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Louvor E Historia EM PROSOPOPEIA SRE Marcello Moreira Impressa pela primeira ver em 1601, a Prosopoptia de Bento ‘Teixei- ra € no apenas cxemplo do género prosopopéico, em que divindades olimpicas se nos apresentam como participes das peripécias por que passa o herdi. Jorge de Albuquerque Coelho, mas também exemplo de dialo- sgismo, jf que af se empresta voz, entre outros, a Proteu para que, por seu intermédio, se tega a fantasia do canto ao referido heréi. Na invocagio, declara-se 0 catolicissimo propésito de nao apelar as délficas irmas, pois s6 se pode esperar inspiragao, j4 compreendida cris- mente como a participagdo na graca infusa, d’Aquele de quem 0 poeta espera “A vida que se espera em fim de cudo” (11, 4). Conquanto possa nos parecer nova a deliberagéo de Bento Teixeira, ao por de lado a tra- digao de recorrer As divindades pagis na invocagao — lembremo-nos de que Camées, em Or Lusfadas, invoca as Tagides em busca de inspira- 0 -, na verdade os precedentes em que se baseia nosso poeta datam do século XVI. E verdade também que na maioria das poéticas quinhen- tistas, ao aprescntar 0 conjunto de preceitos que devem regrar a escrita dda épica, assevera-se que “le Pore commence pat l'invocation des Dieux, cu, le plus souvent, des Muses”! (0 poeta comega pela invocagio dos deu- 1. Jacques Peleier du Mans, Art Puhigue, em Tait de paige ede rtriqu dele Rens ‘anc, Pris, Le Livre de Poche, 199, p. 305. ses, ou, © que & mais freqtiente, das musas}, mas, ao mesmo tempo, 10 cexplicicarem-se as raz6es para a fatura da invocagio, constatamos que a finalidade tanto no caso de invitatdrio as divindades pagis como ao Deus cristo é a mesma: “pour montrer, qu’en toutes entreprises doit étre implorée l'aide et reconnue la puissance divine” (para mostrar que em todas as empresas humanas deve-se implorar pelo auxilio divino e reco- anhecer seu pederio}. Durante o século XV1, as obras épicas mais influentes sobre a tradi- sao curopéia de composigio de poemas herdicos foram, sem sombra de diivida, a Fueida e os poemas homéricos. Em seu estudo sobre a tradi- fo épica curopéia na [dade Moderna, William Kennedy assevera ter sido a Freida de Virgilio muito mais influente do que a Miada ¢ a Odisséia durante o século XVI', a ponto de Vida, que jd se baseara em Virgflio a0 compor seu Christiades, declacar sem rebucos a respeito do Mantuano em seu De Arte Poetica (1, v. 168): “Vacem, animumgue deo similis" (seme- Ihante a. um deus pelo canto e pelo pensamento). Entretanto, nao nos esquesamos de que o achamento do Jnstitutio Oratoria de Quintiliano, em 1416, por Poggio, e sua publicacio integral, em 1470, por Campa- no, repuseram em circulagio um juizo que eta, de longe, favordvel 3 superioridade dos poemas homéricos relativamente aquele de Virgilio, jé que, em duas passagens distintas do liveo X do Institutio Oratoria, lemos, primeitamente, sobre a exceléncia do Mednio: Hic enim, quemadmodum ex Ocean dicisipce omnium amnism fontiumgue cur- sus initiuyn capere, omnibus eloguentiae partibus exemplum et ortum dedit Hane nemo in magnis vebus sublimiate, i parvis proprietate superaveris, Idem lnctus ac presus, incundus et gravis, tum copie tum brevitate mirabilis, nee poetca modo red oratoria intute eminentssiaus, Nam ut de landibus, echortationibus, consolasionibns saceams ‘nonne vel nonus liber, quo missa ad Achillem legatio continentur, vel im primo inter duces illacontentio vel dictae in secundn sententiae omnes litiam ac eonsiliorum ex- 2. Idem biden 3. Willam J. Kennedy, Rbervical Norms in Renate Literature, New Haven, Yale Univers: ty Press, 1978, pp. 130-135, plicant artes? Adfeceus quidem vel ios mites vel hos concitatos, nemo erit tam indoe- us, qui mon in sua potectate hue auctorem habuiseefateatur, Age vero, non uirius ‘gue opsris sui ingresu in paucissimis versibus lgem prooemiorum non dice servavit red constiruir? Nem benevolum auditorem invocatione dearuo, quat prectidere vatibus creditum est, et intentumm proposiea rerum magnitudine et docilem cumma ecleiter comprehensa facit. Narvare vero quis brevias guam qui mortem nuntiat Patrol, quis vignificantins potest quarm qui Curerum Aetolorumgue proclium exponit? Iam cimili- sudines, amplificationes, exemplay digress, signa rerum et argumenta ceerague ge era probandi ac refusandi sunt ita malta, ut eiam gui de artis wripserunt pluri- ‘mi haruom rerum testimonium ab hoc poeta petant. Nam epilogus quidem quis unquam ‘poterieillis Priami rogants Acillem precibus acguari? Quid? in verbis, sententis, Pris, dispositione sori operis nonne humani ingenii modum excedit? ut magni st virtues eis non aemulatione, quod fieri nom potest, sed