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Neste tópico serão analisados os mais importantes princípios que regem o direito
processual constitucional, do qual derivam outros postulados igualmente relevantes,
todos necessários ao viço do sistema jurídico, ao qual servem como seiva e como raiz.
1. Princípio da humanidade
Por sua vez, o Pacto de Nova Iorque, de 1966, declara que "Toda pessoa privada de sua
liberdade deverá ser tratada com humanidade e respeito à dignidade inerente à pessoa
humana". A privação de liberdade implica, necessariamente, um processo. Resulta,
portanto, clara a obrigação dos órgãos de persecução e julgamento de respeitar os
direitos personalíssimos do acusado no processo e durante sua tramitação.
Ao declarar, no terceiro inciso do art. 5º que "ninguém será submetido a tortura nem a
tratamento desumano ou degradante", o constituinte especificou indiretamente duas
garantias processuais, as de que:
a)o processo penal não pode servir como meio para a aplicação da pena de tortura ou da
pena de morte ou para a sujeição de quem quer que seja a tratamento desumano ou
degradante, como sanção final;
b)o processo penal não pode assumir ele mesmo forma desumana, com procedimentos
que exponham o homem a posições ou situações degradantes, torturantes ou a vexames.
Implica, portanto, o direito ao respeito, de que toda pessoa humana é titular, cabendo ao
Estado providenciar:
Ao seu turno, o art. 5º, inciso XLIX, da Carta Federal, garante aos "presos o respeito à
integridade física e moral", significando que ao homem sujeito do processo penal só se
lhe retira parte da liberdade (a de locomoção extra muros), não lhe sendo tolhida a
dignidade. Vale dizer: mesmo preso ou condenado o homem preserva o direito
personalíssimo à sua integridade física, moral e psíquica, com o que se vedam também
formas de tortura mental e ameaças à sanidade intelectual dos imputados.
Para a exata compreensão desses dogmas e sua efetividade no processo penal, vale
recordar a lição de BETTIOL, segundo quem "O juiz vive e opera num determinado
clima político-constitucional em que a pessoa humana representa o valor supremo; e é
a posição desta que o Juiz é chamado a escolher entre duas interpretações antitéticas
de uma norma legal".
Este princípio, que tem evidente interesse processual, não se acha colocado apenas no
art. 5º, inciso II, da Constituição Federal, onde se anuncia que "ninguém será obrigado
a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei".
A diretriz está também, como conseqüência, no art. 22, inciso I, da mesma Constituição,
que determina competir privativamente à União legislar sobre direito processual, o que
invalida, de pronto, qualquer iniciativa dos Estados-membros, do Distrito Federal e dos
Municípios de dispor sobre a matéria, salvo, para os dois primeiros entes, no tocante a
procedimentos (art. 24, inciso XI, CF).
Daí porque os códigos de processo são veiculados por lei federal, de âmbito nacional,
diferentemente do que ocorria outrora, no regime constitucional de 1891, em que o
processo era estadualizado. A unificação ocorreu com o Código de Processo Penal de 3
de outubro de 1941.
É certo que quanto ao processo penal vige a regra tempus regit actum ou princípio do
efeito imediato (art. 2º, Código de Processo Penal), segundo o qual os atos processuais
praticados na forma da lei anterior são válidos, passando os atos futuros à esfera jurídica
da lei processual nova. Portanto, embora deva-se atender ao critério de legalidade, não
se há de falar em irretroatividade da lei processual penal.
Segundo o art. 5º, inciso I, da Constituição Federal, todos são iguais perante a lei, em
direitos e obrigações. Assim, ainda que subjetivamente desiguais, os cidadãos merecem
igual tratamento jurídico.
Ou seja, essa cláusula geral de isonomia perante a lei traduz-se também em igualdade
processual. Embora na ação penal pública o Estado se faça presentar pelo Ministério
Público, a parte pública não tem maiores poderes que a parte privada ré, o indivíduo.
Ambos estão no mesmo plano de igualdade, com os mesmos poderes e faculdades e os
mesmos deveres processuais, diferentemente do processo civil em que a Fazenda
Pública e o Ministério Público têm prazos mais dilatados para recorrer e contestar, além
de outros privilégios previstos no Código de Processo Civil.
Todavia, no processo penal a isonomia é mais efetiva. Caso seja violado esse princípio,
a ação penal torna-se nula.
O art. 14, §1º, do Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos — Pacto de Nova
Iorque estabelece que "Todas as pessoas são iguais perante os tribunais e as cortes de
justiça". As implicações do postulado parecem interessantes quando ele é posto em
confronto com a prerrogativa especial de função, dirigida a certas autoridades públicas e
agentes políticos.
Do ponto de vista do sujeito passivo da demanda penal, não haveria nesse privilégio
funcional uma violação ao direito à igualdade processual? As razões estatais para tal
espécie de prerrogativa não nos convencem. Não se diga que com o foro especial
protege-se a função pública ou a dignidade do cargo. Ora, esta não precisa de nenhuma
proteção dessa ordem: a função ou o cargo não são sujeitos de direitos, não ficam
maculados pela conduta ímproba ou desonrosa do agente político que a exerça ou que o
ocupe. Ao fim e ao cabo, é mesmo o indivíduo (autoridade) que se beneficiará do foro
privilegiado e, por conseguinte, de eventual impunidade. Aliás, esta tem sido muito
comum nos últimos anos no Brasil, servindo de nutriente para as teses do direito penal
máximo.
