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A espacialidade da riqueza: notas te6ricas sobre as principais determinagédes da dimensao espacial do desenvolvimento capitalista Carlos Anténio Brandao O presente texto procura estabelecer e dis- cutir 0 lugar te6rico das principais determi- nagées que explicariam o carater desigual do processo de desenvolvimento capitalista e busca demonstrar a necessidade de avanear na teorizacao e na hierarquizacao dos determinantes que conformam a di- mensao espacial desse proceso. Sugeri- mos que para a devida anilise critica da acumulacao desigual de capital no espaco seria imprescindivel verificar articulada- mente osmovimentos de homogeneizacdo, de integracdo, de polarizacao e de hegemo- nia nos diversos recortes territoriais. O desenvolvimento capitalista é intrin) secamente marcado por rupturas, con-} flitos, desequilibrios e assimetrias’é ‘apresenfa uma peculiar espacialidade de sua riqueza, sob a forma de mercadorias, que requer instrumentos analiticos e con- ceituais bastante precisos para o seu estu- do. Podemos dizer que todas as correntes do pensamento social que procuraram abordar o desenvolvimento desigual dos espacos regionais apresentaram alguma proposicao tedrica acerca dessas quatro dimensées e forcas. Entendemos que esses conceitos de homogeneizacao, de polariza- Go, de integracao e de hegemonia hoje exigem reatualizacao, pois foram conce- bidos e utilizados em realidades bastante diversas da apresentada pelo novo mo- mento de mundializacao do capital. Cabe aqui, porém, um conjunto de alertas. E preciso ter cuidado para nao cair nem em “abstragées cientificistas” (Oliveira, 1985), ou seja, entender o espa- co eo tempo de forma apartada da acao social de sujeitos concretos, nem em “his- toricismos”, que ndo avancam além dos meros estudos caso a caso. Assim, deve- se esclarecer que esses quatro conceitos, mesmo retrabalhados, nao possibilitam cestabelecimento de leis gerais de movi- Cadernos IPPUR, Rio de Janeiro, Ano XV, N° 1, 2001, p. 119-134 120 mento, ou seja, o entendimento da dimen- sao espacial do processo de desenvol- vimento nao pode prescindir, em nenhum momento, da Historia. As categorias so- ciais possuem uma natureza intrinseca nao universalizavel, posto que histéricas. Marx (1982, p. 17) afirma, acerca do mé- todo da economia politica, que “até as categorias mais abstratas (...) so, con- tudo, na determinidade dessa abstracao, igualmente produto de condigées histori- cas, e nao possuem plena validez senao para essas condig6es e dentro dos limites destas”. Esse principio é discutido por Pacheco (1998, p. 32), quando este escla- rece que ‘a discussao sobre regides é desde logo uma problematica afeita ao desenvol-| \vimento do capitalismo e a conforma- |cdo de padrées de divisao do trabalho lque se diferenciam espacialmente, Icom a conseqiiente diferenciaga leconémica do espaco e, portanto, ltambém,dos sujeitos que habitam est: proceso exige uma formulacao ted- rica, esta formulagao nao se con- funde com leis gerais. Trata-se de um processo eminentemente histdérico- genético (...), Isto nao significa obriga- toriamente ancorar-se numa proposta historicista, mas significa reconhecer que a elaboracao tedrica sobre este Aeespacialidade da riqueza processo nao tem como fugir da fixa- do de suas condicées histéricas.” Outro alerta importante é que aqueles quatro conceitos devem ser formulados em planos teéricos distintos, fruto que sao de determinagées muito diversas. Estando posicionados em Ambitos diferentes de anélise, nao sao derivaveis dos mesmos elementos, ea passagem de um para outro envolve necessariamente intimeras me- diac6es tedricas que estao por ser cons- truidas. Varios exemplos dos equivocos cometidos no estudo da relacao entre tais conceitos podem ser encontrados em di- versas passagens dos especialistas da drea. Assim, Boudeville (1973) afirma que “a auséncia de homogeneidade é a medida da auséncia de integracao”; Lipietz (1977, p.150) diz que “a homogeneidade é cons- titutiva da polarizacao (sem articulacao nao ha polarizago) e reciprocamente sem campo de forcas sociais nao ha senao uni- dade formal do espaco considerado”, ¢ Aydalot (1976), por sua vez, ensina que “o que define um espaco nao pode ser um ctitério de homogeneidade, senao pelo contrario, um critério de complexidade”. Procuraremos demonstrar como os conceitos propostos neste ensaio pode- riam constituir-se em elemento fundante de uma perspectiva critica que assuma como constitutiva a dimensao espacial dos processos econdmicos e sociais Reconceituando o processo de homogeneizagéo A abordagem aqui proposta se afasta completamente da discussao de espaco homogéneo da chamada Ciéncia Regio- nal. Ou seja, esse conceito deve ser iso- lado de qualquer idéia de otimizacao, de convergéncia ou de eqitipoténcia “espa- cial”, bem como de critérios de semelhan- cae de contiguidade. Boudeville (1973), Carlos Anténio Brandao por exemplo, ira tratar a homogeneizacao como “medida dos fatos (isto é, maior ou menor uniformidade)”, e jé se tornou uma tradicdo dos estudos regionais a utili- zagao desse conceito como critério para delimitar fronteiras regionais. O sentido aqui proposto procura mostrar que esse Processo nao delimita “regioes, mas so- bretudo “desfaz” fronteiras territoriais, abrindo horizontes e dispondo espacos para valorizacdo capitalista mais ampla. Propomos que toda a énfase da ana- lise espacial recaia no processo de ho- mogeneizacao de relacées, isto é, de equalizacao, enquanto tendéncia, reque- fida rodu- A mais apropriadas a seu movimento unificado de valorizacéo, ou seja, de con- dices “mais igualitarias” para a sua re- produgéo ampliada. Certamente o capital nao requer e nao engendra qualquer igua- lagao de niveis de desenvolvimento do conjunto das forcas produtivas. Realizar a separacao de caracteristicas comuns (topograficas, climéticas etc.) de uma determinada porgao territorial (para con- trapé-las a dessemelhancas extrafrontei- ra sob andlise) pouco permite avancar na anilise da dimensao espacial do pro- cesso de desenvolvimento. Focalizar iden- tidades regionais, buscando mostrar a harmonizagao e a coesao comunitarias e igualitarias de um espaco visto como continuo e forcando a construgao de uma personalidade prépria e fundada em idiossincrasias localizadas, serve perfeita- mente para a construgao de uma pauta de reivindicagées regionalistas, mas atra- palha a investigacao critica da dinamica concreta de um determinado recorte ter- ritorial, Em outras palavras, a homoge- 121 eizacdo nao deve ser associada a ne- nhuma idéia de afinidades ou de solida- riedade de uma “comunidade” particular, mas ao movimento universalizante do capital, arrebatando mesmo os espacos mais remotos a um tinico dominio. Ape- nas nesse sentido o capital é homogenei- zador e abarcador. Kér encarado através do vetor da acumu- jaca capitalista de busca da valorizagao nificada e da universaliza h mercantilizagao as tiltimas conseqiiés as. O processo homogeneizador é at ‘a imposicao pelo capital, e raualquer espaco, de seus pressupostd anentes; 4 capacidade do mesmo em ipcorporar massas humanas a sua dina ica; 4 atragao de todos os entes a orbital He seu mercado; a subordinacao a si de das as unidades societdrias; 4 busca de construcao de um espaco uno de acu- 1ulagao e a destruicao de quaisquer bar- eiras espaciais e temporais que possam, gerar atritos e fricgSes ao seu movir A luta do capital por uma esfera unificada de valorizacao engendra a are- nae fixa os parametros (a igualdade das tegras) sob os quais se dara a luta concor- rencial. O capital busca a equivaléncia de suas condicées reprodutivas em todo e qualquer lugar, assim, sao préprias do seu movimento a aniquilagao do espaco pelo tempo, a forca dissolvente de rela- Ges arcaicas e a mobilidade e flexibi- lidade espaciais. E preciso muito cuidado no tratamento dessa dimensao “espacial” do capitalismo porque ela néo tem nada de niveladora de desigualdades. Na ver- 122 dade,bsse processo homogeneizador (de Telagdes mercantis) cria e recria estrutu- ras heterogéneas e desigualdades em seu movimento. Certamente o desenvolvi- mento capitalista nao é uma dinamica evolutiva de ‘nivelamento” e de propaga- cdo de progresso técnico por todas as por- c6es do territério. O que ele difunde é a légica da multiplicagao do valor, de um modo continuamente renovado em busca do enriquecimento absoluto, realizando tecorrentemente a ruptura do isolamento, atravessando todas as fronteiras, arrefe-| cendo barreiras e protecdes erguidas por} relacées arcaicas', Sujeitando todos os Tecortes do territ6rio que interessem a sua determinagao, o capital funde os espacos circunscritos, apropriando-se de terra, trabalho e dinheiro, transformando-os em mercadoria, segundo Polanyi (1980). Em sua trajetoria de busca de riqueza abstra- ta, utiliza cegamente todos os entes em todas as escalas, segundo esse objetivo Ultimo de ganho privado, reproduzindo a Aeespacialidade da riqueza segtegacao, as assimetrias e as desconti- nuidades, acirrando a competicao e apro- fundando a desigualdade entre pessoas e lugares. Essas estruturas heterogéneas criadas erecriadas no bojo do movimento homo- geneizador serao enlacadas e, crescente- mente, vinculadas a partir da dominancia de formas superiores de capital, presentes nas reas onde o nfvel de desenvolvimen- to das forcas produtivas tenha alcangado dimensao suficiente para requerer inexo- ravelmente uma divisao social do trabalho supra-regional e, portanto, uma potente articulagao inter-regional. A homogenei- zacao diz respeito, pois, a esse processo de construcao dos loci e das regras das lutas concorrenciais, que busca engen- drar um espaco unificado de valorizacao do capital e que define os espacos de mer- cado nos quais se desenvolverd a “coer- &o imposta” do processo de integracao. Reconceituando o processo de integragado O ambito da anélise em que se procura reconceituar a integracao deve abranger a dinamica coercitiva da concorréncia como seletividade impositiva que ira ope- rar naqueles espagos e horizontes abertos pela homogeneizagao. Apés essa tiltima ter “limpado 0 terreno”, ao “nivelar” as condigées reprodutivas ambientais e ao construir as arenas para a valorizacéo desimpedida de obstaculos extra-econ6- i micos (tarefas do processo homogeneiza- dor), a pugna entre as diversas unidades de riqueza podera ocorrer nos construtos sociais denominados “mercados” (tarefa realizada via processo integrador). Ou