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Do Ensino Universitário No Peru
Do Ensino Universitário No Peru
Lisboa
2020
1
A Nova Política do Ensino Universitário no Peru
A Superintendência Nacional de Ensino Superior (SUNEDU)
Júri:
Presidente:
Vogais:
Lisboa
2020
2
ABSTRACT
Since a few years ago, important changes aiming to improve the university education
system in Peru have occurred. One of the most relevant fact of this process was the approval
of the University Law n°30220, and with it, the creation of the National Superintendence of
Higher University Education (SUNEDU in Spanish) in 2014. The main objective is "the
continuous improvement of the educational quality of university institutions" through the
licensing of all institutions, is it is intended to be achieved.
Even though, at first, the activities carried out by SUNEDU were questioned by certain
sectors, five years later, with the preview of the first results, the perception of the
stakeholders changed, and the public opinion about SUNEDU is now quite favourable.
However, it is worth asking what implications the new policy on higher education has brought
to the development of the Peruvian university market.
This research aimed to extensively portray the situation of the university system in
Peru before the Law 30220 and to highlight future outcomes from different perspectives. We
carry out statistical analysis and an institutional evaluation of the university, allowing us to
place the Law 30220 into the Peruvian society context. The purpose of the investigation was
to justify the need of renew the university policy by showing the inability of previous
regulatory institutions along with the political will of the State about the new social demand.
In that sense, the implementation processes and the current changes in higher education were
evaluated. Additionally, we highlighted some inconveniences and inconsistencies that would
make this reform incomplete and hardly sustainable for the university system.
A substantial change in the political will of the State towards the university was
observed, going from a neglecting role to a leading one in the supervision of the sector. This
new policy prioritizes quality and disregards other aspects such as finance issues or access to
the university. The future of the university has not yet been written; however, the private
sector is probably, once again, the most important actor in Peru.
3
SUMÁRIO
Este projeto teve como objetivo retratar a situação do sistema universitário no Peru
antes da Lei N.º 30220 e destacar os potenciais resultados futuros a partir de diferentes pontos
de vista. Foram realizadas análises estatísticas descritivas e uma avaliação institucional da
universidade que nos permite contextualizar a Lei Universitária na sociedade peruana. O
propósito da investigação foi justificar a necessidade de renovar a política universitária, diante
da incapacidade das prévias instituições reguladoras e da vontade política do Estado frente à
nova demanda social. Nesse sentido, foram avaliados os processos de implementação e as
mudanças atuais para alertar sobre os inconvenientes e inconsistências que tornariam a
reforma incompleta e dificilmente sustentável no sistema universitário.
4
RESUMEN
Desde hace algunos años se viene realizando importantes cambios que buscan mejorar
el sistema de educación universitaria en el Perú. Posiblemente el hecho más importante de
este proceso es la Ley Universitaria N.º 30220 y con ella la creación de la Superintendencia
Nacional de Educación Superior Universitaria (SUNEDU) en 2014. El objetivo es “el
mejoramiento continuo de la calidad educativa de las instituciones universitarias” y se
pretende alcanzar con el licenciamiento de todas las instituciones.
5
LISTA DE GRÁFICOS
Gráfico 13. Número de estudantes da oferta pública gratuita por universidade ................................. 46
Gráfico 14. Universidades privadas em 2018 com benefícios tributários no Peru ............................... 54
Gráfico 17. Percentagem do PIB investido em educação por país, de 1989 a 2018 ............................. 72
Gráfico 18. Evolução das universidades públicas peruanas no QS Latin-America Ranking .................. 79
Gráfico 19. Evolução das universidades privadas peruanas no QS Latin America Ranking .................. 79
Gráfico 20. Evolução das universidades peruanas no Ranking Webometrics, América Latina. ........... 80
6
Gráfico 21. Evolução das universidades peruanas no Schimago Institutions Rankings, América Latina.
............................................................................................................................................................... 80
LISTA DE TABELAS
Tabela 4. Número de estudantes com acesso ao ensino público gratuito de todos os níveis por
universidade .......................................................................................................................................... 45
Tabela 5. Lista de universidades privadas com fins lucrativos isentas de pagar imposto de renda
(2018) .................................................................................................................................................... 55
Tabela 7. Principais requisitos para a concessão de licenças: CONAFU vs. SUNEDU ........................... 60
Tabela 8. Universidades existentes no Peru em 2014 de acordo com a licença de funcionamento .... 63
Tabela 12. Evolução das universidades peruanas no Ranking THE - América Latina............................ 79
7
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS
APRA - Alianza Popular Revolucionaria Americana, partido político (Aliança Popular Revolucionária
Americana)
9
Índice
INTRODUÇÃO ........................................................................................................................................ 11
OBJECTIVOS ........................................................................................................................................... 13
PARTE I. ENQUADRAMENTO TEÓRICO.................................................................................................. 14
Capítulo I. Sociedade peruana .......................................................................................................... 14
Capítulo II. Educação Superior Universitária ..................................................................................... 15
Capítulo III. Demanda Social por Educação Universitária e Políticas Públicas .................................. 18
PARTE II. EDUCAÇÃO UNIVERSITÁRIA NO PERU ANTES DA LEI 30220.................................................. 24
Capítulo IV. Crescimento e Reforma das Universidades no Peru ..................................................... 24
Capítulo V. Análises quantitativas ..................................................................................................... 33
5.1 Quantidade de alunos ................................................................................................................. 33
5.2 Quantidade de universidades ..................................................................................................... 35
5.3 Distribuição de alunos ................................................................................................................. 37
5.4 Distribuição de alunos em universidade de outros países da América Latina ............................ 39
5.5 Oferta pública gratuita ................................................................................................................ 43
5.6 Sumário das análises estatísticas ................................................................................................ 46
Capítulo VI. Análises qualitativas ...................................................................................................... 47
6.1 Institucionalismo na educação .................................................................................................... 47
6.2 Debate sobre a eleição de novas autoridades ............................................................................ 48
6.3 Debate sobre a autonomia universitária: papel político do CONAFU e da ANR ........................... 51
6.4 Debate sobre interesses económicos e benefícios tributários ................................................... 53
6.5 Regulamentação e qualidade antes da Lei N.º 30220: Caso CONAFU .......................................... 57
PARTE III. FUNDAMENTOS DA POLÍTICA DE MELHORIA DA QUALIDADE NA LEI UNIVERSITÁRIA ........ 64
Capítulo VII. Garantia da qualidade .................................................................................................. 64
7.1 Papel do Estado e Condições Básicas da Qualidade ................................................................... 64
PARTE IV. RESULTADOS, DISCUSSÃO E CONCLUSÃO ............................................................................ 70
Capítulo VIII. Resultados e discussão ................................................................................................ 70
8.1 População, recursos e gestão ...................................................................................................... 71
8.2 Decisões políticas ........................................................................................................................ 73
8.3 Acesso e qualidade ...................................................................................................................... 74
Capítulo IX. Discussão e Conclusões ................................................................................................. 76
9.1 Financiamento ............................................................................................................................. 76
9.2 Qualidade .................................................................................................................................... 78
9.3 O futuro da universidade ............................................................................................................ 81
9.4 Considerações finais .................................................................................................................... 84
10
INTRODUÇÃO
O Peru chega ao final da primeira década do século XXI com muitos questionamentos
a respeito do funcionamento das universidades, os seus preços e a sua qualidade de ensino.
Como resultado, durante a segunda década dos anos 2000, o governo realizou mudanças
políticas com base em propostas para educação superior, o que o levou a aprovar a Lei
Universitária N°30220, promulgada em julho de 2014. Neste contexto, a anterior Asamblea
Nacional de Rectores (Assembleia Nacional de Reitores - ANR) e outras instituições foram
substituídas pela Superintendencia Nacional de Educación Superior Universitaria
(Superintendência Nacional de Ensino Superior - SUNEDU), cujo papel é fiscalizar o
cumprimento das condições básicas de qualidade no ensino. À SUNEDU foi atribuída,
portanto, a responsabilidade de licenciamento das universidades públicas e privadas no Peru
de acordo com a política de garantia da qualidade na educação superior universitária do
Ministério da Educação - MINEDU (D. S. N.º 16-2015). Todas essas medidas tiveram como
objetivo aprimorar a situação do ensino universitário no país.
11
As crises e os grandes problemas socioeconómicos geralmente marcam a agenda
política de um país; no caso peruano, foram as dificuldades económicas e sociais anteriores
que conduziram a uma situação de enfraquecimento do sector da educação, o que prejudicou
gravemente a educação universitária (Saavedra & Suárez, 2002).
1
Fonte: Superintentencia Nacional de Educación Superior Universitaria (SUNEDU).
Disponível em: https://www.sunedu.gob.pe/lista-universidades/
12
OBJECTIVOS
13
PARTE I. ENQUADRAMENTO TEÓRICO
A comunidade peruana tem sido formada por várias etnias ao longo dos séculos. No
entanto, desde o período colonial e da vida republicana, houve uma forte influência católica
espanhola e evidentes divisões na sociedade - especialmente entre espaços urbanos e rurais
- dentro do território do Peru. Estas divisões tem acompanhado uma lógica centralista,
concentrando a população e seu desenvolvimento na zona da costa. Segundo estimativas do
Instituto Nacional de Estatística (INEI), o Peru chegaria em 2020 com 32.6 milhões de
habitantes; destes, quase 60% moram na costa, 28% na serra e apenas 13% na selva. Esta
distribuição territorial é o resultado da massiva migração do campo a cidade, principalmente
na última metade do século XX.
Nas últimas décadas do século XX, o país sofreu uma forte crise económica e social. O
descontrole fiscal e hiperinflação, o conflito armado pelo surgimento de grupos terroristas e
ações bélicas contra o Equador foram alguns dos motivos que explicam a debilidade
económica do Estado e também de uma grande percentagem das famílias peruanas. Porém,
o sustentável crescimento económico posterior aos 2000 beneficiou a maior parte da
população, dinamizando a mobilidade social principalmente à classe média emergente, que
chegou a alcançar ao 69% dos peruanos (Ferreira et al., 2013).
