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; i Jacques Le Goff e Pierre Nora HISTORIA: © A religito: Antropologia religiosa ALPHONSE DUPRON'T ‘A ANTROPOLOGIA religiosa estabelece-se como conhecimento — ou ciéncia — do homem religioso. E sem diivida uma observacéo parcial sobre a totalidade da existéncia humana, mas uma das que mais apreendem, porque toda vida religiosa, seja individual ou coletiva, é chave de unidade. No sentido de que ela exige ¢ coloca a vida do “além” — esse “além” necessariamente ligado 4 existéncia humana —, assim como, em sua soberana leitura do universo, implica o maior niamero de participagdes em todos os aspectos do césmico. Finalmente, qualquer que tenha sido 0 encatnicamento do ¢spisito moderno em dividir, até querer separar a-religifo das outras formas da existéncia, consciente ou subliminar- mente, a necessidade religiosa, que harmoniza na medida do possivel o irracio- fal e 0 tacional, permanece pega essencial do equilibrio humano, assim como do poder de testemunhar: 0 que é a0 mesmo tempo, criagio € violéncia, Assim, © homem na religifo esta, ao contririo do que pretendem anilises hoje em dia tltrapassadas, no exercicio ow em busca do todo-poderoso, © eligioso exprime © humano quase em sua mais alta ¢ mais enérgica medida, E 0 faz — 0 que fateressa & historia — através de uma considerdvel “espessura” humana, tempo- tal. © fenémeno religioso pertence, do ponto de vista temporal, a0 longo prazo. Mais ainda: as suas transformacSes, mesmo a sua evolucio, sio muito lentas, no que se refere aos hibitos adquitidos ¢ & visio do mundo. 84 HISTORIA: NOVAS ABORDAGENS g <2 9) Que a religifo seja cosmogonia ou religiéo étc oO ofhaneira de alterar, do modo mais leve possivel, 0 pode! eo <>) librio que detém. Entre as diferentes expresses di a mais profundamente estavel. Isso se pas ct antropolégica, a saber, que a duracio cria a venerabilidade.e_que e550 4— venerabilidade, uma ver estabelecida, ainda toma mais espessa a duracio. O nosso ranto & solide das religides; que nfo tempo, quanto & s i nos iludam, no entanto, as explosdes, as vezes vertiginosas, do que se Sgr 20 Vaticano II, em nossa interpretagio ocidental das coisas: essas explosbes 30, sem dévida, stbitas, mas preparadas, no mundo catélico, hd trés séculos, como tuma assimilagio lenta das putezas religiosas da Reforma, qualquer tenha sido a vitalidade tenaz, para no dizer “triunfal”, dos equilibrios tridentinos. Através da experiéncia religiosa, o homem vive num ritmo lento, o qual oferece, quando apreendido em seu préprio movimento, uma ‘extraordinaria e talvez unica possi- bilidade de decifrar confissOes e testemunhos, e o duplo sentido do combate de | existir e da interpretacio que o proprio homem dé a si mesmo de tal combate. Desse modo, 0 tempo longo ¢ 8 eternidade, ou antes, a extratemporaridade sto na a fandidas “na mentalidade ‘coletiva. Assim, a hist6ria vali ial o-normativa, no haveria .t das chaves ou do equi- iedade dos homens, ¢ a sa em virtude dessa outra rel realidade damente estabelecer-se como fornecedora de mate Tsso passa-se com toda histéria, mas no caso da histéria religiosa o processo . | i extremamente Jento. Essa massa de profundidades, de vida interior, desen 972, volve-se na duragio, no tempo, com uma pesada “Bravidade reverente. A. hist < permite, com o seu duplo desenvolvimento, no espago ¢ 10 tempo, a quantiFicaca « SQuantificar € 0 tratamento estético do macigo, ao mesmo tempo, manifestagao OX deste ultimo, apreendida em sua “espessura” e medida de sua dispersio. O que > hhé de ambigio de universal, na velha formula, t2o cOmoda para 0 espirito mo- p demno, do “homem de todos os tempos ¢ de todos os paises”, fundamenta-sc, fom uma outra forca, pela quantificagio. A apologética moderna, também ela - aniversalizante, invocava sem cessar 0 consensus omnium, De todos? Quem é Q) oF 9 que pode apreendé-lo? Mas conseguis, pelas cifras, extrair a amplitude da_neces- » sidade, da-atitude, da pritica_ou_da visio na sociedade _dos_homens Constitai uma maneira de ultrapassar as fragilidades de uma comparacio comparacio muito-naturalmente inclinada “a fazer inducbes, images necessariamente ocasionais. O idioma das cifras € apenas uma perspectiva para o estabelecimento do comum, do ponto de vista antropol6gico.-Mas, como sai da historia, esse idioma assume uma ‘segura particular, porque a hist6ria, se cla deve abstrair o material da quantificacio, negar-se-ia ela propria nfo conservando, para cada dado que fornece, as garantias do arraigamento temporal. Tudo 0 que cla confronta na homogeinizacio natural do niimero guarda sempre alguma coisa do terreno original. A quantificacio, a partic da histéria, nunca elimina. completamente as singularidades. A contri- buigio que ela traz € 0 dado s6lido do “comum”, que é sobretudo visio mental de sémelhancas, a observagao do “mesmo’ no desenvolvimento temporal da pre- sencz, ou melhor, talvez, da agitagio humana, Para apresentar o exemplo mais facil, embora, quanto ao cariter do material, um tanto dbvio, é certo que os numerosos estudos de “pritica religiosa” feitos com uma particular autoridade po a partir de aproxi VX w Ww ‘6" sidade_sacramental, em primeiro lugar, condiciot A RELIGIAO: ANTROPOLOGIA RELIGIOSA Ld jor (George Le_Bras e por sua escola, trazem uma interpretagio solidamente Namentada. dos comportamentos coletivos de religito no campo geogrtifico eas Tal interpretacio pode ser conduzido segundo a diacronia, mas, qUASe yo" as relagbes sincronia/diacronia, existem provas macigas: a prova da neces- A ) Social, la largamente pela _pressio~ social, @, portanto, uma fixagio de relagdes-de Zo entre o natural € 0 renatural; as corres; et 5 pe ondéncias com o césmico da vida litirgica coletiva & © na vida, dessa coftespoméaca e nos ritmios 0 tabilho agricola o conflito qusse permanente entre a Festa litargica e 0 campo; oposi¢io ow conciliagéo entre. a socigdade_eclesiéstica € 08 aspectos sagrados do césmico, aspectos considerados " } Como pagios; ainda miais profundamente, os componentes psicossociais do confor- misino ou da_necessidade sacramental; finalmente, as diferengas de comporta- mento ligadas ao meio fisico e a0 meio ambiente. Tal € 0 material, ou uma Parte do miatetial, cuja interpretagio € de uma importincia facil de medir, no | caminho de atingir-se uma certa qiiintesséncia do homo. religiosus; somente. & histéria, isto é © dado ¢ a meméria de base, pode permitir o tratamento refinado, fora do qual correr-se-ia 0 risco das generalizacbes qui tudo igual — (© que & de todas as formas da abstracio, a que apresenta maior perigo —, ou de um 'verbalismo sedutor, 0 quedilapidaria_o pattiménio das experiéncias mortas. 7 Esses perfis de penetragées reciprocas entre a vida da religiio no tempo se € a hist6ria estabelece 0 acordo possivel e fecundo de dois caminhos do conhe- ar Cimento ou olhares langados sobre as realidades da experiéncia humana, indivi- "°° geal e coletiva, Para melhor, no entanto, fundamentar a certeza, é util definir, Ce is do que acabamos de fazer, 0 que quer, ou pode ser uma antropologia reli- ie giosa, E evidentemente um conhecimento do. homem_em_seuscomportamentos — |< -?.