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Copyright © 1999 dos Autor Direitos de tradugio gentilmente cedidos para a Pontes Faltores, Coordenagdo Eittoral: Exnesto Guimaraes apa: Claudio Roberto Martini Revisdo: Equipe de revisores da Pontes Faltores PONTES EDITORES Rua Maria Monteiro 1635 13025.152 Campinas SP Brasil Fone (019) 252.6011 Fax (019) 253.0769 e-mail: ponteseditori@lexxa.com.br 1999 Impresso no Brasil INDICE Inrodugio Memériae Produgéo Discursiva do Sentido AIimagem, uma Ante de Meméria Meméria Grega Papel da Meméria, Maio de 1968: Os Siléncios da Meméria.. INTRODUCAO © conjunto de quatro textos que ora apresentamos cons- \ituia sessio temética «Papel da Meméria» inserida em Hist: ria e Lingiistica, uma publicacio das Atas da Mesa Redonda ««Linguagem e Sociedade», realizada na Escola Normal Superi or de Paris em abril de 1983. Esse col6quio reuniu especialistas de diversas éreas, tendo como ponto de encontro arelagao entre lingua hist6ria. O tema particularmente enfocado aqui, a me- méria, € visto sob diferentes aspectos: lembranca ou reminis- céncia, meméria social ou coletiva, meméria institucional, me- méria mitol6gica, memériaregistrada, meméria do historiador, Atravessando os artigos, a questo: o que é produzit meméria? Como a meméria se institu, € regulada, provada, conservada, ou ¢ rompida, deslocada, restabelecida? De que modo os acon- lecimentos - historicos, mediéticos, culturais - so inscritos ou ro na meméria, como efes sf absorvidos por ela ou produzem rela urna ruptura ? Estas questies se desenvolvem nos artigos através de di ferentes perspectivas disciplinares, incluindo-se elementos de historia, semistica, sociolingustica, andlise de discurso. Além. disso, a meméria é analisada em sua materialidade complexa, ‘com énfase pare arelagio do texto com a imagem, para a passa- ‘gem do visivel ao nomeado, Por um lado, os textos fundadores cde meméria: mitos, relatos, enunciados, parfrases, Por outro, a eficicia simbética da imagem: a reprodugio pictérica, o meio (clevisual e até objetos arqueolgicas. Ficam expostas ao leitor ‘diferentes praticas memoria presentes na sociedade ocidental, sejam aquelas da Grécia antiga, sejam as que emergem com as rTecentes mudancas tecnolégicas, Analisando a construgto discursiva do sentido eo funci- ‘onamento dos implicitos, Pierre Achard mostra que a meméria ‘no pode ser provada, ndo pode ser deduzida de um corpus, ‘mas cla $6 trabalha ao ser reenquadrada por formulagdes no discurso conereto em que nos encontramos. O implcito de um. cenunciado (Achard analisa 0 enunciado: «Neste momento, ‘erescimento da economia é da ordem de 0,5%») nao contém sta explicitagio, nfo se pode provar que ele tena existido em al- gum lugar. O que funcionaria entio seriam operadores Tinguageiros imersos em uma situacdo, que condicionariam 0 cexercicio de uma regularidade enunciativa, Haveria, deste modo, colocagao em sétie dos contextos e das repotigdes formais, ‘numa oscilagdo entre 0 histérico e o lingtistico, Através das retomadas e das parsfrases, produz-se na memria um jogo de forga simbslico que constitui uma questo social Jean Davallon aponta, depois do aparecimento da im= prensa, 0 desenvolvimento dos meios de registro da imagem ¢ do som como fatores que deslocam a questo da meméria soci- al, que nao se encontraria mais nas «cabegas» dos individuos, ‘mas nas mfdias. O autor esboga uma rellexdo sobre a imagem, contemporiinea como operadora de meméria, Pela andlise do registto televisual de um acontecimento (a posse do presidente Mitterrand na Franga), € questionada a distancia que separa a «realidade> do «tfato de significagio». Davallon langa a hipste- se de que 0s objetos culturais (livros, escrites, imagens, filmes, arquiteturas, etc.), como operadores de meméia social, trabar ham no sentido de entreeruzar meméria coletiva (lembrange, onservagio do pasado, foco datradigyo, monumento de emi nisctncia) e historia (quadro dos acontecimentos. conhecimen- to, documento histérieo) Do contempordneo passamos para o antigo, Jean-Louis Durand faz uma interrogagao envolvendo as préticas memoriais a Grécia clissica, Ele coloca uma questio de enunciago im- ortante: quem fala e com que direito, a se produzir meméria? No caso da Grécia antiga, a produgiio da meméria s6 se daria na presenga do poeta épico - de Homero - pot meio de um texto produzido fora do dominio da cidade. No entanto, hd uma con- ‘tadigao na meméria, com a oposicao dos valores de grupo, dos, {extos homéricos, aos valores éticos, polticos, sociais em uma dada situagio. Ao examinar a imagem de um vaso grego, Durand nota possibilidade de remissio ao mesmo tempo a um herdi da epopéia © a um simples combatente da cidade, um guerreiro ‘anGnimo. Se pensarmos nos sistemas atuais de meméria, pode- Femos ver a relagao das prticas memoriais gregas com as me- hersicas estabelecidas em nossa sociedade, Em seguida olivro,o artigo de