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zxeressio roruar ~TRORIA DA ORGANIZACAO POLITICA - I Avzaz Booo (oxs.) ADEMAR Boao (orG.) TEORIADA | ORGANIZACAO POLITICA say Reavy 3} A teoria da organizacio foi sendo elaborada a partir de 1830. As experiéncias de organizacao tiveram inicio com os Comités de Correspondéncia; depois, com a criagdo da Liga dos Comunistas, unificaram-se 05 comités dos diferentes paises; por fim, em forma de Associagao Internacional - a ‘organizacao de classe que reuniu os revolucionatios dos paises da Europa e de outros continentes. Mas, hoje, esto incapazes de enfrentar 0 capital. Toda crise remete-se as suas causas, 3 compreensio de suas manifestacées e 8 busca de saidas para a sua superacSo. As experiéncias histéricas do sociajismo, particularmente no Leste europeu, colocaram na ordem do dia a necessidade de teafirmar os principios tedricos do socialismo, de superar a apatia politica que marca as organizaces da classe trabalhadora e de reconstruir o instrumento politico condutor das forcas revolucionérias. © problema maior no esté em saber para ‘onde vamos, mas como e com que vamos. A superacao da crise esté na retomada das lutas de massas, na construgéo do conhecimento e das conviccdes voltadas para os desafios atuais, no respeito | Ademar Bogo (org.) TEORIA DA ORGANIZAGAO POLITICA Escritos de Engels - Marx - Lenin - Rosa - Mao 2 edigio EDITOR EXPRESSAO POPULAR ‘So Paulo, 2010 Copyright © 2005, by Editora Expressio Popular Reviso: Geraldo Martins de Azevedo Filho Projeto grafico ¢ diagramacio c capa: ZAP Design Foto da capa: Otto Griebel, Die Intemacional, Beli, 1929. Impressio e acabamento: Cromoseie ‘Datos inemacinas de Calalogsedo-na-Pubteseo (Ci) “Teoria ea otganzarso poli: exeros de Ege, Marx. rang "Cen Rosa, Ma /Ademar Bozo (org)~-2.03~S8o Pat | ‘Expresate Popular, 2010 28% Indexato em GeoDados - itp: geodados sem br. Won as-e7a04709 +. Poliea Teoria 2. Esetoe pois 3, Orgatizagso pia Tool # Engels, Fear, 1820-1266 ~Esertos pltcoa 5. Marx hal Helwich, 1678-1065 ~ Eseitos potzce 6 Lene, Vadimiiteh Utano, 1870-1024 — Eevtos piece. 7. Lixemburgo, Rosa, 1871-1919 ~Esertos Poltece 6. Mao, Tsb-Tung, 1883076 —Esertos palteos {Boge Sem 1g. NTH, con s2001 320011 ‘alalgagi na Pubioagao Blane WS, Jovanavih CRB 97250 ‘Todos os direitos reservados. Nenhuma parte deste livro pode ser utilizada ou reproduzida sem a antorizacio da editora, Edigdo revista e atualizada conforme a nova regra ortogrifica 2 edigho: feverciro de 2010 EDITORA EXPRESSAO POPULAR Run Aboligio, 197 - Bela Vista CEP 01319010 ~ Sao Paulo-SP Fone/Fax: (11) 3105-9500 vendas@expressaopopular.com.br -wonwexpressaopopular.com.br SUMARIO APRESENTACAO., INTRODUGAO. 9 OLEGADO DE FRIEDRICH ENGELS ett ay PRINCIPIOS DO COMUNISMO .ernsinnnsnnnnnnnsnn A Friedrich Engels OLEGADO DE KARL MARX. MANIFESTO DO PARTIDO COMUNISTA.... Karl Mars e Friedrich Engel OLEGADO DE LENIN, ances CARTA A UM CAMARADA 137 VE Lewin : OS METODOS ARTESANAIS DOS ECONOMISTAS E A ORGANIZAGAO DOS REVOLUCIONARIOS .. UT. Lenin O LEGADO DE ROSA LUXEMBURGO. 231 GREVE DE MASSAS, PARTIDO E SINDICATOS. se DAL Rosa Lucemburgo © LEGADO DE MAO TSE-TUNG RETIFIQUEMOS O ESTILO DE TRABALHO NO PARTIDO... Mao Be-tung SOBRE O FORTALECIMENTO DO SISTEMA 159 335 345; DE COMITES DO PARTIDO. 369. Mao Te-tang METODOS DE TRABALHO DOS COMITES DO PARTIDO. 373 Mao Te-tung APRESENTACAO Este livro pretende resgatar alguns dos principais textos ~ formulagio do materialismo histérico e dialético,— sobre a teoria da organizacao da classe trabalhadora. ‘i ‘Sempre que alguém faz referéncia a um texto de importancia hist6rica, diz: “Encontramos nos cléssicos...” Mas, que so os “cléssicos”? Sao ideias sistematizadas que mantém, apesar do ‘tempo, importincia na orientacao das geragdes futuras. Ou, “Os lassicos sio aqueles livros que chegam até nés trazendo consigo as marcas das leituras que precederam a nossa e atris de si os tragos que deixaram na cultura ou nas culturas que atravessa~ ram (ou mais simplesmente na linguagem ou nos costumes)” Esta compilacio € fruto da preocupagio com a formacio da consciéncia politica de nossos militantes que, passando ou no por cursos de formagio, apenas conhecem fragmentos da teoria e nao tém acesso as obras ¢ aos autores clissicos. Por ‘CALVINO, lato. Porque ero discs, Cia das Letras, So Palo, 1998, p. 1 TEORIA DA ORGANIZAGAO POLITICA outro lado, 0 conhecimento nunca foi elaborado desvinculado das condigées histéricas do seu tempo. Cada texto tem um contexto. Seus autores viveram, pensaram e se preocuparam com questdes decisivas de sua época. Por isso, cada texto seré antecedido por uma breve introducio. Estes textos pretendem nos ajudar a conhecer um pouco da vida e da luta daqueles que so, sem sombra de diivida, nossos genitores politicos. Embora tenhamos grande admiracao por cada um destes revolucionétios, veremos que, apesar de estudiosos, tinham incertezas e dtividas como qualquer um de nés; sofreram per- seguig6es, foram levados aos tribunais ¢, alguns, condenados e executados, Finalmente, a leitura deste material no pode ser a tinica. Devemos sempre recorrer aos “classicos” como fonte de inspi- ragio. Os “classicos” nunca devem ser vistos como caminho, como instrumento, mas como luz que indica o rumo a seguir. Nestes textos, encontramos citag6es de outras obras importan- tes que deverio ser lidas. Sio suportes para nossas elaboragées ¢ elementos para a formulagio de métodos para a construgio do pedago de histéria que cabe & nossa geracio. INTRODUCAO Apés a queda do socialismo do Leste europeu, a esquerda socialista mundial encontra dificuldades para estabalecer um ponto de referéncia onde consiga afirmar suas convicgdes de caréter revolucionério, Ha uma apatia politica nas organizagées de classe, Uma profunda crise estabeleceu-se no instrumento condutor dos processos revolucionétios. Hi muitas andlises que apontam as causas das derrotas politicas e 0 porqué das crises ideol6gicas atuais vividas pela esquerda de modo geral, Estas estariam centradas em trés aspec~ tos: “tebrico, programitico ¢ orginico”! Mas é preciso ir além. E preciso retomar as lutas de massas, reconstruir as conviegSes voltadas para os desafios de nosso tempo, respeitar a cultura local, formular métodos adequados, multiplicar liderancas, reafirmar principios interligados com a ética revolucionéria, *HARNECKER, Mart. Tomar poste! imps Pa ¢ Terra, So Paul, 2000,p. 24, Pet gg ged ged ge a Cee TEORIA DA ORGANIZAGAO POLITICA estabelecer valores a screm praticados ¢ desenvolver uma mistica que alimente ¢ unifique a vontade de chegarmos do outro lado das crises, vitoriosos. Talvez o problema maior nao esteja em saber para onde vamos. Nossos antepassados jé nos mostraram 0 caminho. A questio é: com que vamos? Alguns nos oferecem os mesmos instrumentos que provocaram a queda no Leste europeu. ‘Outros, instrumentos semelhantes que, com certeza, néo nos levariam até o fim da viagem e poderfamos correr os mesmos riscos nas maos de dirigentes desqualificados ¢ interessados mais em resolverem seus problemas pessoais do que os da classe trabalhadora e dos despossutdos da terra. Nio podemos parar. Mesmo sabendo que nao hé instru- mento totalmente seguro, é preciso seguir. Insistir na constru- io do instrumento que apresente maior seguranga. Para isso temos como ponto de partida as experiéncias, os conceitos € as palavras. “Se a massa dos trabalhadores quiser desempenhar tarefas priticas especificas e criadoras, ela tem de se apossar primeiro de certas palavras-chave (que nao podem ser com- partilhadas com outras classes, que nio estéo empenhadas ou que no podem realizar aquelas tarefas sem se destruirem ou se prejudicarem irremediavelmente). Em seguida, deve calibré-las cuidadosamente, porque o sentido daquelas palavras terd de se confuundir, inexoravelmente, com o sentido das ages coletivas envolvidas pelas mencionadas tarefas hist6ricas.”? Sem diivida, duas palavras com seus sin6nimos que s6 a classe trabalhadora pode usé-las corretamente sio revolugio- democracia ¢ partido-organizacio. Os inimigos jamais pode- vo usé-las sem apontar para a sua propria destruigio. Quando FERNANDES, Florestan,Ogue reo, Abril Coltaral-Brailense, 1984, pp. 910. ADEMAR BOGO (ORG) essas palavras no apontam para isso, perdem a forca de seu contetido. Precisamos, como tarefa imediata, buscar ¢ resgatar das experiéncias passadas, das entranhas da historia, aquilo que 0 tempo no superou nem degenerou. 