Outra razão nos leva a deplorar o foro especial por prerrogativa de função. O
julgamento criminal do indivíduo deve-se dar sempre pelo Poder Judiciário, que é
composto por órgãos de primeira e segunda instância e encimado por tribunais
superiores. Por que se haveria de imaginar que o detentor do foro especial estaria
melhor "protegido" por ser julgado num tribunal e não diretamente por um juiz de
direito? Qual é a base racional para se acreditar que a função estatal será melhor tratada
ou que o interesse público será melhor atendido, do ponto de vista processual, numa
instância superior?
Ainda que julgado pelo juízo de primeira instância, o agente político que hoje detém a
prerrogativa de foro especial inevitavelmente acabaria por ter sua causa penal revista,
em grau recursal, por um tribunal, seja pelas cortes estaduais de justiça, pelas cortes
regionais federais ou pelos tribunais superiores.
Onde estaria então o risco para a "função pública"? Que prejuízo é esse que poderia
advir de um julgamento direto, como o a que têm direito os cidadãos "comuns"? Se esse
suposto risco existe para os detentores de função pública, existe também (e talvez em
muito maior grau) para os pobres homens do Povo.
Extrai-se do art. 5º, inciso LIII, da Constituição Federal, o princípio do juiz natural.
"Ninguém será processado nem sentenciado senão pela autoridade competente". Com
isso garante-se a existência de um órgão julgador técnico e isento, com competência
estabelecida na própria Constituição e nas leis de organização judiciária de modo a
evitar que se materialize o dogma nulla pœna sine judice.
c)e modificações usuais de competência, pela criação de novas varas ou juízos ou pela
redistribuição de processos.
Inserido no art. 5º, inciso LIV, da Constituição Federal, o princípio due process of law
determina que "ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido
processo legal".
A garantia vale tanto para o processo civil ("de seus bens") quanto para o processo
penal ("da liberdade") e é uma conquista do humanismo britânico, repartindo-se em
procedural due process e substantive due process.
A Declaração das Nações Unidas, de 1948, repete a regra no seu art. IX: "Ninguém
pode ser arbitrariamente preso, detido ou exilado". Por arbítrio, entende-se a
inexistência de lei ou o abuso de direito.
Está claro que tal liberdade pública mantém íntima relação com o princípio da
legalidade (ora, trata-se do devido processo legal), reclamando a devida persecução
penal, limitada pela lei processual.
Por igual, verifica-se também facilmente que é do due process of law que se retira a
proibição de admissão de provas ilícitas no processo (art. 5º, LVI, CF). Descumprida tal
garantia, a sanção é de nulidade em conformidade com a teoria fruit of the poisonous
tree ("fruto da árvore envenenada"), acolhida pelo Supremo Tribunal Federal. Lembre-
se, contudo, que essa vedação não é absoluta, devendo ser vista em cotejo com o
princípio da proporcionalidade, a fim de que não haja grave prejuízo material ao direito
substancial discutido ou protegido, apenas para se dar atendimento a uma forma
procedimental.
A publicidade surge como uma garantia individual determinando que os processos civis
e penais sejam, em regra, públicos, para evitar abusos dos órgãos julgadores, limitar
formas opressivas de atuação da justiça criminal e facilitar o controle social sobre o
Judiciário e o Ministério Público.
"O processo penal deve ser público, salvo no que for necessário para preservar os
interesses da justiça", determina o art. 8º, §5º, da Convenção Americana sobre Direitos
Humanos. A regra, tamanha a sua importância, é reafirmada no art. 93, inciso IX, da
Constituição Federal, conforme o qual "todos os julgamentos do Poder Judiciário serão
públicos e fundamentadas todas as decisões, sob pena de nulidade (...)".
a)a publicidade geral ou plena, como regra para todo e qualquer processo;
Previsto no art. 5º, inciso LVII, da Constituição brasileira, este princípio é também
denominado "da presunção de inocência" ou da "presunção de não-culpabilidade".
Acolhida também nos tratados internacionais sobre direitos humanos, esta garantia
representou ao tempo de sua introdução nos sistemas jurídicos um enorme avanço.
Ninguém poderia ser considerado culpado senão após o trânsito em julgado da sentença
penal condenatória. Já constava da Declaração Francesa de 1789 no art. 9º: "Todo
acusado é considerado inocente até ser declarado culpado (...)".
A Declaração Universal de 1948 assentou, com mais detalhes, que "Toda pessoa
acusada de um ato delituoso tem o direito de ser presumida inocente, até que a
culpabilidade tenha sido provada de acordo com a lei, em julgamento público, no qual
lhe tenham sido asseguradas todas as garantias necessárias à sua defesa" (art. XI).
Como corolário dessa idéia, foi preciso desenvolver o sistema acusatório, atribuindo-se
a um órgão público a missão de alegar e provar os fatos criminais, em nome do Estado,
desfazendo a presunção legal que vigora em prol do indivíduo.
É também constitucional, para o STJ, o art. 2º, §2º, da Lei Federal n. 8.072/90, que
determina que em caso de sentença condenatória por crime hediondo "o juiz decidirá
fundamentadamente se o réu poderá apelar em liberdade". Este posicionamento é
censurável, tendo em conta que a presunção legal é de não-culpabilidade. Portanto, o
que o juiz deveria decidir fundamentadamente é se o réu precisaria recolher-se à prisão
para apelar até o trânsito em julgado da decisão, e não o contrário. Isto é evidente,
porque a regra é poder o réu, em qualquer caso, apelar em liberdade.
d)o de assegurar a validade da regra universal In dubio pro reo, aplicada no direito
anglo-saxônico com o nome de reasonable doubt, que sempre favorece a posição
jurídica do acusado; e
e)a revogação (ou não recepção) do art. 393, inciso II, do Código de Processo Penal,
que mandava lançar o nome do réu no rol dos culpados, por ocasião da sentença
condenatória recorrível.