seja, diversamente da concepcao neolibe- ral presente, por exemplo, na concepcao vulgar de globalizacao, a integracao é um processo de enfrentamentos em um am- biente nada idilico, determinada que 6, E no Manifesto Comunista que Marx e Engels realizam profunda anédlise do carter disruptive do capitalismo, da forca propagadora (e “homogeneizadora”) que submete todos os seus elementos a légica da mercantilizacao maxima, Carlos Anténio Brandao em tiltima instancia, pela concorréncia, necessariamente marcada por rupturas, transformacées, conquistas e tentativas de preservacao de espacos e horizontes renovados para a reproducao ampliada do capital. A integracao é sempre um processo continuo e de dificil reversao, que exerce influéncia complexa e contraditéria sobre as regides aderentes, que serao engolfa- das em adaptacoes reciprocas, com intensidades e naturezas diversas, des- tacando-se, evidentemente, a poténcia do vetor “centro dinamico” => “periferia”, embora nunca possa Ser enearade como, unidirecional. Dessa forma, ela recondiciona as economias aderentes, forgando-as a con- vergéncia e a reacomodacao das es- truturas produtivas regionais. Quando acelera-se 0 proceso interativo, acirra- se a concorréncia inter-regional, cados regional mM a Ser expostos pluralidade das formas superiores de ca- pitais fordneos. Na esteira da incorpora- ¢o, multiplicam-se as interdependéncias eas complementaridades regionais, que podem acarretar o aumento tanto das po- tencialidades quanto das vulnerabilidades regionais. Metamorfoseia-se a densidade econémica de pontos seletivos no espaco: sua capacidade diferencial de multiplica- 0, de reproducao e de geracdo de valor e riqueza; sua capacidade de articulacao inter-regional; o grau e a natureza das vinculagées e a densidade dos circuitos “produtivos”. Mudam e diversificam-se 05 fluxos, o movimento de seus eixos de circulacao e seu potencial produtivo. 123 Um autor classico que apresenta uma boa percepgao desse processo é Lénin (1982, p. 353), que diferencia o desenvol- vimento do capitalismo numa parte do pais do desenvolvimento do capitalismo nas “novas terras”. “No primeiro, o que temos sao rela- 6es capitalistas ja estabelecidas que se desenvolvem; no segundo, a forma- cao de novas relagées capitalistas num novo territério JO primero cess0 implica 0 desenvolvimento em profundidade do capitalismo, o segun- do, o desenvolvimento em extensao” A integracdo visaria a uma maior pro- fundidade e extensao na acumulagao de capital. A medida que disseminam-se as vin- culagées mercantis e que se acelera 0 concerto de uma divisdo inter-regional do. trabalho, torna-se cada vez mais evidente © contraste com a fase pré-integracao. Naquele momento pretérito, vigorava uma verdadeira constelacao de niicleos isola- dos, com relagées mercantis rarefeitas, compondo um verdadeiro mosaico de “re- gides” dispersas. Nesses espacos, dada a precariedade das comunicagées inter- tegionais, os segredos — base de sustenta- 40 do capital mercantil —sdo preservados e.utilizados na constituicdo e na manuten- do de canais especiais para a obtencao de privilégios e benesses no Poder Puiblico. A tuptura do isolamento inter-regional acelera as temporalidades dos diversos espacos integrados. Concordamos com Faria (2000), que assevera que 124 ‘a maior circulacéo de mercadorias nao s6 permitia romper com as limi- tacées da duracao do ciclo produtivo local, como, pelo aumento concomi- tante do fluxo de informagées, pro- porcionava uma maior velocidade aos processos sociais e politicos, acele- rando o proprio curso da historia”. Tomar os espacos conexos nao é uma tarefa que ocorre com naturalidade. “Passar do mercado regional ao merca- do nacional costurando juntas eco- nomias de raio bastante curto, quase auténomas e muitas vezes fortemente individualizadas, nao tem portanto nada de espontaneo. O mercado na- cional foi uma coeréncia imposta ao mesmo tempo pela vontade politica, nem sempre eficaz na matéria, ¢ pelas tensées capitalistas do comér- cio externo e a longa distancia.” (Braudel, 1979, p. 255, apud Faria) Essa coeréncia imposta para construir earticular socialmente os mercados encon- tra diversos obstaculos que se antepdem ao avango da concorréncia intercapitais locais/regionais e ao estabelecimento de lacos de complementaridade inter-regio- nais. A acdo das forcas da integracao ge- ralmente constitui um longo, contraditério, heterogéneo e coniflituoso processo em que 08 espacos regionais circunscritos e capsu- lares vao sendo enredados a partir daque- le(s) espaco(s) onde prevalecem formas superiores de acumuulacao e de reprodugao econémica. Assim, constata-se que a dindmica da acumulacao de capital geralmente Aeespacialidade da riqueza logra, na longa duracdo, integrar a eco- nomia nacional, formando um tinico es- pago nacional de valorizacdo, embora esse processo pouco tenha a ver com a diminuicdo das especificidades intra e inter-tegionais. Muito pelo contrario, a in- tegracdo pde em toda sua inteireza a questao do fosso no nivel de desenvol- vimento das forgas produtivas entre as regides, impondo a conscientizagao da na- tureza desigual do processo de desenvol- vimento capitalista e explicitando uma “questdo regional”, que ganha foros de problematica concreta