intellect sequi. Verum hic ‘omnes sine dubio et in ori genereeloguentiae proc ase rligui,epicos amen prae: cipue, videlicer quia clarissima in material sili comparatio es. (Ble é como sua concepsio do Oceano, por ele descrito come a fonte de onde imanam todos 08 regatos ¢ rion, pois nos forneceu medcle¢ inspires pare todo fs setores da clogiiéncia, Admite-se que ninguém 0 superou na sublimidade com {que tratou dos grandes temas ou 1a propriedade com que lidou com os pequenos. Ele é a0 mesmo tempo abundance e conciso, deleitivel e grave, supremo pela ha- bilidade nio apenas poética, mas também oratéra. Pois, para nie dizer quase nada de sua elogéncia, que demonstra no louvor, na exortagto ¢ na consolagio, nio cvidenciam © nona livro, que contém a embsixada de Aquiles, o primeira, que dlescreve a querela entre os comandances, ¢, as falas dos conselheiros, no segundo, onlay as regras ea arte a serem seguidas na oratériajudictdriae deliberativa? No que ‘ange & expressio das emogdes, nfo hd ninguém tio indouto a ponto de negar que ‘© poeta era mestre em todas elas, sendo suave e veemente de acordo com a neces: sidade. Novamence, nas poucas linhas com que introduz suas duas épicas, nfo es- tabeleceu ele as leis que devem regrar @ compasicio do exérdio? Pela invocagio das dousas que se exe presidem & poesia, captou ele a benevoléncia de seu audio, pela 4. Quinlan, fst Oruoria, Cambridge, Harvatd Univesity Pres, Loeb Clas Libary 1961, X. 1. 46-51, pp 28:30. declaragdo da grandeza de seu tema cle excitou a atengio de seus ouvinces rornou- ‘0s receptivos pela brevidade de seu sumério. Quem pode nartar com maior brevi- dade do que o her6i que trax as novas da morte de Pétroclo, ou mais vividamente do que aquele que descreve a batalha encte os curetes ¢ os etdlios? Considerem-se enti seus smiles, suas amplificagées, suas digressbes, seus exemplos, seus argumen~ tos probatériose refutatérios; io tio numerosos que a maioria dos autores de pre- ceptivas retéricas [oi aos seus escritos em busca de exemplos para todas essas coi- sas, E quanto & peroragio, 0 que pode igualar as siplicas enderesadas por Priamo « Aquiles 20 implorar pelo cospo de seu filha? Novamente, nlo supera o poeta os limites da inteligencia humana ao escolher palavras, figuras, oragdes, na disposigio dada a toda a obra, 0 que resulta na necessidade de uma mente poderosa para que s© possa, nio dire! imité-lo, pois iso € impossivel, mas para apenas apreciar seus talentos? Ele se distanciou por sua exeeldncia de tudo aquilo que se lhe seguiu, em todos 0s serores da elogiéncia, acima de tudo, na épica, devido & semelhanga dos matetiais c a0 tratamento a eles dispensados.] depois, sobre sua superioridade com celagio a Virgi dem nobis per Romanos quogue auctores ordo ducendus est. Tague wt apud illos Homers sic apud nos Vergilinseuspicatisimus dedevisexordium, omnium cis generis ‘poctarum Graccorum noscrorumge baud duble proximus. Urar enim verbis isdem, ‘quae ex Afio Domisio iuvenis excepi; qui mihi interraganti, quem Homero orederes ‘maxime accedere, Secundus, inguit, ert Vergilius, proprio: amen primo quam certo" [Agora trara dos autores romanes e seguirei os mesmos principios ao lidar com cles todos. Assim como entre os autores grogos Homero nos propiciou 0 mais aus- picioso comego, assim ¢ 0 que nos propicia Virgilio entre nds. Pois dentce codos os poetas épicos, canto gregas quanto romanos, el, sem sobra de divida, & aquele que ‘mais se aproxima de Homero, Repetirei as palavras ue ouvi Domitius Afer pronun: iar em meus dias de juvencude. Perguntei-lhe que poeta, cm sua opinio, era mais préximo da exceléncia de Homero, ¢ ele replicou-me: “Virgilio vem em segundo lugar, mas est mais peéximo do primeiro do que do terccira™ 5. dm, X, 1, 85:86, p48 Apesar do influxo da épica oriunda da Antigiidade sobre os poetas, ‘quinhentistas e seiscentistas, é de notar que muitos poemas heréicos, cuja farura se deu a partir do século XVI, passaram a ser encatados como modelos a serem emulados, constieuindo-se em autoridades no interior dda tradigio do género épico. Tanto assim que em Pro:opopéia o mode- {o aser imediacamente considerado como objero de emulagSo nao é nem a1 Eneida nem os poemas homéricos, mas sim Os Lusiadas de Cambs. Basta cotejar estrofes de ambos os poemas para constatar como Bento leineira segue em imimeros passos 0 pocma camoniano, como em: Cantem poetas 0 poder romano, Submetendo nagées 20 juge duro; (© Mantuano pinte o Rei Teoiano, Descendo & confusio do reino escuros Que eu canto um Albuquerque soberano, Da fé, da cara pitria firme muro, Cujo valor ser, que 0 céu the inspira, Dade eatancar a Ica © grega lisa. Prosopopéia, 1 Cessem do sibio Grego e do Troiano ‘As navegagies grandes que fizeram; Cale-se de Alexandro e de Tiajano AA fama das vit6tias que tiveram: ‘Que eu canto © peito ilustte Lusitano, ‘A quem Necuno e Marte obedeceram, ‘Cesse tudo o que a Musa antiga canta, Que outro valor mais alto se alevanta Os Lusadas, 3 Ou em: ‘A limpada do Sol tinha encoberto, ‘Ao mundo, sua luz serena ¢ pura, a jem dos erés nomes descoberto ‘A sua ters e circular figura, Lido porta de Dite, sempre aberto, Tinha chegado, com a noite escura, Morfeu, que com sutis¢ lentos passos Azar vem dos mortais os membros lassos. Prosopopéia, VIL J neste tempo o kicido Planeta Que as horas ai do dia dstinguindo Chegava deja elenta meta, ‘Al celeste gents encobrindo, da cass maria secreta Lhe stave o deus Noturno a porta abindo, Quando as infidas genes se chegaram As naus, que pouco havia que ancoraam. Or Latadet 1,1 © argumento de Prasopopéia ¢ a atribulada vida de membros do cla Coelho que, como donatérios da capitania de Pernambuco, tiveram de mover guerra aos indios da costa do Brasil e foram a Africa participar da batalha de Alcdcer-Quibir, ladeando o infausto monarca portugués Dom Scbastido. Um outro episédio narrado no poema é a travessia do ocea- tno por Jorge de Albuquerque Coelho com destino a Portugal, durante a qual o herdi reve de refrear seus companheiros de infortunada viagem, ‘que quase se entregaram 3 antropofagia. (© poema estrucura-se a partir do uso da prosopopéia e do dialogismo, jf que a nartagio ¢ levada a efeito por Proteu. Concudo, é preciso aten- tar para o fato de que, embora a escolha da figura de Proteu seja apropria- da & exposigio do argumento, pois, como tantas divindades marinhas da Antigiidade, também ele era dotado do dom da antevisio, negar, em Prinefpio, a verossimilhanga ao invocar as musas por ser tal invocagio “vao estudo” implica, obviamente, a qualquer leitor avisado, o caréter inveros- simil das profecias de Proteu, pois como divindade pagi deve ser ajuiza- dla Go ineficaz como as préprias musas. As “previsocs” de Proteu s6 se sornam verossimeis porque referentes a eventos que se sabe de fato ocor- ‘cram, pois 0 canto da divindade marinha tem carter retrospectivo, con- ‘quanto nos seja apresentado como prospectivo ~ Proteu antevé fatos que if ocorreram no tempo histérico, Assim, se fatos narrados no poema real- pois transformados pelos procedimentos da amplificatio ~ exagerattio ‘minutio a fantasia poética ¢ 0 louvor que se visa a produzir por meio «la palavra poética carreiam para as estrofes elementos que nao encontram respaldo na histdria ¢ se mesclam 20s dados de origem histérica para com cles se confundir, Assim, parece-nos histérico o herofsmo dos irmaos Coctho durante a batalha de Aleécer-Quibir, embora saibamos que ne- hum deles deu o cavalo ao rei Dom Sebastiio com vistas a livrar 0 rei portugues de caprura ou morte certas (LXV). No “Prélogo”, “Dirigido a Jorge d’Albuquerque Coelho, Capitéo ¢ Governador da Capitania de Pernambuco, das paites do Brasil da Nova Lusitania ete", faz-se uso do preceito horaciano “we pictura poesis", com © objetivo de comparar os procedimentos compositivos de que langam mio pintores © poctas para atingir a consecugio dos fins a que se pro- puseram, Se a facura da pintura principia pelo rascunho que se faz, “na lisa tébua’, da imagem, para que somente depois se pintem “os membros dela extensamente, até realgarem as tintas e ela ficar na fineza de sua per- feigao”, assim também procedeté 0 poeta para pintar a imagem de Jor- ge de Albuquerque Coclho: “assim eu, querendo debuxar com obstardo pincel de meu engenho a viva imagem da vida e feitos memoriveis de vossa mercé, quis primeiro fazer este rascunho, para depois, sendo-me voncedido por vossa merce, ir mui particularmente pintando os mem- bros desta imagem [...]” Ainda no “Prélogo”, que é simultaneamente a dedicatéria do poema, © poeta emprega 0 tepos “modéstia afetada” no s6 a0 rogar a Jorge de Al- huquerque Coelho que receba suas “rimas”, por serem as “primicias” com «que tenta servi-lo, mas também ao asseverar que o rascunho que com- ‘ate ocorreram, embora nao da maneira como nos foram apresentados, pés se transformara em pintura e, por conseguinte, em imagem, fmago, desde que nao Ihe falte 0 amparo do homem a quem solicita protecao favor: quis primeiro fazer este rascunbo, para depois, sendo-me concedide por vossa ‘merc, ir mui particularmence pintando os membros desta imagem, se ndo me fal- tara tinea do favor de vossa merce, a quem pego, humildemente, receba minhas rimas, por serem as primicias com que cento serviclo. © topos “modéstia afetada” instaura-se por meio de um simile apre- sentado no “Prélogo”: assim como dista o rascunho da pintura jé acabada, assim