Dispõe o art. 14, §3º, alínea ´g´, do Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos
— Pacto de Nova Iorque que toda pessoa humana tem o direito de não ser obrigada a
depor contra si mesma nem a confessar-se culpada.
É também garantia judicial internacional, no continente americano, por força do art. 8º,
§2º, alínea ´g´, do Pacto de São José da Costa Rica o direito que toda pessoa tem de
"não ser obrigada a depor contra si mesma, nem a declarar-se culpada". Quer dizer,
nenhuma pessoa é obrigada a confessar crime de que seja acusada ou a prestar
informações que possam vir a dar causa a uma acusação criminal.
A Quinta Emenda à Constituição dos Estados Unidos da América assegura tal garantia
desde o século XVIII. Desde sua adoção nenhuma pessoa "shall be compelled in any
criminal case to be a witness against himsel." Trata-se do "privilege against self
incrimination", que, entre nós, denomina-se garantia contra a auto-incriminação.
Embora a confissão seja tida doutrinariamente como a "rainha das provas", não se pode,
no processo penal, constranger a isso o acusado. Vale dizer: confissão, só espontânea
e/ou voluntária. Qualquer informação obtida do réu (ou mesmo de testemunha)
mediante coação configurará o crime de tortura, previsto na Lei n. 9.455/97.
No sistema brasileiro, admite-se que o indiciado ou réu minta, que negue relação com o
fato, que cale a verdade, que fantasie, que amolde versões aos seus interesses. Trata-se
da regra de ouro Nemo tenetur se detegere, insculpida no art. 5º, inciso LXIII, da
Constituição com a seguinte redação: "O preso será informado de seus direitos, entre
os quais o de permanecer calado (...)".
Em razão desta regra, não foi recepcionado no ordenamento pátrio o disposto no art.
186, parte final, do Código de Processo Penal, segundo o qual, por ocasião do
interrogatório do acusado, "o juiz observará ao réu que, embora não esteja obrigado a
responder às perguntas que lhe forem formuladas, o seu silêncio poderá ser
interpretado em prejuízo da própria defesa".
De igual modo, derrogado está a segunda parte do art. 198 do Código de Processo
Penal, conforme o qual "O silêncio do acusado não importará confissão, mas poderá
constituir elemento para a formação do convencimento do juiz". De sorte que, desde
1988, não pode o magistrado considerar o silêncio do réu em desfavor do processado.
Estas normas, como se evidenciou, não mais têm aplicação no País. Os réus continuam
desobrigados de responderem às perguntas do juiz, e agora têm o direito de manter-se
em silêncio. E só. Desse estado ou dessa postura, em juízo ou no interrogatório policial,
nada advirá em prejuízo do acusado. A única implicação lógica admissível do princípio
é a de que continuará cabendo ao Ministério Público ou ao querelante (na ação penal
privada) a prova da culpabilidade do réu.
Interessante notar, porém, que se o réu não desejar exercer esse direito ao silêncio ou a
ele renunciar, poderá ser "compensado" pelo sistema criminal, por meio dos institutos
da delação premiada e da confissão espontânea.
No primeiro caso, lei especial prevê redução da pena de 1/3 (um terço) a 2/3 (dois
terços) para o réu delator (co-autor ou partícipe) que "através de confissão espontânea
revelar à autoridade policial ou judicial toda a trama delituosa". É o que se dá por
força do art. 16, parágrafo único, da Lei Federal n. 8.137/90, que cuida dos crimes
contra a ordem tributária, a ordem econômica e as relações de consumo.
Tratamento mais favorável ao delinqüente colaborador também está presente no art. 1º,
§5º, da Lei n. 9.613/98 — Lei de Lavagem de Capitais, quando o réu, co-autor ou
partícipe "colaborar espontaneamente com as autoridades, prestando esclarecimentos
que conduzam à apuração das infrações penais e de sua autoria ou à localização dos
bens, direitos ou valores obeto do crime".
Perceba-se que, em qualquer das situações acima analisadas, o réu preserva o seu direito
ao silêncio e continua desobrigado de colaborar com as autoridades. Mas se resolver
falar, cooperando, será premiado com a redução da pena.
A Sexta Emenda à Constituição dos Estados Unidos declara que "In all criminal
prosecutions, the accused shall enjoy the right to a speedy and public trial, by an
impartial jury of the State and district wherein the crime shall have been committed,
which district shall have been previously ascertained by law, and to be informed of the
nature and cause of the accusation; to be confronted with the witnesses against him; to
have compulsory process for obtaining witnesses in his favor, and to have the
Assistance of Counsel for his defence".
Para o Supremo Tribunal Federal, a garantia do contraditório não vigora, também, nos
pedidos de quebra de sigilo bancário, porquanto em tais situações o anúncio da
disclosure poderá levar à mobilização de somas em dinheiro e sua conversão em ativos
móveis, o que dificultaria sobremaneira a reparação do dano ou o eventual seqüestro
dos bens.
Tais considerações, entretanto, precisam ser bem entendidas. Não é que de fato inexista
contraditório nesses procedimentos. Significa apenas que a oportunidade de
conhecimento da medida apuratória ou das provas colhidas na investigação inquisitorial,
e o ensejo de contestação a elas e produção de contra-provas serão dados ao
investigado/réu em momento posterior, garantindo-se assim a ampla defesa.
