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XII

O ciúme de Maggie

Ela tinha razão: vida boa e confortável, o dinheiro entrava, e o escritor já tinha
inclusive sua faca culinária, ou melhor, empresas como a que passou a vender facas com a
marca “PHIL M.”, surgiram e já havia um bom conjunto de objetos licenciados com seu
nome e de alguns personagens, revertendo sempre um algo para sua conta bancária. Para
que questionar? O que fazia de errado? As pessoas estavam tendo, cada uma, exatamente
o que queria, o computador estava fazendo isso pela humanidade, pensava o escritor
procurando se convencer. “Apenas viver”, repetia para si, lembrando-se de Maggie. O
problema é que, à esse conselho, uma outra frase fazia contrapeso: “foi difícil encontrar o
Phil original”. E é verdade que essa frase lhe vinha à mente todos os dias, e o levava para a
janela, especialmente às tardes, quando Maggie não estava. Era essa frase mesmo? Onde
escondeu as cartas de Violeta? O escritor ansiou. Esperou Maggie sair. Ela andava
desconfiada, mais atenta aos gestos, olhares… Fingia que, depois da conversa, depois de
tudo, as coisas haviam normalizado, mas só que não. Os dois estavam jogando o jogo da
normalidade, mas dentro disso, um sabia do outro.

Sim, Maggie saiu. Mas, como percebeu algo a mais no comportamento do escritor,
resolveu não ir ao Pilates. Apenas foi a portaria, simulou uma dor de cabeça no portão do
edifício, voltou, e comentou com o porteiro Roberto:

- É, parece que não vou hoje. As correspondências já chegaram? Assim já subo com
elas. Sempre eu que faço esse serviço, não é mesmo?
- É sim senhora. Só quando eu entrei né, que não sabia que a senhora que recolhia
tudo sempre.
- E o quê, Roberto?
- Aquela moça que deixou a carta que o Elias levou direto ao senhor Felipe. - Pelo
olhar de Maggie, o porteiro percebeu que havia feito ou revelado algo que não podia,
e emendou:
- Bem, a senhora e o senhor Felipe estavam recém-mudados eu ainda não…
- Tudo bem Roberto. As cartas por favor.

O escritor abriu o computador com sua chave philips PHIL M. Pegou as cartas na
mão, e em seguida retornou com a segunda, a com instruções impressas. Leu “Violeta”,
tremeu. Abriu e releu a única frase: Foi difícil encontrar o Phil original.

- O que tem nessa carta?

Maggie entrara sem que o escritor escutasse.

- Nada, só mais uma fã.


- Deixe-me ler. O que está fazendo com ela? Quando chegou?
- Ei, que tantas perguntas! Não importa. - Vai até a cozinha, acende o cooktop e a
queima.
- Não há nada ali. Eu simplesmente havia me esquecido de jogar fora.
Maggie aceitou o abraço do escritor, mas por trás de seu ombro, os olhos abertos
mostravam uma dor fria, um pensativo quase ensaiado. Ela também passaria a mentir
menos a partir dali, ou mentiria ainda mais. Sua única certeza é que as coisas não ficariam
assim.

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