem. Vito pelos amt 08 coma um gir, Pesson Todos os textos que SéCarneiro escreveu manifestam uma grande ‘s6alcancouo reconhecimanr seneiblidede, marcada pela expresso de uma angustia existencialista | tds rica apas.a morte, praticamente insuportavel. Ainfluéncia do decadentisma e de astetica simbolista de fim de século ¢ recorrente nos poemas de Dispersdo, nas novelas de Principio e Céu em fogo, na pega teatral Amizace e, principelmente, no estranho A canfissa0 de Lucio. Com esta narretiva, S4-Carneira leva para a ficgao 0 tema da fragmentagao do “eu” e constréi a mais impressionante novela do Moder- nismo portugués. Castelos desmantelados, Lebes alados sem juba, Par SA-CARNEINO, Maria de, Obra completa. Flo de Janeiro, Nova Agullr, 1995p. 81-63, (Fregmentol | i A f ; d Fernando Pessoa: Fernando Pessoa. o poeta de muitas faces Locale deta do foto esconhacidos, Quando se estuda a obra poética de Pessoa, 6 necessério fazer uma distingado entre todos os poemas que assinou com o seu nome verdadeiro, portanto considerados poesia orténima, e tadas os outros, atribuidas a diferentes heterdnimos. Além do escandalo da publicago de Orpheu, que Ihe rendeu alguma ce- Isbridade, a vida de Fernando Pessoa foi basicaente andnima e solitaria. Conhecido apenas por um reduzido grupo de amigos, dentre os quais merece posig&o destacada Mario de Sé-Carneiro, o autor costumava espantéos com sua inteligéncia assombrosa e sua vasta produgao postica. Quando, apds sua morte, os criticos descobriram e riqueza de sua obra e 0 fendmeno da heteronimia, Pessoa finalmente conheceu a fama merecida @ hoje é visto como um dos maiores escritores de lingua portuguesa de todos os tempos. A poesia orténima Se julgar interessante, explicar aos alunos que ort6nimo significa nome ivi completo e correto, declarado Alguns temas marcam a poesia orténima de Fernando Pessoa.Emint- pelo proprio individuo. No caso da meros poemas 0 tema do “questionemento do eu" ¢abordedo, as vezesda ha Ce Earle Hssoa, 0 tee of modo meis sofrido e denotando uma grande angustia, as vezes de modo —_asinados pelo poata de todos os outros ai o diminuigéo que atribuiu aseus varios heterénimos. ‘mais cesual. A variagéo de tom, porém, nao representa uma jp gua tl ae vr heard, no interesse do poeta em investigar como se constitul a identidade in- —Fimos pessoanos mas aante,naseqS0 dividual, Observe: A poesia heteronima". Vonguordas cultural europoias. Modernismoem Portugal 41 ({ Digitalizada com CamScanner Gato que brincas na rua ‘Como se fosse na cama, Invejo a sorte que é tua Porque nem sorte se chama. Bom servo das leis fatais ‘Que regem pedras e gentes, Que tens instintos gerais Essentes 56.0 que sentes, ARN és feliz porque és assim, ‘Ao lado do chopeu do bigodiaho, Todo o nada que és é teu. Ppserlae tomar a0 era de Eu vejo-me e estou ser mim, Conts-se que, na hore da morte, Conheco-me e ndo sou eu. © poeta tern edie. Cdime 08 ‘culos, os mous acute. Locale PESSOA, Fernanda. Cancioneio, In: GALMOZ, Mario Aliote {Org}. Obra postica data de foto desconhocidas, Filo da Janeiro: Nove Aguilar, 1999, p. 158, Outra questo que acupou Pessoa foi a da “sinceridade do fingimenty. condigdo da criagao literdria, e que deu origem a alguns poemas muito cn, nhecidas, como 0 que segue. Isto Dizem que finjo ou minto Tudo que escrevo. Nao. J Eu simplesmente sinto x Com a imaginagéo. Nao uso 0 coracao. Tudo 0 que sonho ou passo, (© que me falha ou finda, E