Certo, por outro lado, é que não há incidência do contraditório no inquérito policial, que
é procedimento administrativo pré-processual, inquisitorial, presidido pela Polícia
Judiciária, destinado à formação da opinio delicti do Ministério Público e a subsidiar a
ação responsável do Estado em juízo, evitando lides penais temerárias.
c)o direito à ciência prévia e a tempo da acusação, podendo o acusado "dispor do tempo
e dos meios necessários à preparação de sua defesa";
Assim, também no processo penal, em que estão em jogo a liberdade e o patrimônio dos
acusados, bem como suas honras. Ao lado da vida, esses são os bens mais valiosos do
homem, que o diferenciam da imensa massa dos seres. Por isso, nesse campo, quando
um desses bens é posto na berlinda, a defesa deles deve ser amplamente assegurada,
"com todos os meios e recursos a ela inerentes".
A defesa criminal pode ser técnica, quando realizada por meio de advogado, ou pessoal.
Neste caso, o réu assumiria a proteção processual dos seus próprios interesses em face
da acusação contra si apresentada.
Quanto a este último aspecto, realçamos a previsão do art. 14, §3º, alínea ´d´, do Pacto
de Nova Iorque, que assegura a todo acusado o direito de "estar presente no julgamento
e de defender-se pessoalmente ou por intermédio de defensor de sua escolha; de ser
informado, caso não tenha defensor, do direito que lhe assiste de tê-lo e, sempre que o
interesse da justiça assim exija, de ter um defensor designado ex officio gratuitamente,
se não tiver meios para remunerá-lo".
Semelhantemente, no art. 8º, §2º, alínea ´d´, do Pacto de São José da Costa Rica, está a
garantia do acusado de "defender-se pessoalmente ou de ser assistido por um defensor
de sua escolha e de comunicar-se livremente e em particular, com seu defensor".
Daí resulta que a incomunicabilidade dos acusados, ainda que judicialmente decretada
na forma do art. 21 do Código de Processo Penal, não impede o contato direto do
advogado com o seu cliente. Esta garantia profissional do advogado é imprescindível ao
asseguramento da ampla defesa do acusado. O direito profissional é uma das
manifestações do direito constitucional do acusado a uma defesa efetiva e larga.
Nessa mesma medida, é óbvio que a defesa deverá ser efetiva, uma vez que defesa
técnica irreal, falha, omissa, leniente equivale a ausência de defesa, sendo causa de
nulidade do processo.
Além disso, parece-nos oportuno assinalar que o art. 261 do Código de Processo Penal
foi derrogado pelos citados dispositivos convencionais. Os tratados internacionais têm
força de lei ordinária no Brasil, seguindo o princípio temporal de que "lei posterior
derroga lei anterior".
Assim, em tese, seria possível a defesa processual realizada inteiramente pelo acusado
in persona, sem concurso de advogado, já que a regra do art. 261 ("Nenhum acusado,
ainda que ausente ou foragido, será processado ou julgado sem defensor") datada de
1941 foi suplantada pelo art. 8º, §2º, ´d´, do Pacto de São José da Costa Rica, e pelo art.
14, §3º, ´d´, do Pacto de Nova Iorque, que lhe são posteriores (1992) e permitem às
inteiras a defesa pessoal.
Todavia, esta possibilidade é um tanto temerária, pois a falta de defesa técnica pode
prejudicar sobremaneira os interesses do acusado, em virtude da real ou potencial
disparidade de armas entre o réu e o Ministério Público, sempre profissional.
Demais disso, a tese peca por olvidar que, por força do art. 133 da Constituição Federal
(norma hierarquicamente superior aos citados tratados) o advogado é essencial à
administração da justiça, principalmente a criminal. Isto se mostra mais claro ao se
verificar que as hipóteses de jus postulandi existentes em nosso ordenamento aplicam-
se apenas a procedimentos extrajudiciais. Quanto aos judiciais, admite-se a postulação
direta, sem advogado, tão-somente nas reclamações trabalhistas em geral e nas ações
cíveis de até 20 salários mínimos, reguladas pela Lei n. 9.099/95, que instituiu os
Juizados Especiais Cíveis.
Este princípio não está expressamente previsto na Constituição Federal. Trata-se de uma
diretriz implícita, que se constrói a partir do art. 5º, inciso LV, segunda parte, da
Constituição, e dos arts. 92, 102, 105 e 108 da mesma Carta.
Ora, se é garantida a ampla defesa, "com os meios e recursos a ela inerentes", assegura-
se concomitantemente o direito de revisão da decisão por um órgão colegiado superior.
Está também previsto tal princípio no Pacto de São José da Costa Rica e no Pacto de
Nova Iorque. Todavia, nessas duas convenções a menção é expressa, valendo como lei
ordinária no Brasil. Neste caso, como lei processual ordinária.
Genericamente, o art. 9º, §4º, do Pacto de Nova Iorque determina que "Qualquer pessoa
que seja privada de sua liberdade por prisão ou encarceramento terá o direito de
recorrer a um tribunal para que este decida sobre a legalidade de seus encarceramento
e ordene sua soltura, caso a prisão tenha sido ilegal".
Mais claro é o art. 15 do mesmo tratado: "Toda pessoa declarada culpada por um delito
terá o direito de recorrer da sentença condenatória e da pena a uma instância
superior, em conformidade com a lei".
Neste passo, é oportuno assinalar o art. 5º, §2º, da Constituição Federal, que estabelece
que "Os direitos e garantias expressos nesta Constituição não excluem outros
decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados, ou dos tratados
internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte".
