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odo vivo uma grande eam evel &, elim, reabelcer umn gende harmonia (ocviti, 219), © principio solar explicaria, de certo modo, aim, yoreincia acribuida Bor essa cultura 20s ritos envolvendo a morte ¢ a oluséo das formas & estados, inclusive através de sacrificion, A “queima” periédica daquilo na cfetivamente 0 apcgo 3s formas, 0 desc de a todo custo, cistalizas a vida e negat a more, ¢ enearada como uma acto profiitica c terapéutica, que recondus + ereepeio da transitoriedade do existente © do que Artaud chama de “superioridade” da morte sobre a vida. Ao mesmo tempo, ¢ paradoxalmente ant titos reintegrariam a por toda ptt oPerando desse modo um forte impacto ue se fz sentir Por tods a exstncia. Ble x tradus, por exemplo, he atitude desprendida cap lose, na generosidade © na alegra, preentes ne comportamento de ‘nuitos indigenas, e que tanto chamou a tengo do colonizador europeu, Ritos Tarabumaras © apenas para proferic conferéncias ¢ # Seu interesse principal sempre foi o de ents a contato caunne, Poulet: indigenas: *(..) desea eserever wa livro sobre o eee mas tenho falta de elementos que s6 nos locale osso obter: (OCI, Sane fs, 0s costumes das tribos aurdcrones atuténticas (OCIX, 232). Seria mesmo estranho para alguém que dizia querer “fugit di civilzagao europeia’, manter-se no tnbitn da universidade © do Jornalismo. © livro Ler Tarabumaras foi publicade apenas em 19 ‘eunindo textos produzides ao longo de rae Ge sua estida até um. poema produzide em 1944 (Tutuguri), sea antes de sua morte, € que acabou endo parte da emissao ‘aiofnica Pur en fnir avec lejugementde dine Artaud conseguiu permissio oficial pars uma estada junto aos Indios Tarahumaras, grupo do tronco Tinguistico ‘nahuas” (cuja tribo Principal era a dos Astecas), habitante das montanifas do noroeste do Antonin Artaud ~ Teatro e Rieual 173 Povo némade, provindo da América do Norte, vive da -& Possui rituals religiosos nos quais sio ingeridas porgées a planta[Peyorl,Jtambém chamada Por eles de Ciguri, Arcaud relatou algumas dificuldades vvidas pela eribo em fungi de sug religido, ja que fre mexicano nao via com bons alhos as fests sagradas crn que 0 ever! era ingerido, Por isso, era comum que tropes do exenac, destrutssem periodicamente os campos de planta aldeia, Anaud presenciou a revolta dos in dss tipo. Estando hospedado na Escola Indigena inslads pelo Estado, rou intervir junto 20 ditetor (q -omando) no sentido de facilitar 86 assim seria possivel “apaziguar os animes”, ambigua do diretor mestigo,)uma “autoridade” que tinhs cen simpatia ndios,acabou possibllanda 6 contato de Anaud eam os sceneone do Ciguri | ___Mesmo antes desse encontro capital, Artaud fer uma série de observagdes sobre © comportamento e as atieudes indigenas, de grande importincia para compreendermos a natureza de sua busca no M os valores ncla implicados. Apesar de re ‘ativos tinhgy se transformado em repetisSes mecinicas de ume tradicao Sratecida, Artaud mostra-se preocupado em reconheccr as mans Profundas de uma cultura que servisse de contraponce & ‘mentalidade comme dinge tlt oF exemple, 0 desdém dos indios em relagio as gomodidades ¢ confortos que os europeus associam an ‘ I resistencia A fadiga”, 0 “ formentos ¢ pelas doengas” revelariam a pro ainda mantém “das forcas da natureca’ redos (OGXIX, 69). Tnreressa-Ihe @ distanciamento que os nativos cultivariam em sclasdo as proprias sensagdes, ejam elas agradiveis ou desagradaveis, atitude que se choca frontalmente com a idéia de contort ‘material cultivada no ocidente A indiferenga quase estSicaldianee dec mazelas ¢ Brzeres isicos eraducnia uma peculiar vio do corpo huumanos "(.) ‘ndio Tarahumara no atribui ao corpo o valor que aés europeus lhe 155. Algumas informagées sobre os Tarahumaras podem ser encontadas em (1985. 