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Introdugao as Curvas Algébricas Planas Israel Vainsencher COPYRIGHT ® by ISRAEL VAINSENCHER (1979) Nenhuma parte deste livro pode ser reproduzida, por qualquer processo, sem a permissio do autor, INST{TUTO DE MATEMATICA PURA E APLICADA Rua Luiz de Camées, 68 20.060 - Rio de Janeiro = RJ ie PREFACIO "la premiére est toujours si astreinte & la considération des figures, quelle ne peut exercer ltentendement sans fatiguer beaucoup Ltimagination; et on s'est tellement assujetti en la derniére &-certaines régles et & certams chiffres, qu'on en a fait un art confus et obscur qui embarrasse liesprit®? au lieu d'une science qui le cultive". Apés enunciar este veredito, Descarte propds-se a tomar o melhor da Geometria e da Algebra, corrigindo os defeitos de uma pélas virtudes da outra. Nascia a Geometria Anal{tica Classica. Dela sto sucedGneas a Geometria Diferencial e a Geometria Algébri ca. Apesar da origem comun, é claro o desequilfbrio verificado nos currfculos atuais quanto eo tratamento dispensado aos aspectos introdutérios dessas duas disciplinas. 0 estudante é devidamente apresentado a0 triedro de Frenet, torc&o, curvatura... mas se pas— ga a dist€ncia do plano projetivo e curvas algébricas. Estas notas foram escritas com o objetivo de servir de tex to a um curso de 1 semestre, como disciplina eletiva destinada a alunos do 32/42 ano do Bacharelado, ow ainda como disciplina de iniciag&o cient{fica. 0 teorema de Bezout é o resultado central do curso. Para apresenté-lo com vigor, é necessdério empreender uma jornada razod vel. Nosso ponto de partida sic as curvas planas usualmente es- tudadas na geometria elementar, tais como retas, cénicas, conchdi- des, etc. ... Passamos em seguida a uma revisdo critica do conced to de curva algébrica, formulando uma definigdo rigorosa, ainda que mais abstrata. No Capftulo II, iniciamos o estudo da intersegdo de 2 curvas. Introduzimos a resultante de 2 polinémios e concluimos com um caso particular do teorema dos zeros de Hilbert. Nos Capftulos ITI e IV so exploradas as idéias bagicas necessérias 4 demonstragdo do teorema de Bezout. Para que curvas de graus m e nse intersectem "sempre" em mn pontos, & neces sdério explicar como alguns desses pontos devem ser contados mais de uma vez, quer seja por tangéneia quer pelo fato de uma das cur- vas "passar varias vezes" pelo ponto em quest&o; por fim, deve-se explicar como alguns outros podem estar no infinito... No Capf{tulo V demonstramos 0 Teorema de Bezout. No capftu- lo seguinte estudamos mais detalhadamente o indice de intersecdo de 2 curvas. 0 Capftulo VII constitui-se quase que numareviséo da maté- ria: aplicamos o Teorema de Bezout ao cAlculo do ntimero de tangen— tes inflexionais de uma curva e o de tangentes que passem por um ponto. No Capf{tulo VIII ocorre uma certa mudanga no objeto de estu do. Até ent&o estivéramos interessados no aspecto conjuntista, ana lisando propriedades de uma curva como subconjunto do plano; agora -idi- examinamos o seu cardter funcional, i,e., propriedades do corpo de fungSes racionais. © Ultimo tépico - cibicas nfo singulares - tenta mostrar o sabor de coisa inacabada, mal disfargando a esperanga de que o alu no recorra & bibliografia indicada para explorar com mais profun- didade 0 roteiro aqui iniciado. Gostaria de registrar meus agradecimentos 4 Comissd&o Orga— nizadora; ao Yves, Karl Otto e Celso por vérias sugestdes e, em especial, ao Antonio Carlos pelo espfrito critico com que leu o manuscrito. Recife, 29/06/1979. ave inprce CAPfTULO I - Definicgdes preliminares e exemplos. 