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magao da Africa num vasto campo de cagada lucrativa slo os aconte- cimentos que marcam os albores da era da produgao capitalist. Esses processos idilicos so fatores fundamentais da acumulacao primitiva, (Marx, 1975, p.868) O PROCESSO DE INDEPENDENCIA NA AMERICA LATINA Hoy una nueva Nacién En el mundo se presenta AJ RSSERMAN Cloiclin ; Frocioman a ndependeneia Sh “aaa ‘ - 5 oe jurando la Independencia See da Gente oe ere aaa ie tr Sentech a NASD o— OLrace. | of LOS DE ABAJO: 0S MOVIMENTOS UFERS 1996 PRECURSORES DA INDEPENDENCIA Numa sociedade em que a base econ6mica era o trabalho com- pulsério dos indios submetidos pela conquista ou dos cativos vindos da ae nas minas e plant las pelos empresarios criollos, as estiveram presentes durante todo brevivéncia das comunidades aldeds, jé ha muito consolidadas naAmé- rica dos tempos da conquista; para 0s escravos afticanos havia uma so- ciedade perdida, pela situacao do cativeiro, a ser restaurada de acordo ‘com 0 que o seu imagindrio construia como sendo a distante Africa. Em 89 ambos os casos havia um antagonismo duplo: com as autoridades me- tropolitanas, responsaveis pela ordem colonial, e com os criollos, os opressores diretos, que dirigiam as atividades produtivas, As atitudes de rebeliao das clases peligrosas variavam muito em suas manifestagSes: desde a ineficiéncia no cumprimento das taretas (0 que, sem diivida, motivou o aparecimento de teorias sobre as aptiddes raciais para a “civilizagio”), 0s suicidios e infanticidios as fugas para regides desabitadas (cimarronerias € quilombos) até as insurreigies rar a ordem dos pairoes. Nao havia, por certo, uma homogeneidade entre 0s revoltosos: entre os indios, cura~ ) cas ou caciques podiam ter certos privilégios na hierarquizada socie- dade colonial; entre os escravos negros, os mulatos, oriundos da opres- ‘so dos criollos sobre as mulheres cativas, também alingiam posigoes intermediarias.As revoltas de los de abajo foram sempre marcadas por tais diferencas. Como exemplares destes movimentos destacaram-se a rebelido de Tipac Amaru, a mais marcante das insurreigdes indigenas nos Andes, €2 revélugao haitiana, onde os escravos africanos fizeram tremer 65 pilares da sociedade colonial americana. ‘Terremoto nos Andes Centrais: Tapac Amaru Inca As revoltas indigenas aumentaram em intensidade e freqiiéneia (Goren te 0 século XVIII no Alto Peru, em boa parte devido as refor- ‘mas burbSnicas. O repartimiento era ali uma versao da antiga mita dos tempos incaicos, visando fundamentalmente as minas de Potosi, pot muito tempo as maiores produtoras de prata do mundo, além da tene- }\- brosa Huancavélica, de onde se extrata o merctrio para o processo de amélgama que tornava eficiente a mineragao argentifera. A mao-de- obra para estas atividades era fornecida pelas comunidades campo- esas como tributo aos conquistadores, e sua disponibilidade depen- dia dos chefes de aldeias, os curacas. Existiam ainda unidades pro- dutivas bem mais recentes, 98 obrajes, dedicados as manufaturas, es- pecialmente de tecidos. Estes obrajesutilizavam indigenas, formal- mente assalariados, foragidos das mitas ou das comunidades, que com- 90 punham um grupo de trabalhadores que chegou a signi homens adultos do Alto Peru, os chamados forasieros. ~ A busca de maior eficiéncia burocritica significou um aumen- to-na-carga tributaria, aparecendo no primeiro plano os corregidores: devido aos baixas salérios que recebiam da Coroa, procuravam com- ar 40% dos a pensagdes através do sistema de repartos, que era um virtual mono- Polio de todas as transaces comerciais e da forca de trabalho indige- ‘na no ambito dos respectivos corregimientos. Na medida em que “co- brador de impostos, alcaide ¢ empresatio privado eram fungdes que ‘GSiavam concentradas na pessoa do corregedor” (Mires, 24), estes fun- ciondrios tornaram-se a porgao mais visivel da exploracio colonial. Havia muitas vezes a colaboragao de curacas em troca de uma parti- cipagao menor no botim, chegando alguns deles a posicdes destaca- das nasociedade colonial. Nao era homogénea, no entanto, aconduta desta “nobreza” indigena: houve curacas que entraram em conflito\ ‘com as autoridades e com os produtores criollos, colocando-se a tes- ta das rebeliGes