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Edmund. HUSSERL A IDEIA DA FENOMENOLOGIA PULL NUL Onc CORT eS Titulo original: Die Idee der Phinomenologie —— (Band II Husserliana) © Martinus Nijhoff Tradugéo de Artur Morao Capa de Edigdes 70 Depésito legal n.° 32973/89 Direitos reservados para todos os paises de lingua portuguesa por Edigdes 70, L.*, Lisboa — PoRTUGAL EDICOES 70, L.*, Av. Elias Garcia, 81, r/c — 1000 LISBOA Telefs. 76 27 20 / 76 27 92 / 76 28 54 Telegramas: SETENTA Telex: 64489 TEXTOS P DISTRUBUIGAO NO NORTE EDICOES 70, L.>* Rua da Rasa, 173 4400 VILA NOVA DE GAIA EDICOES 70 (BRASIL), Ltda. Rua Sao Francisco Xavier, 224-A, Loja 2 (Tijuca) CEP 20550 RIO DE JANEIRO, RJ Telef. 2842942 Esta obra esté protegida pela’Lei. ‘Nao pode ser reproduzida, no todo ou em Parte, qualquer que seja o modo utilizado, incluindo fotocépia € 46% copia, sem prévia autorizagdo do Editor. Qualquer wranepiesdh 3 a Lei dos Direitos de Autor serd passivel de procedimento judicial, ADVERTENCIA DO TRADUTOR Na versao deste famoso opitsculo de Edmund Husserl, que constitui o HU volume da Husserliana (1), foi meu propésito aderir o mais estreitamente possivel ao texto original; apesar de ser claro, conciso € logicamente con- catenado, nem sempre prima pelo_fulgor literdrio, e, por vexes, mostra-se demasiado redundante. Impus-me, pois, a ‘fidelidade total d expressdo e ao contetido do pen- samento de Husserl. Procurei, para isso, encontrar ou adaptar termos correspondentes que, embora nao muito vulgares no nosso idioma, the sao, no entanto, consenta- neos ¢ ndo ferem a sua ldgica interna. No fim do volume, um breve glossdrio includ. os termos mais nucleares ou, pelo menos, mais problemdticos. Prestou-me grande ajuda a tradugao espanhola de Miguel Garca-Baré (1), de que aproveitei a selecgéo 1) Die Idee der Phanomenologie. Funf Vorlesuncen. Hirsg.u.eing Walter Biemel (Husserliana, D), Haia, Mar- tinus Nijhoff 1973. Dele existem jA as seguintes tradugdes: The Idea of Phenomenology (trad. de W. P. Alston e G. Nakhnikian; intr. de G. N,), The Hague, M. Nijhoff 1964; L'ldée de la phénoménologie (tad. de ‘Alexandre Lowit), 9 das notas criticas ao texto (alids, por indicacdéo da Edi~ tora Martinus Nijhoff) e uma ou outra solucdo relativa a termos mais dificeis. Esta neste caso a dupla de ajecti- vos alemdes real e reell, que nao é posstvel conservar em portugués sem gerar confuséo. O primeiro significa, em Husserl, ‘real’ no sentido de ‘mundano, pertencente 4 realidade natural’, e 0 segundo quer também dizer ‘real’, mas em relacéo apenas as componentes do vivido (segundo P. Ricoeur) (2), isto é, aguilo que forma parte da consciéncia e se encontra no tempo fenomenoldgico. Aproveitando a versio do tradutor espanhol —o qual, por seu turno, depende de José Gaos—, traduzi reell por ‘ingrediente’ (ou, ainda, ‘incluso’ ), Na margem de cada pdgina do presente volume, indica-se, entre barras, a paginagdo da edicéo alema. As notas criticas finais fornecem apenas as observagdes mais importantes que Husserl fez ao texto primitivo. Quem desejar um conspecto mais circunstanciado teré de consuliar o respectivo volume da Husserliana, Espero que este esforgo de translagao da terminologia de Husserl para a nossa lingua seja bem aceite, embora seja eu o primeiro a sentir-me insatisfeito com 6 resul- tado. Mostrar-me-ei, pois, grato a quem apresentar cor- recedes (para futuras reimpressdes) ou sugestées mais felizes e adequadas para determinados termos. Husserl merece uma tal solicitude e atengao. Artur Morio Paris, P.U.F., 1970; La Idea de la Fenomenologia (trad. por Miguel Garcfa~Baré), México-Madrid, Fondo de Cultura Econdémica 1982. (2) Cf. na sua tradingio das Idées directrices pour une phé- noménologie de Husserl, Paris, Gallimard 1950. ” 10 INTRODUGAO DO EDITOR ALEMAO O significado das cinco ligdes presentes —A Ideia da Fenomenologia (introdugao a Fragmentos da Feno- menologia e da Critica da Raziio) —, pronunciadas por Husserl em Gotinga, de 26.1v a 2. de 1907, sobressai inequivocamente quando procuramos entender em que momento da evolugao espiritual de Husserl elas surgiram, que viragem no set pensamento representam. Eis 0 que se propde esclarecer esta introdugao. Seis anos apds 0 aparecimento das Investigagdes Légicas, Husserl atravessa uma dificil crise. Na altura, sofre ainda a humilhagdo de ver