> “feligiosos. Dascrlagbes-da-espécie, da raca_ou do meio que,-em_si_ptdptios, <7 2.07 condigionam-se para uma busca do além. E uma andlise dos mitos ou das cosmo- ~” gonias, das estrutiiras que os alimentam, do desenvolvimento de um duplo, no qual se exprime a vontade de poder, ou seja, a prépria dinimica d toda existéncia religiosa, que é uma forma de ultrapassar no além ou na subli- macio a vida terrena, sendo também uma plenitude do ‘presente na posse do instante ¢ fonte da carga energética necessiria & busca. Para esse conhecimento concorrem todos os sinais da experiéncia ou do estado religioso, desde o cariiter macico dos fendmenos de pritica, medida de um impacto vital coletivo, até a | andlise dos mecanismos mentais, sobretudo dos postulados ocultos nas_elabora- | Bes doutrindtias. A definigio © a vida das instituicées, de suas relagGes com j imeio ambiente ou mesmo, como € a paixio € 0 esforgo do mundo contem- | posineo, a coexisténcia mais oa menes harmonizads. no préprio homem do | verso religioso € de outros universos nao menos absorventes, senfo substanci ou seja, a economia mental e verbal do cerimonial litirgico, a constituigio dd * modelos exemplares sob a forma de santos ou de herdis, a ret6rica dos serm@es) j fou a l6gica catequista, tudo isso consiste em meios de compreender comporta, mentos € necessidades, ¢ so constituicBes do universo onde se descobre o misté- tio do poder do homem em sua vida religiosa, Isto é, a maneira pela qual 2 arranjou esses limites onde é possivel passar de um a outro mundo, ou de mani- festar um mundo a0 outro. Todos esses sinais, algumas vezes desmesurados, falam | 86 H ‘ MISTORIA: Novas ABORDAGENS do homem, yy, imeizo Iujg et 28ttopologia teligiosa é ; a Primeiro lugaP “tiaras oot eligiosa é interpretacio_desse conjunto; é, em ter eh conte > na Teuniao paciente- dos“clementos-que-o compéem, lepois de loa io, depois, sem indugBes _preci- Biosidade & no entanto, impulso religioso, ¢ sempre, seja busca ou consciéncia clementar do sagrado, coloca um universo F : ligioso ou uma maneia religiosa de aproximacio da existéncia e das coisas. Em seu conjunto, a antropologia do sagrado é quase dado imediato; 0 seu material, bruto sem davida, é freqiiente- mente manifesto, ¢ Sobretudo € mostrado de forma maciga, pois um dos terrenos da evidéncia € constituido pelos cultos populares. — um’ dado inumerivel, no qual as praticas os Sestos, os ritos aparecem como uma linguagem de expressi- vidade comum, da antropologia no lugar. Essa facilidade de aproximacio, na qual a principal dificuldade consiste na imensidade do material, ndo nos deveria, Po, Cnfanto, conduzir a resumir, muito, o sagrado- O sagrado é essencialmente vida do objeto; h4, todavia, uma criagio do sagrado qué precede o objeto e que pode permanecer sem” objeto. uma dupla reveréncia ao total, a da ambiya- | Hencia: a criacdo sobrenatural e tudo o que, por qualquer via que seja, € sagrado 7 © vem do alto; a criacio coletiva, intra-humana,em-que o BTupo, 0 meio, a socie- | dade reconhecem-seno instante ou no tempo, ‘como portadores, de poder sacral. \ _ Uma antropologia do sagrado que, como tal, quer constituir-se deve reunis { /%8 contribuicées dessas trés vias essenciais em que se manifestam, na experiéncia humana, sagrado e a ctiacio sacral. No que se tefere a0 intra-humane que € muitas vezes o que se consegue menos discernir, de um ponto de vista cienti- | fico — o material do reconhecido, do admitido, do herdado, e, portanto, de um Patriménio constituido no tempo, é fornecido pelo inventirio dos valores ditos sagrados, das proibigoes, dos cultos ditos de meméria, como os monumentos aos niortos das tiltimas guerras, os hébitos de linguagem e de seus usos cotrentes Nio se poderia, por isso, negligenciar a criagéo do sagtado no presente. As comunidades que séo ditas de base ¢ que crescem hoje em dia em certos teios das Tgrejas cristis ocidentais vivem, incontestavelmente, uma ctiacio do sagrado, fundamentada em sua leitura do Evangelho, sobre a sua propria maneita de receber a palavra e sobre as suas diferentes afinidades eletivas , Em torno do tamulo de Charles de Gaulle concentra-se um culto do corpo, de meméria hist6- rica € de idealizacio coletiva, em volta, sem divida, “de uma certa idéia da 2. 87 A RELIGIAO: ANTROPOLOGIA RELIGIOSA Franca”, Assembléias efémeras vivem estados de sublimagio, frente a um Con Jo, em paraxismos de exigéncia, de tensio ou de exorcismo coletivo, quando das grandes demonstracbes culturais, sejam paradas ou desfiles militares: essas sobre o sagrado “intra-humano” tém todas uma fonte comum, os impulsos, & vida do irracional na alma coletiva, irracional cuja dinimica “existencial” pro- cura o Outro, procura ultrapassat-se, satisfazer-se, procura poder, procura subli- macio. E essencial, com efeito, a essa realidade do sagrado nunca ser egolatria = © fdolo pessoal € sempre separado do rebanho — ¢ cristalizacio narcisistica estéril; 0 sagrado procura—o- seu- lugar. natural, que é 0 além, mais ou menos imanente A exaltagio ou ao pinico presentes, E uma dinimica que desemboca Fo ercontro com a outra realidade sacral, a manifestagio sobrenatural. Sio os lugares consagrados, desde 0 alto, pela tradicgéo da histéria sagrada, 0 arraiga- ‘mento cosmogénico, a existéncia humana do ser divino, a aparigio ou a mensa- em; € a presenca do acontecimento ou da vida do que nao é terreno ou do umprimento da promessa divina; € a consciéncia coletiva da participagio numa historia sagrada, ou, de forma mais elementat, na vida sagrada coletiva, neces- sidade_de presenca; encarnagio do livro ou da palavra, realizagio do que foi escrito ou anunciado; sejam miticas ou lendirias que unem, ao nivel da existén- 4% @ natureza e o que é sobrenatural, sio outras grandes vias pelas quais o que € humiano procura o cariter sagrado da presenca, procura torni-la sagrada. De que se Base No interior do homem pode-se dizer que permanece um -impulso itracional, A manifestacio do que & sobrenatural, como tal, é de uma ordem diferente. O nosso conhecimento, o qual, quanto a essa ordem, deve ter uma reveréncia perfeita, pode apenas registrar os tracos, a fertilidade e tracos psi- quicos no coletivo humano, que recebe essa ordem do alto ou do além. Nesses limites entre a transcendéncia ¢ a imanéncia, entre a natureza e 0 que & sobre- natural, o fervor do sagrado conhece uma palpitante intensidade, um ardor de ctiagio, criador e alimentador excepcional. Todos os seus sinais do humano assumem um poder de expressividade de ambigio do sagrado, desde as palavras da aparicio até as lendas inumeriveis pelas quais 0 imaginétio humano concre- tiza © comércio quase inefavel entre os dois mundos. © material mais imediato de uma antropologia do sagrado continua a ser, no_entanto, 0 objeto sagrado. Tudo tem o seu objeto de fixacio: culto de corpos santos ou de reliquias, culto de lugares sagrados inscritos diversamente no. cosmos ¢ na histéria, adoragio de imagens ou de outros objetos, oratérios & | beira dos caminhos ou cruzes nas encruzilhadas, esses impulsos de adorar ou \ de recorrer que se agitam na alma coletiva. F fixacéo que, evidentemente, impde consciéncia e resposta. Pelo objeto, o influxo sagrado retorna ao homem em oracio, multiplicando a sua energia criadora. No coracio do siléncio e do mistétio, esse diélogo de que se fala muito hoje em dia — as vezes fala-se demais, @ apenas das palaveas — foi sempre precedido, do fundo dos séculos, dessa troca de recursos sagrados na qual o objeto, sem palavras e fora de qualquer azo, impde a manifestagio. E, alids, em seu impulso conjutatério, a linguagem da imensa multidio 4 procura de ultrapassar-se, e, portanto, a procura de