como que um terrago Sobre outra coisa ainda. Essa coisa é que é linda Por isso escrevo em meio Do que nao esta ao pé, Livre do meu enleio, Enleio: aquilo que prende, Sério do que nao é. ligo, enveive. Sentir? Sinta quem lé! PESSOA, Fernando. Cancioneiro. In: GALHOZ, Maria Aleta (Org). Obra peatien. Rio de Janeiro: Nova Agullar, 1999. p.185. * Mensagem: releitura mitica do destino portugués Dentre 2s obras da poesia orténima de Fernando Pessoa, destacanrse 03 belissimos poemas de Mensagem, livro com o qual abteve o segundo luget em um concurso do Secretariado de Propaganda Nacional portugués. Fo! 9 Unica livro publicado em vida por Pessoa (1934). 42 copituio 2 Digitalizada com CamScanner Nesse livre, o poeta promave uma releitura de destino de Portugal, tendo como base 0 fenémeno das navegac0es, a ligagaio entre os portugueses @ ‘omar @ 0 mito do encoberto, associado ao desaparecimenta misteriaso de D, Sebastiaa.® Os poemes de Mensagem revelam a cranga em um futuro na qual Portu- gal voltara a ocupar uma posi¢ao de destaque entre as nacbes, cumprindo, assim, 0 destino que the fol atributdo pelos deuses, @0 termo encoberto ita relacionodo 8s profecias do sapateiro Bandara fetasnépo {ado desaparecimen {9 de D. Sebasto. Segundo os versos de snare 0 vel vl ‘ncoberto pela névoa do mar pert gues", paro liderar Portugal em dregs a tim destino de gloria ‘idea deur salvador que surge do melo da névoa temonta 3 fenda srtrions, Na Matera de Bretanho, dlendarishade Ava" ion, para onde o vei {oi levado apds 5 mmortaimente feride Mordred, esta fa sempre encoberta pelos névoss. Apés © feu restabelecimen- to, Arthur ressrgivia para devoWver apaz a Inglaterra Oinfante Deus quer, © homem sonha, a obra nasce. Deus quis que a terra fosse toda uma, ‘Que o mar unisse no separasse. Sagrou-te, e foste desvendando a espuma, Ea orla branca foi de itha em continente, Clareou, correndo, até ao fim do mundo, E viu-se a terra inteira, de repente, Surgir, redonda, do azul profundo, (Quem te 83g criou-te portugues Do mar e n6s em tinos deu sinal Cumpriu-se 0 Mar, ¢ 0 Império se desfer. Senhor, falta cumprir-se Portugal! PESSOA, Fernande. Mensagem. Ins GALHOZ, Morin Alcte (Org. Obra poetics Fic de lence: Neva Aguiar, 1993. p.78, Nas trés partes em que organizou os poemas ("Braséo", "Mar portugues" e “Dencoberto"), Pessoa reinterpreta os principals simbolos historicos e miticos da culture portuguese, sempre enfatizando a vocagao do pova para superar todos os abstéculos, movida por uma grandeza de alma que a torna Unico. Elemento central na arquitetura poética de Mensagem € o mar oceano, simbola da transcendéncia a ser alcangada pela provagao individual e cole- tiva. Como afirma o eu lirico, nos versos finais de “Mar portugues’: “Deus 20 mar 0 periga ¢ o abismo deu, Mas nele é que espelhou o céu". A poesia heterénima O fendmeno da heteronimia resolveu de mado interessante uma questo que persequiu Fernando Pessoa durante toda sua vida: o desdobramento do "eu", a multiplicagao de identidades. “Desde crianga tive a tendéncia para criar em meu torno um mundo ficth- cio, de me cercar de amigos e conhecidos que nunca existiram’, confessou © poeta ao amigo Adolfo Casals Monteiro em carta que explica a g@nese dos heternimos. Heterdnimos s60 autores Imaginades por Fernand Pasco Quando eee aie zeus heterios, Peon produ textos com caracteristicas completamente diferentes dos de sua autoria. Entre 05 heterdnimos, destacam-se