distam as primeiras rimas do poeta de um poema consumado. As “primicias” que 0 poeta oferece, na dedicatéria, a Jorge de Albuquerque Coelho, portanto, por serem primicias, slo aceitas devido & benevolén- cia que caracteriza 0 sujeito a quem slo dedicadas. A benevoléncia e bran- dura de Jorge de Albuquerque Coelho sao retoricamente constituidas anteriormente a0 efeito que se deseja produzir, ou seja, a aceitagio da dedicatétia por parte do mesmo Jorge de Albuquerque Coelho, accitagio possivel pelas virtudes que o tipificam ¢ dentre as quais se patenteiam a benevoléncia ¢ a brandura, Entretanto, € preciso ressalvar que 0 efeito objetivado s6 produzido na medida mesma em que as virtudes que propiciam sua constitui¢io nos sio apresentadas como naturais 20 enco- miado, © nao accitar a dedicatéria, portanto, implica © nao ser benevo- lente ¢ brando, resultado este que se deve evita, j& que 0 encémio a Jorge de Albuquerque Coelho se funda também na discriminagao de suas vir- tudes naturais, compreendidas aqui como elementos constituintes da pincura de um tipo ou de um modelo cultural ~ 0 fidalgo discreto e en- ‘genhoso — de que 0 encomiado se nos apresentaria como espécie. Nao aceitar a dedicatéria & negar a si préprio o ser pintado como particula- rizagio de um modelo de que participam a benevoléncia ¢ a brandura. ay uma rela- «fo entre o pintar “a viva imagem da vida efeitos memoréveis de vossa mercé (Jorge de Albuquerque Coelho)”, de maneira sucinta e imperfei- ta, no poema épico que Ihe é dedicado, ¢ 0 pinté-la de maneira acaba- Estabelece-se, assim, no “Prélogo”, de maneira impli dae perfeita ("para depois, sendo-me concedido por vossa merce, ir mui particularmence pintando os membros desta imagem’). Parte integran- ta a benevo- te do topos “falsa modéstia”, a relagao acima referida s lencia nao s6 daquele a quem é dedicado o poema, mas simultaneamente do leitor que vier a Ié-lo, jd que 0 poema nos é apresentado como *ras- cunho”, “esbogo”, ‘projeto” que, por conseguinte, deve ser lido, apropria- do como tal. O “rascunho” apresentado por Bento Teixeira, contudo, apesar de etapa na elaboracdo de uma pintura mais perfeita do herdi por cle cantado, hé de ser composto por versos “sinceros”, nao por versos “toscos” e “rudos”. O adjetivo, em posicdo de adjunto adnominal, pa- rece remeter a seu sentido etimolégico de “sem mistura’, o que vem a significar, no contexto em que comparece, “regular”, “medido”, “lavra~ do", porque inspirado diretamente por Deus: “Que por raz0 negar nfo deve 6 menos / quem deu o mais a mfseros terrenos”. A inspiragio a ser- Ihe concedida pelo Deus cristo é penhor do valor de seu poema e, € Sbvio, garantia do merecimento que conduz & perpetuidade das letras. Se todavia “esboco", 0s versos mal limados de Bento Teixeira reclamam para sia exceléncia alcangada por modelos que visa, na Prosopoptia, a pelo menos igualar. A relagio entre poesia e meméria, presente no “Prélogo” ¢ reiterada ‘muitas veres ao longo do proprio poema, ecos uma tradigio que remonta aos antigos, particularmente a famosa ode de Horicio em que se estima ‘© verso mais resistente 20 tempo do que os monumentos erigidos pelos homens com o objetivo explicito de a ele fazer face: Exegi monumentum aere perennias Regalique stu pyramidum altins, Quod non imber eda, non Aguile impotens Possitdiruere aut innumerabilis Anmoruon teies et fuga temporum 6 Horace. eunres Plies avec une dade biographigue es inure, une otc sur le mdsrigue 1 a provi, des moe cries wm indes ds noms proprese des notes explcatves parE Pls 12 Lay Pats, Machete, 1906, pp 187-188 [Um monumenta mais que 6 bronze eterno E que ceais pirimides mais ato Arrematei, que nem vorar dilivio, Aguile icoso ou série imensa de anos [Nem dos tempos a Fuga estragar possa.) E justamente 0 reconhecimento do poder de perpetuagio da palavea poética que levou ¢ leva 0s governantes a protegerem os poetas, pois sio os grandes que mais tém a perder com a auséncia de talentos que Ihes perenizem os feitos ¢ a vida. O cardter imperecedouro da poesia ¢ a as- sociagio entre rcis ¢ poetas é narrada em quase todas as potti ricas quinhentistas e, de forma modelar, em Thomas Sébiller: © re Ex pis pourra nier aucun aux Padter leur divine prévllence? Laguelle connue par les monarques o1souverains ceigneurs des hommes ee des teres, oeyant et ayant dire (qe Mercure, un Apollo, un Arion, an Amphion, un Orphde par la dowceur de ses vers chantés avai ilasré la glove des plus hauts et plus puissantsdiews, privent em semble envie de régaler aus: dieu, et Fre comme uc loués et connus dla potest par le carme det Pabtes, De bt Hombre de la Hebiode, de € Pindare resentcent entre les Grecs admiration et louange de ler divine