reli- giao. A materializagio é aqui vida cheia de profundidade. & um -caminho de dentro para fora, ao encontro de um caminho que se poderia dizer de conhe- cimento ou de cultura, que se desenvolve de fora para dentro e que tende, Tae i I j { 88 HISTORIA: NOVAS ABORDAGENS naturalmente, a suprimir o objeto. Esses cultos exteriores ¢ inumeriveis, onde niio hi distingio entre Grego e gentio, ou entre “culto” e popular, nos quais, no ato coletivo de busca e de participagio no sagrado, todos se encontram confundidos, impéem-se como um dado antropoldgico elementar, mas ja raiz ¢ seiva do homo religiosus. Tanto mais que todos, cultos de conjuragao ou de re- curso, sio cultos terdpicos. Essa forma de curar € a mais comum, e também a mais quotidianamente tocante, do impulso fundamental da existéncia humana em sua ambicio de poder, e que é nio morrer. As soteriologias ensinam as socie- dad&shumanas as maneiras de vencer a morte ou de ressuscitar. Com o recurso te- ripico, que nunca foi ensinado, mas apenas explorado — 0 que mantém no im- pulso 0 seu cariter original de necessidade vital, talvez animal — trata-se de libertar do mau fisico da vida quotidiana. Nessa crispacio ou nessa angistia do equilibrio vital, ¢, portanto, do poder de existir, o que & sagrado conserva uma surpreendente virtude. O objeto sagrado cura 14 onde os remédios caseiros € a icina popular no sio suficientes, num encontro extraordinério em que in- tervém a crenca no sobrenatural, algumas vezes a manifestacio do sobrenatural, a exigéncia humana de integridade, do normal e do nao-sofrimento e o desen- volvimento de uma energia vital sem medida. Esse objeto toma forma humana no mundo cristio: 0 que permite so_& palavra, mesmo_muda. E orar pela_cura,-pedir_a_ = ¢. Tao comum e tio aguda quanto a doenga € a terapia. Para ela contribui a vida mais difusa do que é sagrado, certamente com elemento popular dominante, mas sempre no fundo visceral coletivo. Imenso material que se interpreta quase com facilidade, exceto no que se refere ao sew mistério terdpico, Em_nossas velhas sociedades ocidentais, 0 antropélogo, se quiser conhecer a totalidade do material, deve, primeiro, constituir tal material. Pertencem i investigacio mais ou menos etnoldgica, diversificada em seus caminhos e de uma extrema diferenca de natureza e de tipo de aproximacio, os dados que servirio a estabelecer o seu material. Investigagio no presente, e que, em seu desenvolvimento, pode ser tentada a cristalizar-se, justamente num eterno presente, Porque, no inventirio do que € sagrado, acumula-se o testemunho de coisas que subsistem desde sempre. Mesmo num momento como o nosso de interrogacio tenaz e andrquica, desde que se investigue, por exemplo, peregrinagdes e cultos populares, a resposta que se obtém € banal, quanto & duragio. Fora do tempo, “sempre",.éa medida popular do que é sagrado. A alma coletiva nio concebe, no carter clementar de sua energia sacra, a imersio no tempo dessa realidade gue, para ela, pertence a etemnidade. O que é sagtado desafia 0 tempo, porque justamente constitui um instrumento, uma arma Para vencer o tempo. Por sua natureza, recusa a histéria. No entanto,-o-inventario do que é sagrado conduz- nos & histéria. Isso pode decorrer do estado de usura em que se situam esses cultos. A escala de continuidade estabelece-se simplesmente de uma sobrevi- véncia de meméria ainda intacta a uma duracio sempre maior, algumas vezes de mais de um milénio. Isso coloca, em germe, os problemas da vitalidade da necessidade coletiva, dos condicionamentos, ou dos mecanismos esgotados ou ativos que mantém essa vitalidade, do desaparecimento ou da petmanéncia das circunstincias hist6ricas, das transferéncias seja no mesmo lugar, seja para ouitro. Bs ® o Lo” entre a Virgem, em sua gruta, ¢ a uma “ satisfagio coletiva da necessidade de peregrin 89 A A RELIGIAO: ANTROPOLOGIA RELIGIOS. tanto, i i tempo & Por j de da anilise da vida no teNP- i is fc N feanoitas a jo, um inventitio exaustivo ‘primem hist6rica. No campo francés, por exemplo, i | populares numa rexito determinada, cultos todos, tere teas, impoe um sob a forma de peregrinagdes institucionais, individuals ov OT tedrio, a come certo ndimero de primeiras evidéncias. Numa visio do tempo rte do sécul0 XIX, gar pelo plano contemporinen, ou seja, nosso século ¢ bos pate a fim modelo” de peregrinacio, numa maneira de centralizaslo MT curdes, Nua TasEicaie cada lice francesa gian(wtouny perce) ar ; em mas sio muitos os cultos da Virgem de Lourdes reconstitutdos um eae toda parte, no interior da Igreja da pardquia ou fora, aproveitando, Po wando # tuma ‘grate natural ou uma rocha na qual se possa abrir uma grit, Ter a, grata nio & fabricada em todos os seus elementos. © iiltimo aper eearat wiles fe mais e mais estes anos, € 0 didlog imago de Lourdes, que tende a espalhar-s e a "ote ' i distincia que exprime reverénc's, uma | Bemadeite de joelhos, em sya roupa de pequena camponest pobre; Por s}te esse modelo, e no, por exemplo, La Sallette ou Pontmain? S6 a histéri pode responder a essa pergunta, Jevantando uma quantidade de imponderdveis ¢ in indo assim o fato no fendmeno mais amplo, patente no nivel dos. culos | peregrinos no periodo ‘contemporineo, de uma agio da Tgreja tendente,, pot Gaminhos conscientes mas também inconsciefites, a agrupar de outra manciré & agio nos grandes centros, nem que autéctones uma populacao até encontrari facilmente lugar a para isso seja necessirio desarraigar de seus cultos entio sedentiria, Entre as respostas da histéria, anilise marxista: o desenvolvimento das estradas de ferro aumentou 0 espago do sagrado, enfraquecendo-o de cetta forma, transformando em seus caprichos, suas expectativas, seus valores penitenciais, a busca dos peregrinos, ¢ talvez também atingindo a fonte da energia da peregrinagio, e, portanto, a recepgao-< de gracas. (© extraordinitio impulso do culto de Maria no século XIX havia sido precedido, e preparado, sem diivida, em profundidade, pelo surto, ao tempo da Reforma catélica, na primeira metade do século XVII sobretudo, de numerosos jsantudtios que exaltavam a intercessio todo-poderosa da Virgem, combatida pelo cristianismo viril e denunciador de adoragées da Reforma, & uma meméria patente no dado da investigacio de hoje, conservada nos escritos devocionais da literatura de peregrinacio, e muitas vezes nas inscrigées da época, no mobilidrio ou na arquitetura de santuario cuja data € facil hoje em dia descobrir. E ime- diato, portanto, o estabelecimento da camada histérica, confirmado, na ampliacio da investigacio, por concordancias evidentes. Outra concordancia, essa nascida do legendario: a maior parte desses cultos so justificados por histérias de “desco- bertas”: a estétua, objeto do culto, foi miraculosamente achada numa Arvore (Vingens de carvalho ou do olmo, ou de tal espécie de arvore que predomina em certa regio, ou, a0 contrario, que é rara), num canto do solo, ou na dgua ctistalina de uma fonte, ou numa posa, também cristalina. E a descoberta é feita a maior parte das vezes por um Ieigo, entre os mais simples, pastor ou pequena camponesa guardii de um rebanho, ou mesmo por um dos animais do rebanho. Evidentemente, nem padre nem a Igreja intervém no imediato da descoberta wJE uma constatagio que impde a conclusio de uma evidente compensacio leiga, 90 HISTORIA: NOVAS ABORDAGENS, . An frente A instituigio da Igreja, de um povo ficllvelseia mesino, is pina