Pécheux faz uma retoma- 4da das exposigdes anteriores, situando-as no contexto das pes- quisas em andlise de discurso. Ble discute como as questBes de lingiiistica e de discurso aparecem nos estudos sobre memséria, introduzindo um debate sobre as disciplinas de interpretacio. Nesse sentido, ele pergunta: a lingistica é uma disciplina pura- ‘mente experimental ou ela tem algo a ver com as diseiplinas de interpretacdo? Por sua vez, a andlise de discurso cada vez mais ‘busca se distancia, afirma Pécheux, das evidéncias da proposi- ‘do, da frase e da estabilidade parafréstica, Ademais, ela permi- {e, apds os trabalhos de Benveniste ¢ Barthes com a nogio de «significdncia», avangar teoricamente e tecnologicamente na relagdo do texta com a imagem. i i s textos aqui reunidos guardam as marcas do debate em meio a0 qual foram concebidos, com o tom um pouco colo- quial e as freqlentes remissdes a outros expositores. Como re- sultado dessas discussbes, salientamos 0 seguinte comentario, de Pécheux: «A certeza que aparece, em todo caso, no fim desse debate € que uma meméria nao poderia ser concebida como uma esfera plena, cujas bordas seriam transcendentais hist 0s e cujo contedido seria um sentido homogéneo, acumulado ‘a9 modo de umn teservatGrio: & necessariamente um espago m6- vel de divisbes, de disjungtes, de deslocamentas e de retoma- «as, de conflitos de regularizacZo... Um espaco de desdobra- ‘mentos,réplicas, polémicas e contra-discursos». Pouco mais de ddez anos depois, este é um momento bastante apropriado para tetomar esse acontecimento, atualizAo,inseri-loem nosso con- texto para que produza sentido e meméria, Actescentamas ainda nessa edigdo 0 texto de Eni Orlandi faio de 1968: 0s siléncios da memsria”, em que a autora apre- senta uma reflexio sobre a relagdo entre meméria € censura n0 contextoda ditadura no Brasil. Neste caso mostra-se que hi acon- tecimentos que nd se inscrevem na meméria, como se ndo vvessem ocorrido: 0s sentidos de Maio de 68, entre eles, os rela- cionados a palavra “liberdade”, sto evitados em um processo hist6rico-polttico silenciador, de modo que se estabelece uma, falta na meméria, José Horta Nunes MEMORIA E PRODUCAO DISCURSIVA DO SENTIDO ‘Se, a partir de uma posigao de andlise de diseurso, que remos falar do papel da meméria,e, por conseguinte, do estatu- {0 dos implicitos, logo encontramo-nos em posigdo delicada, ‘Mas se este é um ponto em direc a0 qual € perigoso se aven turar - Sendo real orisco de uma interpretagto psicologisia dos ‘mplicitos - ¢ no entanto necessério se preocupar com ele, Ten- {are entio falar sobre isso, considerando que a estruturagio do discursivo vai constituir a materilidade de uma certa meméria, social. Bem entendido, nfo se trata de avangar 0 termo “materialidade” como mascara retGrica para explicagSes que seriam da ordem do inefével ou do inconsciente coletivo, nem de dar ao termo “memeéria social” um valor tal que ni teriamos, Finalmente outro meio de analisé-lo sendo colocélo Procurarei enti mostrar que 6 possivel colocar um cer- to nGémero de hip6teses concernentes ao funcionamento formal no discurso, hipsteses arelacionar com a circulagdo dos discur- sos; esta relacio deve permitir que nos afastemos de interpreta- ses psicol6gicas da meméria em termos de “realmente-jé-ou- u vido”, meméria fono-magnética ou registro mecfinico, Paraisso, apoiat-me-ci sobre alguns exemplos. Mea primeira exemplo conceme ao funcionamento da palavra “reseimenta” no dominio da Economia Politica. Um fnunciado como: "Neste moment, ocreseimento da economia da oniem de 05 % faz apelo-aum certo ndmero de iplie\- tos, dos quai evacare apenas alguns. © primeira dle nd zido pela pressuposigdo de que se pode aplicar uma “taxa a um “crescimeno da economia”, quer diet, que a economia pode ser medida (endo simplesmente“verificada, como sedi da Temperatura em fsia elementa), © segundo implicit que & também um implicito segundo (quer dizer, que stoma seu sen- tidoem relaga0 ao primeto}, 6a equivalénca, do ponto de vista da taxa nts diferentes medidas posses, Paricularente, nese cao, a diferenga ene PIB ¢ PNB nao ser pertinent Em terceir ugar, pressupde-seimplictamente que esse cresc- mento se cleulado dentro do prazo de um ano, prazo cn derado como evident, Enfim, ntma orden umn pouco diferen 10 local dese reseimento no € indicad isto ipica que ie sito em um universe desoritivo nacional, © que falo por onseguinte do erescimento da economia francesa ~ ou, mais extent, do crescimento da economia que concer nag, aopafsno qual aenunciagio se situa. Eo que di aeste implicit um estatuto diferente dos precedenes, que ele remete mais & “situaglo” que "meméra". A “*memria" inervém, no entan- 10, para engudrarimplctamente a sinago no espago nacio= nal, pea falta, Esse enquadramento pode ser explictmente Geslocado (podemos falar de “erescinento da economia mun

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