O antropólogo Ludwig Huber considera que dentre os principais fatores por trás desta
expansão da classe média está a educação superior, que em vários casos oferece - pela
primeira vez – a oportunidade de profissionalizar os membros da família peruana. Além disso,
agrega-se o fator da migração, que tem criado nas últimas décadas numerosos
empreendimentos – majoritariamente informais – nas maiores cidades. Entretanto, o
14
desenvolvimento destes empresários tem elevado grande parte da população aos níveis
socioeconómicos (NSE) que consideramos atualmente como a “nova classe média”. Os
peruanos acreditam que a educação universitária tem assumido um papel de liderança na
mobilização social, como é evidenciado pelo crescimento deste sector. Contudo, isto
representa um desafio para a sociedade, porque as instituições de ensino superior
frequentadas pela maioria da nova classe média apresentam um limite para o progresso social
(Huber & Lamas, 2017).
Educação
De acordo com a Real Academia Española (Real Academia Espanhola - RAE), educação
é "o ensino e a doutrinação dados à crianças e jovens", "instrução através da ação de ensino"
e a "ação ou efeito da educação". Educar vem da palavra latina educatio, que se refere ao
processo de transmissão de conhecimentos, valores e modos de agir.
Educação superior
15
Essa definição deve estar vinculada ao contexto em que a educação é praticada. Por
exemplo, na situação Latino-americana, incluindo no Peru, o ensino superior prima por criar
soluções para os problemas dessa sociedade em específico, cujas prioridades não serão as
mesmas quando comparadas a outras regiões ou culturas ao redor do mundo.
As funções do ensino superior no Peru são definidas com base nos fundamentos do
Ministério da Educação do Peru, dispostos na Lei N.º 30512, Lei dos institutos e escolas de
ensino superior e carreira pública de ensino. Os seus principais objetivos são: (i) treinamento
de pessoas nas áreas de ciência, tecnologia e ensino para contribuir com o desenvolvimento
pessoal e social; (ii) fornecimento de treinamento de qualidade capaz de responder às
demandas do sector produtivo; (iii) contribuição para o desenvolvimento do país e de sua
sustentabilidade; (iv) promoção do empreendedorismo, da inovação e da investigação para
um desenvolvimento adequado no ambiente de trabalho regional, nacional e global.2
2
Ley de Institutos y Escuelas de Educación Superior y de la Carrera Pública Docente, Ley Nº 30512. Artículo 3º.
Disponível em: Diario El Peruano: http://www.minedu.gob.pe/ley-de-institutos/pdf/ley-de-institutos.pdf
16
Em 2014, com a criação da Lei N.º 30220 (Lei Universitária), entre outras aplicações,
foi criada a SUNEDU, sendo esta nomeada como entidade totalmente competente para a
supervisão e execução da política de melhoria da qualidade, exclusivamente para o ensino
superior universitário no Peru. Nesse sentido, as instituições supervisionadas pela SUNEDU
fazem parte do sistema de ensino superior da universidade. A Lei Universitária regulamenta
universidades públicas e privadas, nacionais ou estrangeiras, que operam no território
peruano. Logo, a nova política de ensino superior no Peru é aplicada em específico a esse tipo
de ensino: as universidades.
3
Diario Gestión. Disponível em: https://gestion.pe/economia/peru-8-5-millones-jovenes-educacion-superior-
144111-noticia/?ref=gesr
18
discutidas provêm de diferentes fontes de informação, incluindo órgãos governamentais e
opiniões de personagens políticos, filósofos, educadores.
As bases nas quais as políticas públicas haviam sido articuladas também mudaram
drasticamente (Rama, 2003). 4 Dito isto, a política de ensino universitário no Peru deve
procurar, inicialmente, atender às demandas sociais corriqueiras, como matrícula, acesso e
qualidade. Essas demandas têm sido cada vez mais evidentes com o aumento de candidatos
e matrículas em universidades no país.
Uma das maneiras mais concretas de saber qual é a política de um Estado, neste caso
em relação à educação, é revisar a constituição do país. A constituição estabelece as bases
para o desenvolvimento do sistema jurídico e enquadra o significado das políticas, além de
outras manifestações no território nacional. Nenhuma regra ou manifestação pode ir contra
uma constituição. No entanto, deve-se considerar que, mesmo quando uma constituição
inclui alguns artigos dedicados ao ensino superior que definem os propósitos, objetivos,
limites e liberdades da universidade, são as leis, regulamentos e outras disposições legais que
especificam as suas práticas em linha à carta magna. Assim, foram revisados nesta
4
Os estudos sobre a expansão da oferta universitária no mundo surgiram nos Estados Unidos pela primeira vez
na década de 1940, com a publicação do 1947 Truman Commision Report (Truman, 1948), informe que resume
a necessidade de expandir o acesso a universidade nos Estados Unidos após a Segunda Guerra Mundial
(Tenney, 1950; Kennedy, 1952; Quattlebaum, 1956; Trow; 1972). O fim da guerra foi o começo do discurso para
a busca de uma sociedade mais inclusiva em termos raciais, abrindo múltiplas possibilidades de mobilização,
internacionalização e cooperação multicultural entre América do Norte, Europa e Ásia (Smith e Bender, 2008;
Baron, 1993; Neave, 1992; Islam, 1975). Na América Latina e no Peru, esse processo começou a surgir apenas
no início dos anos 80, no contexto de crises sociais (Lynch, 1990; Silva, 1986) e reformas políticas e económicas
(Romero, 1987; Brunner, 1981). Para realizar os estudos de expansão, as investigações seguiram um caminho
diferente, diferenciado pelo contexto político (López, 2006). Na Europa e América do Norte, o olhar pós-
Segunda Guerra Mundial abriu caminho para uma geração de redes organizacionais (Clark, 1983); enquanto na
América Latina, a análise foi marcada pela necessidade de incluir o sector marginalizado da população em
detrimento da qualidade educacional (Burga, 2008; García, 2003).
19
investigação as principais leis, decretos, resoluções e sentenças relacionadas ao
funcionamento do ensino superior no Peru.
5
Constitución del Perú. 1993. Artículo 16º.
6
Constitución del Perú. 1993. Artículo 18º.
7
Constitución del Perú. 1993. Artículo 19º.
8
Constitución del Perú. 1979. Artículo 32º.
9
Constitución del Perú. 1933. Artículo 72º.
20
tendência ao ensino gratuito" 10 , sendo essa a única constituição que contemplava
minimamente a possibilidade de oferta de ensino superior gratuito.
Com relação à legislação universitária atual no Peru, as considerações passam por uma
lista de regulamentos, começando com a lei universitária já revogada de 1983, que estabelecia
que a universidade deveria "transmitir a cultura universal com um senso crítico e criativo, de
preferência afirmando valores nacionais", com objetivo de capacitar profissionais de alta
qualidade académica e que conhecem a realidade nacional, estendendo sua ação à
comunidade 11 . Em seguida, tem-se a Lei N.º 26439 que criou o Consejo Nacional para la
Autorización de Funcionamiento de Universidades (Conselho Nacional de Autorização de
Operação de Universidades - CONAFU), entidade autônoma encarregada de autorizar ou
negar novas universidades. Há ainda o DL N.º 882, Lei de Promoção de Investimentos em
Educação, que de acordo com a Constituição, "estabelece condições e garantias para
promover investimentos em serviços educacionais, a fim de contribuir para modernizar o
sistema educacional e ampliar a oferta e cobertura”, e priorizar o acesso à qualidade 12. Por
fim, pode-se citar a Lei Moratória N.º 29971, sobre a criação das universidades públicas e
privadas, que proibiu a criação de novas instituições universitárias, bem como de novas
subsidiárias e sua subsequente extensão, por um período de dois anos.
10
Constitución del Perú. 1933. Artículo 75º.
11
Ley Universitaria. Ley Nº 23733. Diciembre de 1983. Artículo 2º. Disponível em:
http://transparencia.unitru.edu.pe/doc/LEY23733.pdf
12
Decreto Legislativo 882, Artículo 1.
21
Esse cenário jurídico desenvolvido nas últimas décadas pelos governos no poder no
Peru permitiu que o sector privado continuasse a criar novas universidades, com um aumento
significativo da sua participação no mercado. Isso se deu até a publicação da última lei
universitária que entrou em vigor em 2015 (ver Tabela 1).
13
Constitución de Brasil. 1988. Artículo 206º.
14
Constitución de Brasil. 1988. Artículo 208º.
15
Constitución de Brasil. 1988. Artículo 209º.
16
Constitución de Brasil. 1988. Artículo 212º.
17
Constitución de Portugal. 1976. Artículo 73º.
22
os níveis 18 . Quanto à educação pública e privada, a Constituição oferece cobertura às
necessidades de toda a população e a supervisão da "educação complementar privada para
educação pública". Estabelece ainda que "o acesso à universidade deve levar em consideração
as necessidades do país em quadros qualificados e estimular e favorecer a entrada de
trabalhadores e crianças das classes trabalhadoras" 19.
Deve-se notar que tanto a Constituição brasileira quanto a portuguesa mostram uma
tendência a definir o ensino superior como uma obrigação do Estado e um direito dos
cidadãos; portanto, o Estado deve garantir – progressivamente, no caso do ensino superior –
acesso gratuito aos mais altos níveis de educação para todos.
Em um primeiro momento, pode ser difícil estabelecer uma tendência na intenção dos
Estados em ofertar ensino superior gratuito; no entanto, essa possibilidade não é
completamente singular em países com semelhanças socioculturais, cujas constituições foram
criadas em contextos similares. O Peru está na lista de países que não têm a intenção de
incorporar a educação universitária gratuita em sua Constituição - embora na prática essa
situação seja diferente – porém, concede benefícios especiais a instituições educacionais
privadas, especialmente na área tributária.
18
Constitución de Portugal. 1976. Artículo 74º.
19
Constitución de Portugal. 1976. Artículo 76º.
20
Constitución Política de Colombia. 1991. Artículo 67º.