Esse dispositivo de extensão, além de fazer clara a importância dos princípios para a
exegese constitucional, evidencia por igual que as diretrizes que regem essa
hermenêutica não se encontram apenas no art. 5º, do rol de direitos, nem estão
elencadas somente na Constituição; podem estar nas convenções internacionais de que o
Brasil seja parte ou mesmo em outros pontos da Constituição, como no art. 228, que
estatui que "São penalmente inimputáveis os menores de dezoito anos, sujeitos às
normas da legislação especial".
Embora situado no capítulo VII, do Título VIII, da Constituição, que trata da ordem
social, o art. 228 prevê legítimo direito individual, limitador da ação do Estado no
processo penal. E, portanto, é também cláusula pétrea, em conformidade com o art. 60,
§4º, inciso IV, da Carta Federal.
O fato de não estarem previstos na Constituição não lhes retira a importância, bastando
lembrar a norma de extensão do art. 5º, §2º, da Constituição Federal.
Segundo a doutrina mais moderna, capitaneada no Brasil por LUIZ FLÁVIO GOMES,
é impossível alcançar a verdade real. No máximo, obtém-se a verdade processual ou a
verdade judicial, o que dá no mesmo.
O que importa observar é que nunca será possível reconstruir inteiramente o iter
criminis, porquanto parte dele se processa no mundo subjetivo, na mente do
delinqüente, sendo inalcançável pelo julgador e pelo Ministério Público, mesmo
mediante confissão.
De qualquer modo, o princípio da verdade real — que deve ser aplicado também ao
processo civil, malgrado a resistência da doutrina — obriga:
Para atingir esse desiderato, permite-se, ao lado da iniciativa das partes, o impulso
oficial pelo magistrado e a produção de provas ex officio, faculdade que é criticável pois
pode contaminar o ente de razão do juiz, levando-o a pré-julgamento.
Decorrem também desse princípio a redução das faculdades dispositivas das partes,
quanto a prazos, procedimentos e formas, todos de ordem pública, bem assim a drástica
limitação das ficções, transações e presunções, tão características do processo civil, mas
quase totalmente vedadas no penal.
Também em razão da verdade real, a confissão do réu, para alguns tida como regina
probationum, passa a ser vista no processo penal como prova comum, a teor do art. 197
do Código de Processo Penal, que dispõe: "O valor da confissão se aferirá pelos
critérios adotados para os outros elementos de prova, e para a sua apreciação o juiz
deverá confrontá-la com as demais provas do processo, verificando se entre ela e estas
existe compatibilidade ou concordância".
b)a perempção, que extingue o processo, na ação penal privada, em razão da contumácia
ou da simples inércia do querelante;
c)o perdão do ofendido na ação penal privada, como forma de extinção do processo,
impedindo também a declaração da verdade real.
2. Princípio da oralidade
A oralidade, além dessa noção temporal, ligada à concentração dos atos, permite
também inserir no processo penal o princípio da imediatidade, que confere maior
proximidade ao julgador em relação às partes e à prova produzida, levando à mesma
celeridade.
Por igual, outra conseqüência da oralidade pode ser a garantia da identidade física do
juiz, que não se aplica ao processo penal, segundo a doutrina, salvo excepcionalmente
mediante a repetição voluntária dos atos processuais, determinada na forma do art. 502,
parágrafo único, do Código de Processo Penal, ou analogicamente in bonam partem, na
forma do art. 132 do Código de Processo Civil.
a)no rito sumariíssimo da Lei Federal n. 9.099/95, decorrente do art. 98, inciso I, da
Constituição Federal; e
Isto torna-se ainda mais evidente quando consideramos que o princípio da oportunidade
deriva do brocardo Nec delicta maneant impunita, ou seja, que nenhum crime
permaneça impune. Evidentemente tal diretriz não se harmoniza com o direito penal
mínimo. Ao contrário, serve à doutrina da lei e da ordem e da tolerância zero ou ao
direito penal do terror.
Há pouco espaço normativo (no direito positivo infraconstitucional, que fique bem
entendido) para a aplicação do princípio da oportunidade da ação penal pública. Esse
postulado deriva da regra magna minima non curat prætor, que hoje encontra descrição
doutrinária como o princípio da insignificância.
Um dos dispositivos úteis é o próprio artigo 28 do Código de Processo Penal, pois este
cânon não diz quais devem ser as "razões invocadas" pelo Ministério Público para a
promoção do arquivamento do inquérito policial. O promotor ou o procurador poderia,
perfeitamente, invocar razões de política criminal ou de utilidade para não promover a
demanda penal, tendo em vista, por exemplo, a aproximação do termo final do prazo
prescricional máximo previsto para aquele delito. Poderia, ainda, alegar o membro do
Parquet a insignificância penal da conduta apurada no inquérito, ou a inconveniência da
ação.
Com isso quer-se dizer que, embora reconheçamos, que a teoria geral da ação é uma só
— abarcando ação civil e ação penal —, as semelhanças entre a ação penal privada e a
ação civil são maiores do que as que existem entre as demais. Prova disso é que o
princípio da obrigatoriedade não se aplica nem à ação civil nem à ação penal privada,
mas é impositivo em relação à ação penal pública incondicionada e à ação penal pública
condicionada.
Tratando desta última, é de se ver aí uma forma híbrida de ação — meio penal e meio
civil, ou meio penal pública e meio penal privada —, porquanto nela a persecução penal
pelo Estado (presentado pelo Ministério Público) somente se iniciará se houver o
implemento da condição: a representação da vítima ou de seu representante legal ou a
requisição do Ministro da Justiça. Sem essas condições de procedibilidade, a ação penal
pública, conquanto marcada pelo princípio da obrigatoriedade, não poderá ser iniciada.