verification: et sous ewe gui suivant leurs traces ont été depuis emer les Grect honorés Poetes. De la Livins Andronicus, de lt le pire Ennius, deli le plasant Plante trouvérent nom et faveur entre les Romains: ‘apres eus Vingle, Ovide, Horace, et autres infimis, furent enrich, fuvori, et honarés 4 Rome des Céears, des Séuateurs et du peuple” IE, pois, poderé alguém negar aos poctas sua divina superioridade? Superiori- dade esta reconhecida pelos monarcas e senhores soberanos de homens ¢ terras que, 40 verem e a0 ouvirem dizer que Merciio, Apolo, Arido, Anfido, Orfeu, pela do- ‘gura de seus versos cantados, ilustraram a glia dos mais altos e poderosos deuses, scntiram inveja destestltimos e quiseram igualar-se-Ihes ser como eles louvados conhecidos da posteridade pelos versos dos poetas. Deriva 2 admiragao e 0 lou- 2, Thomas Silt, Ar Pdeque Fangs, eo Tis de podique ede rhiorigue de a Reni ace ap. pp. 53°56 ‘or que 0s egos autrram pot Homero, Heslodo e Padaro da divina versificagso por eles produzida, admirasso e louvor devidos a todos equeles que, sepuindo-thes as pegadass foram depois pelos gregos honrados como potas. Por isso mesmo Le vio Andrnico, Eni e Pla obsiveram fama ¢ favor entre os romanos e, depois eles, Virgilio, Ovidio ¢ Horicio ¢ outros incontives foram favorecidos, enrique: Lids ¢ honrados na Roma dos césates, das senadores e do pove.] ‘Conquanto 0 poeta possa tanto escolher o argumento do poema épico, extraindo-o da histéria, quanto inventé-lo, fingi-lo, € muito melhor, sequndo Torquato Tasso, que extraia da histétia. Este assevera que 0 vverosstmill deve fazer-se presente em cada parte do poema e, segundo ele, nnio € crivel que uma agio ilustre, tal como devem ser aquelas que pos- sam servir de argumento a fatura de poemas épicos, ndo seja registrada Se tum importante sucesso ndo pode ser desconhecido ¢ nao pode também indo ter sido registrado pela hist6ria, 0 fato de sé-lo e de nao haver sido historiado é suficiente para que seja ajuizado falso pelos homens ¢ aquilo «que se estima falso dificilmente os move & ira, ao terzor € 3 piedade, efeitos pula escrita e nao se torne meméria por meio da escrita da histér «que se espera produzir por meio da leitura da poesia: La materia, che argomento pub ancora comodamente chiamatsi, 0 i finge. ed allora par che il poeta abbia parte non solo ne la sceta, ma ne la invenione ancora: 0 sitoglie da Vistorie, Ma malta meglio ta mio giudicio, che da Vistoria si prendas per- he dovendo Fepico cereae in ogni parte il versimile(presuponge questo, come prin« jo notissimo), non & versimile eh'una azione illustre, quali sono quelle del pocma ruieo, non sia staa scrtta,e passata a la memoria de'posteri con Paiuco 'alcuna isto- ria, I success grandi non possono esser incognitis € ove non siano ricevutl in serittu- ra, da questo solo argomentano gli uomin la loro fasts fals stimandbli, on con- sentono cost facilmente dessere or mosti ad ira, ora terrore, oF a pit [1% A. "Vyuato Taso, Dies dell Arte Pedi ed in Paricolare Sop 1 Poem Frc Dscorso rina, Ope acuta di Gini Petrachi, Milano, Maria Faitre, 1974, p. $22. [A Matéria, que se pode chamar mais comodamente de argumento, ou se finge, jf que o poeta toma parte néo apenas em sua escolha, mas também em sua inven- do, ou sea retira da hietéria, Mas 6 muito melhor, segundo meu juizo, que er re da historia, porque, em devendo o épico em todos os seus elementos buscar 0 verossimil (pressuponho ser esse um principio conhecidissimo), nfo é verossfmil que ‘uma agio ilustre, como 0 sie aquelas do poema herdico, no tena sido escritae per- peruada na meméria dos pésteros por meio do ausilio da histéria. Os grandes su- ‘esos nio podem ser desconhecides e onde no foram registrados por meio da es- critura, desea fileaargumentam os homens a favor de sua falsdade, E, se os estimam falsos, nio consentem facilmente por eles set movidas 3 ira, a0 ceror ou & piedadel Embora o “argumento” seja extraido da histéria com o firo de pro- mover a verossimilhanga do escrito poético, 0 conjunto de preceitos que regram a épica promoveré a amplificagio retérica da “matéria” por meio do uso da fantasia poética. A fantasia, contudo, nio elude o que hi de histérico no “argumento” e que se patenteia na selegao de personagens ages passiveis de serem encomiadas e de servirem de exemplo aque- les que se concebe como potenciais leitores do poema épico. Os gesta, apresentados como efetuacio da virtude operativa que tipificaria mem- bros da nobreza, no Estado Monarquico e no Antigo Regime em Portugal, ao screm selecionados pelo pocta como “matéria” ou “argumento” do poema épico, passam a operacionalizar uma leitura em chave sinedéquica do texto poético, 0 que