indigenas ¢ buscando referéncias miticas no passado incaico para legitimar suas liderangas’ entre eles José Gabriel Con- doreanqui Noguera, mais tarde Tpac Amaru, ~~Aléntde pertencer & “nobreza” indigena, José Gabriel recebera uma educacao invulgar para a época, chegando a freqiientar a Uni- versidade de Sao Marcos, Mais tarde viveu longo tempo em Lima ten- tando o reconhecimento oficial para a sua descendéncia do Inca Tii- “pac Amaru, quando entdo amadureceu suras convicgées a respeito dos funcionérios da metrépole, simultaneamente ao contato com as idéi- as liberais que permeavam a Ilustragao espanhola. Obtendo o titulo, herdou 350 mulas€ tornou-se arriero num territ6rio que abarcava varias comarcas, estab endo um amplo circulo de amizades e pres- tigio como comerciante. Estava na situagio invulgar de representar a0 mesmo tempo os trabalhadores oprimidos e os produtores coloniais: | coma titulagao, hat ler legitimo dos indios comu- eros; como empresatio, percebia as dificuldades que as autoridades | impunham aos criollos curacas pelo aumento da carga tributaria. ——~ A rebeliio foi desencadeadaem 1780 com a prisio, seguida do 91 enforcamento, do corregedor Arriaga, que teve seus bens saqueados ¢ libertados seus escravos. O movimento se espalhou pelas quatorze provincias de Cuzco, com o exército rebelde sendo ampliado com escravos e presos libertos dos carceres, chegando a mais de dez mil efetivos. Até este momento, Tupac Amaru contou nao s6 com 0 apoio como também a instigacéo de criollos intluentes, inclusive membros do alto clero: a perseguigao dos corregidores marcava a éntase da in- surreigdo na reacdo contra as autoridades peninsulares, 0s “odiados Ghapetones Ou pucacuncas € seus proiegidos” (Valcarcel, p.47). Pre- eocemente, pore, houve uma tadiealizacio do movimento, com a destruiggo de todos os obrajes encontrados no caminho das forgas rebeldes: se isto significou maior adesio dos indios, especialmente dos temidos forasteros, escravos e até brancos empobrecidos, por outro lado foi um alerta para os criollos sobre o perigo que representava a sublevacao de los de abajo para seus interesses. O cunho social da revolta de Tupac Amaru seria defi selado pelo Bando de Libertad de los Esclavos, pelo qual era decretada a aboligao de todas as formas compulsorias de trabalho, com o fim de todos 05 tributos e repartimiencos que vigoravam no Peru. Isto assegu- rava um cardter revolucionério que implicava a destruicio completa da al.com uma clara “finalidade aufonomista e emancipadora ‘Sivirichi Tapia, p.66-67). Para os criollos, a situagao ti- nha ido muito além da abolicdo inicial dos corregimientos, e os tepre- sentantes das clases decentes fizeram causa comum com as autorida- des espanholas e com 0 alto clero, tratando de apoiar uma violenta re- |. pressio a0s insurfetos. Contavam ainda com 0 apoio de diversos cura- as, temerosos da perda do escasso prestigio que haviam alcangado no mundo colonial. Finalmente derrotados, Tapac Amaru, seus familiares ¢ principais seguidores foram exemplarmente executados em Cuzco, estimando John Lynch que tenham sido mortos mais de cem mil pesso- as nesta guerra, a grande maioria indios (Lynch, 31). = ~~ As marcas da rebelido de Tipac Amaru foram profundas: nao por acaso foi o Peru o iltimo reduto dos espanhdis no subcontinente, tampouco o fora tendéncia exiremamiente conservadora que assumi- 92 ram 0s grupos dominantes locais apés a Independéncia, perdurando OF Muito tempo as formas compuls6rias de trabalho e o temor & or- ‘ganizagao do fidios comuneros. Mais do que um cardter precursor da Independéncia, a guerra deTaipac Amaru foi uma adverténcia con- creta aos anseios autonomistas dos criollos: a mobilizaco das clases peligrosas poderia trazer mais danos que a exploragao exercida pela ‘metropole espanhola, que ao menos garantia a continuidade das ati- vidades produtivas, das propriedades e vidas dos que faziam parte dos grupos dominantes. E este alerta nao permaneceu localizado, mas foi um sentimento que se propagou do Equador ao norte argentino. Furacio nas Antilhas: A revolucio haitiana A posigao destacada da colénia francesa de Saint-Domingue se dera ao longo do século XVIII: ocupando a parte ocidental da ilha de La Espafola, os franceses deram-Ihe uma orientagio diferente daquela mantida pelos espanhdis, que nas suas possessées criavam gado para abastecimento de outras coldnias. Saint-Domingue foi destinada & produgao dos valiosos artigos tropicais, como caté, algodao, indigo e > especialmente 0 agiicar. Em pouco tempo a produgao acucareira su- perava a dasAntilhas britanicas, numa competicao que seria ainda mais favorecida com a Independéncia das coldnias norte-americanas. Para manter este ctescimento econémico, houve uma grande importagao de escravos africanos, numa média de trinta mil por ano, atingindo um total de meio milhao de cativos destinados as plantations agucareiras (Halperin 1985, p.338). 