174 Antonin Artaud — Teatro e Ritual asribuimos, ¢ tem dele uma nogio totalmente outra” (OCXIX, 15). se trata de uma visio “pecaminosa” do corpo, qu ria priticas asecticas, jf que “para eles, o mal nao é 0 pecado. Para os Tarahumatss, nio hd. pecado: 0 mal é a perda da consciéncia” (idem:70), Ao i disso, haveria 0 cultivo de uma impessoalidade na relagio com corganismo: a realidade corporal ndo & per. smo 0 fundamento de lima identidade. © corpo existe como uma exterioridade descolada da nosio de “cu”. Essa desidentificagéo permitiria, a0 mesmo tempo, 0 aprofundamento da capacidade de perserutar 0 organismo e de conhever seus mistérios, sem 2 compulsto de fixi-lo em imagens ¢ representagbes. Ao mesmo tempo, tal “distanciamento” dos fendmenos fisicos ¢ sensoriais nao desemboca numa dualidade do tipo “corpo-alma”) Os Tarahumaras nio de itimento de identidade para uma dimensio “psiquica’ da individualidade, representada pelas experiéncias "mocionais ou racionais, que se oporiam 20 corpo. Para Artaud, os indios sabem também fazer “o sacrificio da sua consciéncia”, sendo nesse trabalho “orientados pelo Peyot!”!*. Mas que “consciéncia” ¢ essa que os ritos do Ciguri destronario para instaurar um novo tipo de experiéncia? Na *plicitagio de Anaud, é uma consciéncia que opera de! modo seletive k, imuitas veres, de forma automética) circunscrevendo o campo de fendmenos e excluindo outros: Ener todas as idéias que passam na nossa cabeca, hi aquclas que aceitamos ¢ outras que no aceitamos, No dia em que nossa onscigncia e nosso eu se formaram, ui ritmo distinsivo e uma escolha natural se estabeleceram neste movimento incessance de ‘ncubagio,obrigando nossas iia proprias ex elas asobrenadarcmn no campo da 2 sendo 0 rest aucomea ‘Talverprecisemos de um tempo pata tlhe amos nossa propria figura (..) (OC erito em 1943 ao hospital isa que me impzessionow fo fadio ) parce er desu conseaca eo ito de ser neste bal. condurdo pelo Peau!” Nos excritos de Redes, a ingoagea de Arad ¢ | pecilmente marca pelos terns da mites erst Anconin Artaud ~ Teatro ¢ Ricual 175 © sactificio dessa “consciéncia” traz, portanto, 0 mesmo sentido da impessoalidade e da “nio-identidade” que pautaria a relagéo dos Tarahumaras com 0 corpa. Um sacrificio que apagatia as marcas, discintivas pelas quais figuramos um “rosto”, regido corporal que tende a concentrat os caracteres que atribuimos 4 individualidade. Nao é um rosto fixado o que Araud ¥é no semblante indigena: “os sentimentos que inradiava passavam-lhe um aps.o outro pelo rosto, € 08 que se liam nao eran manifestamente os seus; nao se apropriava deles, jf no se 1m aquilo que é para nds emogio pessoal (..)” (idem: autor). Os sensimentos ¢ estados mentais fluiriam pelo rosto as aguas de um rio, sem se sedimentarem. J no rosto do hom {que se constréi como individualidade, haveria uma “incubacai imediata”, processo veloz e quase imperceprivel, que faz nascer a cada instante 0 sentido e 2 imagem de um “eu” que se assegura de si. Entre os ‘Tarahumaras néo haveria 0 culko de uma subjesividade que se ancora e constrdi pela circunscrigso de estados psico-fisicos geradores de identificagio, Principalmente no caso dos sacerdotes € nativos mais comprometides com 2 a tradigio espiritual, cbserva-se uma buse2 continua pela liberagio do cftculo Techado da individualidade, através dos sitos ¢ priticas que proporcionariam a imerséo num estado nao mais condicionado pelos limites do “cu”, « Arcaud se debate, a0 longo dos textos que compoem Les Tarabumaras, com os termos que usa para designar essa experiéncia (“infinito”, “ilimitado”, “incriado”), assumindo por vezes 0 vocabulitio a crista, que serd depois renegado, apés sua safda de Rodez. dilemas expressam a violenta crise espiritual que ele enftentard, a za Irlanda, em 1937, inaugurando um longo perio de inceenac De qualquer modo, suas bes tornam claras as diferengas da experiéncia que tem em mente em relacio 2 maneira de se pensar 0 “ilimitado”, tipica do pensamento clissico europeu, deserito por Foucault”, em que diferentes ordens de realidade podem sempre ser elevadas ¢ desdobradas até 0 “infinito”/O por Foucault ¢ feito da composicio das forgas do-homem ¢ da natu 40 desdobrados a partir de um nticleo central, de