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O Estilo Português Suave surgiu de uma corrente de arquitectos que, já

desde o início do século XX, procurava criar uma arquitectura "genuinamente


portuguesa". Um dos mentores desta corrente era o arquitecto Raul Lino,
teorizador da casa portuguesa. O resultado desta corrente foi a criação de um
estilo de arquitectura que utilizava as características modernistas da
engenharia, disfarçadas por uma mistura de elementos estéticos exteriores
retirados da arquitectura portuguesa dos séculos XVII e XVIII e das casas
tradicionais das várias regiões de Portugal.

O Estado Novo, regime político liderado por Oliveira Salazar, saído da


revolução de 1926, iniciou uma política de obras públicas em larga escala, a
partir de meados da década de 1930. Inicialmente, nos novos edifícios
públicos construídos, prevaleceu o estilo modernista, com elementos
monumentalizantes da art déco, como foram os casos do Instituto Superior
Técnico, do Instituto Nacional de Estatística e do Liceu Nacional de Beja.

No entanto, sobretudo a partir da Exposição do Mundo Português[1] em


1940, cujo arquitecto-chefe foi José Cottinelli Telmo, começou-se a privilegiar
o Estilo Nacionalista nas novas construções públicas. Este estilo foi usado em
todos os tipos de edificações, desde as pequenas escolas primárias rurais até
às grandes escolas secundárias e superiores, passando por quartéis militares,
tribunais, hospitais, câmaras municipais, etc. Além de Portugal, este estilo foi
também largamente utilizado em edifícios públicos dos territórios ultramarinos
portugueses da África, Ásia e Oceânia. O estilo alcançou também grande
popularidade no sector privado, sendo também utilizado em todos os tipos de
edifícios desse meio, desde as casas unifamiliares até aos prédios de
apartamentos, passando por edifícios de escritórios, de comércio e até de
indústria.

Praça do Império, em Belém.

O estilo foi duramente atacado por um grande número de arquitectos, que o


acusaram de ser provinciano e desprovido de imaginação. A designação, pela
qual o estilo acabou por ser oficiosamente conhecido, “Português Suave”, foi-
lhe dada ironicamente pelos seus críticos, que o compararam a uma marca
homónima de cigarros. O maior golpe no estilo foi dado no I Congresso
Nacional de Arquitectura de 1948 que levou a que, progressivamente fosse
deixado de ser utilizado nas construções públicas e particulares. A partir de
meados da década de 1950, as obras públicas promovidas pelo Estado Novo
voltaram a privilegiar a arquitectura modernista.
Apesar das críticas dos intelectuais, o Estilo Português Suave revelou-se
bastante popular, correspondendo ao gosto de muitos portugueses. As suas
características, ainda que atenuadas, voltaram a estar presentes em inúmeros
edifícios privados, sobretudo a partir da década de 1990.

Características Gerais
Os edifícios típicos da deste estilo constituíram um ponto de viragem no
que diz respeito à construção civil nacional. O que até então tinha sido muito
tradicionalista e retrógrado passou a contar com as mais recente inovações
técnicas internacionais. A introdução de novas e modernas técnicas de
engenharia, tais como a utilização de estruturas em betão e o sistema de laje
- pilar - viga, vieram revolucionar não só a maneira de construir, mas também
a forma de pensar as construções. Os edifícios comuns, tal como a maioria das
habitações, eram desenhados e concebidos por mestre-de-obras, não
qualificados; a partir desta época, começaram a ser feitos progressos nesse
sentido, atribuindo o trabalho de dimensionamento da estrutura a um técnico
especializado. Contudo, todo este modernismo não era aceite da mesma forma
que no resto da Europa, mais virada para o futuro e para a modernidade, pois
o governo português da altura era muito puritano e conservador. Nessa medida
a técnica moderna era disfarçada por elementos ornamentais clássicos, num
gesto de obstrução cultural ao progressismo internacionalista.

Esfera armilar.

Os elementos ornamentais presentes no estilo são retirados da arquitectura


dos séculos XVII e XVIII e da arquitectura tradicional das várias regiões
portuguesas. Estas inspirações vieram sobretudo dos estudos de Raul Lino.
Tipicamente são utilizados elementos decorativos como pedra rusticada, socos,
cunhais e guarnições de vãos em cantaria, tectos de águas inclinadas com
beirais e telha vermelha, falsas cornijas, pináculos, pilastras em varandins, etc.
É também comum a existência de arcadas e torreões de evocação
medievalista com coruchéus (piramidais ou cónicos) rematados com esferas
armilares (simbolizando o império), ou com cata-ventos, mais presente nas
aldeias. As colunatas têm também um papel importante nos elementos
arquitectónicos constituintes do edifício do Português Suave. A verticalidade
desta, e o facto de repetirem ao longo da fachada, provocam um espaço de
entrada bastante austero e forte; esta característica é aproveitada sobretudo
nos edifícios de cariz administrativo e judicial (ministérios, tribunais, etc) pelo
papel que representavam no dia-a-dia da sociedade da época.