1, Um pouco de histéria Bxere{eios 1-6 . 2. Equag&o de uma curva algébrica. Exerofcios 7-l6..e.ssesee 3. Mudanca de coordenadas. Exerefcios 17-22...... CAPITULO II - Intersegdes de curvas planas. 1 Finitude da intersecio...... Exerofcoios I-4..ssseeee ~ A resultante....cecessecessseccererecreceeseeceser ExorclciOS 5-Qeesseeuseeceseeeverssevenserercesaee 3. 0 grav da resultante. Exercicios 10-12.... F © teorema dos zeros Exercfeios 13-16, CAP{TULO III ~ Multiplicidades 1. IntersegSes de uma curva com uma reta 2. Pontos miltiplos. 3. Diagrama de Newton. Exercfcios 1-11, “capftuLo Iv - Pontos no infinito L, 0 plano projetivOsssccsscceeseceusacecctecsseeeeee 2, Bspagos ProjetivOs.cessesecesesscceessceenceeeeuee Be Curvas Projetivasscescccsscccereseasesesseeeerenee aH 1. 16 17 2l 42 45 51 55 58 59 -vi- 4, Mudanga projetiva de coordenadas.... Exerc{cios 1-18..sseeseseeseeneees CAPffULO V - Intersecfo de curvas projetivas 1. Intersegfio de reta e curva, agora projetivas....+. Exerclol0s 1-G.sseeesceescceresessescsesensaeansens 2, 0 teorema de Bezoute..eseeee Exerc{coios 7-ll..sseeeseeree caPfTULO VI - Propriedades do {ndice de interse¢So. 1. As propriedades caracteristicas Exerofcios 1-6.. 2. Séries de poténcia. Bxerefecios 7-13. cAPfTULO VII - Férmulas de Plicker. Exercf{eios 1-15....++0+0+ CaPfTULO VIII - Curvas racionais 1. Curvas racionais afins. Exerefcios 1-3.. 2. Fungdes regulares e fungSes racionais Exercicios 4-8. 3. 0 teorema de Litroth ... Exerc{cios 9~10..... 4, Curvas racionais projetivasssseseccsssseeereresenes Exercicios L1-16...ecseseeeeeeeeerscereneetasereees 0 género virtual... Aplicagio ao cdlculo integral, Exercicio 17-19. .seeeseeeeee 70 73 76 85 86 4 95 107 109 118 121 123 124 129 130 133 133 138 139 147 149 avii- CAPITULO IX - Cibicas nfo singulares. 1 2 - BIBLIOGRAFIA ...05 Conexdes inesperadassseserserecseccesecervseeeeece Forma normal. Exerefeios 1-5 PungSes racionaisssssesesesseceesreeeteeseteeseees Exercicio 6... Ciclo e equivaléncia racional Exercfeios 7-13......+ A estrutura de grupo... Exercfoios 14-23 esse cAPETULO I DEFINICOES PRELIMINARES E EXEMPLOS §1. Um_pouco de histéria A manipulegiio de expressées do tipo x*4y° = 1 é um fato relativamente recente na histéria da Matemitica, podendo se situar em torno do século XVI. Mas os matemdticos gregos jd sabiam efe~ tuar cAlculos elaborados, recorrendo a procedimentos geométricos. Por exemplo, para o cAlculo do produto de duas quantidades a, b, poderfamos proceder assim: ab oO 1 b Fig. 2 Neste exemplo, o segmento de comprimento a é tragado perpendicularmente A reta 0b. Esta construc&o requer somente o desenho de retas e cfrculos. (0s cfrculos foram empregados para se obter o Angulo reto). Com um pouco de imaginagdo, é possfvel se descrever méto- dos para a construg&o com régua e compasso de expressées do tipo Ja+ fab Je , ou mais geralmente, para qualquer elemento do chamado corpo dos ni 1) meros construtiveis”’. Além das retas e cfrculos, os matemdticos da Antiguidade estudaram outras curvas, geralmente descritas como o lugar geomé- trico de pontos satisfazendo a certas condigdes. Essas curvas es peciais eram o recurso empregado na solugdo de v4rios problemas, para os quais todas as tentativas com régua e compasso malograran. Alguns desses problemas tém uma historia curiosa, em que lenda e fato se misturam. f 0 caso dos célebres problemas da duplicagio do cubo, da trisseg&o do Angulo e da quadratura go circulo®). ve- ja o Exemplo 6 mais adiante, e o Exercicio 1d). Com a ulterior introdug&o do método das coordenadas, cons tatou-se que varias curvas conhecidas desde a Antiguidade podiam ser descritas por equagées polinomiais. 