a ser enfrentada no/pelo Estado, Isso s6 acontece quando se consolida uma economia nacional in- tegrada, diversificada e complexa (que tenha estabelecido e cristalizado uma di visao inter-regional do trabalho). Assim, a constituicao, de modo irrecorrivel, de um “mercado interno” nao nega, antes reafirma e explicita, os descompassos, assimetrias e disritmias da dinamica de transformacao nos diferenciados espagos regionais, expondo, de forma elogiiente, as heterogeneidades estruturais inter- regionais (““desequilibrios regionais”), as forcas desintegradoras, e criando uma densidade social para a reivindicacao de politicas compensatérias. A partir da consolidacao desse pro- cesso torna-se impossivel qualquer expe- tiéncia de engendrar-se, ao nivel de uma nica regido, uma matriz produtiva densa e integrada, isto é, regionalmente “com- pleta”. Inescapavelmente resta a cada tegido desprender-se de qualquer “inge- nuidade” de buscar autonomia econémi- ca (Cano, 1998) e, portanto, inserir-se especializada e complementarmente em elos especificos das cadeias produtivas Carlos Anténio Brandao constitutivas da “matriz produtiva na- cional”, que se encontra espacializada por todo 0 territ6rio doméstico. Note-se que a natureza daquele en- trelacamento de espacos diferenciados é bastante distinta segundo o grau alcan- cado pelo desenvolvimento das forcas produtivas, tanto no “centro” quanto nos diversos espacos periféricos. Cada espa- co constitutivo da diversidade regional acaba sucumbindo, de forma singular, a0 enquadramento e a hierarquizacao pro- venientes do espaco regional hegem6ni- co. Todas as regides encontraram seu locus de vinculagao na equacao produtiva na- cional, comprometendo, desse modo, sua autonomia econémica. A impactacéo in- tra-regional no momento do (e posterior- mente ao) engate de cada regiao no “quadro nacional” é (des)estruturante, uma vez que os “espagos intemos” a cada regio metabolizarao, de maneira distin- ta, esse processo (Brandao, 2001). Consolidadas a formacao e a integra- cao do mercado nacional, as economias regionais periféricas so impedidas de levar adiante qualquer projeto de “repetir 0s passos” da regido dominante. Como afirma Cano (1998), as regides periféricas passam a ser “acionadas” a partir do co- mando da economia do centro. Resta, entao, tdo-somente integrar-se comple- 125 mentarmente a economia do pélo dina- mico da acumulacao, submetendo-se e enquadrando-se a uma hierarquia coman- dada por aquele centro do processo de decis6es atinentes a acumulagao de capi- tal, que passa a ditar o ritmo e a natureza da incorporagao de cada regiao do ranking nacional, vetando o que nao fosse aquela “articulacao possivel” em cada momento e eventualmente gerando efeitos de des- truigao nas regides que ousassem enfren- tar os requerimentos emitidos pelo nicleo da acumulacao de capital’. Os diversos capitais, enquanto unidades expansivas de valorizacao, se disseminam e se defron- tam em todo o territ6rio nacional (espaco agora homogeneizado para o jogo concor- rencial), conformando uma estrutura pro- dutiva densa, integrada, complexa e diversificada, que se localiza em diferentes parcelas do espaco geogréfico nacional. Amplificam-se e adensam-se os fluxos entre as regides, e a relacao centro-peri- feria ganha nova dinamica e natureza Transformam-se, inclusive, as pautas de comercializagao regional, com a implan- tacdo e a diversificagao da industria da periferia, complementarmente ao pélo. Uma vez realizada a integracao, a nature- za ea dinamica da poténcia desse “nticleo central da acumulacac” devem ser analisa- das, e deve-se perquerir sobre seu papel polarizador. 2 Wilson Cano (1998) discutiu em detalhe o caso brasileiro de integracao do mercado nacional, inclusive alertando para o fato de que o processo integrador pode proporcionar tanto efeitos de estimulo quanto efeitos de inibicao/bloqueio e destruigao. 126 Conceituando o processo A terceira dimensao que deve estar pre- sente em qualquer abordagem que nao descure dos aspectos espaciais da acu- mulacao de capital é a da polarizacao. Esta deriva da propria natureza desigual e combinada do desenvolvimento capi- talista. O desenvolvimento das for jundadas na assimetria e na irreversibili- dade, que ainda serao reforcadas pela inércia dos investimentos em capital fixo concentrados naquela area central, mar- cada por forcas aglomerativas. Apesar de contemplar a necesséria interdependén- cia entre distintas areas, essa atracao pelos pontos nodais funda-se na hetero- geneidade e no exercicio uni lo poder e da poténcia do }'centro” sobre algum tipo de “peniferia” Os mais diversos estudiosos da te- matica urbano-regional apresentaram contribuigdes pertinentes as forcas polari- zadoras, ressaltando as caracteristicas de cumulatividade, de crescimento nao-ba- lanceado e nao-generalizado, ou seja, 0 cardter de transmissao bloqueada propria do crescimento econdmico. Boudeville (1973) fala da polarizacao como medida dos processos (com maior ou menor in- terdependéncia e hierarquia). As idéias classicas associadas a esse conceito, tais como irradiagao mercantil com satélites gravitando em torno de alguns nés cen- trais, medida pela intensidade dos fluxos, sempre estiveram presentes no debate. Furié (1996, p. 79) expressa bem esse Aespacialidade da riqueza de polarizagao capitalista conjunto de contribuigdes quando discute que “os fluxos nao se distribuem aleatoria- mente, nem com intensidades uniformes (...) os fluxos mais importantes tendem a orientar-se na direcdo e desde alguns centros dominantes”, Em um nivel mais geral, a polarizagio deriva dos processos de concentragao e centralizacao do capital e de seus desdo- bramentos no espaco, embora entre um e outro intimeras mediacées sejam reque- ridas. Na verdade, ela é decorrente da heterogeneidade estrutural e da propria cumulatividade e das forcas aglomerati- vas presentes no espaco geografico capi- talista. O capitalismo continuamente desenha e redesenha “novas geografias”, produ- zindo novas escalas, novos pontos nodais, rearranjando as forcas da polarizagao, da heterogeneidade e da dominacao regio- nais. Muda o padrao de articulagao da diversidade regional, Mudam os nticleos dinamicos de comando que exercem dife- rentes espécies de atratividade e domi- nagao e geram estratégicos pontos, eixos enés de maior ou menor poténcia repro- dutiva e capacidade de apropriacao. Atualmente, encontramos um novo carater da influéncia exercida de alguns pontos do espaco sobre outros: as rela- Oes entre as regides dominantes eas re- gides subordinadas tém se transformado rapidamente, na medida em que o siste- ma capitalista aperfeigoou uma série de instrumentos técnicos, organizacionais Carlos Anténio Brandao etc. que Ihe permitiu avancar em sua se- letividade geografica. Assim, a nocao de polarizacdo nao precisa e nao deve ser associada a conceitos do tipo industria motriz, efeitos de filtracao etc. e nem estar sempre necessariamente vinculada, como ocorreu no passado, de alguma forma, varidvel distancia. Crescentemente, a pesquisa regional e urbana deve encerrar um mapeamento exaustivo e complexo de localizagées, de movimentos, de redes (direcdo e sentido), de fluxos (origens e destinos) e de nés (entrelacamentos). Nesse sentido, a importante e cada vez mais freqitente pesquisa da matriz espa- cializada de investimentos ajuda a enten- der uma parte do processo, mas perde o sentido ea natureza da dominancia exer- cida pelos controlling cores das grandes corporacoes e das grandes fortunas sobre 127 o desempenho das areas periféricas. Ou seja, é 0 poder de controle progressivo dos headquarters do grande capital que possibilita “ondas desconcentracionistas” a partir do centro, Em outras palavras, sdo a poténcia e a eficdcia das forcas centripetas que permitem a acao das for- cas centrifugas. A discussdo da gravitacao, a partir de alguns poucos pontos focais, impoe a discussao da capacidade e do poder de decisao diferencial acerca do conjunto de elementos que dao sustentacao a acumu- lagao de capital. Em outras palavras, ha que analisar, a partir do core do sistema, © grau de autonomia da reprodugao de suas formas dominantes de valorizacao, para questionar o potencial de gestao e ordenamento sobre 0 conjunto nacional. O grande desafio da andlise: a incorporagdo do Processo de hegemonia As profundas transformacées que esto se operando nas temporalidades e espa- cialidades da riqueza capitalista em es- cala mundial neste momento apresentam uma série de desafios para a analise da expressao espacial de densas e répidas mudancas sociais. Essas transformacées verificadas no quadro mundial da atualidade e 0 con- seqiiente redesenho da geografia econd- mica mundial impdem uma agenda ampla e complexa de importantes questdes que devem fazer parte do debate acerca do estatuto, hoje, do recorte regional e das metamorfoses do movimento da acumu- lacao de capital em sua dimensao espa- cial. O grande desafio é, entao, procurar responder a intrigante questao: diante da atual onda de “globalizacao” , que papel a desempenhar resta as regides? As tentativas de resposta a essa dificil questao depararam-se com uma insufi- ciéncia do quadro teérico da chamada “economia regional e urbana”, Basica- Como nao é nosso objetivo neste ensaio apresentar uma “histéria do pensamento” sobre a dimensdo espacial do proceso de desenvolvimento, af incluida a discussao te6rica sobre regiao, remetemos o leitor para Coraggio (1988), Gottdiener (1985) e Furié (1996). 128 mente, duas grandes correntes do pensa- mento social procuraram explicar a pro- blematica das diversidades regionais. Uma, amparada pelo positivismo, conhe- cida como Ciéncia Regional, que em seu tratamento econémico de extracao neo- classica procurou pensar as causas da ineficiéncia alocativa de recursos escassos no espaco, pesquisando “a diferenciacao e inter-relagao de areas num universo de recursos desigualmente distribuidos e im- perfeitamente méveis” (Dubey, 1977, p. 26). Outra, de extracéo marxista, que buscou examinar as diversidades entre as regides, sob o prisma do movimento da acumulagao de capital. Talvez se pudesse acrescentar uma “terceira via”, de corte “keynesiano”, que procurou analisar os mecanismos de determinacao e medicao das rendas regionais e propor agées esta- tais de Planejamento Regional. Entretanto, tal perspectiva acabou por emaranhar-se eesterilizar-se na primeira corrente listada, de base neoclassica Assim, uma ampla agenda de pes- quisas se abre na