Em razão disso, percebe-se que o brocardo Nec delicta maneant impunita somente se
aplica inteiramente à ação penal pública incondicionada, porque se para a ação penal
privada não tem qualquer influência, no que pertine à ação pública condicionada fica a
depender da vontade (autonomia privada) do indivíduo ofendido ou da requisição do
Ministro da Justiça, que agirá animado por razões políticas.
Sem dúvida, essa concepção inovadora tem-se inserido aos poucos no sistema jurídico
brasileiro, a partir da Constituição Federal de 1988, que, além de conferir independência
funcional ao Ministério Público, permitiu a instituição do procedimento sumaríissimo,
com transação penal (art. 98, inciso I).
4. Princípio da oficialidade
Daí serem criados por lei órgãos oficiais de persecução criminal, para investigação dos
delitos e processamento dos crimes, no sistema acusatório. A Declaração Francesa de
1789 já especificava que "A garantia dos direitos do homem e do cidadão necessita de
uma força pública; esta força é, pois, instituída para fruição por todos, e não para
utilidade particular daqueles a quem é confiada" (art. 12).
O art. 144 da Constituição Federal organiza a segurança pública no País, ao passo que o
art. 4º do Código de Processo Penal estabelece atribuições de Polícia Judiciária e o art.
129, inciso I, da Constituição Federal especifica o munus do Ministério Público no
tocante à ação penal pública.
Observe-se, porém, que existe uma outra aparente exceção à oficialidade da ação penal.
Trata-se da ação penal popular, instituída no art. 14 da Lei n. 1.079/50, que cuida dos
impropriamente chamados "crimes" de responsabilidade do Presidente da República.
Trata-se esta da lei especial a que alude o art. 85, parágrafo único da Constituição
Federal. Perceba-se que os delitos previstos na legislação de 1950, que foi recepcionada
pela Carta de 1988, não estabelecem sanção privativa de liberdade. A sanção é a perda
do cargo com a inabilitação para a função pública, na forma do art. 52, parágrafo único,
da Constituição Federal, combinado com o art. 2º da Lei n. 1079/50.
Está claro, portanto, que, embora chamadas de "crimes" de responsabilidade, as
infrações previstas na Lei n. 1079/50 e no art. 85 da Constituição Federal não são de
fato delitos criminais, mas sim infrações político-administrativas, que acarretam o
impeachment do Presidente da República.
Logo, não se pode falar na existência de ação penal popular, como entendem alguns
comentaristas do art. 14 da Lei n. 1079/50.
De igual modo, não há ação penal popular (conquanto assim denominada) no art. 41-A
da mesma Lei, para as ações "penais" por "crime" de responsabilidade previstos no art.
10 da Lei n. 1.079/50. Esses delitos podem ser atribuídos ao Presidente do STF, aos
presidentes dos tribunais superiores, tribunais regionais e cortes de contas, tribunais de
justiça e de alçada, aos juízes diretores de fóruns, ao Procurador-Geral da República, ao
Advogado-Geral da União, aos membros do Ministério Público e da AGU com função
de direção de unidades regionais, entre outros.
Com razão, portanto, LUIZ FLÁVIO GOMES e ALICE BIANCHINI, ao dizerem que
"se for entendido que as condutas previstas no art. 10 da Lei 1.079/50 são de caráter
penal (e isso já foi anteriormente afastado), torna-se absurdo permitir a todo cidadão o
oferecimento da denúncia, pois amplia o rol dos legitimados para propositura de ação
penal, em total afronta ao art. 129, I, da Constituição, que estabelece a competência
privativa do Ministério Público".
Corrente minoritária da doutrina defende a idéia de que a "denúncia" de que trata a Lei
n. 1.079/50 (especialmente a prevista no art. 14) é simplesmente uma notitia criminis
postulatória, pois a verdadeira acusação contra o Presidente da República nos chamados
crimes de responsabilidade ficaria a cargo da Câmara dos Deputados, autoridade
competente consoante o art. 51, inciso I, da Constituição Federal.
5. Princípio da indisponibilidade
Tanto o inquérito policial quanto o processo penal são indisponíveis. Esta realidade
deriva do princípio da obrigatoriedade da ação penal pública e do brocardo Nec delicta
maneant impunita.
Positivam tal princípio o art. 10 do Código de Processo Penal, que estabelece prazo
cabal para a conclusão do inquérito policial; o art. 17 do mesmo código, que impede o
arquivamento do IP pela autoridade policial; e o art. 28, que situa o juiz como fiscal do
princípio da obrigatoriedade da ação penal, permitindo-lhe discordar da promoção feita
pelo Ministério Público.
São também corporificações do princípio o art. 42 do CPP, que proíbe que o Ministério
Público desista da ação penal que tenha proposto e o art. 576 do Código de Processo
Penal, que impede o Parquet de desistir de recurso que haja interposto em ação penal
pública.
Merece crítica, no entanto, a disposição do art. 385 do Código de Processo Penal, que
autoriza o juiz a condenar o réu, mesmo em face de pedido absolutório apresentado pelo
Ministério Público na ação penal pública.
Contudo, já foi dito noutro passo que no processo não se atinge a verdade real, senão a
verdade judicial, e a constante busca por essa "verdade" somente ocorre na ação penal
pública incondicionada, porquanto, mesmo na ação penal pública condicionada pode o
ofendido impedir a persecução se não oferece a representação ou dela se retrata, antes
do oferecimento da denúncia (art. 25 do Código de Processo Penal).