0 comércio de escravos era dominado por comerciantes dos principais portos franceses, que assim colocavam- yse como controladores das grandes plantadores de Saint-Domingue, os grands blancs. Além destes senhores de escravos, a populagao bran- ca era formada ainda por mais quarenta mil individuos,pequenos co- merciantes ¢ artesios, os petits blancs. Entre os brancos livfes e a grande massa de escravos, situava-se um setor formado por unstzinta mil mulatos libertos, os affranchis, que denodadamente buscavam ascender na rigida hierarquia colonial, atin- 93 lades coloniais; petits blancs em relacao a grands blancs e affranchis; affranchisem relagao a todos os brancos que ocupavam as posigbes de.destaque na Sociedade; e todos estes grupos em relagio aos crise metropolitana que desembacaria na Revolucao Francesa traria desenconiros importantes nas agGes destes grupos. ~As primeiras tentativas de ruptura partiram dos affranchis: en- _guanto os grands blancs mandavam representantes para aAssembléia dos Estados Gerais, buscando apoio dos mais moderados, os mulatos procuravam nos mais liberais 0 reconhecimento oficial para sua igual- dade com os brancos, 0_que néo foi alcangado por temor de que se desorganizasse a produgao na mais rica colonia francesa. Buscando apoio na rival Inglaterra, os affranchis tentaram uma insurreicao ar- mada em 1790, que fracassou € teve seus lideres Ogé e Chavannes executados. A seguir, a situagdo tornou-se cada vez mais tensa, com os grands blancs buscando autonomia, os affranchiso reconhecimento como homens livres e iguais (mantendo a escravidao dos negros) e | ambos os grupos tentando uma dificil alianga com os desconfiados petits blancs, que se sentiam prejudicados por ambos os lados. No entanto, como afirma Moya Pons, “o que ninguém pensava ou di era que 0s escravos negros tinam d Pons, p.126): quando em agosto de 1791 iniciou a rebeliao dos escra- Y vos no norte da colénia, grands blancs e affranchis solicitaram a in- tervengao metropolitan, que tentou uma mediagio entre estes gru- pos rivais que nao apresentou resultados po: levou os grands blancs a sol tanicos contra os ne- 94 aros'e mulatos rebelados. Os franceses, ainda em 1792, enviaram seis miefetivos sob comando do girondino Santhonax, para conterem as tropa de escravos apoiadas por Santo Domingo e eventuais interven- goes armadas da Inglaterra. Como tinica atitude possivel, Santhonax aboliu a escravidao em abril de 1793 e apelou para os escravos rebe- : res, se incorporassem ao fo francés. Isto Ihe gatantiu a adesao de quatro mil combaten- tes escravos, comandados pelo principal chefe rebelde, Toussai Louverture, yor 1 antigo escravo doméstico que tinha recebido uma in- vulgar educacao para a época. Com Toussaint demonstrando grande capacidade mi f, afir- mou-se a primazia francesa na colénia; obfigando o recuo das fron- teiras espanholas na ilha, enfrentando.a oposicao interna dos affran- chis ¢.causando aos ingleses uma perda de mais de vinte mil soldados até 1798, com o que se québravam também as iniciativas belicosas dos grands blancs. Sendo indicado para os cargos de governador-geral ‘comandante das armas em Saint-Domingue, Toussaint tratou de reor- denar_as atividades produtivas da colénia, obrigando o retorno dos anigos escravos as plantations na qualidade de assalariados: a meta- de da produgio ficaria para o Estado, uma quarta parte para os pro- rietarios das terras e a outra entre os trabalhadores. Procurava ao mesmo tempo restaurar a condigao empresa transformar os antigos escravos em cultivateurs, com 0 que pensava acalmar os distirbios sociais de Saint-Domingue. Houve, no entan resisténcia