23
PARTE II. EDUCAÇÃO UNIVERSITÁRIA NO PERU ANTES DA LEI 30220
Com o objetivo de retratar a situação do Peru diante da Lei Universitária, o capítulo III
aborda uma breve revisão histórica do crescimento das universidades no país. Do ponto de
vista quantitativo, análises estatísticas descritivas considerando o número de universidades,
número de matrículas de alunos, distribuição de alunos nas instituições e objetivos da Lei N.º
30220 foram conduzidas. Posteriormente, o tema foi discutido através de análises
qualitativas.
Em 1551, a rainha mãe, Dona Juana, com a autorização do rei Carlos V da Espanha,
assinou o Real Cédula em Valladolid para a criação da primeira universidade da América do
Sul, a Universidade da Cidade dos Reis ou Lima, a mesma que mais tarde seria renomeada
Universidade Nacional de San Marcos, quando as ações bélicas para a conquista espanhola
nas terras incas ainda não haviam terminado. De facto, a fundação desta universidade
consolidou o poder político da Espanha, justificando os pesados gastos da conquista. Assim,
na realidade, mais do que a busca por conhecimento e pensamento livre, o principal objetivo
da primeira universidade peruana foi uma estratégia para justificar o processo de
"culturalização", compreender e subsumir a língua nativa dos conquistados, a fim de dominá-
los completamente. Naquela época, a criação e abertura de novas universidades estava sujeita
aos interesses da conquista, motivo pelo qual o consenso de um grupo de clérigos espanhóis
do mais alto escalão, que justificava o orçamento necessário antes da coroa, era suficiente.
24
Portanto, mais do que claustros ou conventos religiosos, instituições estatais foram fundadas
a serviço dos vice-reis da Coroa (Robles, 2006).
Quanto às reformas universitárias, pode-se dizer que a primeira reforma no Peru foi
realizada pelo vice-rei Francisco de Toledo em 1571, com a secularização da Universidade de
San Marcos e a eleição de seu primeiro reitor leigo. Uma segunda reforma ocorreu entre os
séculos XVII e XVIII, com o surgimento das principais faculdades, cujos profissionais se
formaram na Universidade de San Marcos. Embora fossem praticamente uma extensão da
universidade, foram nesses centros que o direito canónico e o dogma foram paulatinamente
substituídos pela experimentação e pensamento livre, promovidos por intelectuais como José
Baquíjano e Carrillo, Toribio Rodríguez de Mendoza e Hipólito Unanue.
Com a criação da Universidade Católica do Peru - ainda sem ser pontifícia - no início do
século XX, inaugurou-se o domínio das universidades privadas, já legalizada pelo Estado
peruano através de uma resolução suprema de março de 1917. Entretanto, o novo cenário de
independência não resultou em mudanças substanciais na educação literária e elitista. O
25
estopim deste processo se deu com o chamado "Grito de Córdoba" (Argentina em 1918), um
movimento de abrangência latino-americana que propôs a Reforma Universitária como uma
tentativa de democratizar a educação, fortalecer a investigação científica e orientar a criação
de conhecimento em direção ao mundo real. Esse sonho da nova universidade do século XX
no Peru, apesar das tentativas de se adaptar às mudanças da modernidade e da criação de
novas instituições de ensino, não se materializou numa formação de qualidade ou que
atendesse às demandas para o desenvolvimento nacional, apresentando, assim, diversas
fragilidades. Isso foi agravado pela baixa prioridade dada à educação pelos governos
sucessivos (com algumas exceções) e pela presença de interesses extra académicos.
Diversos intelectuais e políticos peruanos como Manuel González Prada, Víctor Raúl
Haya de la Torre, José Carlos Mariátegui, Jorge Basadre, Luis Alberto Sánchez e José Antonio
Encinas, para citar apenas alguns 21 , alertaram para a "esclerose do ensino", "os esquemas
coloniais da universidade" e seu "atraso espiritual, de ensino e científico", propondo sua
conversão em "nova ciência e verdadeiros laboratórios da vida", "rompendo os obstáculos dos
antigos sistemas de ensino e vida das universidades, bem como das relações entre ela e o
público em geral” e a participação da universidade como promotora do desenvolvimento.22
21
Sánchez, Luis Alberto. (1969) La universidad actual y la rebelión juvenil. Buenos Aires: Losada. “Quien
pretenda reducir la reforma universitaria al mero ámbito de la universidad cometería un grueso error. Siendo la
universidad en América Latina, espejo fiel de la existencia colectiva, sus variantes se refieren tanto a una como
a la otra". P. 62.
22
Robles Ortiz, Elmer. (2009) La reforma universitaria: Sus principales manifestaciones. Universidad Privada
Antenor Orrego (UPAO). Trujillo: Fondo Editorial UPAO.
26
Em 1941, o Presidente Manuel Prado promulgou a Lei Orgânica da Educação Pública e
reconheceu a autonomia da universidade. Em 1946, o Presidente José Luis Bustamante e
Rivero promulgou a Lei 10555, que estabeleceu o cogoverno, reorganizou a universidade e
flexibilizou seu regime de estudos. Durante o governo do general Manuel A. Odría (1948-
1956), os avanços na educação duramente conquistados foram novamente perdidos, gerando
um período de caos nas universidades.
27
Nacional de Engenharia, UNI), da Escola de Agronomia (Universidade Nacional Agrária) e da
Normal Superior Enrique Guzmán y Valle (para Universidade Nacional de Educação) de acordo
com as Lei N.º 13417 de 1960 e Lei N.º 15519 de 1965 (Sandoval López, 2002).
A reforma de 1972 não teve continuidade e não pôde ser sustentada devido à falta de
diretrizes políticas e apoio da população (Casas, 2012). Além disso, nas décadas seguintes,
houve necessidade de repensar as abordagens políticas, não apenas educacionais, no Peru e
região. Desde 1969, o corpo diretivo das universidades constituía o Consejo Nacional de la
Universidad Peruana (Conselho Nacional da Universidade Peruana - CONUP).
Nos anos 80, a tendência anterior foi revertida com a abertura de doze universidades
privadas e apenas duas públicas (Asamblea Nacional de Rectores, 2012). Entretanto, mais do
que uma iniciativa do Estado para expandir o acesso à educação universitária, esse processo
ocorreu pela incapacidade de investimentos em universidades públicas (Sandoval López,
2002). Em 1983, o Presidente Fernando Belaúnde Terry promulgou a Lei N.º 23733, Lei
Universitária, que restaurou a autonomia da universidade e a participação dos estudantes, e
criou a agora extinta ANR como a mais alta autoridade das universidades públicas e privadas,
assumindo em suas funções a avaliação e a autorização de novas instituições (artigo 90). Neste
28
ínterim, as universidades privadas continuaram a crescer enquanto os gastos sociais com as
universidades públicas diminuíram (ver Gráfico 1 e 2).
25.0%
23.0% 23.0%
22.0% 20.4%
21.0%
18.6%
19.0% 18.8%
19.2%
17.0% 18.0%
15.2%
15.0% 16.0%
13.6% 15.1% 14.0%
13.0% 12.8%
10.9% 11.6%
11.0% 10.6%
11.9% 10.4%
9.0%
9.1%
7.0% 9.1%
6.6%
5.0%
1970 1980 1990 1995
Fonte: Elaboração própria (o Autor, 2020) com base no informativo “La educación superior en los países en
desarrollo: Peligros y promesas”, Banco Mundial, 2000.
6.0%
5.5%
5.0% 5.1% 4.7% 4.9%
4.6%
4.3%
4.0% 3.8% 4.0%
3.6% 3.7%
3.3%
3.0% 3.1% 2.7% 3.0%
2.9%
2.3% 2.6%
2.4%
2.0% 1.9%
1.5%
1.0% 1.1%
1970 1980 1990 1995
Fonte: Elaboração própria (o Autor, 2020) com base no informativo “La educación superior en los países en
desarrollo: Peligros y promesas”, Banco Mundial, 2000.
29
Na década de 1990, Alberto Fujimori implementou uma reforma liberal na educação,
para legalizar e promover a criação de novas universidades privadas. Aparentemente, o
aumento do número de universidades foi determinado com base nos interesses económicos,
que levaram o Estado peruano a reduzir seu investimento em universidades públicas. Porém,
adicionalmente, deduz-se que essas medidas destruíram o senso de cogoverno universitário.
Alguns estudos descreveram que Fujimori empreendeu ações paramilitares para eliminar
qualquer movimento terrorista das universidades (Casas, 2012), forçando -entre outros
fatores- a interrupção da abertura de universidades nacionais e aumento do investimento no
sector privado.
A expansão das universidades privadas não ocorreu apenas em função dos interesses
económicos que levaram à redução do investimento público nas universidades. O Estado, pelo
contrário, com base na ANR –que não possuía grande relevância para a expansão privada das
universidades– criou outra entidade encarregada de controlar as autorizações para
funcionamento de novas instituições de ensino superior, o CONAFU, através da Lei N.º 26439,
em 20 de janeiro de 1995. A essa entidade, foi atribuída a garantia da qualidade educacional
das universidades, além do controlo e autorização de novas instituições e sedes, algo que até
então não havia sido regulamentado no país.
30
Legislativo N.º 882, garantindo benefícios fiscais para investimentos privados 23, ratificando
assim a posição política do Estado expressa na Constituição de 1993. Certamente, havia uma
incapacidade económica por parte do Estado de investir em universidades públicas. Porém,
neste contexto, existiam também fortes interesses de grupos económicos, igualmente
representados na política, em especial no Congresso, cujo objetivo foi criar um cenário
favorável para investimento privado (Casas, 2012). A partir deste período, as universidades no
Peru aceleraram seu crescimento, desta vez com inclinação mais forte para o sector privado.
23
Decreto Legislativo N° 882. Capítulo II: Disposiciones tributarias.
31
Gráfico 3. Crescimento e reforma universitária no Peru
32
Capítulo V. Análises quantitativas
"A segunda metade do nosso século - que se refere ao século XX - será registrada
na história do ensino superior como o período mais espetacular de expansão; em
todo o mundo, o número de estudantes matriculados multiplicou por mais de seis
entre 1960 (13 milhões) e 1995 (82 milhões). Mas também é o momento em que a
disparidade já crescente entre os países industrialmente desenvolvidos, os países
em desenvolvimento e, em particular, os países menos desenvolvidos em termos
de acesso se torna ainda mais acentuada para o ensino superior e a investigação,
e os recursos que eles dispõem...”