eclesastca, objeto sac de que tem, neceaidade, ume me is is sim, 4 < 7 edie ade Tiveis pa neralizacio”, cristalizados na tends de mmen rereatinacbes. Uma interpeetagao, das peregrinacdes_em ono ds "Vinge ree maliion licagio habitual de uma origem no oriente da estétua, com 9 ree rico chs Crmvadas, para tomar “natural” essa origem, tendo sido. ¢ : ino. Sio associacs is ida sej ado, seja pot um peregrino. ‘agbee virgem trazida seja por um Jo. peregring, tém a sua coeréncia de certeza 6 tal d ma e z que, para a estrutura ment peas, implese « interpretagte ae i mum, Atraves y ¢ uma fora ed ona pal en eal rentals intracristis, e impde-se também o alcance “chtoniano” de todos esses culos ncontram ligados a negritude ¢ a maternidade, do tipo icono. eration © da estitua. Estamos em jentic iientemente, Iogico da Sedes sapientiae sendo, freqiien i presence do cre eels do nascimento € do feBresso, motivo por que ha presenca i associagio, menos difusa, suscita toda uma historia: é ', oe rtaak calsti de cimar’o ealto acje altara dos tempos carolingios, com a grande estatura mica de Carlos Magno, seja nos cpisédios da mesma époc, p de luta contra o Isla, Carlos Martelo constituindo a figura ou o nome expres. sivo. A fixagio de tal nivel define em nossa frente um conteido de tempo, "com cardter sagrado por causa de sua venerabilidade, ¢ uma profusio de fontes, Assim, com apenas 0 inventirio da atualidade, estabelece-se uma anilise espectral do passado com essa escada de subida — ou de descida — as profundidades do tempo: Virgens de aparicio dos séculos XIX ¢ XX} descobertas de Maria do século XVI, que se profongam algumas vezes até o fim do século XVIIT; Virgens de piedade que € preciso aqui introduzir em sua epidémica propagacio nos séculos XIV e XV; enfim, Virgens de majestades, de império ¢ de sabe. doria, para as quais é patente o cordao umbilical do Oriente. Histéria das pro- | fundidades que transparece no presente: o esquema que tal histéria descobre movimenta blocos enormes de mutagGes religiosas, isto é, de transformacbes da visio ¢ da participagio sacras por massas imensas ¢ até agora silenciosas, as x quais o simples perfil que acaba de ser esbocado restitui j4 uma linguagem, Seri necessdrio multiplicar os exemplos dessa presenga do passado no pre- sente, talvez presenca do eterno, colocado esse em sua dimensio_humana? Dois cxemplos merecem ser retidos, pois fazem parte de nossa vida quotidiana ,~ portanto, de nossa menor sensibilidade. Um dos exemplos refere-se & reparticio) dos lugares de culto; 0 outro exemplo refere-se aos titulares dos cultos Todos os dois sio coisas inscritas em nosso terreno familiar, em nossas paisagens,-da- quelas que nao interpretamos mais. Quanto aos lugares de culto ¢ sua repartigio, ha densidades urbanas, havendo também a dispersio mais ou menos grande no campo; h4 igualmente, na cidade € nos campos, igrejas ¢ capelas transformadas em garagens ¢ estibulos, algumas vezes, mesmo, de forma menos natural, em restaurantes; ha, enfim, mapas an- tigos, topdnimos, e, algumas vezes, a meméria coletiva sempre cultualmente fiel ou quaisquer outros tragos que atestam igrejas ou capelas desaparecidas. A colo- cacao de tais fatos em evidéncia pode contentar-se com 0 | plano histérico-geogra- fico, ¢ nio_ultrapassar_dados muitas vezes estabelecidos, tais como a urbanizacio A RELIGIAO: ANTROPOLOGIA RELIGIOSA be impulso competitivo, intramuros, das congregagées movas € das ss antigas, o regresso dos campos, as paixdes em contraste. los Brandes © dos ricos armando now conitios uubaros 0s ees de culto e de gléria, sees sempre renovadas, quando o bom Povo comeca a exprimir-se atra- caldades ae igitio nas visitas candnicas, sobre a distancia até A Igreja, as difi- @ complex “hegar a ela no inverno, a imposicio do lugar do culto castral_ ou fia ae a aaa significativa reparti¢ao entre igreja Paroquial ¢ sucursais, ¢, Prolifengs ainda, sits ‘greja matriz ¢ igtejas paroquiais ulteriores, enfim a ekivacieen ao mais das vezes relatada em histéria das capelas. freqiientemente ate = ee Para partir do ‘mais elementar, no entanto, a densidade Osi vase Sa pi da alma, ¢ no 0 sio menos, na carta das reparticbes, sagrado Deus eat it do que Podemos fazer a investigacio da necessidade de estabelecer.ce an casa de oracio Pféximos ou distantes, podendo um ou outro social, a south a inversa. Avidez cultural que influié sobre a qualidade 22GH0 © ith denne ge BIS 405 fiis, 0s seus apoios sagrados de. cristali- isk “descobrit, assim, os cultos fechados ou os cultes abertos; enfim, ae aa perfeitamente significativa confissio de um espaco “médio” de poe ae ane Petcorrer para atingir a casa de Deus. Sio esses os tragos Pe ; “eS apenas esbocados, que descobtem os impulsos da alma cole- son ima necessidade de Tgreja ¢ 0 sentido desta como niicleo de concentracio « Ainda sio mais significativos os vazios: hi tegides proibidas ao sagrado, em geral 36 Mais cheias de intensidade césmica. Ali intervém a interpretagio 10 incessante, dramitico ¢ muitas vezes fatal didlogo entre 6 homem e a natu- no ceantetvém, portanto, uma libertagio de estado profundo, um dado de Bénio, s » c € natureza e uma natureza que & fundamento da exis. ~ Sacia, assim, realidade antropolégica eminente, O que pode, nas sociedad “'\ histoticamente cristas, permitir que se meca até onde foi a audicia ou o poder de antropomorfizar a realidade, sendo quase sempre o batismo cristo dos lugares de culto a antropomorfizacio de um locus ebsthico, Falam da mesma maneita ou tanto os lugares habituais de culto, capelas, oratérios, ou cruzes na beira das estradas. seu niimero, a sua colocacio, o espaco entre eles contém uma histéria complexa em que se revelam a neceseidade do objeto, fundamento ou Pretexto para a oracio, os ritmos de um espaco sa- grado, as exigéncias de sublimacio segundo 0 caminho ou o trabalho, a sacra. ~ Hizagio necesséria a certos Iugares do espaco, como as encruzilhadas ou as en. tradas de dominios. No simples inventério de tais sinais, pode-se dar uma Primeira interpretacio, corrente, sobre os hibitos ou necessidades religiosas de uma terra, podendo-se fazer o mesmo para a multiplicacio ou, a0 contritio, a auséncia de nichos que abram, nas fachadas das casas camponesas ou urbanas, a irradiacio de uma estitua protetora. O enraizamento, quer dizer as formas ¢ as localizacies, desde que possam ser analisadas com rigor, descobrem uma outra Profundidade, além da minticia hist6rica: seja, freqiientemente para o oratorio, um ato de exorcismo, seja, quanto & cruz, uma multido de apelos que ultrapassam © fundo cristéo. Pode-se dizer que é sumariamente toda uma rede de proteces Para que a natureza, embora assumida, no reine com uma implacivel ¢ solitiria soberania, que anule 0 homem. As cruzes, justamente, falam da outra sobe- rania, a do homem, erguidas como sio por obra do homem e governando o ¥ a HISTORIA: NOVAS ABORDAGENS espago (ombora as cruzes cristis sejam um empobrecimento ou uma SU je\Guatro Brages, ela um verdadero domnio da extensto fisca e444 die psiquica); slmbolos solares, por outro lado, elas confirmam, pela sua cont? naclo simbslica, o dominio humano do astro, que fazem itradiar até mee’, no gesto da pessoa em prece ou da pessoa que passa, que fazem o sina] di cruz. O seu iio € sind mais explcto na confrontago rude entre diferentes tipos de cruz (os modelos escolhidos exprimem um estado coletivo de alm, ‘ou mostram, ao contririo, que, com