1—A organizacio politica da parte consciente da sociedade A palavra “partido” é atribufda a Frangois Marie Arouet, © satirico pensador francés conhecido pelo pseudénimo de Voltaire. Nascido em Paris, em 21 de novembro de 1694, teve sua vida literdria e politica ligada ao abade de Chateauneuf, Por ter satirizado o duque de Orléans foi preso em 1717, Caracterizava-se como um “fildsofo militante”, “,,. zombador da Biblia, dos apéstolos e dos padres” Ele deu continuidade as discussées que vinham sendo feitas em torno dos gonceitos “facca0” e “partido”. : ‘A necessidade de superacio da palavra “faccio”, vista como algo pejorative, fez com que Voltaire se preocupasse em desenvolver outro termo, mais adequado, para representar a onganizacio de um grupo social, que desejasse liderar politica- mente a sociedade. Para Voltaire “A palavra partido nio é em si, repulsiva; a palavra facco sempre €™ A palavra “partido” vem do latim, do verbo partire, que sig- nifica, dividir, separar. A palavra antecessora, que tinha cono~ tagio parecida, era “seta”, do verbo secare, que significa separar, cortar, dividir. “Partido transmitia, entio, basicamente, a ideia > VOFTAIRE, Frangois Marie Arouct de. Cantus. Tadugio: Mério Quintana, Sfo Paulo, Abril Culearai, 1979. SARTORI, Giovani. Pardes polities ¢ temas partddrias. Zahar Editores © Bd ‘Universidade de Beatin, 1989, p. 23, TEORIA DA ORGANIZAGAO POLITICA de parte, ¢ parte nio &, em si, uma palavra depreciativa: € um constructo analitico.”* Segundo Sartori, “Quando ‘parte’ se torna ‘partido’, temos, entio, uma palavra sujeita a duas influéncias semAnticas: a deri- vvacio de partre, dividir, de um lado, e a associagao com tomar parte ¢, portanto, com participagio, do outro. Esta tiltima €, na verdade, mais forte do que a primeira derivacio. Devemos observar, porém, uma complicagio. Enquanto ‘partido’ entrava no vocabulério da politica, ‘seita’ dele saia. Durante o século 17, a expresso passou a se ligar 3 religio, ¢ especialmente 20 sectarismo protestante...”.§ O partido, aos poucos, foi ganhando forma nao apenas no sentido de estruturacio orgiinica na sociedade, tendo a palavrao significado de “associacio” da parte, com programa, princfpios e métodos de ago, tendo em vista a tomada do poder ea admi- nistragio da estrutura do Estado, mas também se diferenciou, assim, da palavra “facgo”. Enquanto esta significava “parte contra o todo”, 0 partido passou a representar “parte do todo”. Ou seja, uma organizacio ligada & sociedade e, consequente- ‘mente, a0 chegar ao governo, ligada ao Estado, Maguiavel [Niccolé Machiavelli, Florenca, Itélia, 1469- 1527], antes mesmo de Voltaire, também se referiu ao tema sem vincular a ideia de fazer politica a0 partido politico. Conside- rava que as partes concorriam para o bem-estar da sociedade, ‘mas, para ele, tudo girava em torno do principe. Das palavras de Antonio Gramsci podemos extrait a evolugio que teve essa questo a partir de Maquiavel: “O moderno principe, o mito- principe, no pode ser uma pessoa real, um individuo concreto; © He, p24 + Tide ADEMAR BOGO (ORG.) s6 pode ser um organismo; um elemento complexo de sociedade rno qual jé tena se iniciado a concretizacdo de uma vontade coletiva reconhecida e fundamentada parcialmente naa¢io. Esse organismo jé é determinado pelo desenvolvimento histérico, € 0 partido politico: a primeira célula na qual se aglomeram germes de vontade coletiva que tendem a se tornar universais e totais...” Porém, serd com Marx e Engels que a classe trabalhadora ganharé elementos filos6ficos para se onganizar de forma parti- daria com ideologia de classe. A rigor, poucas vezes encontramos escrita a palavra “partido” na elaboracio dos fundamentos do comunismo cientifico. No Manifesto do Partido Comunista, por exemplo, encontramos a citagio apenas uma vez. “O proleta~ riado organizado em classes, ¢ em partido politico, € constan- temente abalado pela competigio entre os proprios operitios. No entanto, sua organizagio renasce cada vez mais ferte, mais firme, mais poderosa. Valendo-se das préprias divis6es internas da burguesia, os operdrios forcam-na a reconhecer legalmente certos interesses de sua classe, como, por exemplo, a lei da jornada de dez horas de trabalho na Inglaterra.”® Por que hé apenas essa referéncia? Porque este jf era 0 programa da “parte” elaborado para a Liga dos Comunistas, criada em junho de 1847, no Congresso da jé existente Liga dos Justos, em Londres, na qual, para se insetir nela, Marx e Engels sugeriram a mudanca de nome. A Liga dos Comunistas, ento, cumpria a fungio de partido, ou seja, de instrumento > GRAMSCI, Antonio. Maguian, «Pater Estado Modemo, Civilizagio Brasilcna, 1991,p.6. * MARX/ENGELS. Manifesto do Partido Comunisa # edigio, Global Eaitora, 1984, p25. TEORIA DA ORGANIZACAO POLITICA para reunir militantes € ativistas politicos ea tarefa de organizar as lutas operdrias nos varios paises da Europa. Essa era a tarefa dos ativistas (parte consciente) Essa concepgio organizativa de classe levou Marx e Engels a afirmarem: “Entre todas as classes, 56 0 proletariado pode ser considerado classe realmente revolucionéria frente 4 burguesia. ‘As outras vao se dissolvendo e desaparecendo com a evoluugio do processo industrial, enquanto o proletariado surge como seu mais legitimo produto”? Para que a classe operdria cumpra sta missio, precisa que “uma parte” de seus membros eleve o nfvel de consciéncia e se torne comunista. E assim que concluem a elaboragio do Manifesto: “Os comunistas no dissimulam suas opiniGes e seus objetivos, ¢ disso se orgulham, Pregam abertamente que seus jo violenta de toda objetivos s6 serdo alcancados coma destrui ordem social existente...” Para Sartori, “Hé cerca de 150 anos, os partidos se com- portaram e se desenvolveram muito mais como uma pritica do que como uma teoria, Por isso, entre outras coisas, amensagem tende a se perder”!" Para este autor, hé trés questdes que devem orientar debate: —Os partidos nao sao facgoes. Enquanto essas seriam “um al”, os partidos seriam “uma necessidade”. — Um partido é parte de um todo. “Se um partido nio é ‘uma parte capaz de governar e em fungao do todo, isto é, tendo em vista o interesse geral, entio nio difere de uma facgio.” © Hem p22. Ter, pA8: "SARTORI, Giovanni. Op. cit p46 ADEMAR BOGO (ORG.) Os partidos so canais de expressio. “Sio um instrumento ou uma agéncia, de representacio do povo, expressando suas reivindicac6es. ... Os partidos tornaram-se os meios de expres- sio juntamente com o processo da democratizagio da politica. Ao mesmo tempo, o governo responsivel tornou-se ‘sensivel’ precisamente porque os partidos ofereceram os canais para a articulagio, comunicagao e implementagio das demandas dos governados. Foi, entao, a progressio cumulativa e autossus- tentada da faccio para o partido, do governo responsével para © governo sensivel, ¢ do partido parlamentar para o partido eleitoral, que estabeleceu a funcio fiamdamental, 0 papel fun- ional e a situagao sistemética dos partidos em suma, aquilo para que servem os partidos.” E perceptivel na teoria politica, em todos os cléssicos do ma- terialismo hist6rico ¢ dialético, a importincia da organizacio de classe ¢ a natureza revolucionaria do partido politico. Podemos encontrar nos textos mais antigos, ow nos mais atuais, referén- cias como a do Partido Comunista Portugués: “A natureza de classe do partido afirma-se ¢ revela-se pela sua ideologia, nos objetivos, na composi¢io social, na estrutura orginica, no tra- balho de massas e, de tuma forma geral, em todos os aspectos da sua atividade”® Esse aprendizado jé havia sido destacado por Lenin por ocasido da preparacio da primeira revolugio vitoriosa da clas- se trabalhadora: “Sem um partido que saiba conduzir a classe operiria ¢ © povo, através de todas as fases da luta de classes, de todos os conflitos e combates econdmicos, politicos, ideo- dem, p48. ® CUNHAL, Alvaro. O pote com paredes de vide, Edges Avante, 5 edico, 1985, p45, EEE EE Eee eee eee eee eee eee eee eee eee EEE EEE EEE Ee rE ee ee ee ee TEORIA DA ORGANIZAGAO POLITICA I6gicos, A conquista do poder, jamais haverd uma revolugio socialista”.