24
UNESCO. Documentos de política para el cambio y el desarrollo de la educación superior. París, 1995.
33
Gráfico 4. Evolução das matrículas na América Latina 1950-1990 (milhões)
Millones 7
7.097247
6
4 4.745387
2
0.54379 1.563547
1 0.266691
0
1945 1950 1955 1960 1965 1970 1975 1980 1985 1990 1995
Fonte: Elaboração própria (o Autor, 2020) com base no Reporte Anual Estatístico - UNESCO 1970-1992
34
transferência do mercado universitário para o sector privado através das mudanças
constitucionais realizadas e da nova legislação, como abordados previamente.
1.8
Millones
1.6
1.4
1.2
1
0.8
0.6
0.4
0.2
0
2010
1990
1991
1992
1993
1994
1995
1996
1997
1998
1999
2000
2001
2002
2003
2004
2005
2006
2007
2008
2009
2011
2012
2013
2014
2015
2016
2017
TOTAL
Fonte: Elaboração própria (o Autor, 2020) com base em Memorias estadísticas SUNEDU y Estadísticas
Universitarias de la Asamblea Nacional de Rectores.
35
Tabela 2. Criação de universidades peruanas até 2019
De facto, é curioso que a Constituição peruana inclua em seu texto os benefícios fiscais
usufruídos pelas universidades e outros centros educacionais. As constituições em vigor em
outros países, incluindo a constituição portuguesa, nem sequer mencionam benefícios fiscais
para instituições particulares. Nesse sentido, objetivamente, há um apoio do Estado ao
investimento privado em educação por meio de benefícios fiscais.
Outro aspeto legal que apoia o governo à criação de novas universidades privadas é a
Lei de Promoção de Investimentos em Educação, Decreto Legislativo nº 882, que detalha um
pouco mais os benefícios fiscais estabelecidos na Constituição, por exemplo, sobre "receita
25
Constitución Política del Perú. 1993. Artículo 19º. “Las universidades, institutos superiores y demás centros
educativos constituidos conforme a la legislación en la materia gozan de inafectación de todo impuesto directo
e indirecto que afecte los bienes, actividades y servicios propios de su finalidad educativa y cultural. En materia
de aranceles de importación, puede establecerse un régimen especial de afectación para determinados bienes.
Las donaciones y becas con fines educativos gozarán de exoneración y beneficios tributarios en la forma y
dentro de los límites que fije la ley. La ley establece los mecanismos de fiscalización a que se sujetan las
mencionadas instituciones, así como los requisitos y condiciones que deben cumplir los centros culturales que
por excepción puedan gozar de los mismos beneficios. Para las instituciones educativas privadas que generen
ingresos que por ley sean calificados como utilidades, puede establecerse la aplicación del impuesto a la renta.”
36
que por lei é classificada como receita"26, ou no direito a um crédito fiscal para reinvestimento
e dedução à importação 27.
26
Ley de Promoción de la Inversión en la Educación. Decreto Legislativo Nº 882. Artículo 12º.
27
Ley de Promoción de la Inversión en la Educación. Decreto Legislativo Nº 882. Artículo 13º.
37
Gráfico 6. Distribuição dos alunos de acordo com o tipo de universidade
Fonte: Elaboração própria (o Autor, 2020) com base em Memorias Estadísticas SUNEDU y Estadísticas
Universitarias de la Asamblea Nacional de Rectores
38
Gráfico 7. Matrículas de acordo com o tipo de universidade
Millones 1.8
1.6
1.4
1.2
1
0.8
0.6
0.4
0.2
0
1994
2007
1990
1991
1992
1993
1995
1996
1997
1998
1999
2000
2001
2002
2003
2004
2005
2006
2008
2009
2010
2011
2012
2013
2014
2015
2016
2017
TOTAL # Publicas # Privadas
Fonte: Elaboração própria (o Autor, 2020) com base em Memorias Estadísticas SUNEDU y Estadísticas
Universitarias de la Asamblea Nacional de Rectores
Cabe ressaltar que há uma ligeira variação nos sistemas de ensino superior entre os
países, principalmente em sua classificação. O Peru, por exemplo, considera como ensino
superior não universitário o treinamento recebido em institutos e escolas profissionais. O
equivalente a essa classificação na Argentina é a ‘graduação’, considerada neste país como
parte do ensino superior universitário. O equivalente entre a graduação argentina e ensino
superior não universitário peruano na Colômbia é o ensino superior em nível técnico,
profissional ou tecnológico e, no México, institutos e escolas de ensino superior, que também
oferecem ensino universitário. Mesmo com essas diferenças, os sistemas educacionais desses
países têm várias características que os tornam bastante comparáveis.
39
Argentina
Embora a Argentina -da mesma forma que o Peru- tenha experienciado um aumento
constante em sua população universitária, sua distribuição não sofreu grandes mudanças,
conservando grande parte da participação do sector público, que excede quase quatro vezes
a capacidade das instituições privadas (ano-base 2016) (Gráfico 8).
79% 21%
%públicas %privadas
Fonte: Elaboração própria (o Autor, 2020) com base em Sistema de Consulta de Estadísticas Universitárias -
Governo da Argentina.
Colômbia
40
Gráfico 9. Matriculas no ensino superior na Colômbia (2016)
49.9% 50.1%
%públicas %privadas
Fonte: Elaboração própria (o Autor, 2020) com base em Sistema Nacional de Información de la Educación
Superior - Ministerio de Educación.
50.8%
49.2%
%públicas %privadas
Fonte: Elaboração própria (o Autor, 2020) com base em Sistema Nacional de Información de la Educación
Superior - Ministerio de Educación.
50.3% 49.7%
%públicas %privadas
Fonte: Elaboração própria (o Autor, 2020) com base em Sistema Nacional de Información de la Educación
Superior - Ministerio de Educación.
41
México
66%
34%
%públicas %privadas
Fonte: Elaboração própria (o Autor, 2020) com base em estadísticas de la Secretaría de Educación Pública - SEP
28
Disponível em: https://www.elsoldemexico.com.mx/mexico/sociedad/data-mexico-estudia-en-
universidades-publicas-2964291.html
42
Em 30 de dezembro de 2019, o licenciamento foi concedido a 84 universidades e 2
escolas de pós-graduação29. Outras 33 universidades e 2 escolas de pós-graduação tiveram
suas licenças foram negadas30.
Outro aspeto importante que deve ser ressaltado, é que a oferta pública gratuita no
Peru se restringe somente à carreira universitária para obtenção do bacharelado. Isso porque
os estudos de pós-graduação (cursos de extensão, mestrado e doutoramento) não são
gratuitos e seguem uma linha muito próxima para o sector privado, com uma estrutura de
pagamento, porém com menos requisitos para inscrição.
Para investigar a situação da oferta pública gratuita no Peru, é importante realizar uma
análise comparativa do contexto universitário com países estrangeiros, a considerar a
capacidade de matrícula na universidade mais importante ou de importância semelhante com
o contexto da América Latina.
29
Disponível em: https://www.sunedu.gob.pe/lista-de-universidades-
licenciadas/https://www.sunedu.gob.pe/lista-de-universidades-licenciadas/
30
Disponível em: https://www.sunedu.gob.pe/lista-de-universidades-denegadas/
43
Sabe-se que a oferta pública gratuita de ensino universitário não é, usualmente,
percebida como uma obrigação do Estado; entretanto, alguns países no mundo assumem essa
responsabilidade, como é o caso da Eslovênia e Coreia do Norte, onde o ensino superior é
ofertado sem custos pelos respetivos governos. A oferta de educação gratuita e universal não
significa, necessariamente, um indicador de excelência em ensino. Existem sistemas públicos
de educação na América Latina que não são gratuitos, como o chileno e parcialmente o
colombiano, que não apresentam os melhores níveis de ensino. Ademais, estas evidências
auxiliam a perceber em que medida as políticas públicas preveem a participação do Estado e
como se destinam a satisfazer as demandas sociais.
Fonte: Elaboração própria (o Autor, 2020) em base em Memoria Estadística UNMSM, Estadísticas e Indicadores
de la UNC, Anuário USP y DGAE, UNAM.
44
É importante ressaltar que a política universitária varia conforme país e, em alguns
casos, em cada universidade. Nos países investigados, essa política de oferta universitária é
bastante consistente com a vontade política expressa na constituição, como é o caso do Brasil
e da Colômbia. Além disso, o Brasil e o México contemplam o acesso gratuito ao ensino em
praticamente todos os níveis da oferta pública universitária. A Colômbia, por sua vez, faz uso
estudos socioeconómicos para definir o custo da educação na UNC; no entanto, 70% dos
estudantes pertencem ao primeiro bloco de pagamento31 em que os preços variam de 0 a 200
mil pesos (aproximadamente 50 euros) por semestre. Nesse sentido, existe uma grande
maioria de alunos que estuda de graça ou com pagamentos ‘simbólicos’. Porém, nesta mesma
instituição, alguns pagamentos podem chegar até 5 milhões de pesos (em torno de 1.250
euros) por semestre. Essa escala de coleta de pagamentos está prevista no artigo 67 da
Constituição colombiana.
Tabela 4. Número de estudantes com acesso ao ensino público gratuito de todos os níveis por universidade
Fonte: Elaboração própria (o Autor, 2020) com base na Memoria Estadística UNMSM, Estadísticas e Indicadores
de la UNC, Anuário USP y DGAE, UNAM
31
Disponível em: https://www.eltiempo.com/vida/educacion/mitos-y-verdades-sobre-el-ingreso-a-la-
universidad-nacional-252088
32
Portal de posgrado de la Facultad de Ingeniería Industrial de la UNMSM. Disponível em:
https://industrial.unmsm.edu.pe/upg/es.cpagos.php
45
É possível realizar uma breve comparação entre as universidades supracitadas, pois
essas estão estabelecidas na capital ou na cidade mais importante (como a USP em São Paulo,
Brasil) do respetivo país. Tais universidades são, em cada caso, a instituição pública com mais
estudantes e maior histórico, apesar de não serem as únicas entidades públicas em sua
localidade. Cada cidade possui um número de habitantes entre 8 milhões (Bogotá) e 12
milhões (São Paulo); no entanto, há uma diferença considerável entre o tamanho da cidade e
o número de estudantes que pertencem à oferta pública gratuita do governo (Gráfico 13).
