You are on page 1of 112
ANETE ABRAMOWICZ * GISELA WAJSKOP Educagao Infantil Atividades para criangas de zero a seis anos De acordo com 0 Referencial Curricular Nacional para a Educa¢ao Infantil Epirora MODERNA ANETE ABRAMOWICZ Professora do Departamento de Metodologia de Ensino da Universidade Federal de Sao Carlos Coordenadora pedagdgica de Creche e Centro de Juventude no Municipio de Sao Paulo (1984-1996) Doutora em Educacao pela Unicamp-SP GISELA WAJSKOP Doutora em Metodologia ¢ Educacdo Comparada pela USP-SP Educacao Infantil CRECHES Atividades para criancas de zero a seis anos 2? edicdo, revista e atualizada 1? edigao, 1995 EDITORA MODERNA (© ANETE ABRAMOWICZ E GISELA WAISKOP 1999 COORDENACKO EDTORAL: Carmina Branco € Adson Vasconcelos ‘GERENCIADA FREPARACAO EDA REVSAO. Jone Gail Arco PREPARAGAO DO TENO: Hana Bight Pinko EWSAO: Lina Santana, Lege MLS. Mace) CGERENCIADE PRODUCKO GRAFICA: Witton Tenn Garcia EDICAODE ARTE: starcel Destaileur FROJETO GRAFICO, td Melo (CAPA: Ana Mari Once FESQUSAICONOGRAFICA: Ante Abramiomicz, Gila Wabop, Vera Luca da Sia Rariomaevo FOTOS [cup Mars Cauda IWSTRACOES: sara Azcvedo, Vines Lewkowice Katz DIAGRAMAGAO: Tina Crsine Basin Chrisiane Born TRATAMENTO DE IMAGENS: AdemirF. apts, Deledes A. de Ass, Marcos Amur Asie, Sv Pea 'SADADE FUMES: Helo Pde Souza Filho, li A. a Sa COORDENAGAO DO CP: Feary Dako Dean MPRESSAO E ACABAMENTO: Lis Gifs © Fao Dados intenacionas de Cotelogoro na Publicacéo (C1) {Camara Broseira do Livro, SP, Bros) ‘rumor, Ane vaso inf eects ahs pas crn de sem ase anos / Ane Abram Ghela Wako. 3, ed res eat Sto Paulo dens, 19 ‘sibogea 1 Greches 2 Grches — Hrs 3, Eco ft 1 Wapkop, Gh alo pass eopsr22i Indices por catélogo sstomatico: sv dle Oa ame Creches -Edneagto nfo 37221 2 edvcago inf 57221 ISBN 85-16-02341.9 Feproaue proba. rt 184 do Césgo Penal ei 9.610. 19 de fever de 1998, ads os dnote reservados EDrvorA MODERNA L1Da. Rua Pade Adel, 758 Belenzinho So Paulo = SP = Bras - CEP 03303908 Venda ¢ Atendimento: Tel, (O11) 690-1500 Fax (O11) 6090-1501 srw modema com br 1959 Impreso no Brast 13579 08642 Para: Felipe, Renato, Eduardo, Marcelo, Joana, Diana, Marilia, Marina, Daniel, André, Elisa, Julia, Joao. Agradecimentos A Marisa Cauduro, por ter sido a fotégrafa; Ao Professor Vinicio Macedo Santos, pela assessoria na area de matematica; A Amélia Watanabe, aos funcionarios e as criangas das creches da Turma da Touca do bairro do Campo Limpo, S&o Paulo; Aos funcionarios e as criangas da creche da Sociedade Benfeitora Jaguaré, Sao Paulo. oe tee eee RA Apresentagao F 1. Principios educativos da creche .... 9 2. A programagao — bases para sua elaboragao . 13 3. Os instrumentos de trabalho da educadora ... 7 A observagao. O planejamento .. Aanamnese .. O diario .. Os relatorio As reunides..... 4. As rotinas didrias .... Criangas de zero a trés anos... Criangas de quatro a seis anos 5. Os espacos fisicos. Espagos internos — as salas de atividades. Criangas de zero a trés anos, 39; Criangas de quatro a seis anos, 46 Espagos externos .. 6. Brincar nas creches..... 7. Leitura e escrita, Creches: lugar da diversidade cultural Aspectos hist6ricos e culturais da leitura e da escrita.......... 66 Como orientar, nas creches, a construgao do conhecimento de leitura e escrita pelas criangas . . 67 Como as criangas aprendem a ler e a escrever .. 70 Sees Pope ~ 3 Propostas de atividades .. Corpo e movimento .... Segurar, carregar e levantar o bebé Massagem: uma relaco corpo a corpo com o bebé Tapetes de descobertas Mobiles Jogos com bolas.. Percursos motores . Brincadeiras de rua Pedaco de massa Moldando 0 corpo = a Artes Olho magico As cores, as formas e as texturas do mundo .. Pintura e desenho .. Modelagem e construgao Recorte, colagem e dobradura .. BSR BSSSSSYSS Leitura e escrita .... Oralidade: contando e escrevendo historias Aescrita.. Nogées matematicas .. Exploragao livre de materiais e jogos Musicas ¢ historias .. O grupo ¢ 0 cotidiano das criangas Livros de literatura infantil recomendados Brinquedos