dos cultivateurs em permanecerem confinados as planta. tions, preferindo a sobrevivéncia como camponeses parcelares.A falta de recuperagao econémica (OU a Oposigao de brancos e mu- latos a Toussaint, encontrando eco na Franca napoleénica: no comando de sessenta mil soldados, o general Leclerc, cunhado de Napoleio, iniciou as operacdes na ilha em 1802, tomando a porcao espanhola e aprisionando Toussaint-Louverture apés muita resisténcia Os franceses fracassaram nas tentativas de restabelecer a escravi- dao e a dominagio colonial sobre Saint-Domingue. Toussaint-Louvertu- re morreu numa prisio francesa em 1803, mas seu lugar-tenente Jean- jos grands blancs € 95 y Jacques Dessalines, também um antigo escravo, assumiu. 0 comando do exércilo e prosseguiram as revoltas dos cultivateurs, numa prolongada guerra que custou & Franca a perda de mais de cingiienta mil soldados, incluindo o préprio comandante Leclerc. Seu sucessor, Rochambeau, capitulou frente a Dessalines, que em primeiro de janeiro de 1804 pro- clamou a Independéncia de Saint-Domingue adotando o nome de Haiti como os indigenas chamavam a itha antes da conquista. Praticamente exterminados ou exilados os grands blancs, Dessalines confiscou as pro- priedades € 0s direitos dos brancos no Haiti, ficando 0 Estado com se de dois tercos da terra, 0 que traria problemas com os interesses dos affranchis, sempre almejando a propriedade como fator de ascensao, Em fins d&-1806 foi assassinado Dessalines, voltando novamente © Haiti a softer puerras civis. As disputas entre negros e mulatos causa~ ram em 1807 a divisio do pais, com o norte da antiga coldnia comanda- do por outro seguidor de Toussaint, Cristophe, que tentou impor os mé- todos daquele para recuperar a economia de exportacao do Haiti e termi- nou por implantar uma caricata corte imperial. No sul, os mulatos orga- nizaram uma republica sob o governo de Pétion, que teria sua influéncia ‘no cidadao caraquenho Simon Bolivar quando ld se exilou anos mé de. Nao.conseguindo um retorno as lucrativas acucareira, o Haiti mergulharia numa prolongada luta entre negros.e mulatos, além das disputas com os espanhdis. Para o restante do conti neente sestava um preocupante aviso: na primeira col6nia independente a América Latina as conseqiiéncias haviam sido a acentuada decadén- cia econdmica, supressao dos brancos proprietérios de terras e um Esta~ do organizado por escravos insurretos ou mulatos libertos. Além di era uma mostra das més influéncias que podia ter a Revolucao Francesa. AS INFLUENCIAS EXTERNAS: A AMERICA LATINA EO PENSAMENTO LIBERAL, £ bastante comum atribuir-se 0 movimento de independéncia na América Latina as influéncias das correntes de pensamento que, a 96 ficando 0 Estado com a pos- { partir da {lustragao do século XVIII, ajudaram a solapar o Antigo Re- gime. Se os movimentos de Independéncia fazem parte do rol das re- volugdes burguesas, os casos que os precederam, a revolugao ameri- cana ¢ a francesa, teriam logicamente grande importancia pelos seus exemplos, para nao falar da heranca que tinham da Ilustragio, com toda a ideologia que desenvolveu contra as estruturas feudais, o Esta- do absolutista, 0 poder da Igreja € o direito divino. Mais uma vez é necessii zartais impressGes, a comecar pelo pensamento ilu- minista, cujo idedrio penetrou de maneira distorcida na Espanha, ¢ ‘mais ainda naAmérica Latina. participacao da Espanha nas corren- tes-racionalistas do século XVIII foi tardia e ambigua e a partici; io da América espanhola nestas.correntes foi ainda mais tardia e ambigua, pois a América era provincial. (Chaunu, p.28). Se havia um conhecimento das idéias da llustragao, sendo pou- co significativas as proibigdes na divulgacao dos textos, também é inegavel que a versio espanhola do Lluminismo estava “purgada de contetido ideolégico ¢ ficou reduzida a um programa de moderniza- a0 dentro da ordem estabelecida” (Lynch, p.34).Além disto, a pene- trago das idéias ilustradas era assimétrica: apenas um grupo muito 2d llos teve acesso aos autores da Ilustragao, com dife- rengas regionais importantes (mais disseminadas na Venezuela, no Rio da Prata ¢ no Chile, praticamente inexistentes nos Andes centrais e a Situaga0 intermedidria na Nova Espanha). Assim, houve tada circulagao de autores como