350000
300000
250000
200000
150000
100000
50000
0
2014 2015 2016 2017 2018
Fonte: Elaboração própria (o Autor, 2020) com base em Memoria Estadística UNMSM, Estadísticas e
Indicadores de la UNC, Anuário USP y DGAE, UNAM.
Por outro lado, um grupo de reitores, liderado por Pedro Cotillo Zegarra, da UNMSM,
se opôs tenazmente a cumprir a Lei Universitária, ignorando a renovação dos estatutos e a
convocação para eleições (Mora, 2015) 33. Praticamente um ano e meio desde a promulgação
da lei, nada havia progredido em San Marcos. O Dr. Pedro Cotillo, que ocupava o cargo de
reitor desde 30 de maio de 2011, foi eleito para um mandato de cinco anos. Ao recusar deixar
a reitoria da universidade mais antiga da América Latina, Cotillo causou a tomada violenta da
universidade pelas mãos de estudantes sanmarquinos, que exigiam um governo de transição
democrático.
33
Entrevista a Daniel Mora y Luis Solari. Panamericana Televisión. 22 novembro 2015. Disponível em:
https://www.youtube.com/watch?v=K4D2xLA9_50
48
afirmou que o Ministério da Saúde não passaria a considerá-los para o Servicio Rural y Urbano
Marginal de Salud (Serviço de Saúde Urbano Rural e Marginal - SERUMS), obrigatório na
formação de profissionais de saúde34, o que causou ainda indignação e violência por parte dos
alunos. A guerra política entre o governo e Cotillo pelo poder na Universidade de San Marcos
foi favorável ao governo, pois a autoridade do reitor estava desacreditada, o que prejudicou
a comunidade de estudantes, que se opunham fortemente ao Dr. Cotillo. Finalmente, o reitor
foi forçado a deixar a universidade permanentemente, sendo internado em um centro
médico.
Outro facto importante dentro deste histórico foi o do Dr. Agustín Ramos García, reitor
da Universidade Nacional Pedro Ruiz Gallo, na região norte do Peru - Lambayeque, que
também se recusou a deixar o cargo na data estabelecida por lei, causando conflitos entre
diferentes grupos de estudantes e professores. Contudo, em vista da rejeição do reitor Ramos
García, a comunidade universitária realizou uma assembleia na qual elegeram um novo reitor,
Dr. Jorge Oliva Núñez, que assumiu o cargo em 4 de janeiro 2016. Oliva Núñez seria o reitor
em exercício encarregado de formar o comitê eleitoral para cumprir o mandato da Lei
Universitária e convocar eleições; durante esse período, a instituição teve dois reitores
opositores em exercício.35
Daniel Mora argumentou que a ANR, evidentemente, não desejava perder seu poder,
porém não tinha meios políticos para pressionar uma reforma. A supervisão e certificação da
34
https://www.sunedu.gob.pe/sunedu-desconoce-a-pedro-cotillo-como-rector-de-la-unmsm/
35
“Eligen a nuevo rector de la Universidad Nacional Pedro Ruiz Gallo. RPP Noticias”. n. d.
36
A primeira disposição complementar transitória da Lei Nº 30220, relativa ao processo de adaptação do governo
da universidade pública, afirma que “com a entrada em vigor desta lei, a Assembleia Universitária das
Universidades públicas cessa. Todos os processos de nomeação, promoção e ratificação de pessoal docente e
não docente são suspensos até a posse das novas autoridades governamentais”, e dá um prazo de dez dias
corridos, após a sua entrada em vigor, para formar um Comitê Eleitoral Universitário encarregado para organizar
novas eleições.
49
qualidade das instituições de ensino através do SINEACE e CONAFU deveriam ser, em teoria,
os mecanismos de garantia da qualidade universitária no Peru. Esse processo não funcionou
como o esperado, tendo em vista que a educação da maneira como estava desenhada, era
um serviço público. O Decreto Legislativo Nº. 882, cujo objetivo era aprimorar a educação no
país, resultou, entretanto, na criação de mais 74 universidades, sem melhoras significativas
na qualidade do ensino superior 37 , a tal ponto que os diplomas emitidos por algumas
universidades peruanas não foram reconhecidos em outros países. Por esse motivo, propôs-
se que a SUNEDU substituísse o CONAFU, o CONEAU e algumas funções da ANR (Mora, 2013).
Por sua vez, Luis Lezcano Sáenz, gerente geral da Federación de Instituciones Privadas
de Educación Superior (Federação de Instituições Privadas de Ensino Superior - FIPES),
reconheceu que o papel que corresponde ao Estado é definido pela própria Constituição
peruana de 1993), como sendo responsável pela intervenção geral na estrutura e aplicação
dos requisitos mínimos da educação, mas deixando um espaço importante para a autonomia
da universidade. Este último, do ponto de vista de vários atores relacionados às universidades
privadas, implica na necessidade de mudanças na Lei, com a finalidade de se diminuir o rigor
do licenciamento, manter alguns benefícios fiscais, e não intervir na duração dos programas
ou limitar a duração dos programas de educação a distância.38
37
Rosa María Palacios. Entrevista a Daniel Mora. Disponível em:
https://www.youtube.com/watch?v=sgwOwIt9zUE
38
Entrevista a Luis Lezcano Sáenz, gerente geral da Federación de Instituciones Privadas de Educación Superior
(FIPES). Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=1JWflcY_FVw
39
Entrevista a Orlando Velásquez, presidente da ANR. Disponível em:
https://www.youtube.com/watch?v=NjNxVR3DKgY
40
Presentan una acción de amparo. Entrevista a Iván Rodríguez. Canal N. Disponível em:
https://www.youtube.com/watch?v=Qapl1z3RLWA
50
6.3 Debate sobre a autonomia universitária: papel político do CONAFU e da ANR
O CONAFU era um órgão autônomo da ANR, criado em janeiro de 1995 pela Lei Nº.
26439, cujas funções eram, em partes, equivalentes as da atual SUNEDU, especialmente para
licenciamento, autorização, criação e operação de novas instituições de ensino. Desde a sua
criação, o CONAFU, assim como a SUNEDU, desempenhava um papel articulador entre o
Estado, o mercado e a universidade, que para a maioria da população passava despercebido
(Casas, 2012). Esse tipo de entidade tem atitudes políticas transcendentais; o CONAFU foi,
durante seu período, o único braço político encarregado de regulamentar o funcionamento
das universidades, aparentemente afastando-se da ANR, porém causando desentendimentos
com o governo.
41
Ley N° 26439. Ley de Creación de la CONAFU. Art. 3°.
42
Ley N° 26439. Ley de Creación de la CONAFU. Art. 5°.
51
Uma vez que o CONAFU, liderado pelos próprios reitores das universidades, concedia
a autorização de funcionamento à instituição, não existiam mais regulamentações para
garantia da qualidade da educação. Ou seja, a própria universidade estava encarregada de se
‘autorregulamentar’. Lorena Masías, primeira presidente da SUNEDU, e o especialista em
educação, Ricardo Cuenca, explicaram esses argumentos na época 43. Os opositores da Lei
Universitária e defensores do argumento da falta de autonomia universitária, consideravam o
autocontrolo como o único cenário plausível em que a liberdade e autonomia poderiam ser
aplicadas.
A Lei Universitária atual criou a SUNEDU, cuja função substituiu a do CONAFU para
concessão de licenças para universidades (novas ou existentes). Ademais, a SUNEDU também
é responsável por supervisionar os padrões mínimos de qualidade dessas instituições. Dito
isso, é possível deduzir que a Lei Universitária não representa a criação de um novo tipo de
regulamentação, mas a reorganização do sistema responsável pelo controlo da educação
superior. Outra grande diferença está que na SUNEDU, não são os reitores que elegem a
maioria do Conselho de administração, como ocorria no CONAFU, onde os membros eram
reitores ou nomeados por outros reitores da universidade. Atualmente, cinco dos sete
membros do Conselho são eleitos por concurso público, e o poder executivo designa o
superintendente, ou seja, o presidente da superintendência.
43
Reportaje sobre la Ley Universitaria. América Noticias. Disponível em:
https://www.americatv.com.pe/noticias/actualidad/ley-universitaria-debate-analisis-propuesta-apra-
modificarla-n254196
52
De facto, em 2016, a APRA propôs 11 modificações a Lei Universitária. Destas, as mais
importantes foram devolver o poder aos reitores para que eles tivessem mais participação no
conselho de administração da SUNEDU, e criar um tipo de ‘indulgência’ para as 142
universidades que existiam no país em 2016, com o objetivo de que a supervisão fosse
aplicada somente às novas instituições, o que, evidentemente, distorce todo o espírito da
Lei44. Finalmente, nenhuma das modificações propostas pelo partido APRA à Comissão de
Educação do Congresso prosperaram, apesar de terem utilizado argumentos como ‘excessivo
intervencionismo estatal’ na universidade.
44
América Televisione. Disponível em: https://www.americatv.com.pe/noticias/actualidad/ley-universitaria-
estos-son-lo-9-articulos-que-podrian-modificados-n252171
53
de lucro; 68% destas últimas gozam de isenção de imposto de renda (IR). No Peru, o IR
representa 30% dos lucros, o que implica que uma parte considerável dos lucros universitários
privados inclui isenção de imposto45 (Gráfico 14 e Tabela 5).
100
91
90
80
70
60
50
50
41
40
30 28
20
10
0
Total de univ. Univ. Sin fines de lucro Univ. Con fines de lucro Univ. Exoneradas/Inafectas al IR
Fonte: Elaboração própria (o Autor, 2020) com base nas declarações da SUNAT
45
Disponível em: https://gestion.pe/fotogalerias/92-universidades-privadas-peru-28-beneficios-tributarios-
son-233736-noticia/?ref=gesr
54
Tabela 5. Lista de universidades privadas com fins lucrativos isentas de pagar imposto de renda (2018)
Fonte: SUNAT.