Bernardo Soares, autor do Livro do desas- 058090, ¢ 05 poetas Alvaro de Campos, Alberto Caeiro e Ricardo Rels. sardoe eulturais euroneias, Mader LITERATURA Osentida da titulo neon asfrer meh ; Seams, | aaa fe sce ‘Ast pre oul do tora Mensa mc Pesos hvie nisin, deciido chemer su fo de Poemas de Portugal, Conor dando comacpnZa do amiga Cunha iesdeque esse tla jd esteve muita bensizedo.0 | postarmsolefscervmaciie | | deestucos com uma ctegso | erate da obra ee Veaie: | | Mens Atte nicl mente | move @ material. & divies0, | om trés partes resuitou no | titulo do liveo: MENS/AG(ITAT | MOLIEM. | Veja, no Guia de recursos, a transcrigio dos trechos da carta de Pessoa a Casals ‘Monteiro com a explicagSopparao fend- meno da heteronimnia. OLISIPO ao gues ‘A Em 1821, Pessoa fundou, com. ‘amigas, uma casa editora e ‘comercial chamada Diisipo. 0 fnome é uma referencia ao nome imitice da Lisboa, Disigone, tujo fundador teria sido o herd ‘rego Ulisses. O lagatina fol Criada pelo proprio poets. nismoom Portugal 43. CK Digitalizada com CamScanner Alberto Caeiro, segundo mando Pessoa Alberto Caeiro, heterdnimo de Fernanda Pessoa, representado em mural por José de ‘Almada Negreiros, 1961, Alberto Caeiro nasceu em 1889 e morreu em 1915; nas- | ceu em Lisboa, mas viveu quase todaa sua vidanocam- po. No teve profissdo nem educacao quase alguma, Era | de estatura média, e, embo- ra realmente frigil (morreu | tuberculoso), néo parecia téo {Aragil como era. Tinka a cara rapada, era louro sem cor, olhos azuis. [..] Como disse, no teve mais educaco que quase nenhuma — $6 instru- $40 primaria; morreram the cedoopaieamée, edeixouse Ficar em casa, vivendo de uns ‘pequenos rendimentos, Vivia com uma tia vetha, tia-av6. PESSON,Formand, Cartas eacathides, Tre QUADRDS, Antonio (Ora, nt @ notae). bre pottica ee prasa Porto: Lella 6 Inu Euitores, 1885, v.2p. 242903, (Frogmento edaptadel Em termos praticos, o que se obser- va é que Pessoa criou véries “personas” poéticas (seus heterdnimas) e, por meio delas, deu forma a diferentes mados de olhar o mundo. Como veremosa seguir, cada um desses heterOnimos contava com personalidade e estilo préprios. * O“mestre” Alberto Caeiro Autor de uma poesia cuja simplicida- de aparente esconde uma complexidade filoséfica bastante grande, Alberto Caci- ro define-se como o"homem do campo", “o guardador de rebanhos", Toda a sua produgéo postica gira em torno da questéo da percepgéo do mundo e da tendéncia do ser humano em interpretar 0 que vé como simbo- los de outras coisas. Segundo Caciro, essa 6 a razio de néo conseguirmos compreender que as coisas sao o que S80 € que este € 0 seu verdadeiro sig- nificado. Observe, ‘Fernando Ponson eta deseanas sci esters Frnnds Be povoar 0 seu universo com pont? invertadsumexpas umchovtar aan Sia osoevecatas eae XXXV © luar através dos altos ramos, Dizem os poetas todos que ele é mais. Que o luar através dos altos ramos. Mas para mim, que no sei o que penso, O que o Luar através dos altos ramos E, além de ser O luar através dos altos ramos, Endo sermais Que o luar através dos altos ramos, PESSOA, Fernando Poemas completos de Alberto Cacia. Tn: GALHOZ, Maria Aliete (Org). Obrapattca. Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 1889.9. 