* Lenin é, de certa forma, quem representa 0 marco divis6rio entre a teoria politica da organizagio e sua vinculagio com a pritica. Ele proprio desenvolveu a teoria do partido politico da classe trabalhadora, dando-Ihes a definicao de “forma superior de organizagio”. E através dele que a classe trabalhadora tem © poder de autodeterminar o seu destino; para isso, precisa formular um programa, estratégias e titicas para chegar a0 objetivo final. Segundo R. Kaganova, “Lenin fundamentou teoricamente que o partido marxista de novo tipo representa a unio do socia~ lismo cientffico com o movimento operario de massas. A base ideol6gica e teérica do partido é 0 marxismo. Aqui, pois, o que 0 diferencia, radicalmente, de todas as organizagdes politicas do proletariado até entio existentes. O partido comunista é a vanguarda consciente da classe operéria..”"* Reafirma, portanto, de outra forma, que 0 partido é a “parte” consciente da classe ou da sociedade. Portanto, 0 triunfo da revolugo somente serd possfvel se a classe trabalhadora estiver organizada, seja como “parte” da sociedade nacional, seja como parte da sociedade no plano in- ternacional, para, através da organizacio partidaria, ser possivel conduzir-se até a tomada do poder e, a partir daf, estabelecer as bases da construgio da sociedade socialista. om esse entendimento, Marx ¢ Engels, jé no inicio da militincia politica, interessaram-se por organizar o movimento operirio voltado para as quest6es gerais: “Proletarios de todos. #LENINE, VL. Potd petro de nove tipo. Edigdes Avante, Lishos, 1975.16 Tide ADEMAR BOGO (ORG.) 08 pafscs, uni-vos". Dessa forma, dispensaram todo o tempo necessério para organizar as Associag6es Internacionais, 2.- As associagées internacionais dos trabalhadores Com a efervescéncia do movimento operario nos varios pafses da Europa, a partir de 1830, elaborou-se a teoria politica fundamentada na ciéncia e no préprio desenvolvimento do capitalismo. A repressio e a perseguicio politicas eram intensas ¢ 08 militantes ¢ ativistas politicos eram obrigados a safrem de seus paises de origem, Marx ¢ Engels faziam parte dos cfrculos que se reuniam e discutiam os problemas da classe operdria, A teoria da revolucio nasceu com esta natureza internaciona- cionalista e as associagGes cumpriram 0 papel de “unificar” 0 pensamento em cada época determinada, influindo nas téticas € nas formas organizativas de cada pais. As experiéncias de organizagio tiveram inicio com os Co- mités de Correspondéncia; depois, com a criagio da Liga dos Comunistas, unificaram os comités dos diferentes paises; por fim, em forma de Associacio ~ a organizagio de classe que reuniu os revoluciondrios dos paises da Europa e de outros continentes, As Associacdes Internacionais, principalmente as trés primeiras, tiveram importincia em unificar o pensamento politico internacional. Era em torno delas que se estruturavam, as estratégias e titicas para enfrentar as classes dominantes em cada pais. Isso contribuiu, mas também alienou as organizagées de sua prépria realidade quando nao tiveram a capacidade de flexibilizar as téticas. Hoje, essas Associagbes ~ apesar de ainda existirem a Se- gunda ea Quarta — pouco influem na unificagao da classe trabalhadora mundial, talvez sendo esse um dos principais TEORIA DA ORGANIZACAO POLITICA obsticulos para o enfrentamento do imperialismo, que se tor- na cada ver mais ameacador e violento, atuando em qualquer parte do mundo. Para uma melhor compreensio dos textos, vamos resgatar alguns elementos historicos das Associagées Internacionais como forma de articulacio da “parte” consciente da classe trabalhadora mundial A Primeira Internacional ‘As reunides eram frequéntes com os trabalhadores e mili- tantes exilados em Londres. Foi em uma reunito festiva, em 5 de agosto de 1862, em Londres, com representantes de varios paises, que surgiu a ideia de se criar uma Associagio na qual todos pudessem estar representados. Iniciaram as articulagées ¢, em 28 de setembro de 1864, realizaram o primeiro encontro paraa elaboragio dos estatutos ¢ a definigio da data do primeiro congresso. Marx encarregou-se da redacio inicial dos estatutos e do manifesto, no qual repetiu muitas partes do Manifesto do Partido Comunista elaborado em 1848. Pretendiam realizar o primeiro congresso no més de se- tembro de 1865, na Bélgica, mas 0 governo belga editou uma Jei limitando a entrada de estrangeiros no pafs. O congresso somente foi realizado em setembro de 1866. Os estatutos aprovados no congresso afirmavam: *Conside- rando que a emancipacio dos trabalhadores deve ser obra dos proprios trabalhadores; que o esforgo dos trabalhadores para alcangar sua emancipagio nao deve ter novos privilégios, seno estabelecer para todos os trabalhadores os mesmos direitos ¢ os ‘mesmos deveres; que a submissio do trabalhador ao capital é a fonte de toda servidao politica, moral e material; que, por tal Tazo, a emancipagio econdmica dos trabalhadores 0 supremo ADEMAR BOGO (ORG.) objetivo a que deve se subordinar todo o movimento politico; que todos os esforgos realizados até agora foram em vio por fal- tar solidariedade entre os trabalhadores das distintas profissGes de cada pafs e também uma unifio fraternal dos trabalhadores de diversas nag6es; que a emancipacao dos trabalhadores nao é problema simplesmente local ou nacional, senao que, a0 contr’- rio, esse problema interessa a todas as nag6es civilizadas, estando ditadas as solugdes 20 concurso tedrico pritico das mesmas, que 0 movimento que se est efetuando entre os trabalhado- res nos paises mais industrializados da Europa, ao engendrar novas esperangas, dé um aviso solene para nfo se incorrer nos erros antigos, e aconselha combinar todos os esforgos ainda isolados.."" Por isso, todos deveriam reconhecer “a verdade, a justica € a moral” sem diferenciar ragas ou nacionalidades. De forma unitiria, a Internacional funcionou até 1872. Em 1868, entrou para a Associagio a organizacio secreta sufca, a Alianca da Democracia Socialista. Tinha como dirigente prin- cipal Mikhail A. Bakunin [1814-1876], de ideologia anarquista, Essa organizagio se dividiu na Suica ¢ influiu nos rumos da Associacio Internacional. iiltimo congresso unitario foi realizado em Haia, Ho- anda, em 1872, com 67 delegados de 13 paises. Devido de~ sentendimentos durante o congresso, uma parcela minoritaria se retirou ¢ criou outra Internacional. A fracio remanescente ainda tentou seguir em frente; mas os congressos convocados no atrafram ninguém. Desfez-se definitivamente em 1878, ‘Tentando acalmar as reages, o Congresso de Haia decidiu transferir a secretaria da Internacional para Nova York. Essa fragio realizon um outro congresso, em Genebra, em 1873, ® MORATO, Joan Jose. El Pando Soiliste Obro. Editorial Ayuso, 1976, p. 18. TEORIA DA ORGANIZAGAO POLITICA mas 0 congresso teve pouco éxito e, em 1876, dissolveu-se definitivamente 0 Conselho de Genebra e Nova York, sendo extinta a Primeira Internacional. A Segunda Internacional A dissolucao da Primeira Internacional nao significou 0 enfraquecimento do movimento em cada pats. Todos seguiram estruturando suas forgas. A experiéneia da Comuna de Paris [de 18 de marco a 18 de maio de 1871] servia como referéncia de que era possivel chegar ao poder através da organizacio e da Ita da classe trabalhadora. Coma morte de Marx, em 1883, Engels deu continuidade e foi através dele que strgitta possibilidade de se convocar um congresso para organizar a Segunda Internacional. No ano de 1889, em Paris, com 380 delegados, instalou-se o congresso. Essa Internacional tinha caracteristicas préprias. Dela participaram partidos politicos e sindicatos de trabalhadores de todos os continentes. O congresso reafirmou alguns principios da Primeira In- ternacional: “A emancipacio do trabalho e da humanidade s6 pode ser resultado da aco politica internacional do proletariado organizado em partido de classe, tornando-se dono do poder politico para a expropriacio da classe capitalista com a apro- priagio social dos meios de produgio”.” Além disso, definiu-se que 0 “1° de Maio” seria dia de luta em todos os paises para se estabelecer a jornada de trabalho de 8 horas; proibigio do tra- balho para menores de 14 anos; abolicio do trabalho noturno para as mulheres ¢ menores de 18 anos, descanso de 36 horas por semana; proibigio do pagamento do salério em produtos alimentos ete. 7 Tae, p30. ADEMAR BOGO (ORG.) Os partidos foram, aos poucos, saindo da clandestinidade coma legalizagio tornaram-se partidos de massas. Passaram ater seus proprios representantes no Parlamento. “Em alguns pafses, foi adotado o suftégio universal: quer dizer, o sistema pelo qual todos os adultos tinham de votar. Engels, o amigo de Marx, comentou que o processo revolucionario iria se tornar mais lento, mais chato, porém infinitamente mais seguro...” Porém, foi no