Montesquieu, Ve seau, Locke, Adam Smith, ¢ suas influéncias tive! do em relagio a uma primazia do racionalismo do que a transforma- ges Sociais. A versio espanhola da Ilustragao dava prioridade & raci- onalizagao do aparelho de Estado e as cién is aplicadas, nao colo- cando em jogo o absolutismo ¢ a Igreja catélica. Aqueles mais influ- > enciados pelas erais no por acaso se destacariam como li- derangas expressivas nos movimentos de Independéncia, como os casos de Moreno, Belgrano, Miranda, Bolivar e Narifio. A mais concreta influéncia da ria o impacto das ref stragdo na América Latina se- ibutarias daquela racional dade dirigida para o aumento da produgao e maior eficiéncia do Esta- ‘d0-A ampliagao do comércio trouxe a diversificacao das atividades econdmicas coloniais, promovendo a ascensao de novos produtores, ‘ercantis, ao mesmo tempo em que conscientizava fragSes significa- tivas do setorcriollo das vantagens do livre-comércio com a Inglater- ra eda incapacidade da Espanha em cumprir seus objetivos. A: das administrativas, além de promoverem novos centros em de! de outros mais antigos, atingiram todos os setores da populacdo das colénias pelo aumento da fiscalizacao e da arrecadacao de tributos, acirrando 9 antagonismo dos colonos em telacao aos peninsulares. ) Desta forma, é possivel pensar a influéncia da Ilustracao mais pelas conseqlénclas das reformas que inspirou que pelo idesrio eventual- mente propagado: 0 pensamento iluminista apareceu mais tarde na cena politica, ja em plena efervescéncia do movimento de 1810, quan- doa Revoluco Francesa ja estava afirmada e vivia o seu corolario na expansao napolednica. Diferente foi o impacto das revolugdes americana e francesa, que “conduziram a llustragao a vida politica” (Lynch, p.36). E importante notar que-e-modelo americano contou sempre com mais adeptos que 0 francés, por nao ter se caracterizado por solucées radicalizadas nem ter vivido momentos de grande. mobilizagao popular, do que resultaram um predominio de liderangas de origem aristocratica e uma aceitacao das Telagdes escravistas (ROK, p.191). Além disto, a revolugdo america- nna ocorrera numa situagio em que a metrépole inglesa tentara apertar os tagos colonials, depois de um periodo de relativo afrouxamento da dominagao, do que fesultara a expansio de algumas atividades na co- énia, o que parecia uma situagao semethante aquela que viviam os eri- collas no tiltimo quartel do século XVIII. O modelo norte-americano Parecia exeqiiivel, ao mesmo tempo em que nao apresentava aos crio- Uos os riscos de uma mobilizacao das clases peligrasas, Os direitos preconizados pela Declaragao de Independéncia & vida, & liberdade e a propriedade, de autoria de Jefferson, seriam con- substanciados pelo novo Estado com a codificagao destes direitos “na- turais” e pela aplicagdo da teoria do contrato social. J4 na Constitui- — 4 98 —— ao norte-americana de 1787 ganhariam corpo as idéias federalistas, especialmente as de Madison, que garantiam a presenca dos diversos grupos de interesse no cenério politico, controlados pelas estruturas que definiam a participacao dos representantes a divisdo dos pode- res, Em razdo das virtudes do modelo que se afirmava, muito preco- cemente as i Washington, Jefferson ¢ Paine, entie outros, circularam pelas coléni- as espanholas, les que dirigiriam as lutas de Independéncia para observarem in loco ‘0 funcionamento das instituigées liberais. ‘Tao importantes quanto esta difusio de idéias e planos foram 10s econdmicos que a nova nacido norte-americana estabele- ceu com os setores criollos da América espanhola. Além de introdu- zirem_publicagées que traziam os principios norteadores da Revolu~ cao Americana, os Estados Unidos, especialmente a partir de 1793, quando a Franga e a Inglaterra defrontavam-se no campo de batalha em_que se transformara a Europa ap6s a Revolugao Francesa, passa~ ram A condicao de importantes fornecedores de alimentos, algodao & outras matérias-primas. Era visivel o grande desenvolvimento agri- cola e comercial dos Estados Unidos, que entre 1799 ¢ 1810 mul caram em mais de sete vezes a tonelagem dos seus navios, com pro- dugao exclusivamente nacional. Ao participar deste esquema comer- cial que os norte-americanos empenhavam-se em fomentar, ficavam mais evidentes para os