recomendados.. Bibliografia de referéncia e recomendada APRESENTAGAO RON ee” RS m livro sobre creches! Foi 0 que possibilitou que nos encontrassemos, de- pois de muitos anos sem nos ver, e retomar idéias, prati- cas, afetos e conhecimentos. Conflitos, diferengas e identidades que marcaram possibi- lidades de interagao e de vivéncias de um processo criativo. Aescrita deste livro nos deu a dimensao da pluralidade e da diversidade de nossas idéias, que sao também de outros, constituindo-se em material para ser usado como uma das possibilidades pedagégicas em educagao infantil. Oencontro das diferengas presentes neste livro é a pro- posta educativa que pudemos experimentar e, ao mesmo tempo, propor para ser vivida nas creches. Este livro pretende conversar com as professoras de cre- ches, com as alunas de magistério, com professoras e profis- sionais da educagao infantil, propondo um dos multiplos ca- minhos para fazer educagao com criancas de zero a seis anos. Procuramos responder a algumas questdes em relagao ao fazer educativo com criangas em instituig6es coletivas. E ao respondé-las abrimos muitas outras perguntas que ficaram sem respostas. A 2? edigao deste livro ocorre neste final de século e, por- tanto, faz-se necessario afirmar as nossas convicgdes de que todas as criangas deveriam ter direito a uma infancia plena e distante do trabalho; de que todas as criangas deveriam ter direito a uma escola plural e a uma educagao prazerosa, sig- nificativa, multipla e produtora de diferengas. Continuamos a (re)afirmar a importancia de um trabalho educativo com crian- gas, no qual o eixo central sejam a produgao e o acolhimento das diferengas. Nesta 2° edigao fizemos algumas alteragdes nos textos e nas atividades propostas, ampliando e atualizan- do a bibliografia em educagao infantil. As autoras Boa al, ae ee ey 1. Principios educativos da creche reche, Escola Maternal, Sala de Asilo, Escola de Tricotar, Jardim da Infancia, Pré-Primario, Pré-Escola, Educagao Infantil foram alguns nomes dados, ao longo da Historia, a institui- gdes de educagao de criangas peque- nas. O nome e a concepgao norteadora da pratica educacional dessas institui- gdes mantém relagao direta com a con- cepgao de infancia vigente na época e com a classe social a qual se destina- va a instituigdo. O que cada momento historico constrdi, reserva e atribui como “funcao” e periodo da infancia impde tarefas a essas instituigdes educativas. Isto significa dizer que ser crianga e vivenciar uma infancia nem sempre fo- ram as mesmas coisas. E que educa- Ao infantil também teve varios signifi- cados no decorrer da Historia. Entre os séculos XVIII e XIX apare- ceram as primeiras instituig6es de edu- cacao de criangas pequenas: escolas de tricotar fundadas por Padre Oberlin, creches? fundadas por Marbeau, e jar- dins da infancia, os kindergarten fun- dados por Froebel. Creche. [Do fr. créche]] 8. f. 1. Instituigéo de assisténcia social que abriga, durante o dia, criancinhas cujas mes sao necessitadas ou trabalham fora do lar. 2. Estabelecimento que se destina a dar assisténcia diurna a crian- gas de tenra idade.* ES eS ee Se i TA i) i Mehl) "FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Novo Diciondrio da Lingua Portuguesa. Rio de Janeiro, Nova Fronteira, p. 399. Eugene Marbeau constatou, em sua fala, que a instituigao criada por seu pai em 1844 estava se disseminandbo. Em 1875, nao existiam mais que 35 creches [...]