terceiro congresso realizado em Londres, em 1896, um ano depois da morte de Engels ~ embora houvesse relaxamento da repressio e participacio oficial no processo politico ~ que 0 assunto dos “direitos politicos” entra em pauta visando a conquista do direito de voto para ambos os sexos. Um clima de euforia se protongou até novembro de 1912, quando foi realizado o diltimo congresso em Basileia, Suica, com 555 delegados, em que o tema principal do debate foi a guerra mundial, que ocorreria em seguida. O congresso apelou para que os trabalhadores de todos os paises se levantassem contra 05 governos ¢ 0s convencessem a evitar a guerra. Mas, se 08 governos insistissem em realizar a guerra, os trabalhadores a transformariam em revolugées. Em 29 de julho de 1914, reuniram-se em Bruxelas, as pressas, representantes da diregio da Segunda Internacional da Europa. Sentindo que em alguns paises a guerra era imi- nente, reafirmaram a importincia de lutar pela paz. Definiram também convocar um congresso em carter de urgéncia, em Paris, para articular os trabalhadores do mundo contra a guerra. © congresso nao chegou a se realizar, pois, quatro dias apés a reuniao de convocagio, um dos principais dirigentes ® KONDER, Leandro. Hiss da ideieseialitae no Brel Bditora Bxpressio Popular, Sto Paule, 2003, p20, EY TEORIA DA ORGANIZACAO POLITICA da Internacional, conhecido por Juarés, foi assassinado e, logo em seguida, o Partido Operario Belga emitiu mensagem opostaa decisio da reunido. “Socialistas! Impedindo a invasio de nosso territ6rio exerceremos o direito de legftima defesae contribuiremos também para nos defender contra a barbaric militarista, pelas liberdades politicas e pela democracia na Europa.” ‘Com 0 inicio da Primeira Guerra Mundial, em 1914, os par- tidos socialistas se dividiram e cada qual passou a defender pontos de vista nacionalistas, principalmenteasocial-democracia alemaea francesa, “.. Marx havia terminado seu famoso Manifest do Partido Comunista, cm 1848, com a recomendacio: ‘Proletirios de todos 0s paises, uni-vos!’, mas, em 1914, os proletérios alemes e fran- ceses passaram a se matar uns aos outros, de armas nas mios”2" Essa situagao de confusio se estendeu até 1919, quando 08 russos, revoltades com os social-democratas alemies, decidiram criar Internacional Comunista, a terceira. Houve uma profunda divisio entre os socialistas no mundo todo. Uns continuaram na Segunda Internacional, orientados pelos prinefpios da social-democracia, que funciona até hoje; outros, organizados nos partidos comunistas, seguiram a Terceira Internacional. A Terceira Internacional Com a classe trabalhadora russa chegando ao poder em 1917, o Partido Operdrio Social-democrata da Riissia (Posdr) tinha, além de todas as preocupacées com a construcéo do © MORATO, Juan Jose. 5! Paid Sodelite Otro, EditerialAyoso. Madd, 1976 p35, 1 KONDER, Leandro, Hsia ds ideiacilisas no Basi Eaitora Expresso Popul, ‘io Paulo, 2003, p. 3. ADEMAR BOGO (ORG.) novo Estado, de pensar na divisio existente entre os socialis- tas do mundo. Lenin tentou, a partir de 1914, convencer os social-democratas alemaes a mudarem de posigio, mas eles foram irredutiveis, aliando-se & classe dominante e apoiando a guerra. Em abril de 1917, Lenin redigiu a proposta conhecida como As fess de abril, onde no item 9, destacou quais deveriam ser as tarefas do partido: a) congresso imediato do partido; ) modifieagSo do programa do partido, principalmente: sobre o imperialismo ¢ a guerra imperialista ~ sobre a posi¢io perante o Estado e a nossa reivindicagio de um Estado-comuna ~emenda do programa minim, js antiquado; ©) mudanca de denominagio do partido?" E, no conjunto de teses, propés, na de ntimero 10, a cria- ao de uma nova Internacional: “Renovagio da Integnacional. Iniciativa de construir uma Internacional revoluciondria, uma Internacional contra os social-chauvinistas e contra o ‘centro.”? A partir desse momento, iniciou-se, oficialmente, a diferen- GiagZo entre os comunistas ¢ 0s social-democratas. Os partidos comunistas em todos os pafses se contrapunham aos partidos socialistas, reformistas e revisionistas. Lenin praticamente instituiu a Terceira Internacional em nome da defesa do socialismo, dizendo que a social-democracia havia deturpado e trafdo © Manifesto do Partido Comunista em dois aspectos principais: “1, Os operdrios nao tém patria: ‘a defesa da patria’ na guerra imperialista é uma traicio ao socialismo; 2B LENINE, V LAs Tee de Abril. EéigSos Avant, Lisbos, 1978, pp. 12. seg. Hem, p13, TEORIA DA ORGANIZAGAO POLITICA 2. teoria marxista do Estado foi deturpada pela Segunda internacional”. A Terceira Internacional, ou Internacional Comunista, ou ainda Comintern, como também era conhecida, foi fiundada no primeiro congresso, realizado na Riissia, [de 2a 6 de marco de 1919] ¢ funcionou até 1943, quando, durante a Segunda Guerra Mundial, foi dissolvida por Stalin ~ que conduziu o Estado Soviético para o caminho da burocratizacio e se aliou as poténcias capitalistas durante a Segunda Guerra Mundial. A partir da morte de Stalin, em 1953, Nikita Kruschev apresentou uma série de dentincias contra Stalin, gerando uma divisio principalmente entre a Unido Soviética ¢ a China. Os partidos comunistas seguiram, cada qual, a sua preferéncia. As Associacées Internacionais nao apontavam as diretrizes politicas, mas, sim, os partidos comunistas da Unio Soviética (principalmente) e da China. A Quarta Internacional A partir da morte de Lenin, em janeiro de 1924, iniciou- se uma disputa publica entre Stalin e Trotski sobre a sucesso no comando do Estado Soviético. Stalin era o secretirio-geral do partido e rapidamente ascendeu a0 poder, tornando-se 0 herdeiro e comandante do Estado. Insatisfeitos, Trotski e outros revolucionérios iniciaram uma longa e dura batalha para derroté-lo. Em fevereiro de 1929, ‘Trotski foi banido do pais e enviado para a Tarquia. Em 1933, conseguiu, através de amigos, a concessio do governo francés para residir naquele pats. 3 LENINE, V1. Obws Bide Editors Alfamega, Sio Pal, 1980, Ih. 48 ADEMAR BOGO (ORG.) Emagosto de 1936, foi julgado’ revelia ¢ condenado’ morte juntamente com 14 Iideres bolcheviques. Encontrava-se, enti, na Noruega, mas o governo daquele pais negou-se a deportilo. Tniciou-se uma campanha internacional para encontrar um pais seguro onde pudesse residir com sua familia, Foi o muralista Diego Rivera quem conseguiu, junto a0 governo do México, petmissio para Trotski fixar residéncia nesse pais. A.casa de Trotski era fortemente vigiada pela policia e por voluntérios. Dedicou-se a organizar a Quarta Internacional para enfrentar Stalin. O evento de fundacio iniciou-se em 2 de setembro de 1938, em Paris, com a presenga de 212 repre- sentantes de 11 paises. O agente da policia estalinista, Ramén Mercader, em 20 de agosto de 1940, entrou no escrit6rio de ‘Trotski e, com uma picareta de alpinista, golpeou a cabeca de seu opositor. Trotski tentou se defender, sait da sala e, aos gritos, pediu paya que os segurangas no matassem o assassino, pois ele deveria “contar tudo”. Levado ao hospital, Trotski ainda conseguiu ditar sua {altima mensagem: “Estou préximo da morte, devido ao golpe de umassassino politico... por favor, digam aos nossos amigos... Estou certo... da vit6ria da Quarta Internacional... continue” Apés a morte de Trotski, a Quarta Internacional sofreu varias divisoes internas, Permanece articulada, mas, sem condi- 6es de influir para a unificagao do movimento revoluciondrio internacional © proceso de organizacio da classe trabalhadora mundial passou por diferentes momentos de crises ¢ de triunfos, Mas as divergéncias ideolégicas nio conseguiram derrotar a causa GARZA, Hedda. Os Granies Liters. Nova Culkaral, Sio Paul, 1987, p. 9. TEORIA DA ORGANIZACAO POLITICA do socialismo iniciada com a elaboragio dos Prinfpios do Co- munismo, aperfeicoada pelo Manifesto do Partido Comunista enraizada em uma rica literatura produzida por intelectuais, lideres politicos e revoluciondrios do mundo todo. tehek Nesta coletinea, a partir do contexto histérico em que foram produzidos estes documentos, destacamos dois pontos fandamentais para se organizar a luta de classes: a teoria ¢ método. Reunimos os elementos fundamentais que orientaram 05 revoluciondrios, em outros tempos, na realizacdo de suas viagens sem colocar em risco os sonhos que transportavam. “Muitos chegaram até o fim; outros, o tempo derrubou barreiras e obstruiu a estrada e, apesar da insisténcia, nfo conseguiram passar adiante, mas a diregdo que percorriam era correta. O importante é que a hist6ria no para; continua através das ex- perigncias passadas e da rebeldia das geragdes presentes. 