Exercício de Escuta Yoga

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st NISPANDA BHAVA Além de constituir um bom exercicio da concentragio men- tal, tem um efeito sedativo imediato. A calma se faz sentir em dois ou trés minutos de pratica. E uma concentrago mental (atengdo voluntariamente diri- gida ¢ mantida) sobre o mundo sonoro que nos cerca. Geral- mente se aconselha ao praticante de meditagio um lugar silente, onde os ruidos no venham a perturbar ¢ desviar a atengdo. Em nispanda bhava, nos vamos ao encontro dos sons do ambiente. Nao fugimos deles. Do mundo de sons é que vamos sacar tran- diiilidade © repouso. Constitui, outrossim, um exercicio de abs- tragio, de opgao sensitiva e de tapas (aceitar 0 mundo como ele €). Se sé nos sentimos trangiiilos num ambiente acustica- mente isolado, estamos condicionados, e vulnerdveis, portanto dependentes de circunstancias externas. Nao quero dizer com isto que estio errados os Mestres que aconselham solidio e siléncio a quem quer meditar. Estas circunstancias — é claro — contribuem para um maior aprofundamento de consciéncia em pratica de Yoga interior. Na Astanga Yoga de Patnjali, prathyahara constitui a etapa em que, isolando os sentidos, fe- chando-os ao mundo externo o praticante consegue realizar a interiorizagio da mente. Se bem que nispanda bhava patecga a atitude oposta — no o silenciar dos sentidos, mas o agugar da audigdo — também consegue isolar e aquietar a mente. Postura: Em sukhdsana (Fig. 8) ou uma cadeira (Fig. 5). Se o que se quer é remitir uma insénia ou sintoma de fadiga nervosa, é aconselhado shavdsana (Fig. 1), pois sobrevird 327 sonoléncia com poucos minutos de pratica. Se é a realizagiio da meditagdo 0 que se quer, entio é preferivel postura sentada {sukhdsana, Fig, 8). Execucao: Em perfeita imobilidade ¢ afrouxamento geral, feche os olhos e procure escutar os ruidos, os barulhos, os sons do ambiente onde estiver. Procure identificé-los, discriminé-los: © apito do guarda de transito, as buzinas, os motores, a gritaria das criangas, 0 ronco de um avitio, 0 pio de um passaro ou o latido do’ cio. Alguns barulhos sio agudos, outros graves, uns baixos, outros altos, uns continuos, outros curtos... Procure no sen- tir-se irritado com qualquer deles, Desenvolva tapas (aceitagao, paciéncia, pois tudo é expresso do Absoluto), nao se irritando, nao admitindo que qualquer deles tenha poder de feri-lo, de inquieté-lo. Recuse-se a sentir-se incomodado ou ameagado por qualquer deles. Deste mundo sonoro, procure identificar um som que seja: baixo, montono, invaridvel, discreto, continuo. .. Numa grande metrépole este som é 0 que poderiamos chamar a voz anénima da cidade, parecendo 0 somatério de todos os sons, que se le- vantam de todas as ruas. E algo como 0 som de uma cascata muito distante. E como um murmirio grave e monétono. Se vocé estiver na praia, atente para a voz das ondas que se arre- bentam. Se na montanha, 0 vozerio do vento na ramagem da floresta ou a cangdo monocérdia do regato. Tal som existe, apesar de dificil identificd-lo, pois se encontra “abafado", subjacente aos outros, comumente mais audiveis Depois de o identificar, fixe nele a atengdo, isto é, fique alerta exclusivamente para ele. Abstraia-se de todos os outros. Aprenda, assim, a abstrair-se. Ficar atento exclusivamente para aquele som, a principio, enquanto a mente esta inquieta ¢ dificil. Mas vale a pena vencer com persistente paciéncia tal dificulda- de. O segredo do sucesso reside em que vocé no deve /utar contra os outros sons. No entanto, fique receptivo apenas, para © som que vocé elegeu. Os outros, pacificamente, serao nuli- ficados. A monotonia do som e sua qualidade de "som branco", isto 6 de baixa freqiiéncia, portanto, capaz de fazer bloqueio nervoso, tem um consideravel poder sedativo. Em poucos ins- tantes a paz se fara; sua mente estard muito tranqiiila. Vocé 328 sentiré um langor muito gostoso, que parece arrastd-lo para as profundidades da bem-aventuranga. Nada Yoga ensina que cada ser humano tem dentro de si, em seus niveis sutis ¢ interiores, um fascinante e misterioso mundo sonoro. E 0 som césmico que se manifesta em nos. Nao é o som audivel pelos que nao tém "ouvidos de ouvir". A pratica de Yoga, por anos seguidos, vai abrindo-nos a percepgio a esta sonoridade, que os textos classicos chamam de nada. Ao mesmo tempo que vai despertando capacidades perceptivas ainda em laténcia, o Yoga vai também "despertando" os chakras, centros energéticos sutis de onde se levantam estes sons. Quando tal percepgdo se desenvolve, o yoguin j4 néo pre- cisa dos sons de fora para fazer nispanda bhava. Fica atento para os de dentro, até que, em dia de ventura, possa escutar 0 verbo, 0 OM, aquele som de "muitas aguas" de que falava Sio Joao. E o deslumbramento, que conduz ao samadhi. Ba supre- ma bem-aventuranga — ananda — de escutar o inaudivel. A um aluno idoso, que vivia enervado em virtude dos sons subjetivos produzidos talvez por doenca degenerativa (ofoscle- rose, provavelmente), ensinei a substituir a aversio que o irritava pela aceitagéo e mesmo a utilizagao dos tais ruidos incessantes como objeto de concentracdo. Com isto, venceu a isénia e 0 medo. Encontrou paz naquilo que o martirizava.

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