1. Definicdo. Uma curva algébprica plana é o lugar dos pontos Definicgac curva algebrica plana cujas coordenadas cartesianas satisfazem a uma da- da equagSo polinomial £(X%,Y) = 0, onde f é um polindmio nao constante. (Compare com a Definicao 4). 1) Veja a discussdo no livro "Introdugdo & Algebra", de Adilson Gongalves, pag. 183 e seguintes. 2) Consulte a "Histéria da MatemAtica" de Carl B. Boyer, tradu- gao de Elza Gomide, pag. 48. 2. Exemplos. Eis aqui uma lista preliminar de curvas algébricas planas. A maioria deve ser bem conhecida do leitor. 1} A reta que passa pelos pontos (a,b) # (c,d). Sua equagdo é ree Pro Hob if ° 2) Ocfreulo de raio r ecentro (a,b), lugar dos pontos que satisfazem a equacdo (xa)? + (yep)? = 3? 3) A eclipse, lugar dos pontos cujas dist@ncias a dois pontos fixos (digamos (+ ¢,0)) +tém soma constante 2a. A con- @igdo imposte escreve-se Mowe? + + Ae)? + = 20 =o c * Esta equagdo nfo é polinomial, mas é poss{vel eliminar os radicais e mostrar que toda solugdo dela é também solug&o da seguinte (e vice versa), onde b 4) A _hipérbole, lugar dos pontos cujas distancias a dois pon- tos fixos, chamados focos (digamos (4c,0)), tém diferen- ga constante 2a. A condigéo desorita é doe)? + v= Meee)? + ¥? 2 20. Procedendo como no caso da elipse, eliminames os radicais e obte- mos a equagdo 2 ey ae be 2 = o2-a2 onde ona. Fig. 3 5) A parabola, lugar dos pontos equidistantes de um ponto fi- xo (foco, e.g. (0,b), b> 0) e de uma reta fixa (diretriz, e.g. Y=-b). Sua equacdo (j4 simplificada) é, Fig. 4 6) A cisséide de Diocles, lugar dos pés das normais tracadas do vértice de uma parébola 4s suas tangentes. Dada a pa- rébola de equagio x? = 4bY, a tangente num ponto (xgr¥Q) se es creve XX - Aby, = 2b(¥-y,) « A normal tomada da origem (que é 0 vértice) é 2bX + x,Y=0. Dessas duas, resulta a equagdo da cisséide , vx® - ¥(v7ax?) = 0. Note que, em coordenadas poleres, essa Gltima equagdo fornece, r= bcos @ cotg a. Daf obteremos uma descrig&o dindmica que permite tracar a cisséi- de. Construao circulo de didmetro b e centro (0, b/2). Considere a reta Y=; para cada um de seus pontos P, trace arveta OP e tome o ponto Q da intersegdo com o circulo. Final- mente, marque o ponto R tal que OR = PQ. Variando P, o pon- to R descreve a cisséide. Com efeito, temos PQ = OP - 00 b sen @ - bsen® bcos @ cotg @=r. A cisséide foi empregada para resolver c problema da dupli-~ cache do cubo: dadaa aresta de um cubo, construir a aresta do cubo de volume duplo. Em simbolos, procuramos resolver a equacao, = 2p, onde b denota o comprimento da aresta conhecida.. Sabe-se que esta equagio nado é resolivel por régua e compasso (por exemplo, para b= 1). Recorrendo 4 cisséide como "curva auxiliar", a so- -7; lugio gréfica é obtida com o seguinte procedimento: intersecte a cisséide (b-¥)x® = com a reta be¥ = 2x5 obtemse um ponto (x,,y,) com (y,/x,)? = 2. Ligando~o & ori- gem, constréi-se a reta Y=%2X. Fazendo X= b, resulta a quantidade procurada. Convidemos o leitor a se familiarizar com os exemplos adi- cionais compilados na lista de exercicios, Exercfcios 1) Esboce as ourvas seguintes. 