2% O LEGADO DE FRIEDRICH ENGELS Friedrich Engels nasceu em 28 de novembro de 1820, na cidade industrial de Barmen, provincia Renana da Brissia, a parte mais desenvolvida da Alemanha. Era o filho mais velho de oto irmaos. A mie, Elisabeth van Haar Engels, descendia de familia intelectualizada, era extrovertida, amorosa, gostava de literatura € arte. © avd materno teve forte influéncia na formacio de Engels; era fildlogo e profundo conhecedor da mitologia grega. Até 0s 14 anos de idade, frequentou um colégio de professores fansticos religiosos; em outubro de 1834, passou para liceu, em Elbertfeld, um dos melhores colégios da Prussia. O diretor do liceu sugeriu ao pai de Engels que colocasse o filho no internato da comunidade evangélica. O pai aceitou a ideia com alegria, pois considerava que a “vida retirada” ajudaria a retficar alguns desvios de distragio ¢ de carter que tinha adquirido, Aplicado nos estudos, tinha enorme facilidade em hist6- ria, Iinguas antigas ¢ literatura classica alema, “No certificado TEORIA DA ORGANIZACAO POLITICA passado a Engels ao sair do liceu, assinalava-se que ele havia manifestado grande interesse pela hist6ria da literatura alemé, pelas obras de seus cléssicos, adquirira bons conhecimentos em matemitica,fisica, distinguira-se pela sua modéstia, sinceridade e cordialidade, manifestara uma louvavel aspiragao para adquirir uma vasta educacio.”! Engels pretendia, ao terminar o ensino médio, entrar para a universidade e estudar ciéncias econémicas e jurfdicas, mas © pai cxigiu que abandonasse essa ideia e se dedicasse ao oficio de comerciante. Antes mesmo de conciuir os estudos, em 1837, foi convencido a trabalhar no escritério comercial da familia. A principio nfo gostou da ideia, Depois, percebeu que poderia utilizar o tempo livre para estudar os assuntos de que gostava: histéria, filosofia, literatura, Iguas e poesia, principalmente. Seu pai, percebendo que o filo nao se interessava pela atividade comercial, resolveu levi-lo em viagens de negécios. A primeira foi para a Inglaterra e, depois, para a Holanda; 20 retornar, Engels foi enviado para Bremen, cidade portuaria, para trabalhar em uma empresa de exportagio de um amigo de seu pai. Nesse trabalho, Engels ampliou seus conhecimentos a aprendeu Ifnguas estrangeiras. Aproveitou para se especializar em mésica, frequentou concertos ¢ teatros. Dedicou-se também aos esportes, como a pritica de esgrima, patinacio, hipismo ¢ natagio. ‘A situacio politica da Alemanha favoreceu 0 desenvolvi- mento de suas ideias. Estava em curso, na década de 1840, a revolucio democrética burguesa na Alemanha, que se encon- " Biogafia preparada por um coletvo de autores do Institut de Maraismo-Leninismo sexo 20 CC do PCUS. Traduzido di 2 edict por José Oliveira. Edicbes Progresso ~ Bditorial Avante, Moscovo ~ Lisboa, 1986. ADEMAR BOGO.(ORG.) trava fragmentada em 38 Estados independentes, apenas for- malmente unidos na Confederagio Germénica. Isso dificultava © desenvolvimento econémico e social do pais, deixando-o dependente dos outros paises da Europa. Engels comegou a se interessar pela politica e o que mais 0 atraiu foram as ideias modernas de vérios escritores, que de- fendiam a liberdade politica e a eliminagio da coacio religiosa. Nesse periodo, reinava na Priissia, recém-subido ao trono, Frederico Guilherme IV, violento defensor do poder absoluto que teimava em defender a sobrevivéncia do feudalismo. Por volta de 1839, Engels empenhou-se no estudo de Hegel. Impressionou-se com o descobrimento do movimento ascen- dente na humanidade, que se transforma permanentemente. Conseguiu perceber af a dialética da histéria da humanidade, mas discorda das andlises sociopoliticas do filésofo. Também a partir desse ano, Engels comegou a escrever artigos para jornais. Em 1841, Engels mudou-se para Berlim para iniciar o servi- co militar na Brigada de Artilharia. Frequentou a universidade de Berlim como estudante voluntario. Juntou-se aos jovens hegelianos, que formulavam concepgbes atefstas ¢ radicais. O ponto de partida era a tese dialética de Hegel de que “tudo no mundo se encontra em processo de transformacio”; devido 20 seu desenvolvimento interno, toda forma existente vai sendo transformada em outra. Também aproveitou os estudos de Feuerbach “A esséncia do Cristianismo”, passando a defender o atefsmo. Por diversas vezes, polemizou com fildsofos através de artigos em jornais. artigo que teve maior repercussio foi “Schelling e a revela¢io”, publicado em 1842 na revista edita~ da por A. Ruge que, a0 descobrir que o artigo era de Engels, escreveu-Ihe chamando-o de “doutor em filosofia”. Engels TEORIA DA ORGANIZAGAO POLITICA respondeu: “Alids, nfo sou de modo algum doutor e nunca poderei sé-1o; sou apenas comerciante e artilheiro do reino da Priissia, Por isso, livre-me, por favor, desse titulo”? Engels e Marx ‘Terminado o servico militar em 8 de novembro de 1842, Engels retornou a Barmen. A permanéncia na casa paterna foi ripida, Em meados de novembro, seguiu para a Inglaterra, para Manchester, com 0 objetivo de adquirir prética comercial na fibrica de fiacio da firma Erem & Engels, de propriedade de seu pai, cujo objetivo, mais do que ensinar um oficio ao filho, era afasté-lo das ideias revolucionérias em ebuligio na Alemanha. Na ida para a Inglaterra, passou por Colénia e, 20 visitar a sede do jornal Rheinische Zeitune, conheceu Karl Marx, chefe de redagio. Engels permaneceu dois anos em Londres. Foi ali onde, de fato, se tornou socialista. Continuou escrevendo artigos para Jjornais e se dedicou aos estudos para compreender a situacio de vida dos operdrios ingleses visitando suas casas nos bairros de Londres Na primavera de 1843, durante o més de maio, Engels fez contato com dirigentes de uma organizagao secreta de operi- ios comunistas alemaes conhecida como A Liga dos Justos; essa organizagio surgiu de uma cisio da Liga dos Proscritos, nascida em Londres, em 1836. Os trés principais dirigentes da Liga, um compositor, um tipégrafo um sapateiro, propuse- ram que Engels entrasse para a organizacio, mas ele recusou, pois percebeu que havia discordancias no modo de conceber.0 comunismo e os métodos conspirativos que utilizavam, F Opa ADEMAR BOGO (ORG.) Engels foi o primeiro filésofo a aplicar corretamente o mé- todo dialético na andlise nas relagées econ6micas da sociedade burguesa. Por sua capacidade de interligar os diferentes aspectos dos fendmenos econdmicos, demonstrou a unidade e a luta dos contrérios que hd em todas as relagdes, tomando como referéncia a existéncia da propriedade privada do sistema capi- talista. Apontou como saida para o fim da propriedade privada capitalista, nao as pequenas reformas apontadas por Proudhon, mas, a revolucio socialista. “.. Com sua anilise, estabelece certas leis independentes da vontade dos homens, objetivas, naturais, do desenvolvimento social, em cuja base assenta a propriedade privada capitalista. Ea lei da concorréncia, a lei da centralizagio do capital, a lei da ruina e pauperizacio das massas, a lei da oferta e da procura, a lei das crises de superproducio. Essas leis, ‘mostra Engels, ndo podem desaparecer antes de ser destruida a forma de propriedade que as gera.”