constitui a amplificagéo retérica da personagem e de scus feitos, na medida mesma em que aquilo que nos é apresenta- do é uma pequena amostragem do conjunto de fastos que ornam aque- Ie que se deseja encomiar. Se hé o registro de feivos a ponto de serem reputados fastos, geste participantes da histéria e, por conseguinte, da meméria coletiva salva- guardada pela escrita, a poesia nao teria por objetivo principal a preser- vagio dessa mesma meméria, ainda na perspectiva adotada por Tasso, mas sim a promogio do louvor de petsonagens ¢ ages por meio de um dis- curso elogioso constituinte de um género cujo valor social & reconheci- do pelas elites cujos membros ¢ feitos sao, em suma, a sua “matéria”. Em Prosopoptia, desde que se declara 0 poema como esboco a partir do qual «se propord posteriormente a elaboracio da pintura encomidstica de Jorge de Albuquerque Coelho, os feitos que sio apropriados como “matéria para sua fatura so no apenas uma selecdo de gesta, mas também e prin- cipalmente a apresentasio imperfeita desses mesmos feitos selecionados, o que leva A produséo, discursivamente, da amplificagio desses mesmos feitos, lidos ¢ apreendidos como sombras produzidas pela insuficiéncia do poeta em representar 0 que esté além de sua capacidade de represen- tacéo. A incapacidade do poeta, por seu turno, pode ser compreendida, no “Prélogo”, nao apenas como 0 produto da adogio do topos “falsa modéstia", mas também como recurso discursivo que permite ao poeta a constituicio do elogio amplificado dos feitos representados por meio da declaragao da impossibilidade de representacio verossimil desses mesmos feitos por sua excepcionalidade c sobrelevagio ao que se repu- 1a gesta hominum. Dentte os feitos narrados em Prosopopéia, destacam-se as guerras movidas contra os inimigos da fé catdlica, indios e mouros. Como se sabe, a narracio de feitos guerreiros deve constituir 0 miicleo do poema épico, ji que sio sua maéria por exceléncia: LOeuvte Heroique est celui qui donne le prix, et le wri titre de Poste. Br si cat de cel conte et de tel honneur: qu'une Langue n'est pour passer en célébrité vers les Sigcles: sinon quelle ait eraté le Sujet Heroique: qui sone les guerres’ [A obra herdica é aquela que concede o prémio e o verdadeiro tttulo de po IE reputada de tal grandeza ede tal dignidade que uma lingua nio pode tornar jo ser que trate da mat élebre ¢ set reconhecida como tal durante séculos & dda épica que sio as guerras Quanto a narragio de feitos que objerivavam desbaratar os {ndios com vistas & colonizagio da América Portuguesa, 0 argumento em si jé fora explorado por José de Anchieta em seu De Gestis Mendi de Saa. Em Prosopopéia, a previsio de Proteu, que vaticina a grandeza da Nova Lu- 9, Joces eeser du Mans, op. tp 308. sitania, denominasao para a capitania dos Coclhos, sé pode se dar caso consigam os colonizadores amansar “A dura cerviz barbara insolente” (XXVUL, 2). O verbo empregado para significar a tarefa que serd levada a efeito pelos Coelhos, ou seja, “amansar”, significa “tornar manso’, “amestrado”, “domesticado”. O que se visa é & completa submissio dos Indios da costa que fazem oposicio 2 empresa colonizadora lusitana. Depreende-se que © processo de domesticagio dos natives nio foi facil- mente posto em exccusao, pois se faz mengdo a sua “dura cerviz”, 0 que ‘cena para a resistencia que ancepuseram ao avango portugues ¢ a0 de- sejo luso de dominagio. Bento Teixeira, a0 mencionar 0 “brago invicto” dos portugueses em sua agio colonizadora ecivilizadora, associa de forma indiscutivel o avango da “civilizagao" & forga do brago armado, assim como equaciona “forga” & “imposigao da f& catdlica”. Assim sendo, s6 pode haver o “Instruindo 1a fé, dando esperanga / Do bem que sempre dura e ¢ presente”, caso haja como condigao prévia “O brago invicto [...] com que amansa / A dura cervie barbara insolente”. Seria, portanto, a resisténcia dos indios fren te ao avango portugues ~ que os beneficiaria, ao propiciar-Ihes as luzes da verdadeira religido €, como conseqiiéncia, a salvacao de suas almas ~ que levaria os curopeus a fazer-Ihes guerra. A agio belicosa justifica-se como um ato de caridade que, por danos comparativamente pequenos, produz, beneficios incomensuravelmente maiores. Este também é 0 pa- recer de Anchieta em De Gestis Mendi de Saa, em que se exalta a vinda cde “um her6i das plagas do Norte, um herdi que vingasse os crimes ne- fandos” perpetrados pelos silvicolas ¢ os repusesse no trilho da salvagio: Obsenebrata din barathri caligine exec, Gens fait australis, saevi ubicta tyranni Colla iugo, casum divini luminis aevum Traducens, maltisque malls immersa; superba, LEifenis,erudelis, atrox,fusogue eruenta Sanguine: docta