222 Esse tipo de légica desconcertante esta no centro do olhar de Alber Caeiro para o mundo: a natureza nao 6 constituida por simbolos. Oddesafio de uma filosofia de vida como a defendida por Caeira evident: Precisamos “desaprender" um olhar definido pela cultura acidental queins* teem tomar a natureza como simbolo de emogGes e sentimentos humat Aceitar que o luar 6 somente a luar ¢ um imenso desafio para *nés que zemos a alma vestida", como. reconhece o poeta. Esse mado de encarar a vida aproxima a poesia de Alberto Caeito® filosofia zen-budista, negando a ideia de qualquer realidade além 9 Constitul nossa experiéncia concreta e imediata das coisas. Digitalizada com CamScanner LITERATURA Y 4 Glirismo classico de Ricardo Reis Ricardo Reis é o heter rOnimo classico de Fernand | Rloarelo Rete, segunda eieaaneeseravenir ere jo Pessoa.Emtodosos | : be | revela a infiuéncia dos poctas classic Fernando Pessoa | Lifica Ste Vato pun eee etas cléssicos gregas mestre Casio, Com uma sintaxe de grand i 1es Inversbes, us: | eke a icardo Reis nasceu em vocabulario rao, Ricardo Reis da aseuapoereaumacorsctorstiooteerte | astante 1887 (nome lembro do di | ro dodiae diferente da simplicidade observada nos textos de Casio, Ub Forté mace ftcuencs if. Observe. orto, & médico. [J Educado ecstaeee nar | | no Brasil desde 1919, pois se | ‘expatriou espontaneamente | or ser monérquico. £ um latinista por educacao athela, | eum semi-helenista poredu: | cago propria | ‘As rosas amo dos jardins de Ad@nis, Essas volucres amo, Lidia, roses, ‘Que em o dia em que nascem, Emesse dia morrem, : | Aluz para elas ¢ eterna, porque Nascem nascido ja 0 sol, e acabam ESSOA Fernando. Cartas ‘Antes que Apolo deine sscohida Im QUAEROS, Atos _O seu curso vsivel, “cnprsa Pare toicetmas | Assim fagamos nossa vida um dia, Saroren 1900.2 9302300, Inscientes, Lidia, voluntariamente (Gragmenta edeckadch, Que hd noite antes e apés © pouco que duramos. PESSOA, Fernando. Odes de Ricardo Res. Jn GALHOZ, Marie Allete (r9.), dbrapoetie. Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 1999. 9.253. Volucres {vélueres}: que | ‘tem vida curta, ofemeras. Inscientes: ignorentes, | que desconhecem. Esse poema ilustra a influéncia dos temas greco-latinos na poesia de Ricardo Reis. Todo o raciocinio desenvolvido pelo eu lirico pode se resumir de modo simples: 6 necessério viver 0 momento, aproveitélo, sem pensar | no que veio antes ou no que viré depois. | D exemplo das rosas, que florescem e morrem no perfodo de um dia, @ apresentado para encaminhar o apelo dirigido & amada: “Assim faco- ‘lard Rel, | mos nossa vida um dia". Um dia, nesse caso, nao 6 uma referéncia a um teat | momento futuro, mas sim uma medida de tempo. 0 eu lirico deseja viver representado | sua vida de modo pleno, como se a duragSo de que dispusesse fosse @ eres mesma das roses. | Negrirs, 1661 Ne ee * As angustias do engenheiro Alvaro de Campos eteronimo futuriste de Fernando Pessoa, Alvaro de Campos tember é conhecido pela expressao de uma angustia Intenso, que sucede seu entu- siasmo com as conquistas da modernidade. Na faee da “emargura angustiede, 0 posta escreve IonGoe roonessi que urn grande desencanto existencial se revela. 0 toa conhecido i . “Tabacaria’. Nos trechos que seguem podemos identficarameniestacno oe um grande descontentamento consigo mesm>, aliado @ uma visdo critica da realidade que 0 cerca ‘eulturais europelas, Moderniamo erm Portugal 45 Digitalizada com CamScanner cr Alvaro de Campos, ‘segundo Fernando Pessoa BH | es ) {iL | | | | fs | | heteronimo de Fernanda Pessoa, representada ‘em mural por José de ‘Almada Negroes, 1981 Alvaro de Campos nasceu ‘em Tavira, no dia 15 de Outu- bro de 1890 [.