Tipos Funcionais

Palácio de Justiça do Porto.

Palácios de Justiça
Este tipo de edifício é considerado, em conjunto com as Câmaras
Municipais, o "tipo nobre" do Português Suave. São normalmente
caracterizados por uma volumetria dura, recorrendo a colunatas e grandes
pórticos para assim impor a sua monumentalidade. Existe uma preocupação
simbólica de fazer associar à arquitectura destes edifícios a ideia de poder
judicial (intrinsecamente ligado ao poder estatal) aliada a um espírito austero e
clássico. Um bom exemplo das características descritas é o Palácio de Justiça
do Porto (1961) onde as colunatas assumem um papel fundamental no que diz
respeito à ideologia global que o edifício deve fazer transparecer; a austeridade
e monumentalidade quase violentas fazem deste palácio da justiça um dos
mais representativos deste tipo funcional.

Câmaras Municipais
Os edifícios das câmaras municipais fazem parte, em conjunto com os
Palácios de Justiça, o "tipo nobre" do Português Suave. Comparando as duas
tipologias, as câmaras municipais são mais ecléticas, isto é, têm uma forma
mais liberta, não tão presa às ideias de poder e austeridade dos edifícios
judiciais (apesar de estar intimamente ligada a essas expressões). Têm
também associado a elas uma temática mais histórica e nacionalista; por vezes
existem nas fachadas, ou nos pórticos, painéis ilustrativos relativos a vários
aspectos da vida da cidade tal como o trabalho ou a história da mesma. Um
exemplo de câmara municipal deste estilo, apesar de não ser muito
representativo, é o edifício da câmara municipal de Póvoa de Lanhoso esse
edifício está ligado ao domus local juntando pragmaticamente os dois edifícios
nobres da vila.

Agência da Caixa Geral de Depósitos em Santarém.

Caixas Gerais de Depósitos e Créditos e


Providência
Este tipo de edifício era fundamental na economia das cidades e vilas do
país. Estavam normalmente situados no centro das localidades, para que o
acesso fosse o mais rápido para qualquer habitante da zona. Eram construídos
com objectivos de parecerem bastante sólidos e resistentes, devido à natural
sensação que deveriam fazer passar às populações, de que o dinheiro estava
bem seguro. Existem várias tipologias por todo o território português; desde a
faceta de solar urbano, à típica edificação clássica, com grandes torreões
encimados por altos coruchéus. O edifício da caixa geral de depósitos de
Santarém mostra bem o cariz austero, mas sóbrio, deste tipo funcional. A torre
e as janelas altas dão ao público a tão necessária sensação de segurança que
deve estar sempre associada a um edifício destes.

CTT's
Os Correios, Telégrafos e Telefones constituem um caso especial na
arquitectura desta época. O facto de ao longo das décadas de 30 e 40, um
único arquitecto ter sido responsável por projectar e realizar estas obras,
Adelino Nunes, deixou pouco espaço para grandes inovações técnicas e
formais, reflectindo-se na fraca diversidade. Deste facto decorre a capacidade
de se puder dividir as várias instalações construídas um pouco por todo o país,
pois o número elevado de edifícios é inter-relacionável. Existem 3 tipos de
níveis de edificações dos CTT:

• Nível simples - para povoações mais humildes, num estilo mais


histórico-regionalista. Exemplos disso são os CTT de Fafe.
• Nível médio - para vilas com certa importância, ou pequenas cidades,
num estilo mais moderno e inovador. As norte são caracterizados pelo
granito e a sul pelas paredes caiadas. Dois exemplos, um para cada
caso, são os Correios de Valença, a norte, os de Évora, a sul.
• Palácios dos Correios - para grandes cidades, num estilo ecléctico que
mistura tanto o regionalismo, como a modernidade e a
monumentalidade. O exemplo mais relevante deste tipo de edificação é
o Palácio dos Correios em Lisboa.

Escolas
As escolas primárias desta época enquadravam-se num projecto conhecido
por Escolas dos Centenários[5] de Rogério de Azevedo. O arquitecto elaborou
um plano-tipo onde estava descrita a forma de construir o estabelecimento de
ensino. Existiam pequenas variantes que tentavam de certa forma enquadrar
os edifícios no panorama arquitectónico do local onde se encontravam; as
escolas do sul eram caracterizadas pelos arcos e pelas paredes caiadas (a
grande parte das casas no sul são caiadas desde os tempos da ocupação
muçulmana), e a norte pelos alpendres e a utilização de granito.

Os liceus baseavam-se numa ideia bastante diferente das escolas primárias.