necemn rapidis inferresagice Immanesgue rigrs fertate luposque voraces Fe rabidos ruperare canes sacvosgue leones, Humanis avidam parcebat carnibus alum Mulia din scelera intentans, ommanibas atri Regnacorem Erebi, (qui mortem primus in orbem Indusit, primus seducensfoaude parentes) Sponte sequent facts, multorum corpora saevo Discerpens leto, crudele ruperba furore Chrinicolar mule populaba finere genes; Donec ab aethereisspectans regionibus oras Brasilles Pater ommiporens, loca nocte sepulia Horvifica, bumano sudantes sanguine teras, Misi ab Arctoisultorem criminis ois, (Criminieinfandi ultorem: qui pelleretiras Coudele rrraes gui fonera diva, erventis. Perpearata modis, compesceres, borida sedans Bella, foros animos mulcens,nabidisque cravrem Riceibus humane pasci non ferrerinultus. [avolea, hd séeulos, no horror da escuridio idoldcrica, houve nas terras do Sul uma nagio, que dobrara a eabesa 0 jugo do tirano infernal, elevava urna vida vatia de luz divina. Imersa na mais triste miséria, soberba, desenfieada, cruel, ator, sanguindria, mestra cm trespassat a vitima com a seta ligeira, mais feror do que o tigre, mais vorar do que 0 lobo, mais assanhada que 0 lebréu, mais audaz que o leo, saciava o dvido ventre com carnes humanas, Por muito tempo tramou emboscadas: seguia, ro seu viver de eras, 0 exemplo do rei dos inferno, ue por primeito touxe a morte 20 mundo, enganando snossos primeitos pais. Dilacerava os corpos de muitos, com atrozes tormentos, ¢, embriagada de furor e soberba ia enlutando os povos cristios com mortes Freqientes, Mas um dia © Pai onipotente volveu os olhares ddos reinos da luz 3 noite das regies brasileira, fs terras que suavam, em borborses, sanguue humano. Encio mandou-Hhes um herdi das plagas do Norte, ‘um herdi que vingasse os crimes nefandos, que banisse as discérdias,freasse 0 assassinio, birbaro © continuo, acabasse com as guertas horrendas, abrandasse os peitos ferozes ni sofresve impassivel cevar-se em sangue de irmaos queixadas humanas."] Como se 1é em outra estrofe de Prosepopdia, os Coelhos “O principio de sua primavera / Gastardo seu distrito dilatando” (XXX, vv. 1-2). O dilacar as posses é conseqiiéncia da natureza da empresa lusa de conquista € ocupagio do solo, ja que, como se sabe, as capitanias da regio nordeste destinavam-se & produsio em larga escala de géneros destinados a0 mer- cado europeu, entre as quais sobressaa 0 agticar, chamado por frei An- tonio do Rositio, em As Frutas do Brasil, 0 ouro branco que mais vale do que os bisalhos extraidos da India. As reas de plantio, durante o século XVI, estenderam-se cada vez mais, 0 que implicava a presenca de um nniimero maior de trabalhadores nas lavouras que custassem pouco aos senhores de engenho ¢ lavradores de cana. Da necessidade permanente de mao-de-obra barata, a mais barata possivel, deriva a busca por escravos nas. No século XVI, a maior parte da mio-de-obra indigena que cchegava as capicanias do Nordeste era exportada pelos homens do Planalto de Piratininga que, mantcndo aliangas instaveis com tribos diversas, in- 10, José de Anchicta, De Ges Mend de Sea, Introd, verso e notas de Armarido Cardoso, SJ ‘Sto Paulo, Loyola, 1986, pp. 92-93. terferiam na cultura dos nativos e no delicado equilfbrio entze os grupos aurécrones, pois o desejo de captura de novos escravos por meio das guer- ras travadas, insaciével, subvertia “a principal finalidade da guerra indt- gona: o sacrificio ritual no cerseiro™, para além de tornar os conflitos um processo endémico em larga escala Embora os indios da costa do Brasil néo fossem destituidos de agri- cultura, sua economia agricola destinava-se& subsistencia, nfo & produgao de excedentes com vistas & comercializa¢i0, como era o caso do negécio implantado pelos portugueses. A agricultura de sobrevivéncia, os indios associavam as priticas da coleta ¢ da caga com vistas @ complementar sua dicta. Entre os vegetais por eles cultivados, sobressafam os tubérculos € 4 mandioca, base de sua alimentagao. Os homens estavam incumbidos da derrubada das Arvores ¢ da queimada dos matos baixos, que produ- ziam as cinzas utilizadas como fertilizante natural, enquanto as mulhe- res plantavam e cultivavam os vegetais ¢ preparavam os alimentos. Da diviséo do trabalho no interior das comunidades nacivas, assim como de uma diferente concepsdo da natureza ¢ finalidades do trabalho agricola deriva a rejcigao dos indios ao trabalho nas grandes lavouras. Segundo Stuart Schwartz: A concepso comunitiia ou recfproca quanto 3 producio e a0 consumo, a pro- dugdo de cardter doméstico, uma sociedade na qual o stazus nio derivava da ¢a- pacidade econdmica e a subordinagio da economia a outras formas de organizagio social