criollos as vantagens do livre-comércio e da supressao das barreiras monopolistas, sem a necessidade de mudan- ‘cas em profundidade que alterassem a organizacao produtiva basea- da na exploragao do trabalho compulsério. J4a Revolucio Francesa serviria mais como um exemplo aser evitado. Mesmo que a Declaragao dos Direitos do Homem e do Cida- dao ‘anunciasse que “todos os homens sao iguais por natureza e por lei”; 0 que nao diferia muito da Declaragdo americana que afirmava que “todos os homens nascem iguais”, havia na pratica uma diferen- {64 acentuada. Nos Estados Unidos tinham sido preservados os gru- po8dominantes, e nas ricas colénias do sul fora mantida a escravid>~ africana como fator essencial para manutengao das plantations. Na Franga, por outro lado, assistia-se uma cruenta guerra civil, na qual a gio dos setores mais radicalizados da plebe chegou a com. prometer a estabilidade da propria burguesia que liderava 0 processo, Sao exemplares as palavras de Francisco Miranda comparando os dois casos: “Dois grandes exemplos temos diante dos olhos: a Revolugio Americana € a Francesa. Imitemos discretamente a primeira; evitemos com sumo Cuidado os fatais efeitos da segunda.” (Lynch, 37), Nao por acaso, portanto, seriam evitados os chamamentos as massas de trabalhadores indigenas ou de escravos afficanos nos mo- vimentos de Independéncia; também foram obvias as tentativas para * desqualiticar os lideres mais radicais como “jacobinos®, numa refe- Féncia ao que deveria ser evitado como conseqiiéncia negativa da Re- volugao Francesa. Também as autoridades espanholas estiveram aten. as, ao contrario do que ocorrera em relacao aos autores da [lustra- 0, proscrevendo a divulgagio da literatura revoluciondria nas colo. nias,no que reeeberam total apoio da Igreja devido ao profundo card ‘eranti-clerical que assumiria a revolugao na Franca.A crise de Saint- Domingue;-com-seus desdobramentos ameacadores, era vista Como uma comprovagio dos perigos inerentes & divulgacio das idéias igua- litarias-eTadicais que percorriam a Franca. E legitimo pensar, pois, que a Revolugio Francesa exerceu um efeito mais como exemplo ne- Bativo do que um estimulo para a quebra dos vinculos com 0 “sécio ineémodo” que representava a metrépole. Independentemente das influncias em relacéo aos criollos, a Revolugio Francesa teve dois efeitos concretos no futuro das colori ,,Samericanas. O primeiro foio distanciamento que a Espanha se obri- fou 2 tomar em relagao ao até entdo principal aliado, sucumbindo definitivamente-ao crescente poderio da Inglaterra, que solapava o seu monopolio colonial, Com sto, enfraqueceu-se a posicdo espanhola no mundo europeu, limitando-se ainda mais o-alcance das reformas que pretendia. Qsegundo foi justamente a ex; ‘panso napolednica, que iria Propagara revolugdo burguesa para todo o continente ‘europeu. A in- vasdo da Espanha pelas tropas francesas, com a destituigao do rei Fer- 100 nando VII, tornaria acéfala a metrdpole, cujas tentativas de reinstitu- cionalizar o poder teria repercussoes nas guerras de Independencia. A REVOLUCAO DA INDEPENDENCIA: 1810-1815 Em 1808 comegou o desmoronamento do império espanhol. Em margo houve a conspiragio palaciana que depds 0 rei Carlos IV em favor-dé seu filho Fernando VII. Em maio os exércitos de Napoleao ‘ocuparam a Espanha, afastando pai e filho da Coroa espanhola, que foi entregue ao irmao do petit caporal, José Bonaparte. Apesar da fa- cil vit6ria militar contra as tropas regulares e a cooptagao dos mais altos funcionarios, a resisténcia popular contra a dominagao francesa foi muito tenaz, expressando-se politicamente pela formagao de jun- tas locais ¢ regionais, que culminaram na constituigao de uma Juma Supzema, & qual se submetiam as demais, Funcionando primeiro em Aranjuez, mais tarde em Sevilha, seria finalmente o porto de Cadiz a sede destaJunta, virtual substituta do poder real que desaparecera, com © apoio militar da Inglaterra cuja marinha de guerra garantia a inte- gridade gaditana Orreconhecimento formal daJunta Si ae-significou qhilidade na relagao com_as-colénias--além da perda dos melhores funcionarios burocraticos, uma das énfases das reformas burbénicas, para aJunta substituir todo o sentido simbélico que cercava a autoridade real construida durante