® Em agosto de 1844, 20 retornar 4 Alemanha, passou por Pa- ris para visitar Marx. Surpreendeu-se como haviam chegado as ‘mesmas conclusGes, embora por caminhos diferentes. Durante 0s dez dias que permaneceu em Paris, nfo se separou de Marx, estabelecendo com ele uma relacio de confianga e cumplicidade que se seguit até o final da vida de Marx, em 1883. Fez contato com vérios jornais e foi apresentado por Marx para militantes do Movimento Democritico e Socialista da Franca. Ao chegar 4 Alemanha, Engels surpreendeu-se com aampli- tude que haviam alcangado as ideias socialistas. Empenhou-se ardentemente em publicar artigos em revistas e jornais e pro- Jetou uma “biblioteca dos er de outra literatura socialista”. entes socialistas estrangeiros ¢ Opa, pas. 3 eer SESE e eee eee eee TEORIA DA ORGANIZAGAO POLITICA Colaborou na organizacio de trés reuniGes importantes em fevereiro de 1845, em Elberfeld, em que o debate princi- pal se deu em torno do sistema capitalista e a importancia do comunismo, Embora tenham sido um sucesso, as reuni6es posteriores foram proibidas. Engels ainda tentou desobedecer atal proibigio, mas no obteve éxito. Empenhou-se, entio, em. fazer contatos individuais; convocou Feurbach, que residia na Baviera, para que se deslocasse até a Provincia Renana para atividades préticas, mas no foi atendido. Procurou manter as atividades conspirativas com outros companheiros e zelar pela correspondéncia, pois havia uma vigilncia muito intensa sobre o que circulava de literatura na época. Foi obrigado, 20 mesmo tempo, a se empenhar na arrecadagio de recursos para Marx que, no mesmo més de fevereiro, foi expulso da Franga e mudou-se para Bruxelas. Isso criou um profundo mal-estar entre Engels e seu pai, que desaprovou sua ligacio com as atividades comunistas. Empenhou-se em escrever 0 livro A condi da classe traba- thadora na Inglaterma. Mas a situago de sua seguranga se agra~ ‘vou; somando-se as relagdes tensas na familia, Engels resolveu mudar-se para Bruxelas, onde estava Marx. Nesse encontro 6 que Marx the apresentou, em tragos gerais, as concepgdes materialistas da hist6ria, que estava elaborando. A organizacéo dos operarios Com 0 amadurecimento das revolugées burguesas em toda a Europa, em que os trabalhadores, embora nao conscientes, deveriam jogar um papel decisivo, com o movimento operario desorganizado e desligado do pensamento socialista, era preciso ajudar os operdrios a descobrirem as ideias revolucionérias, com uma nova visio do mundo, buscar formas onganizativas 2 ADEMAR BOGO (ORG.) eficientes e formar um partido da classe operéria, tarefa que Marx e Engels deram a si préprios. Devido a forte represséo, resolveram organizar os Comités de Correspondéncia Comunistas, pretendendo, com isso, fa~ zer a ligacio das ideias comunistas entre os revolucionsrios da ‘Alemanha ¢ de outros paises; era a forma mais adequada para fazer circular a propaganda em materiais impressos ¢ manus- critos. Iniciaram, em janeiro de 1846, pela criagio do Comité de Bruxelas, na Bélgica, pois ali residiam dezenas de militantes refugiados da Alemanha, da Franca, da Polénia ¢ da Riissia. As atividades do comit® deveriam colocar em ordem a corres- pondéncia entre os militantes de todos os paises, organizar as informages ¢ imprimir a literatura comunista. No inicio de junho de 1846, os militantes da Liga dos Justos, em Londres, fundaram o seu Comité de Correspondéncia. Com isso, Marxe Engels conseguiram influir mais diretamenge sobre o destino da Liga. As cartas enviadas por Marx e Engels aos comu- nistas do movimento operdrio da Alemanha alertavam para a im- portincia do movimento democratico em geral ea necessidade de defender reinvindicagées democriticas burguesas, como a liberdade de imprensa, a promulgacio de uma constituicio etc. Acteditavam que, conseguindo isso, as condigées melhorariam € a oposicio entre trabalhadores e burguesia se ampliariam. A intengio era criar uma organizagio internacional dos trabalha~ dores; naquele momento, os comités cumpriam essa fisngio. (© Comité de Bruxelas envio Engels para Paris para ajudar 0 Comité de Parisa resolver problemas de divergéncias internas, em agosto de 1846. Engels permaneceu nessa cidade até fins de janeiro de 1848, quando foi expulso do pais pelo governo francés, Na Franca, teve intensas atividades de militincia ¢ de fandamentagéo do comunismo, debatendo constantemente com 3s TEORIA DA ORGANIZAGAO POLITICA 0s comunistas ut6picos. Consta que numa das reunides com os proudhonistas, que defendiam as mudangas por vias pacificas, durante trés noites, Engels defendeu as ideias comunistas em trés pontos: 2) defesa dos interesses proletarios em oposigio aos inte- resses burgueses; b) supressao da propriedade privada e a sua substituigio pela comunidade de bens, ¢) no reconhecimento de nenhum outro meio para a rea- lizagio dessas intengées a nao ser a revolucao democrética, violenta. Para auxilié-lo, Marxempenhou-se em contestar a teoria de Proudhon descrita no livro A filasofia da miséria, respondendo com 0 livro A miséria da filosofia, que Engels considerou um verdadeiro programa de ideologia comunista. No inicio de 1847, a Liga dos justos, de Londres, tomou uma decisio radical de se reorganizar ¢, para isso, decidiu convidar Marxe Engels ase filiarem a ela. Em Bruxelas, Marx, com um grupo de comunistas, organizou um nticleo da Liga. O sonho de organizar 0 partido comunista estava se tornando realidade. Adirecio da Liga dos Justos distribuiu uma mensagem estabe- lecendo as diretrizes para a reorganizacio dos micleos locais Seguiu, com a mensagem, a convocagio do congresso com os pontos a serem discutidos 2) balanco do desenvolvimento da Liga e eleigio da nova direcio; ») reorganizacio da Liga e revisio dos estatutos; 6) elaboragio do programa dé Liga (curta profissio de fé comunista); 4) criagao de um 6rgio de imprensa da Liga; ©) questées de organizagio. ADEMAR BOGO (oRG.) Em 2 de junho de 1847, iniciou-se, em Londres, o Primeiro Congresso da Liga dos Justos ou da Liga dos Comunistas ~ a mudanga de nome foi uma das primeiras discuss6es colocadas por Engels. No congresso, sem a presenca de Marx, Engels condu- ziu as discussées para o caminho do comunismo cientifico. Reformularam os estatutos baseados no principio do cen- tralismo democritico. Criaram, como érgio de imprensa do partido, a revista A comunista, O velho estatuto da Liga dos Justos serviu como base para a formulacio de um novo esta- tuto, cabendo a Engels dar a forma final. Aproveitou-se para simplificar a estrutura organizativa, as normas para ser membro da Liga, a forma de cleicio dos dirigentes e como afasté-los em caso de necessidade. Mas este nao foi aprovado no congresso. © documento basico foi enviado para os comités e micleas para discussdo, com 0 objetivo de aperfeigoé-lo ¢ apgovi-lo no segundo congresso, que s¢ iniciou no dia 29 de novembro de 1847. A palavra de ordem da Liga dos Justos era: “Todos os homens sdo irmios". Por influéncia de Marx e Engels, a Liga dos Comunistas adotou a palavra de ordem “Proletérios de todo o mundo, uni-vos!” Engels props, no primeiro congresso, que deveriam elabo- rar um programa que servisse como “profissio de £€” da Liga dos Comunistas. Coube a ele a tarefa da elaboragio. O progra~ ‘ma seguiu o sistema de perguntas e respostas com diferentes partes constitutiva 1. inicia com explicagio sobre os objetivos do comunismo; 2. caracteriza o proletariado como classe; 3. descreve a hist6ria do surgimento do proletariado; 4. mostra a oposicdo que essa classe tem com a classe bur guesa; 2s TEORIA DA ORGANIZAGAO POLITICA 5, aprofunda a anilise para mostrar a diferenca que ha entre © proletariado, os escravos, os servos e 0s artesiios; 6. descreve o cardter necessirio que deve ter atransformacio comunista da sociedade; 7. como se dar‘ a transformacio da propriedade privada em propriedade social; 8, qual deve ser a posigio dos comunistas em relagio 3 fa- iflia, 3s diferencas nacionais ¢ 3 religiao; 9, qual € 0 papel que a revolucdo desempenha; 10. quais as primeiras medidas que o proletariado deve tomar 20 conquistar 0 poder. Depois do congresso, Engels regressou a Paris, informando as membros da Liga todos os encaminhamentos feitos. Seguit para Bruxelas para conversar com Marx, decidindo fandar um comité regional da Liga dos Comunistas, chamado Socieda- de Operaria Alema de Bruxelas. A ideia era que esse tipo de associagio servisse de instrumento para a agitacio politica ¢ possibilitasse selecionar os membros mais maduros e ativos para a Liga dos Comunistas. As atividades de agitagZo ocorriam de diversas formas: palestras, atos pablicos, pecas de teatro escritas pelo préprio Engels, atividades musicais etc. Ap6s meses de intensas ativi- dades organizativas e de elaboragio teérica e de terem criado a Associagio Democritica, uma espécie de associagio internacio- nal, com Marx eleito vice-presidente, Engels retornou a Paris para fazer contato com os operdrios franceses. Deparou-se, em Paris, com o lider reformista Louis Blanc, que sonhava com a conquista da democracia atra~ vés do voto, pois achava que o Estado cra uma institui¢o separada das classes. Blanqui dirigia 0 Partido Socialista Democrético, que tinha muita influéncia sobre os operarios ADEMAR BOGO (ORG. franceses. A esse partido também se vinculavam sociedades secretas de proletirios comunistas revoluciondrios. Era, em si, um partido pequeno-burgués democratic, com a parti- cipacio de operérios que tinham tendéncia para 0 socialismo € 0 comunismo. ‘Com muito tato, Engels conseguiu se articular com esse partido e