Dito isto, é necessário especificar que certos grupos políticos praticamente são
proprietários de algumas universidades. O partido Aliança para o Progresso (APP), cujo
presidente é o ex-candidato à presidência Cesar Acuña, é dono da universidade privada Cesar
Vallejo (UCV). Virgilio Acuña, também integrado ao APP e irmão do anterior, é proprietário da
Universidade de Lambayeque (UDL). As duas universidades desfrutam de benefícios fiscais.
Esses não seriam os únicos políticos da APP com interesses económicos na educação
universitária, já que Luis Iberico, diretor da imagem institucional da UCV e Richard Acuña (filho
de Cesar) eram congressistas até o ano de 2018.
55
O ex-congressista Joaquín Ramirez, principal financiador e secretário-geral do partido
Fujimorista “Fuerza Popular” tem fortes laços com a Universidade Alas Peruana, cujo tio, Fidel
Ramirez, é o reitor. Depois de ser acusado de falsidade genérica, ele não conseguiu se
candidatar à reeleição parlamentar, mas no lugar dele, ele propôs seu irmão, Osaías Ramirez
Gamarra, como candidato. Segundo Daniel Mora, Joaquín seria o verdadeiro dono da
universidade e estava a procurar, com a aplicação do seu irmão, manter sua representação
para defender os seus interesses46. Outros ex-congressistas do partido Fujimorista vinculados
com universidades são Elías Guevara, presidente fundador da Universidade privada San Juan
Bautista; José Luis Elías Avalos, promotor da Universidade Diego Thomson; e o já aposentado
da política Roger Amuruz Gallegos, que vendeu pouco mais da metade das ações da
Universidade Tecnológica do Peru (UTP) e da Universidade Tecnológica de Chiclayo (UTCH)
para o grupo Intercorp em 2012.
A Universidade San Martín de Porres estava - e continua - ligada à APRA, cujo reitor há
mais de nove anos é José Antonio Chang, militante, ex-ministro de educação e premier do
governo deste partido. Durante o período de reitor dele, contratou o então presidente do
partido aprista, Alan García, como diretor do Instituto de Governo e Administração Pública do
USMP, com uma renda superior a 16 milhões de dólares47.
46
Diario Gestión. Disponível em: https://gestion.pe/peru/politica/sepa-nivel-ingresos-universidades-
vinculadas-candidatos-109611-noticia/?ref=gesr
47
Diario Gestión. Disponível em: https://gestion.pe/peru/politica/sepa-nivel-ingresos-universidades-
vinculadas-candidatos-109611-noticia/?ref=gesr
56
(referindo-se a Velasco Alvarado, protagonista do golpe de estado em 1968) ou “chavista”
afirmando que a Lei Universitária era excessiva em termos de fiscalização e intervenção do
Estado na instituição universitária, sendo uma norma a desfavorecer o investimento privado48.
O Tribunal Constitucional rejeitou os argumentos inconstitucionais e contrários da autonomia
universitária dos opositores.
48
Disponível em: https://www.americatv.com.pe/noticias/actualidad/congresista-mora-llamo-mercantilistas-
de-la-educacion-los-opositores-de-la-ley-universitaria-n111260
57
A ANR foi durante 12 anos (desde sua constituição em 1983 até janeiro de 1995) a
única instituição encarregada de controlar a criação e funcionamento de novas
universidades49, até a criação do CONAFU, uma entidade supostamente autônoma, porém
intimamente ligada a ANR.
Uma vez que os reitores eram, eles próprios, responsáveis pela política e ao mesmo
tempo criação e funcionamento das universidades antes da Lei N.º 30220, a aplicação de uma
regulamentação efetiva por parte do Estado ou de qualquer outra entidade não era possível.
O compromisso do Estado de "modernizar o sistema educacional e ampliar a sua oferta e a
cobertura" (D. L. N ° 882) priorizou o acesso à qualidade como eixo de atuação da universidade
(Casas, 2012), permitindo, assim, o rápido crescimento do número de instituições de ensino.
Essa análise nos leva à questão de quão diferente é a auditoria aplicada pela SUNEDU
em comparação à do CONAFU, ou como era realizada a fiscalização das instituições antes da
Lei Universitária. Para responder a essas perguntas, é necessário perceber um pouco mais
sobre os procedimentos de controlo realizados pelo CONAFU. Ressalta-se que existiam dois
documentos legais que interferiram transversalmente nas atividades do CONAFU antes de sua
dissolução: a anterior Lei Universitária N.º 23733 e a DL N.º 882. Não havia conflito entre eles
quanto ao significado ou rigor nas atividades atribuídas; pelo contrário, o DL N.º 882 flexibiliza
e expande as possibilidades de instituições universitárias privadas, tornando o sector ainda
mais atrativo (Casas, 2012) (ver Tabelas 6 e 7).
49
Ley N° 26439. Ley de Creación de la CONAFU. Art. 2° inc. A, B, C y D.
58
Tabela 6. Principais diferenças e extensões para as universidades, aplicáveis ao CONAFU
Art. 5: autoriza a la persona jurídica o propietaria Art. 5: “Una Universidad no tiene filiales o
de una institución privada a establecer anexos…”
libremente “el régimen de las filiales, sucursales,
sedes o anexos con que cuente de acuerdo con
la normatividad específica.” Según la sección F.
Fonte: Elaboração própria (o Autor, 2020) com base na Lei N° 23733 e D. L. N° 882.
Dito isto, podemos detalhar os requisitos mínimos necessários para a concessão das
licenças de funcionamento correspondentes. De acordo com a mais recente resolução do
CONAFU em 2009, o processo de concessão inicia-se com a apresentação de um projeto
universitário; sua avaliação e aprovação; seguida da verificação presencial da implementação
inicial, incluindo das instalações físicas pelos funcionários do CONAFU; autorização provisória;
e, finalmente, obtenção da licença final.
Esses são os sete princípios básicos que definem o escopo de supervisão do CONAFU e
buscam garantir condições adequadas para que as universidades possam cumprir seu
funcionamento 50 . Entretanto, o PDI possui outros oito itens que o CONAFU requer para
aprovar o projeto educacional 51 e dar continuidade a implementação inicial para a licença
provisória.
Os princípios, bem como os oito itens do PDI, foram substituídos na nova Lei
Universitária pelas oito Condiciones Básicas de Calidad (Condições Básicas de Qualidade - CBQ)
que a SUNEDU, atualmente, requer para concessão do licenciamento. Esses CBQs
contemplam praticamente todas os itens do PDI relacionadas ao funcionamento das
universidades. Para além disso, descrevem melhor alguns pontos inicialmente subjetivos do
PDI e acrescentam novas considerações relacionadas a assuntos atuais, como proteção
ambiental, repositórios bibliográficos virtuais e transparência institucional na web.
CONAFU SUNEDU
La justificación del proyecto institucional en donde demuestra No aplica
la conveniencia regional y nacional, sustentada en un estudio
de mercado de las especialidades que propone ofrecer la
universidad, proyectada a diez años de funcionamiento.
La factibilidad de los grados y títulos que otorgará, así como los
Condición: 1.
currículos correspondientes a las carreras profesionales Componentes: 2 y 3.
proyectadas. Indicadores: 2 y 3.
Las previsiones para disponer de personal docente calificadoCondición: 5.
en el periodo de implementación inicial. Componentes: 1, 2 y 3.
Indicadores: 39, 40, 41 y 42.
Las previsiones para disponer de infraestructura física y Condiciones: 1 y 3.
recursos educacionales adecuados para la enseñanza Componentes: 4 / 1, 2, 3, 4, 7.
universitaria (aulas, laboratorios, biblioteca, servicio de Indicadores: 4, 16, 17, 18, 20, 27 y
informática, etc.) en el periodo inicial de implementación. 28.
50
Inciso “A” Art. 28 Resolución 387-2009 CONAFU.
51
Inciso “D” Art. 28 Resolución 387-2009 CONAFU.
60
Los servicios estudiantiles: psicopedagógico, salud y de apoyo Condición: 6
para el desarrollo individual, social, académico, cultural y Componentes: 1, 2, 3, 4, 5 y 8.
deportivo de los estudiantes. Indicadores: 43, 44, 45, 46 ,47 y
50.
Las previsiones que hagan posible el acceso a la permanencia No hay un indicador exacto para
de estudiantes que no cuentan con suficientes recursos para este requisito.
cubrir el costo de su educación (becas, préstamos, bolsas de
trabajo, etc.).
La previsión económica y financiera de la universidad Condición: 2.
proyectada para los diez años iniciales de funcionamiento. Componentes: 1 y 2.
Indicadores: 10, 13 y 15.
La capacidad económica propia y probada, principalmente a Condición: 2.
través del capital que proyecta en su constitución social o del Componente: 1.
capital con que cuente su promotora para financiar no menos Indicador: 10.
del 30 % de la infraestructura considerada en el Proyecto de *el indicador no es especifico.
Desarrollo Institucional, más el total del egreso en gasto
corriente correspondiente a los dos primeros años de
funcionamiento que tendría la universidad.
Fonte: Elaboração própria (o Autor, 2020) em base a Res. 387 CONAFU - reglamento para la autorización
provisional de funcionamiento de nuevas universidades” e da SUNEDU - Modelo de licenciamiento y su
implementación en el sistema universitario peruano.
61
Gráfico 15. Funcionamento do sistema universitário antes da Lei nº 30220
Fonte: Elaboração própria (o Autor, 2020) em base a SUNEDU - Modelo de licenciamiento y su implementación
en el sistema universitario peruano
62
Em 2014, na época da promulgação da Lei N.º 30220, existiam no Peru 53
universidades com licença provisória, outras 76 com licença definitiva e 13 que operavam por
lei de criação sob a supervisão do CONAFU e ANR (SUNEDU, 2016) (ver Tabela 8).