determinaram a reagio das (ndios ts demandas dos europeus. Os diferentes ppontos de vista dos portugueses ¢ dos fadios com respeito 4 naturera e aos objet +y0s do trabalho e da produgio enconteam-se subjacentes & mudanga no relacio ‘mento entre les, ¢contribuem para explicar 2 histria subseqlente dos indigens no regime da grande lavours. O que aos olhos dos europeus parecia prodigalida- de, fata de interesse em luctos ¢ despreocupacio com os excedentesittitava-os, © ‘mais de uma ver tas atitudes foram apresentadas como prova de irracionalidade do {indio e, porcanto, de sua falta de “humanidade"”, 11, John Manuel Monteiro, Maras de Tir, Inds eBandeirante: mas Orient de Sto Paul, Sto Paulo, Companhia das Letras, 1999, p. 29 12, Seuae Schwa, Seredes Interns Engenbor ioe me Sociedade Colonial So Palo, 9,» pia des Lec Assim, no «rato com os indios, associam-se as motivagoes de order. religiosa para promover sua dominagao aquelas de ordem econdmica que, da dtica porcuguesa, também serviam para atestar a inumanidade dos indios, sua pouca racionalidade. Em Prosepopéia se assevera que 0s Coelhos, antes de que empunhem “a espada lisa e fera” (XXX, 5), hao de tentar tizar os {ndios de seu erro por “mil meios d'amor brando”, o que nos leva a considerar 0 que pode significar na passagem em questio © vocibulo “erro”. Por “erro” pode-se entender, primeiramente, aquilo que o é por exceléncia, ou seja, a falta a verdadeira religido, mas também pode compreender formas desvian- tes segundo a visio européia que justifiquem 0 emprego da forga como forma de coibir esses mesmos desvios. O “amor brando”, contraponto de “espada lisa e fera", assim como ela, serve & remogio de formas desviantes de comportamento € de agdo, mas em caso de ser pouco efetivo, deve-se tecorrer a0 glidio que nunca falha como instrumento para o convenci- ‘mento de elementos resistentes & palavra. Nao havia Mem de $4 mandado por um indio na boca de um canhdo para atemoriar os nativos rebeldes? A beligerancla justificada dos Goelhos resulta no massacre de indios pouco afeitos as provas de amor que se Ihes demonstram: (Os bragos vigorosos e constantes Fenderao peitos, abririo costados, Deixando de mil membros palpitantes Caminhos, arraiais, campos juncados. Cercas soberbas, fortes tepugnantes Serio dos novos Martes arrasados, Sem ficar deles todos mais memsria Que a qu'eu fazendo vou em esta histéria, Prosepopéia, XXXL A palavra “exicio”, empregada pelo poeta para referir 0 exterminio completo dos indios pelos colonizadores (XXIII, v. 8), contrapde-se & meméria que deles passa a existir por meio da escrita poética. Nao hé de cexistir meméria dos nativos, a nao ser aquela instituida por Bento Tei- xcita a0 referir a derrota por eles softida quando do arrostar os varées da familia Coelho, A meméria, em Prosopepeia, instaura-se como padréo contra a vora- cidade do tempo em que se perpetuam as imagens de fidalgos portugueses valorosos ¢ leais que, pelos servigos prestados & monarquia, deveriam ser devidamente galardoados pelo rei assim como os seus descendentes, ¢ de ‘ndios, vagas imagens em forma de destrogos criados pela «i EDIGOES DE PROSOPOPEIA (EM VOLUME) 1. Prowpepea, ! Dinigida a Iorge Dalbuquerque ! Coelho, Capitio & Governador | de Peranambuco, noua / Lusitania, &. Sais apensa 3 segunda edigio do Naw frigio, Que / Passou lorge Dalbuquergue ! Coelho, Capitéo c+ Governader de Pee rimambuco|de Afonso Liz Piloto)./ Em Lisboa: Impresso com licenga da Sancta Inquisigio: / Por Antonio Alvarer Anne MCCCCCCI [1601]. 1 Vendem se na ‘cass de Aunonio Ribeyto Libreyra; Em a rua nous 2. Prosepopea / por | Bento Teixcra / Reprodusio fiel da edigao de 1601 segundo ‘© exemplar existente / na / Biblioteca Nacional e Publica / do Rio de Janeiro / Rio de Janciso / Typographia do Imperial Insticuco Artistico, Rua Primeiro de Margo N. 21. / 1873. Edisto organizada por Benjamin Franklin Ramiz Galvfo, ‘due di noticia sobre a descoberca de exemplaes da edigao de 1601: © primeira ro, em 18 de julbo de 1872, na Biblioteca Pablica de Lisboa, segundo pelo préprio Ranmiz Galvéo na Biblio- deles foi encontrado pelo Bari de Porto Si teca Nacional do Rio de Janeiro, 3. Publicagies da Academia Brasileira / Clasicos Brasileiros 1 Literatura / Bento Teixcira ( Prosopopde / Com Prefacio de Alranio Peixoto / Alvaro Pinto, Editor / (Anuétio do Brasil) / Rio de Jancivo (1923) ‘4. Afonso Luiz Piloto / & / Bento Teixeira) Naufiigio / & / Prsopapes ! Recife | Universidade Federal de Pernambuco / 1969. Texto conforme a edigio de 1601, com introdugio, notase glosirio pelo professor Fernando de Oliveira Mora, Pre- fico de José Antonio Gonsalves de Mello,

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