séculos. Tornaram-se evidentes nas diversas regides do mundo colonial as dificuldades para @ manutengao.da hierarquia: formaram-se juntas em terras america- nas, houve conflitos destas com_os cabildos, cismas entre estes, as audiencias e os vice-reis, 0 que denotava a auséncia de uma verda- deira autoridade na metrépole. Enquanto isto, era dubia a posicao da Inglaterra, que tinha sido © pior inimigo da Espanha e agora consti- tufa-se no seu principal aliado: por um lado, a quebra do monopdlio espanhol ¢bloqueio continental decretad por Napoleao colocavam ‘Kos ingleses como principais parceios comercais das col6nias espa- 101 5, conclamando todos & luta contra os gachupines, ditando desde o ini nholas; por cutzo;era.necessédrio garantir a sobrevivencia da Espanha, que para isto dependia de algumma continuidade do pacto colonial. E foi neste clima que se desatou a revolucao da Independéncia 4 Nova Espanhu: a revolucao social de Hidalgo e Morelos As noticias da ocupacao napolednica de 1808 tiveram como conseqiiéncia a deposigao do muito aproximado dos criollos da Cidade do México. As autoridades espanholas substituiram o man- datario ¢ aprisionaram oscriollos mais influentes, enquanto os Comer- cianleS mionopolistas constituiram uma forca m na forca militar para garantir a subordinagao da colénia. Em 1810, quando a Espanha perdeu o con- trole da Andaluzia para os franceses e restringiu-se a Cadiz, 0 setor criotto- mexicano estava demasiado debilitado e vigiado pelas Torgas peninsulares para tentar qualquer movimento, o que terminou sendo iniciativa das camadas populares. A rebelido explodiu em El Bajio, uma regido onde convivianr uma mineracio jé no ocaso, latifindios agricolas formados as custas de terras indigenas e diversas atividades artesanais. Ei Fingio disto, reuniam-se ali negros e mulatos, escra- vos ou libertos, indios trabalhadores nas haciendas, minas e obrajes, além de um grande numero de desocupados e marginais, formando um ambiente propicio para uma rebeliao (O Tevante foi comandado pelo padre Miguel Hidalgo y Costi- la, membro do baixo clero, cujo contato com oSautores-da Ilustra- fo prejudicara a carreira eclesidstica. Assumindo a chefia dos des- Possuidos, Hidalgo empunhou a consigna da Virgem de. Guadalupe, cio medidas de.cunho social, tais como aboligio dos tributos indige- nas, aboligio da escravidao e proibigao do traficd We WeErOS, Gue ti- nham um aleance bem maior que as propostas liberais de aulonomia © estabelecimento de juntas regionais (Mires, p.95). Na tomada de Guanajuato houve um total descontrole da massa seguidora de Hidal- 0, Com ataque aos bens e pessoas dos grupos dominantes, apesar dos esforgos em contririo de alguns criollos, como 0 oficial Ignacio Al- 102 \ fundou o prograt lende, que haviam acompanhado 0 movimento no seu inicio. Com 0 | afastamento dos poucos criollas que ainda 0 sepuiam, Hidalgo apro- ima agrarista, abolindo os latifindios em dezembro de 1810 e iniciando a distribuicao de terras entre seus acompanhantes.™ ~ Logo Hidalgo foi condenado pela Igreja, que o acusou de here- sia e outros crimes, terminando por excomungi-lo. Chegando a ter itenta mil seguidores (Vilar 1973, p.54), as hostes de Hidalgo eram desorganizadas ¢ terminaram sendo aniquiladas pelas tropas espanho- las, sendo o lider executado em principios de 1811.A luta teve seqiién- cias através de alguns de seus sequazes, como Guadalupe Victor Vicente Guerrero e Lépez Rayén. Q grande condutor, no entanto, foi um outro paroco.de.aldeia, José Maria Morelos y Pavon. Sem.ter a lustrago de Hidalgo, o padre Morelos era muito mais eficiente camo organizador politico - sabendo atrair outros setores insatisfeitos da sociedade mexicana - © militar, adotando uma estratégia capaz de manter 0 movimento até fins de 1815. Ao contrério das terras planas de B! Bajio, deslocou suas tropas para as acidentadas terras do sul, no estado que hoje leva seu nome, empregando tdticas guerrilheiras, com pequenos grupos fustigando o exército peninsular sem apresentar com- bates frontais, “o que se acomodava bastante bem as tradig6es de lu- tas dos Tidios” (Mires, p.98). Mofelos tentau combinar as pautas sociais que mobilizavam os indigenas com os interesses dos criollos, enfatizando 0 alastamento dos peninsulares das fungbes piblicas e o