atualidade, impondo uma espécie de “retematizagao” das diver- sidades regionais capitalistas. Em escala global, a realidade do desenvolvimento desigual dentro das diversas nac6es e dos blocos de nacdes vem sendo crescente- mente diagnosticado e submetido a inter- vencées ptiblicas compensatérias. A celeridade e a dimensao das revitaliza- goes, das desindustrializacées, das relo- calizacdes regionais é impressionante. Surgem novas interdependéncias setoriais e teitoriais, que redefinem circuitos pro- dutivos regionais/locais e (re)criam novos usos das heterogeneidades espaciais pelo capital. Aeespacialidade da riqueza A crescente internacionalizagao dos circuitos econémicos, financeiros e tecno- légicos do capital mundializado, de um modo geral, debilita os centros nacionais de decisao e comando sobre os destinos de qualquer espaco nacional. Uma das primeiras manifestacées dessa descons- trucdo nacional se revela no esgargamen- to do pacto federativo, que desorganiza as articulagées entre o poder central e os poderes locais/regionais. Nesse sentido, muitos proclamam que bastaria cumprir as “exigéncias” da globalizagao, deste novo imperialismo da “partilha dos luga- res eleitos”, ajustando-se, adaptando-se e submetendo-se a esta “fatalidade”, para formar um espaco receptivo e con- quistador da confianca dos agentes econémicos mais poderosos. Coma com- pleta negacao da natureza das hierar- quias (impostas em variadas escalas) de geracao e apropriacao de riqueza, segun- do esse “pensamento tinico” que invade o debate do desenvolvimento regional e local na atualidade, teria ocorrido o fim das escalas intermediarias (e das media- 6es) entre o local e o global. Assim, “o local pode tudo”, e, diante da crescente “sensibilidade do capital as variagoes do lugar”, bastaria que se mostrasse diferen- te e “especial”, propagandeando suas vantagens comparativas de competitivi- dade, para ter garantida sua insergao na modernidade. Exacerba-se, desse modo, uma luta entre os lugares para realizar a melhor “venda da regido ou da cidade”, coma busca desenfreada de atratividade a novos investimentos, melhorando 0 “clima local dos negécios” Nesse novo contexto mundial, em que ordena-se e impée-se, em uma “escala Carlos Anténio Brandao geogréfica condensatéria”, a reproducao material e afirma-se a “totalidade empi- rica”, de que nos fala Milton Santos, con- trapondo o mundo e 0 local, é preciso reproblematizar a regido: “a crescente importancia da escala pla- netdria na organizacao da economia, das financas, das redes de poder tem, paradoxalmente, reforcado a impor- tancia das decisGes nas escalas regio- nais e locais. O recrudescimento dos nacionalismos, regionalismos e loca- lismos obriga-nos a encarar novos problemas e novos aparatos con- ceituais para a pesquisa regional.” (Castro, 1994, p. 158) As mudangas tecnolégicas e os imperati- vos da globalizagaéo tém apresentado novos requisitos locacionais, reafirmam- se e negam-se externalidades locais e regionais, desconstroem-se regides. Ten- déncias e contratendéncias medem suas respectivas forcas. Muitas ainda nao tive- ram o tempo e a circunstancia adequa- dos para sua efetivacéo. Observadores menos atentos sugerem o fim das escalas intermediarias entre o local e o global. O inicio do enfrentamento de tao complexas questées passa pelo levanta- mento minimo das poderosas contradi- gées inculcadas nesse objeto, que encontra manifestaco em varios movi- mentos paradoxais que, grosso modo, poderiam ser sintetizados naqueles apre- sentados por Harvey (1992): “quanto menos importantes as barreiras espaciais, tanto maior a sensibilidade do capital as variacées do lugar dentro do espaco e tanto maior o incentivo para que os lu- 129 gares se diferenciem de maneiras atrati- vas ao capital”. Mas listemos algumas contradicées, que se exacerbam no mo- mento contemporaneo. Einconteste que o movimento da acu- mulagao de capital se processa, em sua expressao espacial, de forma mutavel, parcial, diversa, irregular e com alta sele- tividade. As manifestagdes no espaco da valorizagao e da riqueza sao altamente discriminatorias. Existe, assim, um pro- cesso de busca e selecao por pontos do espaco que oferecam maior capacidade de apropriagao privada de rendimentos e onde “valorizar o valor” seja mais facil. Cristalizam-se no espaco estruturas que “materializam-se” enquanto fluxos e fixos diversos, reveladores de uma propagacéo nao-seqiiencial, de uma intermiténcia espacial no proceso de valorizacéo do capital. Cabe notar que existe uma cumu- latividade estrutural inerente a esse pro- cesso que ir determinar uma fixidez do arranjo espacial da reprodugao da vida social. O peso da experiéncia passada — “espaco construido” — afirma cicatrizes, sinais e vestigios que posicionam “rugo- sidades” (Santos, 1985) no (e do) espaco. Ou seja, herangas e residuos nos pontos do espaco que obstaculizam a fluidez e a mobilidade, constituindo formas fixadas através do prolongamento do passado no presente. Nesse contexto, nao ha sentido em buscar qualquer desses fenémenos “fora da hist6ria”. O movimento da acu- mulagao de capital, sobretudo em sua face homogeneizadora de relagées, vai procurar suplantar essa durabilidade das formas, das estruturas, das relages e dos processos