uma “fo ero ensio de Deleuze (1987:167-179) a respeito de Focault, “Sobre a Hoomen¢ 0 Super Homen’ 176 Antonin Artaud ~Teatroe Ritual Deus’. Para essa idéia central convergiriam todas as séries de criaturas e modos de existét ‘em Artaud, se hd, em alguns momentos, a utilizacao ‘que nos aproximasiam dessa persp. referéncias, na verdade, so ouras, Scu interesse & pela que desenvolve umateologia negativa} na qual a forma-Deus é constantemente “atacada”, tendo em vista constituir a abertur permitiria uma experiéncia do(Deus-abismo"™ So essas formulagies ‘que poderiam ter alguma proximidade com 05 fritos de aniquilamenco? dos Tarahumaras, Se Ciguri é uma “divindade”, cla nfo possui forma ou “rosto”. Ciguri € apenas um nome possivel, que mascara ¢ revela uma cxperigncia, que pela sua propria natureza transborda os limites da linguagem, colocando-a sob extrema tensio. Participar dos ritos Tarahumaras torna-se assim 0 modo de se aproximar do cerne de sua tradigao. [Os ritos indigenas encarnam plenamente a ideia arcaudiana de um teatro que se Consttui como evento fundamental de uma culeura, local em que o préprio organismo do homem € reconstruido. Mas penetrar no mundo dos rites implicaria na passagem por uma série de etapas preparatérias, Artaud logo percebeu que o contato com 0s sacerdotes do Ciguri ndo seria vio Ficil e imediato: “(..) quem me abriu caminho 20 Ciguri foram os sacerdotes do Tutuguri(..) Quem preside as relagdes exteriores entre os homens & 0 Senhor de Todas as Coisas (o Tutugusi): amizade, compaixio, esmola, fidelida generosidade, trabalho” (OGIX, 11). Desconsiderando a po descrever as qualidades do Senbor de Todas as Coivas, jue Artaud fax referéncia a uma etapa preliminar ¢ preparatéria ‘nas quais sio desenvolvidas qualidades relacionadas 20 contrale dos impulsos egocéntricos.| Generosidade, coragem, determin. fo nesse sentido apenas qualidades “morais”, mas requisicos “técnicos que preparam o candidato para a experiéncia de dissolucio da individualidade que esta no cere do sito, Sem essa “purificacio” inicial, 08 rigidos limites da individualidade, a agio do entes dest miscica do "Deus sem Forma” em Sao Joie de mo jf disemos, os textos de Artaud exerts em Redcr so frtemente marcados pelo voctbulisio esto, Antonin Arcaud—Teatroe Ricual 17 = Dor demais devastadora. Nao se deve encarar tal processo Preparatério aie aide Puttano. A experincia do sagrado nas sociedades. primitives nio pode ser enquadrada nos parimetros do que entendemen por moralidade religiosa. (Como demonstraram diversos autores", 0 sentido sutaico do sagrado no pode ser reduzido & moraizagio Posterior da ‘igo, jé que tende a ultrapassr todas 26 dualdedes (beg, mal, belo © Feio, tile inutil,éxtase e terror). Ao assinalar as duas etapas do sto tarthumars, Artaud desta a ceunsia do comportamento alrusta e disciplinado, 4 repara o candidato para penetrar em dominios nos quais as miltiplas formas de identificasio ¢ crisalizaiio do “eu” serio abuladas con an rafzes, Assim, ocultivo de qualdades como ada “generosidade”, por exemplo, ajudariam a dissolver o¢ rgidos limites de uma individualidade enclausurada. Por enna Pode almejar aos “estados” prometide pelo Cigu! sem ea stenuasio inicil das tendéncias contriias a0 processor ‘Ninguém pode se: iniciado no Mésico, quer dizer, ninguém pode Feccber 2 ungio dos sacerdotes do Sol ¢ a marca iment reagregadora dos que pertencem ao Ciguti, que é vito de aniquilamento, se antes nao for tocado palo gidio do velo cick, indio que preside i paz e guena (.) (OCIX, 1) Submeter-se ao glidio e a0 poder do “velho chefe” que preside a relagio entre os homens € prova indispensivel, sem a qual no hi Renetracao nas experiéncias mais profiundas umbres metafisicos que o eto po impossiveis sem 0 contr qualidade desenvolvida no sanyo emo euros Homens. Num artigo eserito sobre ¢ arin ‘na Maria lequierdo, Arcud jf havia tecido algumae en ideracses Sobre o eoinportamencoindigena, marcado pela "auéncis i sentimento

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