}. E engenhei- | ro naval (por Glasgow), mas | | agora ests aqui em Lisboa em | inactividade. € alto (1,75 m | dealtura,mais2emdoqueeu), | magro.e um pouco tendente a | curverse, cara rapada, entre | branco e moreno, tipo vaga- ‘mente de udeuportugués, ca- belo, porém,lsoenormalmen- teapartadozolado, mondculo, | Teve uma educagéo vulgar de | | Gceu; depois foimendado para | a Escécia estudar engenharia, | primeiromecanicaedepoisna._| val, Numas féria fez a viagem 0 Oriente de onde resultou 0 *Opiario". Ensinou-the latim | umtiobeiraoqueerapadre. | | PESSOA. Fernando, Cartas escolhidas Tr QURDROS, Antonio (01g, int. erates. abr postca | eemprosa. rte: Lelio treo | Ectores, 1926 ¥.2, | psa imonette nis | Tabacaria Nao sou nada, Nunca serei nada. Nao posso querer ser nada, parte isso, tenho em mim todos os sonhos do mundo, Bh hoje vencido, como se soubesse a verdade, Estou hoje licido, como se estivesse para morrer, E nao tivesse mais irmandade com as coisas Sendo uma despedida, tornando-se esta casa e este lado da rua Mileira de carruagens de um comboio, e uma partida apitada De dentro da minha cabeca, E uma sacudidela dos meus nervos e um ranger de ossos na ida Estou hoje perplexo, como quem pensou e achou e esqueceu, Estou hoje dividido entre a lealdade que devo A Tabacaria do outro lado da rua, como coisa real por fora, E & sensacdo de que tudo ¢ sonho, como coisa real por dentro, Ld ‘ mundo é para quem nasce para 0 conquistar E nao para quem sonha que pode conquisté-lo, ainda que tenha razio Tenho sonhado mais que o que Napoledo fez. Tenho apertado 20 peito hipotético mais humanidades do que Cristo, Tenho feito filosofias em segredo que nenhum Kant escreveu, Mas sou, e talvez serei sempre, o da mansarda, Ainda que no more nela; Serei sempre 0 que ndo nasceu para isso; Serei sempre s6 0 que tinha qualidades; Ld Mansarda: sét80, dltimo PESSOA, Fernanda, Poesias de Alvaro da Conpst. ander de uma case, cujee Tre GALHOZ, Maria Alte janelas d80 acesso a0 bra postica. Rio de Janeira: Nova Aguiar, 3S telhado, egua-furtada, 362-363. (Fragnerte Passadios mais de setenta anos da morte de Fernando Pessoa, ele contin @ ser considerado um fenémeno sem igual entre os poetas de lingua port guesa, Nao se tem conhecimento, em nenhuma cutra cultura, de um autor aut tenha se multiplicado em tantos outros e, com cada uma dessas identidedes literarias, produzido uma obra tao vasta e de téo grande qualidade. Os estudiosos do espolia de Pessoa contaram pelomenos T2heterénimes © semiheterdnimos criados pelo poeta para dar vazo. sentimentos elds que, em muitos casos, ndo chegava sequer a reconhecer como seus. "Néoh# que buscar em quaisquer deles ideias ou sentimentos meus, pois muitos del exprimem ideias que nao aceito, sentimentos que nunca tive. Hé simplesment® que os ler coma esto, que é alias como se deve ler”, escreveu autor emu" de seus muitos textos a respeita do fendmeno da heteronimia. ial O contato com a poosia de Femando Pessoa (ortonima ou heterenine® revels, portanto, a esséncia do fazer literario: a capacidade de olhar mundo com olhas que, ao mesmo tempo, indagam, interpretam e trad uma realidade e os muitos sentimentos por ela evacados. Moquina do eacrever utilizada por Fernanda Passea, Local @ data da fato desconhecidos Digitalizada com CamScanner

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