Não há nada de estranho nesse proceder, uma vez que noutros sistemas jurídicos pode o
Ministério Público simplesmente retirar a acusação apresentada contra o réu, findando-
se a instância.
Idêntica censura se faça quanto à previsão da segunda parte do art. 385 do Código de
Processo Penal, que autoriza a autoridade judiciária a reconhecer agravantes que não
tenham sido alegadas na denúncia ou nas alegações finais do Ministério Público. A
proposição é estranha, porque representa forma de julgamento ultra petita, além do
pedido. A sentença não terá correlação com a acusação.
Disposição como esta tinha sentido na década de 1940, quando da introdução do Código
de Processo Penal, época em que o Ministério Público não estava organizado
nacionalmente com a devida estrutura e capilarizado em todas as comarcas do País,
como instituição inteiramente profissional. Hoje, com as responsabilidades que foram
atribuídas ao Parquet e com o desenvolvimento de uma cultura de Ministério Público é
desarrazoada a regra ora examinada, tanto quanto o é a que determina o reexame
necessário em certos casos.
Em apoio à tese ora esposada, lembremos que na fase recursal o tribunal de apelação
não pode piorar a situação jurídica do réu caso não haja recurso da acusação. Ou seja, se
o Ministério Público não interpuser apelação, o colegiado ad quem não poderá reformar
sentença que tenha absolvido o réu e nem mesmo poderá agravar a pena que lhe tenha
sido aplicada.
Por outro lado, se o Ministério Público (ou o querelante) apresentar apelação, o tribunal
estará livre para manter a decisão de primeira instância, para reformá-la (inclusive
condenando réu que tenha sido absolvido) ou para alterar a pena, minorando-a ou
agravando-a.
Ora, o tribunal ad quem não pode nem mesmo aumentar a pena do réu, no caso de
recurso exclusivo da defesa, que corresponde a hipótese de silêncio ou conformação do
Ministério Público, com cessação da tarefa acusatória. Como então admitir que o juiz a
quo possa condenar o réu a pena maior do que a pedida pela acusação, reconhecendo
agravante não alegada?!
A resposta parece estar no princípio da verdade real. Mas esse princípio não pode
aplicar-se apenas à primeira instância, esquecendo a fase recursal. Há assim um
evidente descompasso entre a regra do art. 385 do Código de Processo Penal e o
princípio non reformatio in pejus.
Também caracteriza o princípio da iniciativa das partes o axioma sententia debet esse
conformis libello, o de que a sentença deve estar em conformidade com a acusação. Este
princípio é também denominado de princípio da correlação.
A regra Ne procedat judex ex officio não transforma o juiz num órgão absolutamente
inerte. Iniciada a ação penal, pode e deve a autoridade judiciária promover o bom e
rápido andamento do feito. Presidindo a instância penal, cabem ao juiz (art. 251, Código
de Processo Penal) a direção e regulação do processo, competindo-lhe determinar:
Essas providências são necessárias para a busca da verdade real, tendo em conta
também a indeclinabilidade da jurisdição penal, o que siginifica que o juiz não poderá
declarar non liquet; encerrar o processo sem causa legal (como a incidência de causa
extintiva de punibilidade); ou paralisá-lo injustificadamente em seu curso.
A desatenção à forma sucessiva e lógica dos atos processuais pode conduzir também à
nulidade do processo. Assim, a alteração da ordem legal de ouvida de testemunhas
(primeiro as da acusação e depois as da defesa), se causar prejuízo ao acusado,
ocasionará a nulidade do processo a partir do instante da violação da ordem sucessiva
ordenada em lei.
Conforme o art. 14, §7º, do Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos,
"Ninguém poderá ser processado ou punido por um delito pelo qual já foi absolvido ou
condenado por sentença passada em julgado, em conformidade com a lei e os
procedimentos penais de cada país".
Pelo art. 8º, §4º, do Pacto de São José da Costa Rica "O acusado absolvido por
sentença passada em julgado não poderá ser submetido a novo processo pelos mesmos
fatos".
"No person shall be held to answer for a capital, or otherwise infamous crime, unless
on a presentment or indictment of a Grand Jury, except in cases arising in the land or
naval forces, or in the Militia, when in actual service in time of War or public danger;
nor shall any person be subject for the same offence to be twice put in jeopardy of life
or limb; nor shall be compelled in any criminal case to be a witness against himself,
nor be deprived of life, liberty, or property, without due process of law; nor shall
private property be taken for public use, without just compensation.
Talvez um dos mais importantes princípios do processo penal, o do favor rei representa
uma garantia contra a ineficiência do Estado ou contra acusações temerárias.
Em face dele, conhecido também como princípio In dubio pro reo (favor innocentiæ), a
lei processual permite a absolvição do réu por insuficiência de provas (art. 386, II e IV).
O favor rei proíbe a reformatio in pejus em detrimento do acusado (art. 617 do CPP)
durante o exame recursal de irresignação exclusiva da defesa e favorece a posição
jurídica do réu, facultando-se a interposição de recursos privativos, como o protesto por
novo júri (art. 607-CPP) e a revisão criminal (art. 621).
Como exceção, pode-se citar a desclassificação in pejus, prevista no art. 408, §4º, do
Código de Processo Penal.
Conclusão
Se alguma utilidade tem este rápido panorama, é a de revelar a importância do estudo
dos princípios constitucionais e dos princípios gerais do processo penal. Sem o exame e
o conhecimento dessas diretrizes e postulados, não pode a Justiça Criminal funcionar a
contento, nem estarão os juldadores, os membros do Ministério Público e os defensores
habilitados a promover o bom direito.