. No precisavam trabalhar para ganhar o seu sustento [...] dagem histérica. Porto Alegre, Mediacao, 1998, p. 72. estrangeiro, havia creches nos paises onde as mulheres ". Kuhlmann Jr., M. Infancia e educagao infantil: uma abor- 9 sh) (auresnos crecnt/ Accreche — palavra de origem france- sa que significa manjedoura — foi criada para educar, guardar e abrigar criangas pequenas cujas maes necessitavam tra- balhar ou criangas que necessitavam de assisténcia. Para Marbeau a creche constituiria uma ajuda na escolarizagao, seria uma escola de higiene, moral e de virtudes sociais. Durante muito tempo, as creches de todo o mundo, incluindo as brasileiras, organizaram seu espago e sua rotina diaria em fungao de idéias do que signi- ficava educar tais criangas. A assistén- cia, a custddia e a higiene constituiam o centro do processo educativo. No Brasil, a década de 1980 passou por um momento de ampliacao do debate arespeito das fungdes das creches para a sociedade moderna, que teve inicio com os movimentos populares dos anos 1970. A partir desse periodo, as creches passaram a ser pensadas e reivindica- das como o lugar de educag¢ao e cuida- dos coletivos das criangas de zero a seis anos. E educar deixou de ser, apenas, cuidar, assistir e higienizar. A abertura politica permitiu o reconhecimento so- cial desses direitos manifestados pe- los movimentos populares e por grupos organizados da sociedade civil. A Cons- tituigao de 1988, pela primeira vez na historia do Brasil, definiu como direito 10 ‘VaNIA LEWKOWIEE KATZ das criangas de zero a seis anos de ida- de e dever do Estado 0 atendimento em creche e pré-escola. Em julho de 1990, o Estatuto da Crianga e do Adolescente reafirmou, em seu artigo n° 54, IV: “E dever do Estado assegurar a crianca e ao ado- lescente [...] atendimento em creche e pré-escola as criangas de zero a seis anos de idade”. ES SENS 11 Muitos fatos ocorreram de forma a in- fluenciar essas mudangas nas creches: 0 desenvolvimento urbano, as reivindi- cagées populares, o trabalho da mulher, a transformagao das fungées familiares, as idéias de infancia e as condigdes so- cioculturais para o desenvolvimento das criangas. A educagao e os cuidados coletivos de criangas em creches séo uma fun- gao e uma pratica recentes, principal- mente no Brasil! Atualmente, cunhou-se a expressao. educac¢ao infantil, a partir dos dispositi- vos da Constituigao de 1988 e, mais re- centemente, da Lei de Diretrizes e Ba- ses da Educagao Nacional de 1996 (Lei 9.394/96), para designar todas as insti- tuigdes de atendimento de criangas de zero a seis anos. Isto significa que no- vas concepgées de crianga, infancia e educagao vém sendo forjadas. Hoje, as creches podem ser defini- das como equipamentos educativos com base nos seguintes pontos: * Acreche deve desenvolver agdes edu- cativas que integrem os cuidados es- senciais e a ampliacéo dos multiplos conhecimentos, linguagens e expres- sdes das criancas. * A creche deve respeitar a cultura de origem de cada crianga. * Acreche deve partilhar com as fami- lias e a comunidade os projetos educativos. * Acreche é um espaco de socializacao, de vivéncias e de interagées. *A brincadeira 6 uma atividade edu- cativa fundamental da infancia. 12 * A creche deve ter um ambiente cultu- ral que propicie a leitura e a escrita. * Aorganizacao do espago e do tempo é importante para a educagao, interagao e construgao de conhecimentos. Conclusao Apanrtir desses pontos, conclui-se que as creches de qualidade compartilham com as familias e com a comunidade a educagdo e os cuidados essenciais das criancas, do nascimento aos seis anos, podendo trocar conhecimentos e interagir. Devem acolher todas as criangas cujas familias desejam ou necessitam que seus filhos as frequentem. Por ser um espago de vida e de interagdes, as creches devem trabalhar com 0 heterogéneo e a pluralidade. Para pensar * Procure saber quando, por quem e por que foi criada a creche na qual trabalha. * Quantas criangas e qual a popu- lagao a que atende? ° Por que as familias procuram a creche? STO ——— Para saber mais CONSELHO NACIONAL DOS DIREI- TOS DA MULHER. Crianga: compromis- so social, carta de principios. Brasilia, CNDM, 1986. ae A, a a cee 2. A programacio — bases para sua elaboracio ada creche se constrdi e se recons- trdi, diariamente, a partir dos ele- mentos humanos, espaciais, sociais, cul- turais e econdémicos de que dispée. Pistas tedricas e praticas acumula- das orientam a elaboragao da progra- magao para as criancas... Essa pro- gramagao deve levar em conta, tam- bém, a realidade das criangas, seus familiares