o tempo, esse estado de alma foi teomo, dado), sobretudo na oposicgio entre a cruz de pedra bruta e a cruz trabalhade, cheia de histéria, A apatigio do corpo divino, curiosamente realista e de um patético explorado, nas épocas contemporiineas, confere A cruz uma outta pre- senga, Essa escolha denuncia 0 conformismo mental de uma cultura de igreja, acentuagio humano-cristica ¢, em certo sentido, enfraquecimento do simbolismo da cruz: toda humanizagio é um antidoto do sentido do objeto nu, essa cruz soberana de pedra, sem figura, Através dos lugares marcados por sinais césmicos ou das simples cruzes de encruzilhadas aparece fortemente 0 dado antropolé. gico de nosso velho mundo cristo: a imagem antropomérfica, nio menos antro- pockntrica, € elemento de constituigio da sociedade sacra cristi, numa vontade tensa de cobrir 0 objeto nu. Descobrir a imensidade dese processo torna-se hoje uma maneira de libertagio, seja do poder de uma ordem tradicional, seja de uma reveréncia batismal, seja, ao contririo, de uma riqueza petdida, ¢, portanto, € uma manifestagio da existéncia humana nos préprios limites do “set”. Com © _inventirio dos titulares de cultos, nds passamos ao que & antropomérfico. © poder do sagrado liberta-se aqui através de nome de homem, ou de Deus feito homem, ou, mais raramente, de um dado teolégico, as vezes histérico, relative as pessoas divinas. E evidente que o nome implica uma opgio. Essa eleigio coletiva do padroeiro, que é muitas vezes, acompanhado por um pa- droeiro secundirio — padroeiro de igreja ou de capela, ¢ nio menos padroeiro de paréquia — encerra um sentido religioso, com freqiiéncia apagado pelo curso dos séculos, mas permanece sempre o trago da opgio, ¢ que é justamente, o vocibulo imposto a0 edificio religioso. EB com freqiiéncia um duplo vocibulo, porque a piedade popular transpde 0 nome, ou, por muitas razSes contingentes que assumem rapidamente a forga de um hébito, denomina de forma diferente © titular da igreja... Simples ou duplos, no entanto, titulares ¢ secundirios aca- salados, isso nio impede que 0 inventério sistemitico descubra, hoje em dia, um documento imenso, de dupla interpretacio, segundo 0 tempo e segundo o espaco. E impressionante, quase que para qualquer diocese francesa, a inter- pretagio imediata de uma quantificacio bruta, A Virgem e os santos competem de maneira multissecular, e, em sentido oposto ao impulso matianista contem- porineo, os santos ocupam numericamente o maior lugar, com a contribuicio importante de So Martinho, que revela a evangelizacio fundamental do mona- quismo negro. Uma outra evidéncia que se impde, sempre na lista bruta acima mencionada, € 0 fato de que 0s vocibulos recentes revelam-se, em sua formu- lagio teolégica, produtos da Igreja em transformagio de seus valores teolégicos, cou, pelo menos, variando em acentuacio: todos referem-se, a pardquias ou lugares de culto em zonas de extensio urbana, ou em vias de urbanizagio. O que se chamava antigamente de puro campo revela, e com que forga, a sua fidelidade A RELIGIAO: ANTROPOLOGIA RELIGIOSA 2 ~ ( G eus santos. Além dessas impressses objetivas, o dado: os titulares aparecem, im cVidéncia, como perfeitamente estabelecidos, no ptazo longo. Alguns acrés- ‘ses atuais no alteram o caréter poderoso do monolito, como fundo do tempo. A tal Ponto que, por confrontagdes sucessivas € | Menem de estudos histéricos, destacam-se camadas de imposicio de \ecultos, des. " cobrindo as Sucessivas receptividades dos grupos humanos religiosos Compreendidos na estrutura diseaa oo Isso é xu, uma cronolo; i que Se estabelecem, S \cimos ou varia ia das opcSes, significativa Por causa das concordancias » dos grandes impulsos de apostolado, de uma dinmica ‘o-popular entre o-ensinamento-da-Igreja a historia ignora, ha uma tech, i séculos sem a eredin (mt focha da alma coletiva sobte a qual_passaram os essa rocha prenderam-se lendas ou natragdes histéricas, cede com uma verdade de conto, a existéncia verossimil ou real do santo Pi FO, contos cuja estrutura ou coeréncia revelam uma data histérica, teste- rane once ia sacralizagao, ou do. “modelo” de santidade de uma & o Sulpice, mmeemo ao Sttetminadas. Até no aspecto insosso da imagem estilo Saint canto sombrin deep testitts 40 padrocito corre o risco de ser relegada a um aren ee 2 greja, ainda pairam a nostalgia ou os tiltimos tragos do “mode- + Modelo que revela mais do que cle préprio no tratamento quantitativ se, modernamente, ha Poucos titulares saidos de canonizacées, impdem-se grandes ‘massas numa classificacéo quantitativa, mesmo elementar. Por exemplo, 0 que Se poderia chamar de “episcopalizacio” necessétia do santo padroeiro, como uma compensacao do poder de uma sociedade cujo elemento dominante era monds- ‘ito autéctone, ou como tal considerado, € tico; a importincia relativa do padroei do estrangeiro; a camada essencial dos santos oriundos do Oriente, ou a parte dos cultos apostélicos, quicé romanos. Essas grandes divisdes que se estabelecem de uma forma quase natural em listas numéricas fixam toda uma historia de Propagacéo ainda secreta, e a sucesso dos modelos ou dos tipos de modelos recebidos época apés época. Tudo isso est inscrito em nosso presente, embora © investigador possa, tio freqiientemente, constatar a ignordncia do coletivo vizi- nho quanto a identidade do titular da Igreja, e os ertos relativamente numerosos que, de maneira passiva, sio conservados nos papéis da diocese. Quanto ao espaco, o inventério dos titulares estabelece, num setor geogri- fico determinado ¢ que convém compreendé-lo o mais amplamente possivel, sem ce perda-de coeténcia histrica, irradiagées, circulagSes, caminhos. A que seria pre- ‘ €iso acrescentar, para que a lista seja completa, estabilidades: esses santos, com “> pés de barro que no viajam, quais sio? E que condicionamentos historicos os » tornami estéveis, enquanto os outros percorrem o mundo? A extraordinaria dids- pora martiniana € um alicerce cultual do Ocidente cristo, entre outros exemplos, a diagonal Bourges-Tréves foi um caminho de migracio de cultos, assim como * existe um eixo rodaniano. Tudo isso sio dados de inventitio que as condigdes hist6rico-geogréficas podem perfeitamente explicar. Além disso hé uma cocrén- cia das opcoes, os processos de aculturacio, ¢ essa aceitagio extraordindria do AL HISTORIA: NOVAS ABORDAGENS 94 ue se mede a distincia necessiria para que ; do um titular ou um objeto.’ Major «f Vonging stetminadg nk a literatura clissica, mas constitui uma chaye oe", ia Ima coletiva torna sagrados os titulares ¢ ata os nee gquadeo das medidas de distincias necessirias para conferic 9 cerita 8- De a0 objeto pode esbogar-se uma le as aoe da alma, Fege*® Brady que é sagrado pelo espaco € uma forma. sntropal légica_de aproximaggg 02g rare aarens gars descobrie 0 mistrio pelo qual a energiaseerg on SC dima coletiva concentra-se num objeto. Acresce que todo estudo das Cena Sncrais por meio dos titulares, no campo europeu, por exemplo, reyely lies primeires de um comércio fundamental do sagrado, comércio esse que, Ses Focas unificava, e que em outras nao tinka a virtude da comunicagig sey” Ha nisso um sistema de linguagem religiosa que, além dos idiomas dh igiosa. Fs Teamo da lingua sagrada, exige a decifracio. Tanto mais que q v'™uls, dos cultos ¢ esse ato fundamental que é para um lugar de culto, a re oPaBacig fo padrociro estio estreitamente ligadas & circulacio e & veneracio dag sit |B chtro aspecto do antropomorfismo cristio 0 culto do corpo do sant ss. | evidenciado pela reliquia. Auténticas ou attificiais, essas reliquias enconta i ¢ | natural ou psiquicamente, carregadas de sacralidades, ¢ 0 seu comércig erase, | Garante pelo menos um milénio, a fome sagrada do Ocidente cristig. 