2) Folium de Descarte: Way? ~ FaxY = 0. b) Trissectriz de Maclaurin: x(x74¥) = a(y*3x*) . c) Seracol de Pascal: (x°4¥?)? - 2ax(x®4y?) + (a2-b?) - by? 20, Mostre que em coordenadas polares a equacho é rsacos 8b. Distinga os casos a>b, aa, temse a oval propriamente dita. 2) Mostre que a curva dada parametricamente por x(t) = 79, y(t) = é algébrica, encontrando um polinémio £(X,¥) n&o constante tal que f(x(T), y(2)) = 0. 3) Sejam x= x(T), y= y(T) fungdes racionais (= quocientes de polinémios em uma varidével 1). Mostre que existe um po~ linémio nfo constante £(X,Y) tal que ty) = 0, (Sugestao: seja k(Z) © corpo das fungdes racionais a coeficientes no corpo k. Se x €k(T) é n&o constante, entéo k(I) & uma extens&o algébrica do subcorpo k(x) gerade por x, pois se x= P/a, ~10- com p,q polinémios entdéo T satisfaz & equagéo polinomial p(X) - xq(X) = 0. Logo, todo y €k(T) & algébrico sobre k(x)). 4) Uma curva 6 racional se for definida parametrioamente por equagdes X=x(T), ¥ = y(t), onde as fungdes de TI indicadas s&o racionais e ao menos uma é n&o constante. Mostre que teda curva racional é algébrica. 5) Gurvas de Lissajous. S&o dadas parametricamente por x(0) =a sen (m@ +p), y(e) = b sen(ne + q), onde a,b,m,n,p,q sao constantes (abm #0). Curvas des- se tipo ocorrem na investigac&o de fenémenos vibratérios. (a) Es boce a curva, supondo m= 2, n=3, a=b=l, p=0, a=n/4. (o) Mostre que a curva nao é algébrica se m/n irracionel. (c) Se m é inteiro,mostre que x(8) pertence ao anel A gerado pe- las fungSes sen?,cos@. (d) Mostre que A é um dom{nio e que seu corpo de fragées é igual a R(f), onde T= tg(@/2). (e) con clua que uma curva de Lissajous com m/n racional é algébrica. Ache a equag&o polinomial no caso considerado em (a). 6) Chama-se rosécea uma curva de equacéo polar r= a sen(b0). (a) Esboce para a=1, b= 1,2,2/3. (b) Prove que se b = m/n, com m,n inteiros > 0, primos relativos, entdo a rosacea é algé brica, satisfazendo a uma equacao polinomial (em coordenadas car- -ll- tesianas) de grau min ou 2(mn) conforme sejam m,n ambos. {mpares ou um deles par. Se » 6 irracional, n&o é algébrica. §2. Eguacdo de uma curva algébrica Reexaminemos a Definig&o 1. Uma questio que naturalmente se poe & se a equagdo polinomial f-=0 estd bem determinada pela curva, i.e., o lugar das solugdes. A resposta é no: f = 0 e f° = 0 tém as mesmas solugdes. Poderfemos arriscar o palpite de que esse seria o tmico tipo de indeterminagdo: se tomdssemos f com grau minimo, talvez todas as outras equacées definindo a mes~ ma curva fossem do tipo f™ = 0. Mas note que as solugdes de W=0 e X¥=0 sfoas mesmas, desmentindo a proposta., Ah, mas nesse exemplo a curva tem visivelmente 2 "pedagos", e a afir- mativa poderia valer pare cada um deles, Talvez uma hipdtese mais promissora seja esperar que existe uma equag&o de grau minimo, as demais sendo miltiplas desta. Mas as curvas (7), ou melhor di- zendo, as equagdes X4Y7 = 0 © 2x24¥2 = 0 tém o mesmo conjun- to de solucSes reais, desfazendo a esperanga. A escassez de pontos reais nesse tiltimo exemplo parece es- tar na raiz do problema. Com efeito, veremos mais adiante. que, se p(X,Y) é um polinémio irredutivel e a curva C definida por B(X,Y) = 0 6 infinita, entdo a equagdo de grau minimo est4 bem de terminada (a menos de fator constante). Aqui, ¢ em outras situacdes com que iremos nos defrontar, a bem da simplicidade de uma proposig&o que desejamos