escrever em seu jornal, A Reforma, divulgando as ideias do comunismo. Sua preocupacio era de nao haver unidade entre 0 militantes da Liga dos Comunistas e, apés varios embates, restaram 30 representantes, dentre os quais Engels, presidente da Liga de Paris. Enquanto isso, circulava o documento “Pro- fissio de f€ comunista”, que provocava intensas discussbes. Devido a tantas contestagSes,a diregio do circulo da Liga de Paris solicitou a Engels que redigisse outra proposta de progra- ma, que ficasse préxima da “Profissio de f& comunista’. Engels desenvolveu mais o contetido do programa, mas manteve 0 mesmo estilo, acrescentando trés perguntas, ficando com 25, 20 qual Engels deu 0 nome de “Prinefpios basicos do comu- nismo", Sua ideia era nomeé-lo logo “Manifesto comunista”, mas se convenceu de que ainda era cedo para tratar a questio nesses termos. Esse documento est4 composto por perguntas € respostas, com a seguinte l6gica: 1. inicia pela definigio do comunismo como doutrina da libertacao do proletariado; 2. define o que é o proletariado, sua origem, situagio de vida na sociedade burguesa, de que forma vende a forca de trabalho, sta tinica mercadoria; explica a diferenga que hé entre © proletirio, o escravo, 0 servo e 0 artesio; 3. trata longamente das consequéncias da revolugio indus trial, principalmente nas condig6es da Inglaterra; em que essa revoluigio havia destruido completamente o sistema anterior » TEORIA DA ORGANIZACAO POLITICA da organizacio da industria manufatureira. Além disso, clas- sificou a burguesia como classe dominante, que contribuiu para o surgimento do proletariado, que, por sua vez, realizar arevolugio; 4, descreve a indiistria moderna, que aumenta muito a produgio industrial, mas que a quantidade de producéo entra em contradigo com as possibilidades de mercado; isso levaria cada vez mais a intensas crises comerciais, tendo como conse~ quéncia o fechamento das firicas, a faléncia dos patrdes € 0 desemprego em massa dos trabalhadores; 5, aponta que a livre concorréncia ¢ 0 direito & propriedade privada dos meios de producio tornam-se © maior problema para a grande indiistria ¢ isso somente seré resolvido com uma nova forma de organizar 2 sociedade na qual os industriais individuais serio substituidos por outros coletivos, cada qual recebendo seu resultado segundo as suas necessidades; ¢ que isso era impossivel nas sociedades anteriores, porque nao havia condigées para suprimir a propriedade privada; 6. aprofiunda o curso da revolucao e as caracterfsticas daso~ ciedade comunista; as vias de sua criagio, as etapas da revolugdo € quais as medidas mais importantes que o Estado proletitio deveria adotar para destruir a velha ordem social; 7, destaca com preciso os tragos da futura sociedade sem classes, em que a concorréncia ser substituida pela associagio, tendo como fisndamento a propriedade social dos meios de pro- dugao, mas alerta, para isso, que a revolugao proletdria deveria vencer em varios paises do mundo, nos mais desenvolvidos economicamente, a0 mesmo tempo; 8. aprofiunda ainda as consequéncias da abolicio da proprie- dade privada ¢ defende a importincia da educagio como forma de a juventude assimilar as mudangas; ML ee ADEMAR BOGO (ORG) 9, procura antecipar que influéncia teria o comunismo sobre a familia, mas deixa sem resposta a questo das nacionalidades € das religiGes; 10. encerra o documento aprofundando a diferenga que havia entre os comunistas e os socialistas e qual deveria ser a atitude dos comunistas em relagio a0s outros partidos, deixando claro que isso variaria de pafs para pais. Dias antes de o congresso ser realizado em Londres, entre 29 de novembro ¢ 8 de dezembro de 1847, Engels encontra-se com Marx, em Ostente, Bélgica, para entrarem em acordo sobre 0 programa. Do congresso participaram comunistas de varios pafses. Reformularam virios artigos dos estatutos ¢ confirmaram o nome de Liga dos Comunistas. Aprovaram que a Liga deveria atuar abertamente como partido e proclamar os seus princfpios tedricos. Embora surgissem vérias propostas de programa, prevaleceram as ideias de Marx ¢ Engels, que receberam a tarefa de elaborar um manifesto tendo. como subsidios todos os programas apresentados. “Assim se iniciou a formagio do partido revolucionirio do proletariado, baseado nos principios do comunismo cientifico elaborados por Marx e Engels.* Alguns dias ap6s 0 congresso, Engels parti para encontrar Marx em Bruxelas, onde se dedicaram a elaboracio do Manis- {esto do Partido Comunisia. Antes de conclui-lo, Engels retornou a Paris para tratar das divergéncias da Liga, permanecendo pouco tempo. Em fins de janeiro, recebeu ordem para deixar a Franga em 24 horas, Voltou para Bruxelas para ver como estava a elabora¢io do Manifesio. Nada pOde fazer: Marx jé 0 5 Opa, p12, TEORIA DA ORGANIZACAO POLITICA da organizacio da industria manufatureira. Além disso, clas- sificou a burguesia como classe dominante, que contribuiu para o surgimento do proletariado, que, por sua vez, realizar a revolugio; 4, descreve a indiistria moderna, que aumenta muito a producio industrial, mas que a quantidade de producéo entra em contradigio com as possibilidades de mercado; isso levaria cada vez mais a intensas crises comerciais, tendo como conse~ quéncia o fechamento das faricas, a faléncia dos patrées € 0 desemprego em massa dos trabalhadores; 5, aponta que a livre concorréncia ¢ 0 direito & propriedade privada dos meios de produgio tornam-se © maior problema paraa grande indiistria c isso somente seré resolvido com uma nova forma de organizar a sociedade na qual os industriais individuais sero substituidos por outros coletivos, cada qual recebendo seu resultado segundo as suas necessidades; e que isso cra imposstvel nas sociedades anteriores, porque nao havia condig6es para suprimir a propriedade privada; 6. aprofiunda o curso da revolugao e as caracteristicas daso- ciedade comunista; as vias de sua criagio, as etapas da revolucéo € quais as medidas mais importantes que o Estado proletério deveria adotar para destruir a velha ordem social; 7, destaca com precisio os tragos da futura sociedade sem classes, em que a concorréncia ser substituida pela associacio, tendo como fundamento a propriedade social dos meios de pro~ dugdo, mas alerta, para isso, que a revolugdo proletdria deveria vencer em varios paises do mundo, nos mais desenvolvidos economicamente, ao mesmo tempo; 8, aprofunda ainda as consequéncias da aboli¢ao da proprie- dade privada ¢ defende a importincia da educagio como forma de a juventude assimilar as mudangas; 2% Lt er eee ee ADEMAR BOGO (ORG. 9, procura antecipar que influéncia teria 0 comunismo sobre a familia, mas deixa sem resposta a questio das nacionalidades € das religides; 10. encerra © documento aprofundando a diferenca que havia entre os comunistas ¢ os socialistas e qual deveria ser a atitude dos comunistas em relacio aos outros partidos, deixando claro que isso variaria de pais para pais. Dias antes de o congresso ser realizado em Londres, entre 29 de novembro e 8 de dezembro de 1847, Engels encontra-se com Marx, em Ostente, Bélgica, para entrarem em acordo sobre 0 programa. Do congresso participaram comunistas de varios pafses. Reformularam vérios artigos dos estatutos ¢ confirmaram o nome de Liga dos Comunistas. Aprovaram que a Liga deveria atuar abertamente como partido e proclamar os seus princfpios teéricos. Embora surgissem varias propostas de programa, prevaleceram as ideias de Marx e Engels, que receberam a tarefa de elaborar um manifesto tendo como subsidios todos os programas apresentados. “Assim se iniciou a formacio do partido revoluciondrio do proletariado, baseado 1nos principios do comunismo cientifico elaborados por Marx ¢ Engels." Alguns dias apés 0 congresso, Engels partiu para encontrar Marx em Bruxelas, onde se dedicaram 3 claboragio do Manis- _festo do Partido Comunista. Antes de concluf-lo, Engels retornou a Paris para tratar das divergéncias da Liga, permanecendo pouco tempo. Em fins de janeiro, recebeu ordem para deixar a Franca em 24 horas, Voltou para Bruxelas para ver como estava a elaboragio do Manifesto. Nada pide fazer: Marx jé 0 © Op dt, p12. » TRORIA DA ORGANIZAGAO POLITICA havia terminado e enviado para Londres, onde, em fevereiro de 1848, foi publicado numa pequena tipografia de um membro da Liga dos Comunistas Engels escreven varias obras em companhia de Marx ~ A sagrada familia, A ideologia alema entre elas ~ ¢ concluiu O capital, aprincipal obra