recusada pela Universi- dade de Gotinga a proposta do Ministério da Educagao para a sua nomeasao como professor ordindrio de filosofia. Parece que este «desprezo dos colegas» 0 afectou mais do que ele queria admitir. Mas, mais grave do que este fracasso externo é a diwida acerca de si mesmo que o atormenta, e de tal modo que poe em questo a sua exis- téncia como fildsofo. Deste desespero brota-a decistio de fazer luz sobre si préprio e sobre a sua tarefa. we Al Em 25.1x de 1906, escreve na sua agenda em que, de vez em quando, inseria anotagies em estilo de did - tio (1): «Em primeiro lugar, menciono a tarefa geral que tenho de resolver para mim mesmo, se & que pretendo chamar-me fildsofo. Refiro-me a uma critica da razio. Uma critica da razao Ibgica, da razio prdtica e da razao valorativa em geral. Sem clarificar, em tragos gerais, o sentido, a esséncia, os métodos, os pontos de vista capitais de uma critica da razdo; sem dela ter pensado, esbo- gado, estabelecido e demonstrado um projecto geral, no posso verdadeira e sinceramente viver. Os tormentos da obscuridade, da diwvida que vacila de um para o outro lado, jd bastante os provei. Tenho de chegar a uma intima firmeza. Sei que se. trata de algo grande e imenso; sei que grandes génios ai fracassaram; e, se qui- sesse com eles comparar-me, deveria de antemao desesperar...» (p. 17 5). A ressondncia do titulo da principal obra kantiana nao é acaso nenhum. Husserl, nesta época, ocupou-se deti- damente de Kant; desta ocupagéo veio-lhe a ideia da fenomenologia como filosofia transcendental, como idea- lismo transcendental, e a ideia da redugio fenomeno- légica (2). (Hd que renunciar aqui a abordar a questéo da diferenga entre 0 pensamento de Kant e o de Husserl, em especial relativamente a ideia bdsica da «constituigéo».) A reducio fenomenolégica proporciona 0 acesso ao modo de consideragao transcendental; possibilita 0 retorno 4 «onsciénci, Vemos nela como € que os objectos se constituem. Efectivamente, com o idealismo transcenden- tal, caminha-se para o centro do seu pensamento, o pro- blema da constituigéo dos objectos na consciéncia ou, (1) A agenda encontra-se no Arquivo sob a indicago Kx 5. 2) B nesta altura que Huser! trava conhecimento com Dilthey, que foi para ele de grande importancia. — Infe- lizmente, até agora nfo se encontraram as cartas destes anos, como Husserl também diz, «a dissolugao do ser na cons- Nas Cinco Licdes, exprimiu Husserl pela primeira vez em piiblico estas ideias, que haviam de determinar todo o seu pensamento ulterior. Nelas oferece uma clara exposig¢ao tanto da redusao fenomenoldgica como da ideia fundamental da constituigao dos objectos na consciéncia. Um primeiro rudimento da ideia da reducgdo encon- tramo-lo ja no verio de 1905, nas chamadas Folhas de Seefeld (Indicagao: A vii 2 5); no entanto, a diferenca relativamente ds Cinco Ligdes é muito grande. Em 1905, pode falar-se sobretudo de um primeiro tactear titubeante, ao passo que, nas Cinco Ligdes, 4 ideia (jé estd expressa em toda a sua significaco, e jd se divi- ‘sou o nexo com o essencial problema da constituigio. As ideias fundamentais das Cinco LigSes nado mais abandonaram Husserl, como nos mostram os manuscritos conservados, entre os quais queremos mencionar apenas os mais importantes e em imediata conexdo com as ligdes. De Setembro de 1907 ¢ Setembro de 1908, os manuscri- tos Bx 1 e Bur 2; em seguida, a ligao de 1909 — «Ideia da fenomenologia e do seu método» (F 1 17); a ligdo sobre a reducdo ampliada, de igtoji1 (F 1, 43); ligao sobre a reducdo fenomenolégica, de 1912 (B wu 19); e, por fim, a ligao de 1915, paralela a de 1909 — «Pro- blemas fenomenolégicos selectos» — (F x 31). Num destes manuscritos (Setembro de 1907, B u 1), especi- fica Husserl 0 seguinte acerca da sua nova posigéo, em ligago com as Investigacbes Légicas: «As ‘Investigagées Légicas’ faxem passar a fenomenologia por psicologia descritiva (embora fosse nelas determinante 0 interesse tedrico-cognoscitivo). Importa, | porém, distinguir esta psicologia descritiva, e, claro, entendida como fenomenologia empi- rica da fenomenologia . O que nas minhas ‘Investigasbes Légicas’ se designava como feromenologia psicoldgica descritiva conceme a simples esfera das vivencias, segundo. o'sex contelsdo incluso: As ‘vivéncias sto 3

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