tornar verda- =12- deira, somos induzidos a repensar os fundamentos, isolar a dificul dade, ¢ resolvé-la "por decreto"? . fo que faremos, passando a admitir pontos cujas coordena- das s&o nimeros complexos. E, ja tomada esta decis&o, por que nao trabalnar também com polinémios a coeficientes complexos? Na rea lidade, praticamente em toda a teoria que exporemos, a proprieda- de decisiva dos nimeros complexos é que estes formam um corpo al- gebricamente fechado de caracter{stica zero. Assim, salvo mencdo explicita em contrério, doravante, coordenadas de pontos, bem como coeficientes de polinédmios,serao tomados em um corpo k algebri- camente fechado e de caracter{stica zero. Frequentemente, nos exemplos, suporemos k = C. A perda aparente do recurso & intuigSo geométrica seré am plamente compensada. JA podemos recolher o primeiro beneficio. 3. Proposicdo. Sejam f, g polindmios em 2 varidveis a coeficien- te_no corpo k. Entéo £(X,¥)=0 e g(X,¥) = 0 +ém as mesmas solugées em k* se ¢ sé se os fatores irredutiveis de £,g sio os mesmos. Demonstracio. Seja p € KCX,¥] um fator irredut{vel de f. Por hipétese, para cada (x,y) €k?, pix,y) = 0 2 g(x,y) = 0. Provaremos que p divide g em k{X,Y]. Podemos supor que Y 3) Vale a pena ler a bel{ssima discusso desse processo de "nega- cao da negagao", em "Conceitos Fundamentais da Matematica", de Bento de Jesus Caraga. -13- ocorre efetivamente em p. Ponhamos A= k{x], = k(X) (corpo de fragdes). Assim, p € ALY] é no constante. Visto que A é um anel fatorial,sabemos que p é irredutfvel em X[¥]. Se, por absurdo, supusermos p +g, ent&éo mdc(p,g) = 1. Daf, existiria uma relag&o ap + bg onde a,b € ALY] e c €A, c #0. Agora, como p nado é cons- tante, exceto para um nimero finite de valores de x a equagdo p(x,¥) = 0 admite solugio. (Aqui usamos o fato de que k 6 alge- pricamente fechado). Segue-se que hé uma infinidade de valores de x tais que c(x) = 0, donde c= 0. Esta contradig&o mostra que ple em K({Y] e portanto plg em ACY]. c.a.D. Segue-se da proposigao que uma curva algébrica, dada como lugar das solugdes de uma equagdo polinomial nfo constante £(X,Y) = 0, determina (2 menos de fator constante) a equac&o de grau m{nimo: tomar o produto dos fatores irredutiveis distintos ge f. Este fato nos leva a substituir a Definigfo 1 pela se- guinte, onde passamos a identificar "curva" com sua equacéo. 4, Definigdo. Uma curva algébrica plana afim (ou mais abrevia— mente, curva) é uma classe de equivaléncia de po- linémios ndo constantes f € k{X,¥], médulo a relag&o que identi- fica dois tais polinémios se um é miiltiplo do outro por uma cons— tante # 0. Nesse contexto, a equago de uma curva é um qualquer dos po wld linédmios nessa classe. Dizemos que uma curva esté definida sobre 9 corpo k, subcorpo de k, se ela admitir uma equacZo a coe~ of ficientes em k,. © trage (resp. trago real...) de uma curva (definida sobre R...) é 0 conjunto das solugdes (resp. solugdes reais...) da equac&o. O grau de uma curva f é 0 grau de sua equagdo, e serd de notado por of. Curvas de grau 1,2,3,. séo chamadas retas, cdnicas, clbicas... Usualmente, cometeremos 0 abuso de designar pelo mesmo sim bolo tanto a curva como o seu trago ou uma sua equacdo., Por como didade, diremos indistintamente "a curve f£" ou “a curva dada pela equagdo f= 0" ou "a curva f = 0", O contexto tornaré claro quando nos referimos seja ao trago, seja ao polindmio, Observemos que, agora, as curvas X°=0 e X= va tenham o mesmo