e a comunidade, envolven- do-os no trabalho da creche. As multiplas interagdes presentes nas creches sao as condigdes para o crescimento das criangas e devem ser traduzidas em atividades didrias. As iniciativas das criangas, suas curiosidades e vontade de explorar as tornam sujeitos ativos no mundo em que vivem. As atividades propostas devem basear-se em uma organiza- gao do espago e na oferta de materi- ais de forma a possibilitar a iniciativa, a acdo independente e a imaginagao das criangas. A programacao diaria deve contem- plar momentos de trabalho orientado e momentos livres, além da higiene e da alimentagao. O mais adequado é que se possam estabelecer vinculos entre os trabalhos propostos e as brin- cadeiras das criangas, através da oferta de materiais e espagos comuns, articulados em torno dos projetos de- senvolvidos. Os projetos podem surgirde quest6es = relativas as culturas de origem das cri- angas, da televisdo, do radio, de um cir- co que chegou a cidade, de uma festa, de um acontecimento individual, da lei- tura de um livro, da observagao de fe- némenos naturais... Podem ser trazidos pelas educadoras, pelas criangas ou pelos pais... Derivam as vezes de uma situagao inesperada, imprevisivel e até mesmo ocasional! As diferentes formas de linguagem — verbal, corporal, plastica e musical — e todas as formas de comunicagao e ex- pressao sao basicas para que as crian- cas compreendam, compartilhem e se estruturem na cultura e na sociedade. Assim, é preciso propor atividades diarias que possibilitem o desenvolvi- mento da fala, do corpo, das artes, da musica, da danga, da leitura, da escrita, da tecnologia. A apropriagao desses conhecimentos pelas criangas aconte- ce 0 tempo todo. As atividades diarias devem levar esse fato em conta. 14 Os cuidados com a higiene e com o corpo das criangas sao atividades edu- cativas. A atengao individualizada nes- ses momentos é fundamental na progra- magao das atividades. Avida coletiva e as interages nas cre- ches favorecem a formagao de grupos. Esses grupos podem variar durante o dia em fung&o das atividades propostas, per- mitindo que as criangas convivam com ou- tras de idades diferentes ou em agrupa- mentos com muitos ou poucos colegas. Estar sé também é muito importante para as criangas! Quando estado sozi- nhas, em um espaco agradavel e aco- lhedor, elas podem pensar, sentir e com- preender, cada uma a sua maneira, 0 mundo em que vivem. 15 A definigao dos objetivos e dos pro- jetos a serem trabalhados, o conheci- mento das caracteristicas de cada faixa etaria, a observagao das criangas em grupo e individualmente, a reflexao cons- tante sobre a pratica educativa pelas Para pensar educadoras sao as bases para a elabo- ragao de uma programagao de ativida- des para as creches. Assim, constrdi-se um projeto edu- cativo que tenha forga, significado e que seja prazeroso para todos! Cena registrada: Num final de tarde, enquanto o grupo terminava de pintar o muro da casinha, Armando, Zeca e Circe, todos de cinco anos de idade, reco- lheram cinco mariposas mortas e uma lagarta gorda e amarela. Aproximaram- se da educadora, aos gritos, anunciando sua cagada. As outras criancas se entusiasmaram com 0 fato, mas o adiantado da hora anunciava o jantar. O que fazer com o material coletado pelas criancas? Reflita sobre essa cena e procure pensar no projeto que poderia ser de- senvolvido com essas criangas no dia seguinte. Procure entender o significa- do dos insetos para as criangas, a vida, o crescimento e a morte. Defina objetivos e etapas de trabalho. ERs ee a Ne Para saber mais CAMPOS, Maria M. Malta; ROSEMBERG, Fulvia & FERREIRA, Isabel Morsoletto. Aspectos sécio-educativos e sugestes para uma politica nacional de educa¢ao da crianga de 0 a 6 anos no Brasil. S40 Paulo, Convénio IPLAN/IPEA/UNICEF, 1989. 2v. OLIVEIRA, Zilma de Moraes Ramos et al. Creches, faz-de-conta & cia. So Paulo, Cortez, 1993. WEIKART, David et al. A crianga em agao. Lisboa, Fund. Calouste Gulbenkian, 1984. aa ee

You might also like