4° omércio.tramaram-se freqjientemente lacos de filiacio, ou de relaggeg N° \,_ grupos ¢ de circulacio, cuja anilise deve permitit compreender certos mt psiquicos da necessidade do sagrado ¢ também as vias de sua satisfagio, qa! Ty momento em que as coisas assim se materializam — seria necessirig Pt yer: tornam-se humanas —, 0 simples desenvolvimento geogrifico de ume” pansio do culto liberta prosimidades de alma e, na medida em que se ton 4 de sociedades étnicas diferentes, seja um impulso irracional de unidade, sot contrastes que fazem nascer a fébula ou formam a idéia de uma pessoa, sei numa maneira do que é “comum”, uma exigéncia de sagrado mais essencial } condicio crista. ‘Até aqui nds observamos e mantivemos o nivel da investigagio. Conduzids. rigorosamente na superficie do presente, a investigacdéo impoe a hist6ria. Digs. ios melhor: ela liberta a histéria. Isso acontece, no entanto, segundo trés - condigdes. A primeira € de nio se limitar a0 caso particular, como muitas vezes 0 faz a etnologit. A segunda é dé nio se satisfazer com comparagSes apressa- das entre casos particulares, € nao fazer indugdes a partir de semelhancas mais “outro” em qi < tivo torne sagra no vale apenas pata —-$= _ nismos pelos quais a al a f ai ou menos superficiais: essa operacio mental de conhecimento ripido é de wads a mais falsa, a que mais atraigoa. A comparacio deve ser uma confrontacio, ¢ antes dado associative, com sugestdes de ligacées ou de enraizamentos do que paralelismo enganador até que tudo fique reduzido @ mesma coisa. Depois das Condigdes negativas, a terceira condicio € positiva: € a_quantificagio. E verdade que a quantificacio s6 deve ser feita onde é possivel, evidentemente, ¢ sempre gue una coisas da mesma natureza. Ela faz distingdes, e, paradoxalmente, sta belece diferencas de tons, confrontando o conjunto com o particular, e, portanto, manifestando as opgdes € 0 que, por outro lado, torna necesséria a histéria: tudo o que é singular, com efeito, € objeto de histéria. As evidéncias em massa, oriun- das do grande nimero, levam a interrogacéo histérica a um nivel maior de A RELIGIAO: ANTROPOLOGIA RELIGIOSA Fnpea tds do que a monografia recotrente. O que é “macigo” aqui N40 suas trabalho da hist6ria; ao contritio, obriga a hist6ria a prosseguir em 25 pomminnts. Liberta as confissGes até aqui confinadas a0 siléncio, Asis estabelee, Encias atestadas quantitativamente do culto da Virgem da Piedade. yy eiaoateas) Por um lado, a longevidade do culto, ¢, por outro lado, obrigam tativa, no séeahe eent’ © Aivel em que apareceu, de evidéncia, também quanti- indugio, © enfi XIV — 0 que pode petmitic, em casos incertos, uma discreta Psicodrama cori © sobretudo impie a andlise das motivacées desse culto no ) (,£ dtafia de coletivo das telacSes entre a mie e o filho morto, ou bem a ceno- jogo soberane den utts#© matriarcal no mais soberana mas aflita, ou talvez 0 |: fina ea 0 da dor pacificada. Outro exemplo, no caso suscetivel de permitir Peregrinacses PPloratsria, esse dado que se manifesta quantitativamente das Brinagdes, de aang CeUNdAs-feiras de Piscoa ou de Pentecostes, que sio pere- Gulto ‘mais recent, j2stitui¢éo muito antiga ou de hébito muito antigo. Um s tecente historicamente pode ter-se apoderado desse dia de festa n0s campos, mas poucas pesquisas si i fi “dé e quisas so suficientes para pér em evidéncia a super- Posigao do moderno a celebragSes mais antigas a Nés_sabfamos qu Na propria multiplici © aprofunda toda a an: le se tratava de uma historia do presente, no presente. dade de seus caminhos, no entanto, a histéria conforta lise da antropologia do sagrado. Em primeiro lugar, para Eines § ssa ser colocado em seu lugar, o que nos €-atestado hoje A ‘agao de um culto Procede de uma investigacio histérica qualquer, de um ‘ocumento, de uma arquitetura, de uma convergéncia de informagdes em_que passado © presente se confundem num material objetivo. O testemunho oral, difuso, nao se Anteressa mais do que no fato de que a duracio é grande, — o < GS, Bum sentido, constitui um dado antropolégico seguro da longa duracio. <-> Mas esse dado nao é medida. A fixagio histérica, quando ela é possivel e 0 é of" qtnais freqiientemente do que pode parecer, define hierarquias de duracio. O que, “bP ) em si mesmo, € um documento novo.. A confrontagio entre o que dura.e o ifs que_passa_ilumina as fontes secretas de alimentacio. Porque ha cultos que “e passam, “efétivamente. Seria um erro grave considerar como um aulto vivo 0 de Joana d’Arc, malgrado a presenca de estétuas da Virgem Lorena na maior || parte de nossas igrejas. Houve um tempo de necessidade, tempo curto que con- dicionou uma moda: ser que desaparecen a necessidade, ou o objeto, a imagem | mio satisfizeram & necessidade? E um fato que a inevitivel estatua é uma estdtua aft | quase morta. Com o seu estandarte, essa jovem de armadura, apesar de seu rosto angélico e seus olhos elevados para as alturas, quando nio € mostrada com as mfos unidas sustentando a foice da morte, nfo desperta mais impulso_reli-_n,_ gigso. E certo que existe uma maneira de peregri nado de idtclect idade hi rica a Domremy-la-Pucelle, mas quase nfo se encontram ex-votos junto das est’- tuas de nossas igrejas. No confronto habitual entre as estétuas da Santa Lorena € de Santa Teresa de Lisieux, é a religiosa das rosas que ganha, com facilidade Serd, no entanto, sempre assim? No final de hoje em dia, esses cultos contem- porneos, de apenas meio século, parecem j& gastos ou em vias de se tornarem gastos. Fragilidade de inspitagio, ou, ‘nessas criagbes necessirias, necessidade, peculiar ao tempo, de outra coisa e de melhor? Todos os modelos de santidade % \nao contém, como tais, uma seiva poderosa de culto. Constati-lo & reconhecer pISTORIA: NOVAS ABORDAGENS pelos quais se exprime @ busca de perfeigio ou de poder das ws Sehecer 0 seu condicionamento, pois, “até jo de Viennois, curiosamente ajadado, & ne als i a ao 5 Au rik pley nio", de ganBi cama¢ c vnanece inscrita na veneracéo coletiva. Que cue eae? Cabe ‘3 andlise manifesti-las. O que obriga a anili entanto, ® Gidro brato dos tempos longoe € des 'empos an cmcultos entende, porque hi estranhas ressurel curtos, ate de difusio cristi de hoje, fo. Santa das causas desesperadas, eligi bali Hy Eyetk ul i| b TH H iF sus tensfxerminado grupo humano libertase nessa orquestragéo te srguzada. Os oito séulos bem contados do culto de tree ioe, 0 hierergyis altars capelas, ¢ nko menos, as fepresentasBes ainda tio é e 5 & i 3 in & z & f ei 3 ify veves, na imagem, vi ui Sere como 90 oro. das pequenas Caarinas tentago de dessper Natinfacio sexual ¢ A fecundidade. As investigasbes 4 a i t Ail sa ase caumeraram as formas do culto de Santa Catarina: exe culto detim, aaa at, muitos segredos da vida sexual feminina no Ocidente cristio medie val ¢ modemo. Da mesma forma as doencas ou medos coletivos sho. lidos aa vvotinuidade dos cultos dos grandes terapeutas, dos santos com 09 outros taumaturgos, seja de designagio erudita, como os dois médicos e Pro = tisin sje de eleicio popular, nesse caso evidentemente orientada mutes pelos grandes estabelecimentos