trago, s&o consideradas distintas. pensar em X° como uma "reta dupla", limite de um par de retas que vém a coincidir (e.g., X(X-cY), com e +0), ou de elipses que se achatam sobre o eixo (e.g. Xx + ev? =e), Uma curva é irredut{fvel se admite uma equac%o que é um po- linémio irredut{vel, As componentes irredut{veis de uma curva f sdo as curvas definidas pelos fatores irredutiveis de f, A mul- tiplicidade de uma componente p de f é 0 expoente com que p ocorre na decomposic&o de £; quando ® 2, dizemos que p é com ponente miltipla de f. -15- Intuitivamente, as componentes irredutfveis de uma curva £ sfo os “pedacos" que constituem f£ e que sao também curvas. Ede fato, se £ contém (oe trago de) uma curva irredutfvel Pp, entio p 6 uma componente de f£. Isto foi demonstrado na Proposicao 3, 0 leiter deve no entanto ser alertado para o fa to de que uma curva pode ser irredut{vel mesmo sendo seu trago real formado por 2 ou mais partes disjuntas. (Veja o Exc.II.3). x y= X(X-1) (X41) Fig. 7 Na vealidade, a determinagdo do ntimero, bem como da disposig&o dos cireuitos reais de uma curve algébrica plana é uma quest&o ainda no resolvida por completo’, Apesar do aparente contra-senso geométrico, a Definigéo 4& coloce em definitivo relevo o papel da equac&o que individualiza uma curva algébrica, Além do mais, frequentemente os argumentos algébricos empregados nas demonstragSes de propriedades geométri- cas se aplicam indistintamente a polinémios sejam eles irredut{- veis ou no, 4) CE. "Problems of Present Day Mathematics", p.50, in Proceedings of Symposia in Pure Math.,Vol. 28, F.E. Browder, Editor (1974). -16~ Exerefeios 7) Verifique se as curvas apresentadas no § 1 sao irredu- tiveis. 8) Ache as componentes irredutiveis das curvas: (a) Par axtynnytaxteyPaxeyeL (bo) ax?y-2xP yy? ay (c) x@-pxvs6r*, Fa xtytnt 3 4 9) Seja £, = Za,x'y" “> um polindmio homogéneo # 0. ° (a) Prove que f, é 0 produto de m fatores lineares homogéneos, i.e., f, 5 |] (byX + c,¥), onde db, , c; sao cons- tentes néo ambas nulas e as razdes b;/c; s&o bem determinadas. (b) Prove que se f,, fyy1 ndo tém fator comum, entéo f, + fair é irredutivel. 10) Mostre que Y° - p(x) é redutivel se e sé se p(x) & um quadrado em K(X]. Em particular, Y°-(X-a)(-b)(x-c) é irredut{vel para todo a,b,c € k. 11) Mostre que uma cénica ayy + agp + agg + 2ay XY + + 2a,5X + 2a,5Y éredut{ivel se e sé se det(a,4) = 12) Dado um ponto arbitrério P e duas retas distintas tye 4y contendo P, mostre que o conjunto das retas que contém P 6 {x)4)+x,4, | x),x) s&o constantes nfo ambas nulas}. -17- 13) Dados 4 pontos ndo colineares, mostre que existem cénicas fy, fy tais que, a condicdo necesséria e suficiente pa- ra que uma cOnica f passe pelos 4 pontos é que f seja da for— ma x,f)+x,f, , com x; Ek, n&o ambas nulas. 14) Dados 5 pontos arbitrérios, existe eo menos uma cénica aue os contém,se existiren 2 distintas, ent&o 4 deles sao colineares. 15) Mostre que, para todo inteiro d= 1, existem S(4+3) pontes no plano pelos quais passa exatamente uma curve de grau d. 16) Seja C acibica Y= X?, Para cada par de pontos P,Q €C, areta PQ intercepta C num 32 ponto R. Mostre que a correspondéncia que associa e cada par (P,Q) 0 simétrico -R de R emrelagio & origem O dda C uma estru~ tura de grupo. §3. Mudanca de coordenadas As propriedades de curvas planas que estudaremos s&o aque- as que independem do particular sistema de coordenadas cartesia- nas empregado. Faremos aqui alguns comentérios sobre mudanga de coordenadas e daremos a conceituac&o precisa de "propriedade in- dependente do referencial", 5. Definig&o. Um referencial ou sistema de coordenadas afim no plano x2 consiste de um ponto © € k°,chamado ori~ 1 ca: gem _do referencial, e de uma base {v,,v,}. 