A. definitiva 31 45 76
A. provisional 10 43 53
Ley de creación 10 3 13
TOTAL 51 91 142
Ressalta-se que a SUNEDU, até hoje, não autorizou a criação de nenhuma nova
universidade, portanto, para esta comparação, foram utilizados parâmetros correspondentes
à autorização de funcionamento ou licenciamento institucional em execução 52. Até abril de
2020, de acordo com a extensão da lei de moratória de 2012, não era possível criar
universidades.
Esta situação foi, em partes, resultante da abertura de 107 novas universidades desde
a década de 1980, sendo 81 delas instituições privadas.
A política de ensino superior no Peru não esteve, por muitos anos, relacionada à
intervenção pública e foi confiada a instituições independentes do Estado, como a ANR,
CONAFU e SINEACE, entidades que, como mostra a história, falharam em seu objetivo de
garantir o desenvolvimento do ensino universitário e a qualidade das instituições.
52
El Seminario Bíblico Andino y el Seminario Evangélico de Lima foram clasificadas como universidades pela
SUNEDU para passarem pelo processo de licenciamento. Ambas instituições foram encerradas em 2019 e em
janeiro de 2020, respetivamente.
63
PARTE III. FUNDAMENTOS DA POLÍTICA DE MELHORIA DA QUALIDADE NA LEI
UNIVERSITÁRIA
53
Tribunal Constitucional. Expediente N.° 4232-2004-AA. Fundamento “D”
64
A segunda característica é que a educação é um serviço público; ou seja, um atributo
indiscutível ao considerar a existência de universidades públicas que prestam serviços
educacionais.
“.... Na medida em que é um serviço público que especifica uma das funções e
objetivos do Estado, de execução per se ou por terceiros sob controle estatal.
Portanto, o Estado tem a obrigação de garantir a continuidade dos serviços
educacionais, bem como aumentar progressivamente sua cobertura e qualidade
...”
Alguns anos depois, em 2008, o Tribunal Constitucional emitiu outra sentença –desta
vez em específico sobre a antiga Lei Universitária– , a reafirmar que a atividade educacional
da universidade deve ter a supervisão e a fiscalização inalienáveis, eficientes, efetivas e
permanentes do Estado. Entretanto, na realidade, havia uma falta de controlo eficiente do
ensino superior, por parte do Estado bem como da ANR e CONAFU - órgãos competentes da
época (Tribunal Constitucional, 2008). Posteriormente, a decisão julgou o CONAFU como uma
entidade administrativa com pouco impacto para garantia da qualidade do ensino no Peru.
Como a qualidade educacional não foi garantida por essas instituições, a decisão
recomendou ao Estado “adotar imediatamente as medidas institucionais necessárias para
reformar o sistema de ensino universitário no país”, o que implica interromper
definitivamente as atividades da ANR e do CONAFU, e, por fim, ordenar a criação de uma
Superintendência Estadual (SUNEDU) especializada, imparcial e eficiente, com os poderes
65
necessários para garantir os propósitos educacionais da Constituição (Tribunal Constitucional,
2008).
Por outro lado, para novas instituições, os padrões para a criação de faculdades e
escolas profissionais só foram aprovados recentemente 54, em maio de 2019. Essas normas
consistem na apresentação da justificativa jurídica, académica, técnica e de melhoria da
qualidade da unidade, bem como na demonstração da existência de recursos suficientes para
implementar a infraestrutura, equipamentos e corpo docente, em especial a realização de
investigação. Da mesma forma, o conteúdo educacional deve ser harmonizado com os
objetivos académicos, seus documentos normativos, académicos e gerenciais, desenho
organizacional e plano de implementação, os quais devem ser regularizados com seus
respetivos mecanismos de monitoramento e avaliação por entidades educacionais. O Gráfico
16 Tabela 1 ilustram os principais aspetos da CBQ, incluindo os componentes e indicadores.
54
Aprobación de los estándares para la creación de facultades y escuelas profesionales. Resolución del Consejo
Directivo Nº 066-2019-SUNEDU/CD. 24 de mayo de 2019.
66
Gráfico 16. Condições Básicas de Qualidade (CBQ)
Fonte: SUNEDU
67
Tabela 9. Descrição dos componentes e indicadores das CBQ
68
Condición Compomente Indicadores
31) Existencia de políticas, normas y procedimientos para el fomento y realización de
la investigación como una actividad esencial y obligatoria de la universidad
32) Existencia de un órgano universitario responsable de Investigación cuyo
responsable cuenta con el grado de doctor.
4.1 Líneas de investigación
33) Existencia de líneas de investigación. Asimismo, un presupuesto asignado para la
investigación, equipamiento, personal y otros.
4) Líneas de 34) Código de ética para la investigación.
investigación a ser 35) Políticas de protección a la propiedad intelectual.
desarrolladas 4.2 Docentes que realizan 36) La universidad cuenta con un registro de docentes que realizan investigación.
investigación Asimismo, los docentes deben estar registrados en el DINA.
37) La universidad tiene un registro de documentos de investigación y/o repositorio
institucional. Los documentos de investigación incluyen tesis, informes de
4.3 Registro de documentos y
investigación, publicaciones científicas, entre otros.
proyectos de investigación
38) La universidad tiene un registro de proyectos de investigación en proceso de
ejecución.
5.1 Existencia del 25% del total
39) La universidad tiene como mínimo el 25% del total de docentes a tiempo
de docentes, como mínimo, a
completo.
5) Disponibilidad de tiempo completo
personal docente 40) Los docentes incorporados a la docencia universitaria con fecha posterior a la Ley
5.2 Requisitos para el ejercicio
calificado con no Universitaria que dicten horas de docencia en pregrado o postgrado cuentan, al
de la docencia
menos del 25% de menos, con grado de maestro o doctor según corresponda.
docentes a tiempo 41) La universidad regula los mecanismos para la selección, evaluación periódica del
completo 5.3 Selección, evaluación y desempeño que deben incluir como criterio la calificación de los estudiantes por
capacitación docente semestre académico.
42) La universidad regula la capacitación de sus docentes.
43) La universidad cuenta en todos sus locales con un tópico o con el servicio
6.1 Servicios de salud
tercerizado.
44) Existencia de servicios sociales disponibles para los estudiantes: bienestar social,
6.2 Servicio social
bienestar estudiantil, programas de voluntariado, entre otros.
6.3 Servicios psicopedagógicos 45) Existencia de servicios psicopedagógicos disponibles para todos los estudiantes.
46) Existencia de servicios deportivos en al menos tres disciplinas deportivas,
6.4 Servicios deportivos disponibles para los estudiantes con el objetivo de fomentar su participación y
6) Servicios
desarrollo.
educacionales
47) Existencia y difusión de servicios culturales que estén disponibles para todos los
complementarios 6.5 Servicios culturales
estudiantes para su participación y desarrollo del mismo.
básicos
6.6 Servicios de seguridad y
48) Existencia de servicios de seguridad y vigilancia en todos sus locales.
vigilancia
6.7 Adecuación al entorno y 49) La universidad cuenta con políticas, planes y acciones para la protección al
protección al ambiente ambiente.
50) Material bibliográfico según planes de estudio de sus programas. El acervo
6.8 Acervo bibliográfico bibliográfico puede ser físico y/o virtual. Las bibliotecas virtuales deben estar
suscritas
51) Existencia de un área, dirección o jefatura encargada del seguimiento del
7.1 Mecanismos de mediación e graduado.
inserción laboral para 52) Mecanismos de apoyo a la inserción laboral.
estudiantes y egresados 53) Existencia de convenios con instituciones públicas y/o priva- das de prácticas
7) Mecanismos de
preprofesionales y profesionales.
inserción laboral
7.2 Mecanismos de
coordinación y alianzas 54) Mecanismos de coordinación y alianzas estratégicas con el sector público y/o
estratégicas con el sector privado.
público y/o privado
8) CBC
complementaria: 8.1 Transparencia 55) Transparencia de la información institucional a través del portal web.
Transparencia
Fonte: Elaboração própria (o Autor, 2020) com base no Modelo de Licenciamento - SUNEDU.
69
PARTE IV. RESULTADOS, DISCUSSÃO E CONCLUSÃO
A seguir, para responder com sucesso aos objetivos propostos, foram utilizados
métodos quantitativos e qualitativos de investigação, incluindo análises estatísticas sobre o
sector universitário (p. ex. número de universidades, financiamento, quantidade de
estudantes, percentagens de participação no sector e comparação desses dados com outros
países). Uma análise qualitativa da universidade como instituição também foi conduzida e
considerou opiniões, argumentos e debates, tanto do ponto de vista que precedeu a
publicação da Lei Universitária (p. ex. representantes dos centros universitários) como de
atores envolvidos no processo, em especial legisladores que participaram das discussões e da
elaboração da Lei, com destaque para a Comissão de Educação do Congresso da República.
Além disso, foram avaliadas as leis e regulamentos emitidos pelo governo peruano,
bem como por seus órgãos competentes, com especial atenção às emendas constitucionais,
a Lei de Promoção do Investimento em Educação, o D.L. Nº 882, entre outros, que
contribuíram para a descrição do ponto da situação da universidade no Peru antes da Lei
70
Universitária N. 30220. Por fim, perceber a real necessidade de uma reforma universitária no
país, foi associado o atendimento à demanda social com a política anterior à criação do
SUNEDU.
Com esta mesma tendência, no Peru, após 1990 e até o final de 2017, a população
universitária aumentou quase 4 vezes, de 359.778 a 1.386.100, e embora o investimento em
educação tenha apresentado variações com tendência de alta em relação à percentagem do
PIB, bem como do gasto público total, a partir de 2018, este representava somente 3,72%, o
que deixou o país abaixo da média da OCDE (Organização para a Cooperação e
Desenvolvimento Econômico) e outros países da região, em comparação ao Chile (5,4%),
Colômbia (4,5%) - ambos em 2017 - ou Brasil (acima de 6,2% em 2015) (ver Gráfico 17).