monisticos, A procura de recursos materiais. Nio basta, no entanto, estabelecer quadro de duraches do 6 sagrado, oe a ee Ne inor d coidde i bratas, bat ‘ariagées, algumas vezes, saltos, substituigdes ou transferéncia evidentes. Impde-se a toda antropologia do sagrado, impulsos da vida coletiva ao mesmo tempo iva ¢ tradicional ¢ cheia de mudangas, pronta a cansar-se, uma histéria vida do que é i uuma outra ficgio tomar o universo cultual como outra ficglo do it ij __ 7 ‘A RELIGIAO: ANTROPOLOGIA RELIGIOSA ¢, no universo dos isseculat Os grandes movimentos ¢ variagdes sio lentos n° multi caltos, mas os episédios sio miltiplos. jmeiro nivel S¢ Pode-se iluminar a prova em trés niveis, pelo meno’ 7 a capitulo dos encontra em tomo de um caso circunscrito. Tal é por excmP item, de aultos, a fixagio necessiria, na medida em re aS niveis diacrénicos sucessivos para a vida dos titulares. Quét ual 05 tuto antigo, de forma manifieta, de apéstolo ou de santo oriental ¢ do Tae a papéis de diocese de hoje ainda conservam esse titulo, seria POMC es, em Conclusio de uma estabilidade quase fora do tempo. Na diocese de 00 r ete. particular, estudos mais detalhados, temporalmente, Gases aa me ainda, 0 titular de aparéncia imutivel foi muitas vezes substituido na venerasi ° -7 > fiel por um titular secundizio, hoje esquecido, e que, em geral, é um santo i peuta. A confissio, de ontra forma, desse fato teria desaparecido, ela x a que o fervor popular havia escolhido o seu santo de preferéncia a0 qué Ab sido imposto, um nivel canénico ou cultural superior. Sem o pecfil hist6rico, os “obscuros”, na expressio de seu culto, teriam sido d i ao_siléncio. a O outro nivel encontra-se no plano da_criagao criagio ou consciéncia, e nio, vida dos mitos, pois é um truismo apontar que, no nivel da vida no tempo, nfo hi outra forma de aproximacio que no a hist6- rica. A criagéo € um ato de confissio antropolégica. Pode-se medi-lo com 0 exemplo das cruzadas: cruzada-palavra ou nogio, sendo cruzada-hist6ria. Nenhum mimetismo histérico — uma vez que nio se liberta mais Jerusalém — entre os episédios histéricos dos séculos XI-XII ¢ talvez mais tardios ¢ a cruzada de hoje em dia, no sentido em que o signo ou a invocagéo a propagam. No entanto, 2 partir do extremo fim do século XVIII, através das crises revoluciondrias, 0 nome comum de cruzada — nao mais “as cruzadas” da historia — surge quase mist samente como apoio de expressio, de cristalizagio de impulsos coletivos confusos. # uma palavra tomada de empréstimo, segundo as facilidades de pilhagem do idioma, ou, ao contrario, é uma ressurreicio que corresponde a necessidades and- logas entre 0 uso presente e 0 passado da meméria? A despeito de desperdicios evidentes, a lingua tem os seus rigores: ela nfo retoma ao acaso, ou sem heranca. Pelo elo tenaz do signo sio unidas, de um lado, as continuidades de um fend- meno histérico multissecular, 0 da cruzada para a ocupacio cristé da Terra Santa, fendmeno prolongado pela guerra turca quase até 0 inicio da época contempo- rinea, ¢, por outro, a ressurreicio progressiva de um sinal de apelo, quase 20 mesmo momento em que se esgota a influéncia do fato histérico. Sem que se tenha a menor intencio de estabelecer continuidades artificiais, ¢ bastante, uma vez inteiramente desenvolvida a experiéncia temporal, constatar a sincronia ¢ a transferéncia, nese iiltimo caso apenas do signo. Assim, a anilise do conteitdo psicossocial do signo contemporineo, o recurso quando falamos ou em proclamacées ao apelo da “cruzada” no é sem importincia para que se perceba, de uma parte, a maturacio das coisas latentes, ou seja, um episdio que nao se pode negligenciar da vida das profundidades, a qual, de outra forma, nfo se deixa perceber, e, de outra parte, a dupla indugéo possivel dos contetidos de hoje aos contetidos de um ato de um passado longinquo, ¢ de nossa pene- >) mente, durante todo o século XIX, e certamente com w So do povo By lecisivamente_condenados itica. Digamos bem: rerio- 98 HISTORIA: NOVAS ABORDAGENS tragiio analitica do fendmeno antigo ao que hoje niio é expresso ¢ Nilo ciente, Nesses dados sutis nada pode ser, por assim dizer, endureci je SM pode ser muito apoiado, mas, pela propria tenuidade do signo e pele ido, nad, vimento diacrOnico, afitma-se uma operasio antropolégicn da necessiqagee™¥°l- tiva de criagio de uma “super-sociedade”, da sublimacio coletiva que at,‘ servid6es, os habitos © as coisas quotidianas, da satisfagio de poder Supera ag condicio humana it mais além de scus limites, 0 outro mundo afi wen faz g Na cruzada, uma dinimica de “passage”, a0 mesmo tempo, com a ‘ruistada, dominio des elementos ¢ posse as chaves entre os dois mundos, ¢ (ev8t do pinico coletivo, E tanto sobre 0 apelo como sobre 0 ato, a marca solar get, © Hum fato que as linguas vernaculares do extremo Ocidente, do mundo fyarve 0 do mundo anglo-saxao nio encontraram outro signo para exprimir na com rances Gio contemporinea 0 que é melhor, maior, ¢ mais capaz de sublimagio no ato en) tivo do que aquele que foi, tardiamente, colocado sobre a aventura hierosol; te lee nna, carregada em seus primeicos impulsos por uma aspiracio itresistivel da reali cio salvadora. O_que desejamos é encontrar novamente as vicissitudes do ne se decantayGes, talver as tkansferéncias dos sucessivos contetdos no fhe We a Ceculos XI ¢ XX_ A via diacrOnica era a nica que libertavay a taveett® permitia compreender tanto os apelos silenciosos ¢ exaltantes de hoje, quant eemmistério das migracées tumultudrias no corpo da antiga cristandade, Rox? re-se, portanto, A histéria, para compreender a gestagio das profundidades c+ ato coletivo de transgressio do mundo, ato eminente no plano humano de al, quer poder sacro. mene 8 gual 5) Passa-se a um terceiro nfvel, tlvez ainda mais profundo. Depois da eragio mitica da toda poténcia coletiva, de suas pompas ¢ de. suas obras, a vida do tempo; de vérios tempos, ¢ no de um s6. Em arabescos, entrelaca-se, ao tempo que se pode dizer linear das continuidades histéricas, 0 tempo emotivo sacro da espera, seja de profecia, ou mais solenemente ainda da eschaté. Nesse tempo escatolégico, nio ha mais homogeneidade aparente, mas hi ritmos, periodicidades, Isso se registra no volver de cada século novo, por exemplo, ou na aproximacio dos milénios. Registra-se em outros exemplos, talvez, ainda mais explotados, Quanto a profecia, que distincia entre o antincio e 0 acontecimento, e sobre que fundo de motivacdes tradicionais, de crispagGes internas, de medos, de angtistias, de vingangas, de usura da vontade de existir estabelece-se ela e sobretudo retorna? O inventitio elementar ¢ objetivo das manifestagdes proféticas, dos acontecimentos escatolégicos descobre uma interpretagio do. tempo escatoldgico, absorvido no nivelamento histérico, Somente em scu nivel, a vida tocante da duracio, vida onde nio ha nem relégio, nem calendério, mas hé tensio algumas vezes atl re- bentar, tensGo em que sobe, ultrapassando-se a si mesma, a energética humana que procura satisfagio, Para que a promessa se cumpra, se torne fato, a uma 6 vez verdade do que foi anunciado e dominio humano sobre o futuro, e, portanto, outra libertagéo ou exercicio de poder. Medit a amplitude dessas contragées de espasmos da existéncia coletiva na duragio, s6 a descricio historiogréfica 0 per- mite, fixando as voltas, as escansdes, a desigualdade das esperas, e fixando, portanto, no combate da