preexistentes que soem limitar e dirigir as transformagées em curso 130 requeridas por aquele movimento. Esse é um proceso contfltivo e contraditério que nunca se completa plenamente e “de uma vez por todas...” Isso porque, por um lado, o capital busca valotizar-se sem confinamentos tegionais/espaciais. Generalizando suas relag6es, procura impor e tornar comum sua légica, circulando seus valores, sim- bolos e informacées supra-regionalmente, gestando em seu cosmopolitismo um es- paco e um mercado uno. No Manifesto Comunista, Marx e Engels (1982, p. 97) afirmam: “O capital necesita estabele- cer-se em toda parte, explorar em toda parte, criar vinculos em toda parte. Estas so determinacées de natureza ge- nética do capital enquanto relacao social, que encontram-se em uma fase superior de mundializacao no presente, em que “o capital flui e suas atividades induzidas de produgao/gerenciamento/distribuicao espalham-se por redes interconectadas de geometria varidvel” (Castells, 1999) Seriam a desterritorializagao e a dissolu- cdo das regiées, a derrota das espec dades, até se confundirem com o “espago total”? Existitia a possibilidade concreta de um momento superior de “suplantagao_ do espaco e invalidagao do tempo” (Castells, 1999) ou de “aniquilacao do espaco pelo tempo” (Harvey, 1992)? Por outro lado, ao mesmo tempo, a natureza desigual da acumulacao engen- dra um espaco miiltiplo. “O capital nao somente produz o espaco em geral, mas também produz.as reais escalas espaciais que dao ao desenvolvimento desigual a sua coeréncia” (Smith, 1988, p. 19). As manifestacdes dos processos de produ- Aeespacialidade da riqueza cao, de consumo, de distribuicao, de troca (circulacao) so marcadamente diferen- ciadas espacialmente. Castells (1999) apresenta a tese de que, crescentemente, co capital é global, mas o trabalho é local. Um aumenta sua coordenagao global no espaco dos fluxos. O outro se individualiza no espaco dos lugares. A medida que as fronteiras territoriais sao redesenhadas (apagadas segundo alguns), varias hipéteses sao levantadas procurando dar resposta a contradicao de que, mesmo com o capital universa- lizado, acentuam-se os particularismos localistas. A visdo liberal-conservadora, representada por Ohmae (1993), discute a “disfuncionalidade” do Estado-nacéo em face do movimento globalizante e abarcador do capital. Considera que 0 recorte nacional conforma uma unidade nao-natural para o borderless world. A escala eficiente — a regional - é a que vé constantemente seus contornos serem ratificados pelo mercado e que possui ca- pacidade de justificar infra-estrutura (redes de comunicacées, transportes e servigos profissionais de qualidade), com- provando a eficiéncia das agdes do que ele denomina de Estados-Regiao. Realmente, assiste-se atualmente ao crescente poder de veto, de bloqueio e de burla de grupos nitidamente demar- cados terzitorialmente, com numerosos movimentos exprimindo demandas com express6es regionalistas, a propagacao de ondas de separatismos, fragilizando as acées dos Estados nacionais e desinte- grando pactos federativos. Com o apro- fundamento da crise, diversos grupos de pressao regionais procuram vocalizar Carlos Anténio Brandao suas demandas, e o regionalismo nada mais é que a expressao politica desses grupos, que buscam construir sua identi- dade no recorte territorial, mobilizando- se para o enfrentamento com outras unidades e escalas espaciais no Estado. A coesao € criada simbolicamente, com a elite local articulando o discurso “em prol dos interesses legitimos da regiao” Os donos do poder local instrumentali- zam-se contra os valores universais e rea- cendem toda sorte de particularismos. Deve-se ainda notar que, em seu es forco ideolégico irealizével de negar a politica (restringindo ao maximo o espa- ¢0 do ptiblico e expandindo 0 espaco do privado) e a utilidade de qualquer ente regulador externo ao mercado, os (neo)liberais apdiam toda e qualquer aco que possa significar um solapamen- to das bases do Estado, fomentando todo tipo de localismos. Nesse contexto fragmentador, refor- cam-se as légicas auténomas que créem na forca de seu potencial endégeno de enfrentamento, bastando cumprir a “agen- da estratégica com a qual possam asse- gurar a insercao competitiva” (Compans, 2001). Assim, questiona-se: que légicas “tegionais” poderiam estar atravessando ou “passando por cima” e ao largo da “jurisdi¢ao” e da “alcada” dos Estados na- cionais ? Para tratar adequadamente tais ques- tes complexas serd preciso um novo es- forco tedrico, que passa, a nosso juizo, pela reconstrucao dos trés conceitos basi- cos (homogeneizacao, integracao e polari- zaco) inerentes a expressao espacial do 131 desenvolvimento capitalista, pois entende- mos que essas s40 as trés indissocidveis dimensées do processo de desenvolvi- mento desigual da acumulacao de capital no espaco. Além disso, os estudos dos padrées de desenvolvimento regional deveriam incorporar um quarto e ultimo elemento fundante das relac6es intra e entre espa- cos e escalas geograficas: a hegemonia. Inicialmente cabe uma adverténcia de que ele é 0 “objeto terminal” da econo- mia politica da espacialidade capitalist. E nesse ambito que se deve esclarecer como a questao das diversidades