Estes estavam instalados em grandes casarões com ares seiscentistas e
setecentistas com grandes arcaria e coberturas em telhas. À semelhança das
escolas primárias, a maioria destes edifícios era de educação mista; nessa
medida, e segundo as ideias da época, os rapazes e raparigas frequentavam
lados diferentes do estabelecimento fazendo com que estas fossem simétricas.
Algumas destas escolas estavam associadas a bairros, tal como a escola no
bairro da Ajuda. No que diz respeito a universidades, como estas assumiam um
tamanho muito mais amplo e dizem são tratados como conjuntos urbanos.

Obras religiosas
O santuário de Fátima foi a mais grandiosa obra religiosa do regime.
No geral, as igrejas construídas neste estilo era estilizadas em betão.

Basílica de Nossa Senhora do Rosário, em Fátima.


Monumentos e Infra-estruturas
Havia uma procura por parte do Estado em afirmar-se a grande escala
associado a necessidade de executar grandes obras de equipamento básico
(água, esgotos, electricidade, rede viária). Como exemplos de monumentos
temos a Fonte Luminosa em Lisboa, Cristo Rei em Almada. Em termos de
infra-estruturas há a barragem de Castelo de Bode e a Ponte 25 de Abril (Ponte
Salazar inicialmente), que veio resolver um problema que desde do início do
século precisava de solução — ligar as duas margens do Tejo.

Habitação
A habitação constituiu uma das maiores problemáticas do Regime
Salazarista na capital. A população lisboeta aumentava de ano para ano e
houve a necessidade de construir locais para alojar toda essa gente. Esse
processo foi abordado de várias maneiras dependendo do tipo de cliente. As
habitações dividem-se em três categorias: prédios de rendimento e moradias
unifamiliares ou geminadas, bairros sociais.

Os prédios de rendimento são volumes simétricos, onde se utilizam


materiais tradicionais, pouco salientes e com fachadas lisas. Ao mesmo tempo
apareceram edifícios do mesmo tipo mais progressistas na tecnologia utilizada
(betão armado, sistema pilares-vigas-lajes), mas tradicionais na expressão
arquitectónica que têm. Caracterizados pelos embasamentos em pedra, janelas
enquadradas de peito, vãos de sacada com varanda em ferro forjado
decorativo, coberturas telhadas (uso de coruchéus por vezes) e colunatas de
pedra na fachada.

As moradias unifamiliares são tipicamente constituídas por uma ampla


cobertura em telha com beiral, uma fachada pintada de branco ou cores claras,
utilização de pedra nas molduras do vão, portadas de madeira normalmente
pintadas de verde e um alpendre coberto ou avarandados com cobertura em
telha. Por vezes há alguns trabalhos em azulejos ou cerâmica com motivos
tradicionais, peças em ferro forjado (floreiras, cata-ventos e portões).

Os bairros sociais (ou conjuntos residenciais) eram grandes


aglomerados organizados de "casas económicas" (ou de "Renda Económica")
constituídos por casas unifamiliares, ou mais comummente, por casas
geminadas. Os bairros sociais eram erguidos em zonas mais desqualificadas
da cidade. O primeiro bairro, que serviu de protótipo dos bairros incluídos no
projecto de Duarte Pacheco, Novos Bairros, foi o Bairro Salazar, mais
conhecido por Bairro do Alvito (1938). À parte dos bairros de casas económicas
surgiram também bairros elementares, como por exemplo o Bairro do Alto da
Serafina; e também bairros de casas pré-fabricados.
Construção de frentes urbanas

Casas típicas do bairro da Encarnação.

Entre 1930 e 1940 Duarte Pacheco lança um extenso programa de


construção de frentes urbanas, a fim de evitar um crescimento desordenado da
cidade e, a proliferação de arquitectura de má qualidade. Foi traçado um
primeiro plano que pretendia alojar milhares de lisboetas na periferia da cidade;
foi desenhado, por Paulino Montez um bairro pioneiro entre a Tapada da Ajuda
e Alcântara que teria o nome de Salazar. A geometria simétrica dos
arruamentos e a organização dos vários espaços: habitação, equipamentos e
espaços verdes eram as principais características deste bairro. As casas eram
na sua maioria geminadas, havendo também alguns pequenos prédios. Os
terraços planos representavam bem a inspiração moderna cubista do
arquitecto. Contudo, o gosto neo-tradicional geral reconverteu essas coberturas
em telhados típicos de telha. A partir deste, surgiram até aos anos 40, mais oito
bairros com as mesma características, sendo o mais importantes a Encarnação
e Madre de Deus.

Durante os anos 40 e 50, realizaram-se, no extremo poente da cidade,


Restelo, dois tipos de urbanização residencial: vivendas modestas e grandes
moradias de luxo. Parte delas, profundamente inspiradas na tipologia de Casa
Portuguesa de Raul Lino.

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