imortalidade, soteriolégico de uma certa maneite, 0 exercicio de poder. Vencer o tempo é, com efeito, um outro aspecto ¢ aspecto fundamental da busca humana de todo o poder. A dimensio do eterno é que 99 A RELIGIAO: ANTROPOLOGIA RELIGIOSA . tent, jacio sacra em 0 tempo acabe, ¢ atingi-la ou, pelo menos, tender a atingi-la € criagio sacra ato. és (vivernos muito sobre um comércio do objeto sagrado, exterior € cA” deposto, no-meio dos grupos humanos que dele se alimentam, por w! h e ei ae- do além, Examinando o ato em sua dinimica, a tensiio da criagio sagrada a + se, € no ha tensio maior, em face da condigio humana, do que esse dot " do tempo, estabelecido soberanamente em dependéncia, que a imortalidade repre- senta, E uma dinimica que torna histérico 0 dado antropolégico, mas oe esse dado de sua aparente eternidade é seguramente, a melhor maneira de incarnar, ou seja, de torn4-lo mais expressivo de certas necessidades humanas formalmente guardadas em siléncio. Fixar 0 momento em que os homens temem nao aguentar mais com eles proprios ¢ se precipitam para sair da histéria, vivendo a Toucura pinica de poder fazé-lo, equivale a medit a energia profunda que Possuem, ¢ sua capacidade de accitar, de suportar, de viver a duragio, de aceiti- |h, assim, como duracio, Nesse nivel do combate entre o homem e sua histéria, como é que esta no seria essencial? Como, do proprio scio do combate, nfo descobrit melhor a sua tealidade existencial, na medida em que ela liberta, de Brupo humano, a capacidade respectiva de cada um, de existit? No coragio ; mesmo desse assunto, est a opcio capital entre 0 acontecimento ¢ 0 aparecimento. L O primeiro constitui a Prépria trama da histéria; o segundo constitui o sutto do outro, que precede a saida fora de si. Tluminago ou transcendéncia ¢ 0 aparecimento. Esse poder de aparecimento alimenta, de forma igual, as socie- dades ou grupos humanos? Ou ser que existe uma distingdo entre aqueles que 5 repetem 0 in illo tempore das cosmogonias originais e aqueles que, libertados®” 9 da meméria dos comecos — Jaco evidentemente edénico — ou se acreditando “—~ libertados, vivem a espera do retorno, mais inclinados a anunciar do que a redi: zer? B uma intetrogacio que nao classificaré, uma vez que qualquer classifi- cacao torna mecinico tanto o objeto quanto o autor, mas que abre apenas um outro método de anilise, impondo o concurso descritivo da histéria. A descticio torna fixo_o material a partir do qual seri possivel avaliar proporgdes, varia- §9es ou transferéncias, eo condicionamento dos mesmos, entre meméria € pro- gresso, ou talvez, para falar de maneira teolégica, entre £€ vivida e esperanca. Para as futurologias, os resultados podem ser importantes: todo conhecimento dos comportamentos coletivos é tesouto antropolégico. Sobretudo, para uma antro- pologia do sagrado, onde o sentido do tempo sacro, 0 préprio método de sacra- lizagao, assim como as invers6es que vém depois sio luzes sobre a criatividade sacra do homo religiosus. © que acaba de ser dito da descricao histérica deve ser agora mais forte- mente colocado, como a terceira contribuigio “evidencial” da histéria 4 antro- pologia. A histéria, com_efeito, enquanto a convergéncia de documentos o per- mite, estabelece continuidade e-variagio. De outra maneita, ela mostra, na frente da cena, o trabalho elaborado nas profundidades da criacio coletiva: em grande parte, a historia € a expresso desse trabalho, e é portanto, a sua linguagem. A_ligacie lingua; € © seu sentido, quer dizer, o motivo criador, ainda nao foi explorada: no presente € possivel apenas colocar essa” questio € saber que existe essa ligacio, em face de todas as nossas anilises. Dai vem 0 servigo pelo qual a histbria estabelece essa linguagem numa coeréncia aproxi- mativa, até em sua propria descontinuidade. No que se refere 4 antropologia om \> | “Addolorata” que © fervor mediterrineo, | tratar também como Virg 100 HISTORIA: NOVAS ABORDAGENS exemplos mostrario a utilidade desse servigo, py de Maria, culto que se alimenta na & imeito, do sageado, algun OCR contempe aque diz respeito ao calto. de : : a cicobretudo de aparicies €, de aparigoes da Virgem sozinha, “pe™P- os, operou-se uma mutagio, desde que se confronte 0 culto it see Pe virgens neprts do tipo J64e! sapientiae do ‘lorena a8e9 fa Aqui a dama que brilha Wie pureza proclamando a sua concepgio ° Femang, Aut dam ge irda he sbre um fando orl de aio ume ns Fagus slit Tomo a profundidades inernas, (cone que ay sorta a ie festagio ¢ impée um culto silencioso ¢ que sublima. Na Virgem de aoe ani encontra-se um poder de didlogo — © que se apressa a exprimir, em dias, igrejas, @ proliferagio recente de estétuas de Bernadette de joelhos, a um, Nossas igttfneia da “Senhora” de Lourdes. Frente ‘A estitua romana, nfo hé mais even eNSomércio do idolo, ao mesmo tempo mals Jonge ¢ mais préximo, seguramen® mais provocadot de extroversio, ¢ portanto, mais libertador. Que eramente cnistina, entre uma ¢ outra forma, através dos tempos? Para apuré-la ¢ aire exit ert aga, mporse-ia um inventitio rigoroso de todas as imagen fa Maria, por grandes sctores de Areas culturais, mas das sondagens feites nS de Aivisa uma cadeia que mostra a desagregacéo muito enta do grupo MieChap'? no sentido de uma afirmagio luminosamente virginal. Entre as duas fi fanga ¢ exprimindo um processo progressive de separagao, a Mie da dor soli de emotividade matriarcal animal, ai em das dores transpassada por sete espadas, ne vai “Addolorata” traz em sia tristeza da ctianga morta, da separagio. Desfaz-se, a rasceg conjunto, mas pemanece na. prpri expressio dn dor. As Virgens de aparigio contemporineas aparecem solitirias para dar a sua mensagem, agora Gral » nigo mais figurada, Tais sio os tracos — entre muitos outros — que reve. fam o trabalho silencioso, que modelam a imagem cultual para torné-la mais imediatamente conjurat6ria € que, cada um deles, compdem a linguagem da alma Coletiva de outra maneira impossivel de ouvir. S60 estabelecimento de seqiién. cias histéricas, agrupando de ‘maneira objetiva as séries fortemente mutiladas que nos restam, pode permitir escrutinar, quando 4 Dama de intetcessio, as profun- didades de um comércio de libertagio da mulher, seja tendendo a representar a sublimagio possivel do pecado da carne, seja aceitando a prova mortal da incar- nacio. As imagens € 2 sua lenta transformagio mostram os episddios desse combate entre as duas naturezas, a carnal ¢ a espiritual. Através desses episédios, Sreecebrem-se os acentos de uma consciéncia de reino da Mie chtoniana, sobe- ania quase impessoal, ¢ de uma arte dramitica da carne mortal, e de uma gené. tica “existencial” com fundamento essencialmente feminino, e de uma recusa possivel da condicio humana em suas limitagdes propriamente bioldgicas, reali Foye sem divida do pecado original. Atrés dos ep stdin ¢por-su itemio ropolégi 08 ea figuram esses_dados_do_viver_humano, tanto. mais < mente 20 perfilélos, impOe-se a impressio de reencontro com te Brn‘! séries de imagens das cosmogonias ou mitologias mais ou menos originais. Como-se Coes iio atingit esses niveis de linguagem para que, enfim, o silencio file, Nio se esgota, nesse mergulho em busca do siléncio, o capitulo i ithagem plistica do que é sagrado. Sio séries privilegiadas para que se ougam as vores interiores, as representagdes dos mistérios. Isso passa-se, por exemplo, no caso

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