regio- nais se apresenta inescapavelmente como uma questao de Estado, exptessa como uma “Questao Regional”. A equacao po- litica e a correlagao de forcas presentes em determinada Nacao revelam marcan- tes cortes regionais/locais. Com esse conceito de inspiragéo gramsciana, queremos apreender os pro- cessos assimétricos em que um agente privilegiado detém o poder de ditar, (re)desenhar, delimitar e negar dominio de acao e raio de manobra de outrem. Assim, 0 poder hegeménico deverd ter poder de enquadramento e hierarqui- zacao de relacées, processos e estruturas, eser 0 portador do novo (por exemplo, 0 dominio tecnolégico). Devera ter capa- cidade de iniciativa, de “endogenia de desenvolvimento”, de regulacao e de ad- ministracao dos limites e possibilidades de sie dos outros. Dada uma certa corre- lagao de forcas, considerada em determi- nado tempo-espaco, € preciso perscrutar a forca coercitiva, os niveis e graus de “consentimento” para o dominio e exerci- 132 cio de diregao que consolide um determi- nado “projeto de incorporacao de todos” em sua érbita. Dessa forma, a afirmacao enquanto nticleo hegeménico pressupoe algum grau de autonomia reprodutiva, de capacidade inovativa (em contraponto aos “outros” — os subordinados) e de dire- co persuasiva cultural-ideoldgica sobre © “conjunto nacional”, exercida no interior de uma determinada alianga. O ser hege- ménico necesita ser minimamente “dono de seu préprio destino” para propor, arti- cular e sustentar uma determinada uni- dade e administrar e centralizar uma “coesao nacional imaginaria” O avanco dos estudos regionais em um tal terreno permifiia iluminar questes candentes como o esgarcamento dos pac- tos federativos, o uso de fundos puiblicos na reprodugao das elites e fortunas regio- nais, a estrutura, as contradicées e fissu- ras no bloco de poder, e trazer elementos Referéncias bibliograficas Aypator, P Dynamique spatiale et déve- loppement inégal. Paris: Economica, 1976. Bouneuitie, J. R. Os Espacos Econémicos. Sao Paulo: Difusdo Européia do Livro, 1973 Branpao, C. A. Uma Histéria da Longa Construcao da Unidade Nacional: notas sobre a natureza da formacao e integra- Aeespacialidade da riqueza explicativos das dificuldades imensas em cimentar pactuagées legitimadoras em paises continentais e desiguais como o Brasil Por fim, caberia lembrar que o estudo regional critico s6 tem sentido se indagar as causas da perpetuacao das “estruturas de dominagao: de renda, de propriedade, de controle politico, de acesso ao Estado etc.” (Cano, 1998, p. 310). Ou seja, é somente a partir da insergao das quest6es urbano-tegionais no contexto da reprodu- cao social que se poderiam desvendar as causas mais profundas das heteroge- neidades estruturais que se manifestam espacialmente na producdo da riqueza capitalista. Nesse sentido, talvez os con- ceitos aqui abordados possam contribuir para a melhor apreensao da natureza desse processo de desenvolvimento desi- gual, excludente e segregador. cao do mercado nacional. In: Congreso Brasileiro de Histéria Econémica, 4, 2001, Sao Paulo. Anais... Asprie, Usp, Sao Paulo, 2001. Cano, W, Desequilibrios Regionais e Con- centragao Industrial no Brasil (1930-95). Campinas: Unicamp.lE, 1998. CasteLs, M. A Sociedade em Rede. Sao Paulo: Paz e Terra, 1999. Carlos Anténio Brandao Castro, I. E. Visibilidade da Regido e do Regionalismo. In: Lavinas, L. et al. Inte- gracao, Regido e Regionalismo. Rio de Ja- neiro: Bertrand Brasil, 1994. Compans, R. A emergéncia do empreende- dorismo piiblico urbano na cidade do Rio de Janeiro. 2001. Tese (Doutoramento) - Ippur / Universipape Feperat. 00 Rio DE JANEIRO, Rio de Janeiro. Coracaio, J. L. Territorios en transici6n: critica a la planificacion en América Lati- na. Quito: Ciudad, 1988. Dusey, V. Definigao de Economia Regio- nal. In: ScHwaRTZMAN, J. (Org.). Economia Regional: textos escolhidos. Belo Hori- zonte: Cedeplar/Minter, 1977. Fania, L.A. Capitalismo, Espaco e Tempo. Porto Alegre: Fer, 2000. Mimeo. Fiori, J. L. 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Entende que esses conceitos hoje preci- sam ser reatualizados, pois foram con- cebidos e utilizados em realidades bastante diversas da apresentada pelo novo momento do processo de mundiali- zacdo do capital. Palavras-Chave: Desenvolvimento; Es- aco; Globalizacao. Recebido para publicacao em maio de 2001 Aeespacialidade da riqueza Abstract The present paper aims at discussing the key elements for research focused on the spatial dimension of the capitalist devel- opment process. It proposes that as far as a proper critical analysis of unequal capital accumulation is concerned, it would request concentration on verifying in a combined way the processes of ho- mogenization, integration, polarization and hegemony of the territorial scales. It suggests that these concepts should be brought up to date as long as they have been conceived and applied to rather di- verse realities as compared to the cur- rent one deriving from the process of capital globalization. Keywords. Development; Space; Global- ization Carlos Anténio Brandao é¢ professor do Instituto de Economia da Unicamp e pesquisador do Niicleo de Economia Social, Urbana e Regiona - Nesur

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