0 referenc = (0,1). 0 ye~ nico é dado por © = 0(=(0,0)), v, = (1,0), v. tor coordenadas de um ponto P € k* em relagdo a um referencial a = (8,{vy,v,}] 6 0 par (P)p = (x),%)) tal que (5.1) P= 8 + XyVytXVD + Una transformacio afim ou afinidade em k? & uma aplicaciio t: k@ +? composta de uma translago com um isomorfismo linear. A ambiguidade aparente na ordem da composicéo é irrelevante, pois se L uma aplicagiio linear e PL €k® , temos L(P+P,) = = L(P) + L(Po)s Isso mostra que uma translagéo seguida de uma aplicagéo linear tem o mesmo efeito que a (mesma) aplicagdo linear seguida de uma (outra) translacgdo. Toda transformagao afim é da forma Tog Xp) = (¥q1¥o)s onde ¥. = 879% + yp% + 8] (5.2) ¥2 = 821%] + Ay%2 + AQ + com det(a, 5) #0. O leitor verificaré sem dificuldade que as afinidades formam um grupo com a operagéio de composig&o. Em par- ticular, a composta de duas afinidades 6 uma afinidade, e a inver- sa de uma afinidade também 6. Escrevendo vz = (8@)71891)1 Vg = (892899); © = (a4185), podemos interpretar (5.2) como as equagdes que relacionam P= (yj,yz) com (P), = (x},%5). E reciprocamente, podemos cou~ siderar (5.1) como definindo a afinidade, -19- (x1 ,%) HO + XVM) + XQVy + 6. Definicao. Dizemos que a afinidade TI e o referencial a sie associades se T(P)p =P @ PEK), Assim, podemos adotar 2 atitudes diante do processo de mudan ga de coordenadas: dada uma afinidade 7, podemos olhar a rele- g&o (yysvp) = Taysx,) como a expresso que ad as novas coorde- nadas de um mesmo ponto em termos das antigas; os pontos ficam e as coordenadas movem-se. A outra possibilidade, é a de conside— rar T agindo sobre os pontos do plano: (yy2¥p) é a nova posi- cao de (41%) com as coordenadas todas tomadas em relag&o ao re ferencial canénico. 7. DefinicSo. Uma afinidade T: k°—+ k® induz um k-automorfis- mo do anel de polinémios em 2 variéveis, T,3 KLXy,X_] + kExX,,X] tal que, ” (xpxy) ©, (Df) Ge Hy) = (TMOG) Mais precisamente, se TUxysxy) = (byyxy + Dyoxy + Dy DIX] + PypX + By) > entiio (T 2) (XX) = £Coqy3 -20- 8. Proposig&o. Sejam f uma curva e T uma afinidade. EntZo o trago de Tf é igual & imagem do trago.de f por 3. Demonstrac&o. Imediate. 9. Definigdo - Seja T uma afinidade e seja 2 o referencial as sociado. A equacio de uma curva f em relagdo e a 6 (te A definigao se justifica porque, para cada P = (x,y), te~ mos Péf +> f(x,y) =0 a> ((2,)2)( (x,y) = 0 a> ((1,) 12) ((P)g) = 0 - 10, Definicio, Dizemos que uma propriedade ® relativa a curvas (ou a configuragdes planas, tais como conjuntos de pontos, retas, etc. ...} € uma propriedade invariante ou inde~ pendente do referencial se, para toda afinidade T, wma curva f (ou configuragio ¢) satisfaz © se esd se T,f (resp. T(¢)) satisfaz P. Por exemplo, o grau de uma curva é uma propriedade invarian te. A proprieiade de 3 retas serem concorrentes, bem como a de um porito pertencer a uma curva, séo invariantes. J&'o requerimen to de que 2 pontos no plano real sejam equidistantes de um ter- ceiro nao é invariante; no entanto, a propriedade de um ponto ser colinear com, e equidistante de 2 outros é invariante! (Leitor: verifique!).

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