71
Gráfico 17. Percentagem do PIB investido em educação por país, de 1989 a 2018
7%
6%
5%
4%
3.72%
3%
2%
1%
0%
1994
2002
2010
1989
1990
1991
1992
1993
1995
1996
1997
1998
1999
2000
2001
2003
2004
2005
2006
2007
2008
2009
2011
2012
2013
2014
2015
2016
2017
2018
Perú Brasil México Chile Colombia Argentina Portugal
Este cenário se traduziu em uma demanda social concreta que, por várias razões, foi
negligenciada pelo Estado durante anos, uma vez que os recursos estatais para o ensino
superior, aparentemente, não eram suficientes. Com isso, evidenciou-se o deslocamento da
população universitária para o sector privado, o que causou conflitos na política universitária.
Primeiro, a incapacidade do Estado de participar do mercado universitário, transferindo a suas
responsabilidades para o sector privado; e segundo, a perda de poder no aparato da
instituição universitária no Peru.
Com isso, foi aprovada a Lei Universitária no contexto de uma nova demanda social
que demanda a atenção do Estado para as necessidades da população e exige o uso de
recursos de maneira eficiente, com uma melhor gestão da universidade no Peru.
72
8.2 Decisões políticas
Certamente é bastante difícil deduzir quais são as vontades políticas do Estado e dos
governos ao longo do tempo sobre qualquer tema. No entanto, os factos históricos
supracitados e a investigação conduzida demonstram que houve uma tendência nas tomadas
de decisão para criação de novas universidades, a qual não foi fundamentada em critérios
técnicos ou consistentes com os objetivos ou funções da educação superior. Os atores que
estiveram no poder mantiveram essa tendência durante alguns anos.
73
dos gastos do Estado em educação, também inferiores a Portugal (16,0%), Colômbia (16,0%),
México (12,8%), Argentina (10,9%) e Chile (10,4%).
A Lei N.º 30220 evidencia uma mudança na priorização da qualidade, elevando-a como
eixo principal do ensino universitário. As oito CBQ propostas na Lei Universitária tem como
objetivo garantir, no mínimo, que as universidades disponham dos recursos para prestar
serviços de qualidade e onde essa qualidade possa ser progressivamente aprimorada. A ideia
74
é retirar do mercado as instituições que não conseguem ofertar educação de qualidade (que
atenda aos mínimos padrões exigidos), por motivos de condições ou recursos insuficientes.
Isso significa que, uma vez cumpridos os prazos para a cessação final das primeiras
universidades negadas e até o final da moratória, em abril de 2020, a única maneira de
garantir o acesso à educação é aumentar o número de vagas nas universidades licenciadas já
existentes. Embora, tecnicamente, já seja possível criar novas instituições de ensino e
afiliadas, a SUNEDU ainda não autorizou, na prática, a abertura de nenhum novo centro
universitário.
55
https://www.sunedu.gob.pe/lista-de-universidades-denegadas/ Consultado el 3/06/2020.
75
Esta situação é evidenciada no grande número de componentes e indicadores
descritos no CBQ que são voltados à investigação científica, bem como nos argumentos
utilizados para justificar a implementação da reforma universitária (SUNEDU, 2015). Não
obstante, o presente trabalho não avaliou se a reforma aumentou significativamente as
oportunidades científicas no país para sustentar este eixo.
9.1 Financiamento
O artigo 28 da Lei N.º 30220 estabelece que o cumprimento dos CBQ é obrigatório para
o funcionamento das universidades, o que confere ao licenciamento um caráter universal,
periódico e obrigatório. Assim, todas as instituições - mesmo aquelas que já tinham
licenciamento - precisam obter uma nova licença, o que implica, indiretamente, que essas
universidades e seus programas “nascerão de novo”.
76
O problema surge porque a maioria dos recursos com os quais a universidade pública
é financiada provém da alocação do Ministério da Economia e Finanças (MEF) e, para
completar seu orçamento, a arrecadação de renda própria, que tem tendência de alta desde
meados dos anos 90 (González, 2004). Isso não significa que a coleta por recursos próprios
deva ser limitada ou não representar percentagens mais altas no orçamento; pelo contrário,
a dinâmica do financiamento se torna um fator-chave a ser considerado para que as
universidades públicas possam implementar com êxito o licenciamento, em especial nos CBQ
relacionados à infraestrutura e equipamentos, os quais são em geral os mais caros. Ada
Gallegos, doutorada em governança e políticas públicas, fez um cálculo do orçamento exigido
por algumas universidades públicas para cumprir o licenciamento, que está apresentado na
Tabela 10.
Por outro lado, nos anos que se seguiram à implementação da SUNEDU, a alocação de
recursos pelo MEF tem diminuindo em algumas importantes universidades públicas, apesar
do aumento de alunos e da necessidade de cumprir os requisitos legais. Como exemplos tem-
se os casos da UNMSM - inicialmente uma defensora da Lei Universitário - ou da Universidade
Nacional de San Luis Gonzaga de Ica, que foi encerrada em outubro de 2019 (Tabela 11).
Fonte: Elaboração própria (o Autor, 2020) com base em declarações de orçamento de cada universidade
77
Pode-se concluir que a ausência de um componente orçamentário na lei pode dificultar
a implementação da reforma nas instituições públicas, uma vez que a melhoria da
universidade envolve aspetos que vão além da gestão, incluindo também a captação de
recursos.
9.2 Qualidade
Neste período, dos 59.085 professores universitários existentes no país, apenas 53%
possuíam mestrado e apenas 4% possuíam doutoramento - 15,6% dos professores possuíam
pós-graduação no exterior (Instituto Nacional de Estadística e Informática, INEI, 2011). Essa
realidade foi transformada pela implementação da SUNEDU (condição 5, componente 2,
“requisitos para o exercício do ensino”), que estabelece que os professores devem ter, no
mínimo, o grau de mestre para ensinar na graduação e de doutor para a pós-graduação. Isso
fez com que as taxas subissem de 53% para 100% dos professores universitários com
mestrado, com um aumento também substancial de doutores no país.
78
Gráfico 18. Evolução das universidades públicas peruanas no QS Latin-America Ranking
Gráfico 19. Evolução das universidades privadas peruanas no QS Latin America Ranking
Tabela 12. Evolução das universidades peruanas no Ranking THE - América Latina
Fonte: Elaboração própria (o Autor, 2020) com base em The Times Higher Education Raking, Latin America
79
Gráfico 20. Evolução das universidades peruanas no Ranking Webometrics, América Latina.
50 UNMSM
100
UPC
150
250
Univ. Nacional de Ingeniería
300
Univ. Del Pacífico
350
450
Gráfico 21. Evolução das universidades peruanas no Schimago Institutions Rankings, América Latina.
20 PUCP
UPCH
40
UNMSM
60
UPC
80 Univ. San Martín de Porres
100 Univ. Nacional de Ingeniería
180
Entretanto, as propostas da Lei N.º 30220, apoiadas nas ações da SUNEDU, estão
associadas a fatores que a impossibilitaram constituir, até o momento, uma reforma efetiva e
eficiente. Por exemplo, não foram estabelecidos mecanismos para atender as demandas de
acesso à universidade – em dezembro de 2019 mais de 165.500 estudantes foram
prejudicados pelo fechamento de 33 instituições privadas e públicas no Peru, que não
81
cumpriram com as CBQ56, sem contar os alunos das instituições filiadas que desistiram do
processo de licenciamento. Ainda, praticamente todas as universidades que foram fechadas
atendiam a sectores sociais mais precários, o que afastou ainda mais a possibilidade desta
população de se beneficiar de uma educação universitária, em especial pela falta de recursos
económicos.
Com isso, se conclui que o trabalho da SUNEDU tem grande potencial de aumentar a
qualidade das universidades, apesar de os dados atuais de indicadores da posição das
instituições em rankings internacionais de educação não demonstrarem uma melhora
significativa. É possível que o cumprimento das CBQ e sua fiscalização periódica tornem
factíveis o alcance deste objetivo, o qual deve ser avaliado novamente em um futuro próximo.
56
https://elcomercio.pe/peru/hay-mas-de-165-mil-alumnos-afectados-por-34-universidades-con-
licenciamiento-denegado-sunedu-noticia/
57
https://www.pronabec.gob.pe/noticias/minedu-lanza-beca-de-traslado-para-estudiantes-de-universidades-
no-licenciadas/
82
Não obstante, esta investigação considera que a reforma universitária está incompleta;
ainda há aspetos a serem considerados para que o processo possa ser avaliado como efetivo
e sustentável. Um impacto negativo ao sistema universitário (em especial a universidade
pública) pode vir a ocorrer por motivos financeiros e de acesso a educação superior. Em longo
prazo, a disponibilidade de recursos económicos pode ser o fator chave para a criação de
novas universidades, com uma representatividade única no mercado de grupos empresariais
com amplo respaldo financeiro, devido a escassa intenção política do governo de perceber o
acesso com um incremento da capacidade do sistema educativo público.
Conclui-se que a SUNEDU foi criada como uma ferramenta política poderosa devido às
suas atribuições. O conselho diretivo de 7 integrantes é formado por membros afastados das
reitorias universitárias, sendo o superintendente e/ou o presidente do conselho nomeado
pelo MINEDU, deslocado significativamente da participação dos reitores nos assuntos
regulatórios. Este cenário dá mais poder ao governo face a um ministério cuja instabilidade
tem sido demonstrada nos últimos tempos.
Não há dúvidas que o mundo todo passa por constantes revoluções científicas e
tecnológicas. A criação do conhecimento, assim como a riqueza e sustentabilidade, são a
chave para o desenvolvimento de uma nação, sendo a universidade uma protagonista nesta
história. E é, precisamente, nos países que ainda não alcançaram níveis significativos de
desenvolvimento, onde mais se necessita da figura de uma universidade eficiente, com
condições dignas de educação e que ajude a sociedade a alcançar o tão almejado progresso.
83
9.4 Considerações finais
Esta investigação procura debater questões que chegarão nos próximos meses, logo apos a segunda
fase da reforma universitária, e que ainda não estão em discussão. Apesar da necessidade de uma
nova política para impulsionar o ensino universitário no Peru, ainda há um longo percurso para o
estabelecimento de um sistema de qualidade bem-sucedido.
84
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