NOTAS
3.Em alguns países dessa ordem é crime ter acesso à Internet, expressar opinião, ou,
para a mulher, sair às ruas com maquiagem ou com o rosto descoberto. A Folha de São
Paulo, edição de 19 de julho de 2001, noticia que no Egito é crime ser homossexual
(página A-12): "Justiça do Egito julga 52 homens por comportamento homossexual". A
justiça egípcia imputa aos acusados citados na reportagem o delito de "imoralidade
sexual", estando sujeitos "a até cinco anos de prisão".
4.Como se pode entender como harmônica uma sociedade, como a norte-americana, que
tem dois milhões de pessoas encarceradas?! Tal número, ao contrário de demonstrar a
eficiência do sistema penal dos EUA ou a atuação incansável da Justiça criminal
naquele país, serve para provar a falência de um modelo comunitário e o fracasso do
próprio Estado em integrar os seus cidadãos.
7.Na forma do art. 10, §3º, do Pacto de Nova Iorque, "O regime penitenciário consistirá
num tratamento cujo objetivo principal seja a reforma e a reabilitação moral dos
prisioneiros".
10.A Declaração Francesa de 1789 especifica (art. 5º) que "A lei não proíbe senão as
ações nocivas à sociedade".
12.Mirabete (Processo penal, pp. 122/123) ensina que esse princípio, que "consiste no
fato de ser a ação penal limitada à pessoa ou às pessoas responsáveis pela infração, não
atingindo desse modo, seus familiares ou estranhos", não é acatado nas legislações que
prevêem a reparação civil ex delicto.
13.Pelo art. 14, §3º, ´d´, do Pacto de Nova Iorque, toda pessoa acusada de um delito tem
direito de ser julgada "sem dilações indevidas", garantia esta que efetivamente
determina a limitação do prazo da prisão preventiva. O mesmo direito decorre do art. 8º,
§5º, do Pacto de São José.
18.Conforme o art. 10, §2º, do Pacto de Nova Iorque sobre Direitos Civis e Políticos.
19.É inviável a tipificação criminal de condutas por meio de medidas provisórias.
Questiona-se se o Estado também estaria proibido de veicular regras processuais por
meio de medidas provisórias.
21.Consta da Declaração da ONU, de 1948, que "Toda pessoa tem direito, em plena
igualdade, a uma justa e pública audiência por parte de um tribunal independente e
imparcial, para decidir de seus direitos e deveres ou do fundamento de qualquer
acusação criminal que lhe seja feita" (art. X). Dessa regra decorre a obrigatoriedade da
fundamentação da pretensão punitiva estatal veiculada em denúncia do Ministério
Público.
22.A garantia da publicidade está também no art. 14, §1º, do Pacto de Nova Iorque.
30.Art. 1º, inciso I, alínea ´a´: "Constitui crime de tortura constranger alguém com
emprego de violência ou grave ameaça, causando-lhe sofrimento físico ou mental com o
fim de obter informação, declaração ou confissão da vítima ou de terceira pessoa".
41.Como determina o art. 8º, §1º, do Pacto de São José da Costa Rica.
42.Artigo 9º, §2º, do Pacto de Nova Iorque: "Qualquer pessoa, ao ser presa, deverá ser
informada das razões da prisão e notificada, sem demora, das acusações formuladas
contra ela".
43.Art. 14, §3º, ´b´, do Pacto de Nova Iorque e art. 8º, §2º, ´c´, do Pacto de São José.
47.Consta do art. 14, §3º, ´e´, do Pacto de Nova Iorque, e do art. 8º, §2º, ´f´, do Pacto de
São José.
53.A regra é repetida no art. 8º, §2º, alínea ´h´, do Pacto de São José da Costa Rica.
55."A confissão do acusado só é válida se feita sem coação de nenhuma natureza" (art.
8º, §3º, do Pacto de São José).
56.O inverso, todavia, é causa de nulidade. Não se pode substituir o rito ordinário pelo
sumário, nem este pelo sumariíssimo.
57.Exemplo: ação penal por crime de lesões corporais contra marido que espanque sua
esposa ou companheira. Se o casal voltar a conviver pacificamente, a ação penal
promovida pelo Ministério Público será, sem dúvida, nociva à salubridade da relação
conjugal. Então, o que fazer, diante dos princípios da obrigatoriedade e
indispobinibilidade da ação penal?
58.Para uma análise mais aprofundada, ver o nosso artigo "Suspensão condicional do
processo: direito subjetivo do acusado?" em www.direitocriminal.com.br
59.Vide também o art. III da Declaração Universal dos Direitos Humanos, de 1948:
"Todo homem tem direito à vida, à liberdade e à segurança pessoal" e o art. 9º, §1º, do
Pacto de Nova Iorque.
60.A lei determina inabilitação por cinco anos, mas a Constituição Federal especifica
que tal inabilitação deve-se dar pelo prazo de oito anos, o que de fato aconteceu com o
ex-presidente Fernando Collor de Melo.
64.O art. 8º da Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, de 1789, dispõe que
"A lei deve estabelecer penas estrita e evidentemente necessárias (...)". Já o art. 9º
quanto aos acusados diz que "todo rigor desnecessário à guarda da sua pessoa deverá ser
severamente reprimido pela lei".
Bibliografia
CAPEZ, Fernando. Curso de processo penal. São Paulo: Saraiva, 5ª ed., 2000.
MIRABETE, Júlio Fabbrini. Processo penal. São Paulo: Atlas, 10ª ed., 2000.
Vladimir Aras