de Marx, que ficou inacabada apés a sua morte. Em maio de 1895, Engels, jé com a satide fragilizada ~ um nédulo no pescoco o fez perder completamente a voz — comu- nicava-se através de uma tabuleta e uma barra de giz. Faleceu em 5 de agosto de 1895, em sua casa, em Londres. Conforme seu desejo, o corpo foi cremado e, no dia 27 de agosto, as cinzas foram jogadas no mar por Eleanor, a filha mais nova de Marx, e alguns amigos. PRINC{PIOS DO COMUNISMO* Friedrich Engels 1. O que é 0 comunismo? © comunismo é a douttina das condigdes de libertagao do proletariado. fi 2. O que € 0 proletariado? O proletariado € a classe social que obtém os seus meios de subsisténcia exclusivamente da venda do seu trabalho,’ sem se beneficiar de qualquer lucro extraido de qualquer capital. Ba classe, cuja felicidade e dor, vida e morte, e cuja completa exis- [Reprodusidode ENGELS, F. "Principe communisme”. fn: Marx, Ke ENGELS, FF. Ocuwreschoisis ents walumes. Moscou, Ed. ds Progrés, 1970, v. 1 pp: 82-99 (Tradusido por José Paulo Netto e Maria Filomena Viegas) (Os Prins do omnnismo,redgidos em novembro de 1847, 25 fram publicados em 1914, no Venvs, dro da sociel-democraia lem Originalmentc, texto cra mn rojeto de programa para a Liga dos Comunistas; depois, é de super que o material setenha consticudo numa das bases para a eda do Manji do Partido Comunisa, Nessa altura do seu desenvolvimento zeérico-ideol6gico, Engels (¢, como ele, ‘Mara)ndo distinguia entre venda de trabalho e venda da forga de trabalho, sendo cesta Gkima a expressio conceiual eorreta pars o fermen aqui referido. TRORIA DA ORGANIZAGAO POLITICA téncia dependem da procura de trabalho, ou seja, dos periodos de crise e de prosperidade dos negécios, das flutuagées de uma concorréncia desenfreada. Em poucas palavras, 0 proletariado, ou, a classe proletaria, é a classe trabalhadora do século 19. 3. Isso quer dizer que nem sempre os proletérios existiram? Exatamente, Sempre houve classes pobres ¢ trabalhadoras, © as classes trabalhadoras foram principalmente pobres. No entanto, trabalhadores e pobres, vivendo nas condigdes acima assinaladas, nem sempre existiram. Isso significa que os prole- térios nao existiram sempre, assim como nem sempre existity ‘uma concorréncia livre e desenfreada. 4, Como surgiu o proletariado? O proletariado nasceu com a Revolugio Industrial, pro- duzida na Inglaterra, na segunda metade do século 18 que ogo se estendeu a todos os paises civilizados do mundo. Essa revolugio foi desencadeada pela invengio da maquina a ‘vapor, das varias maquinas de fiacio, do tear mecinico ¢ de uma série de outros inventos. Tais maquinas ~ devido ao seu alto custo s6 estavam ao alcance dos grandes capitalistas — transformaram completamente o antigo modo de producio € alteraram totalmente a situacio dos antigos trabalhadores, uma vez que produziam melhor ¢ a menor custo do que esses podiam fazer com as suas rocas ¢ teares manuais. As maquinas colocaram a inciistria inteiramente nas mios dos grandes capitalistas ¢ reduziram a nada o valor da pequena propriedade dos trabalhadores (instrumentos, teares etc.), do que resultaram a apropriagio de tudo pelos capitalistas ¢ a pentiria dos trabalhadores. Foi assim que o sistema fabril se introduziu na produgio de tecidos. ADEMAR BOGO (ORG.) Com o progresso do sistema fabril ¢ da maquinaria, logo ambos se generalizaram a outros ramos da produgao, espe- cialmente is confecgées ¢ 3 imprensa, & cerimica ¢ & metalurgia © trabalho comegou a ser dividido cada vez mais entre 0s ope- rrios, de tal forma que o trabalhador, que antes fazia uma pega completa, agora fazia apenas uma parte dessa peca. Essa divisio do trabalho permitiu que se produzisse mais rapidamente e, por consequéncia, de modo mais barato, reduzindo a atividade de cada trabalhador a um procedimento mecinico, muito simples, constantemente repetido, passivel de ser realizado de forma melhor pelas maquinas. Desse modo, ¢ como j acontecera com a fiagéo a tecelagem, todos esses ramos da producio cafram, tm apés ‘outro, sob o dominio do vapor, das méquinas ¢ do sistema fabril; consequentemente, cafram também nas mios dos grandes capita- listas,ficando os trabalhadores privados de qualquer independéncia que ainda hes restasse. Pouco a pouco, o sistema fabrilestende o seu dominio nao sé a toda a manufatura em sentido estrto, mas também 3s atividades artesanais, jé que, também nessa esfera, os grandes capitalistas eliminaram os pequenos patrées de artfices, criando grandes oficinas, que possibilitavam diminuir os gastos ¢ implementar uma elaborada divisio de trabalho. Eis como, atualmente, nos pafses civilizados, quase todos 0s tipos de trabalho se realizam em fabricas e em quase todos os tipos de produgio a grande indtistria su- planta o artesanato ¢ a manufatura, Esse proceso arruinou a antiga classe média, especialmente os pequenos artesios, ¢ transformou inteiramente a condigo dos trabalhadores; com ele, surgem duas novas classes que, gradualmente, vio absorvendo todas as outras: a) a classe dos grandes capitalistas, que, em todos os paises ivilizados, jd estao de posse exclusiva de todos os meios de sub- AGAO POLITICA sisténcia, das matérias-primas e dos instrumentos (maquinas, fabricas ctc.), necessérios & producio dos meios de existéncia. Essa € a classe dos burgueses, isto é, a burguesia; b) a classe dos despossuidos, dos que, em virtude do desapossamento, sio obrigados a vender seu trabalho aos burgueses para receber, em troca, os meios necessérios 3 sua subsisténcia. Essa € chamada classe dos proletérios, isto &, 0 proletariado. 5, Em que condigBes se realiza 2 venda de trabalho dos proletarios aos burgueses? O trabalho é uma mercadoria como qualquer outra ¢, por conseguinte, 0 seu preco é determinado pelas mesmas leis que se aplicam as mercadorias. Sob o regime da grande indiistria ou da livre concorréncia — como veremos, os dois slo a mesma coisa—,o prego de uma mercadoria é, em média, sempre igual aos custos de sua produgio; portanto, o prego do trabalho é igual ao custo de produgio do trabalho. Ora, © custo de producio do trabalho consiste precisamente na quantidade de meios de subsisténcia indispensaveis para que 0 trabalhador mantenha a sua capacidade de trabalho e para que se impeca aextingio da classe operaia, Por isso, 0 operdrio nto receber mais do que 0 necessério para sobreviver; 0 prego do trabalho, ou o salério, ser, enfim, 0 mais baixo, constituindo o minimo indispensivel para se manter a vida. Contudo, uma vez que, nos negécios, existem periodos melhores ¢ piores, © operdrio receberd algumas vezes mais, outras vezes menos, da mesma forma que os capitalistas ganham mais, ou menos, pelos seus produtos. E como os capitalistas, na média dos bons e dos maus perfodos, nio conseguem pelas mercadorias ‘ais do que o seu custo de producio, também 0 operirio no | ADEMAR BOGO (ORG.) receberd, na média, mais do que o seu minimo vital. Essa lei econémica dos salérios se verificard tanto mais estritamente quanto maior for o ntimero de ramos da produgio de que a grande indtistria se tenha apoderado. 6. Que classes trabalhadoras existiam antes da Revolugéo Industrial? As classes trabalhadoras tém sempre vivido, de acordo com os diferentes estgios de desenvolvimento da sociedade, em diversas condigSes ¢ com distintas relagbes com as classes possuidoras e dominantes. Na Antiguidade, os trabalhadores cram escravos de seus amos, como ainda ocorre em muitos pafses atrasados, e mesmo no Sul dos Estados Unidos. Na Idade Média, cram servos dos nobres proprietérios de terras, como ainda ocorre na Hungria, na Polénia e na Réssia. Na Idade Média ~ e, na verdade, precisamente até a Revolugio Industrial ~ havia também, nas cidades, artesdos que traba- thavam a servico da pequena burguesia. Gradualmente, & medida que se desenvolviam as manufaturas, esses artesios transformaram-se em trabalhadores empregados por grandes capitalistas. 7. Que diferenca existe entre o proletério e 0 escravo? Oescravo € vendido de uma vez, para sempre; 0 proletério € forcado a se vender diariamente, de hora em hora. Todo escravo, individualmente, propriedade de um s6 dono, tem assegurada a sua existéncia, por mais miserdvel que esta seja, pelo proprio interesse do amo. O proletério, por seu turno, € propriedade da classe burguesa; assim, no tem assegu- rada a sua existéncia — seu trabalho s6 € comprado quando alguém tem necessidade dele. A existéncia s6 é assegurada

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