respeito a§ propriedades)\ Isto foi passivel nas tierras calientes do sul, onde predominavam la- tifindios canavieiros em grande parte propriedades de espanhdis © as expropriagdes nao causavam danos aos criollos. Procurava Morelos ee 2 7 criaf uma identidade “mexicana”, oposta 4 opresso metropolitana, em nome da qual proclamau-a-tIndependéncia da Nova Espanha em dezembro de 1813. Neste mesmo ano foram abolidos a escravidao e © Sistema de castas. Com a escassez de recursos, intensificou-se a de- Sapropriagao dos terratenientes, 0 que paulatinamente lhe trouxe a oposicao dos criollos. A exemplo do seu antécessor, Morelos termi- 1iOw preso € foi'executado em 1815)seguindo algumas das suas hos- Recutado 103 Wis tes em combates isolados, comandadas por Guerrero e Victoria. Os espanhéfs vitoriosos trataram de premiat os criollos que os haviam apoiado com cargos e distingdes, levando adiante procedimentos li- berais da Constituicao que havia sido recentemente promulgada em Cadiz. Peninsulares e criollos aliados afastaram do México Qs ideais. tevolucionérios, transformando-o num sélido pilar da Restauracio. @r Nova Granada e Venezuela: o despertar de Simén Bol Distirbios importantes na Venezuela jé tinham ocorrido em 1795, no porto de Coro, sob comand de José Caridad Gonzalez, um negro liberto refugiado de Curacao, e José Leonardo Chirino, um ad- vogado filho de escravo e india, estendendo-se por todo o vale do Curimagua ¢ atingindo 0 porto de La Guayra. As motivagées vinhiam dos acontecimentos de Saint-Domingue e da Louisiana, onde tambéin explodiam rebelides escravas. O levante de escravos e pardos livres Unificou interesses das autoridades, da Igrejae Gos proprictarios, ha- vendo uma punigao exemplar para os insurretos. No entanto, isto era uma mostra da instabilidade da regiao costeira da Venezuela, incluin- doa cosmopolita Caracas, que concentrava grande nimero de escra- vos nas plantations de cacau e de pardos que buscavam espacos na hierarquia social, além de ser a sede da oligarquia exportadora, que se opunha aos peninsulares ¢ também aos pecuaristas dos llanos, sub- sidiérios da economia costeira. — A difusio de idéias e movimentos perigosos a ordem jé havia cri- ado um lider, Francisco de Miranda, 6! Precursor, que nos varios os havia passado pela Franga revoluciondria pelos Estados Unidos e que ‘Os iltimos tempos andara pela Inglaterra, de onde tentou uma aventu- ‘a militar contra o dominio colonial da Venezuela em 1806. Em 1810 08 earaquenhos reagiram prontamente s noticias vindas da Espanha, formando a primeira Junta americana: em abril o cabildo de Caracas substituitt as autoridades peninsulares.por criollos, alguns dos quais, mais Tadicalizados, haviam formado a Sociedad Patriotica, entre eles Miranda € 0 jovertSimén Boliva pondo-se como vanguarda dos 104 a criollos, a Sociedad forcou o Congresso, formado em 1811, a procla- marem 5 de julho a Repiblica da Venezuela e uma Constituicao ambi- ‘gua que abs fi 0 €eliminava o sistema de castas mas nq definia espacos para negros e pardos livres. Assim, 0 grupo dominante caraquenho promovia uma “acdo que combinava o radicalismo politico com 0 conservadorismo social” (Halperin, 1985, 137), 0 que terminou favorecendo as reagdes pré-realistas. (Os defensores da velha ordem promoveram rebelides escravas nas plantations da costa, ao mesmo tempo em que nos llanos 0s proprieté- rios de terras e gados acaudithavam seus laneros, formando exércitos proprios para combater os latifundidrios exportadores da regiao litora- nea, destacando-se entre eles Boves. A estes problemas somou-se 0 ter- Temoto que em 1812 arrasou Caracas, causando enormes danos mate- Tiais. Isto propiciou o avango dos realistas desde Maracaibo, Guayana € Coro, com auxilios vindos de Porto Rico, derrotando as forcas coman- A excessiva arbitrariedade provocou reacoes também violentas ¢ fatais para as tropas de Bolivar, especialmente entre os llaneros de Boves, que compunham uma cavalaria de mais de cinco mil efetivos entre pedes, indios, negros e mesticos € que deixavam rastros de des- igo por onde passavam, ive Caracas, que foi ocupada em julho de 1814. Mais uma vez obrigado a exilar-se, Bolivar retornou a Cartagena, de onde passou para a Jamaica e mais tarde para a porgdo republicana do Haiti governada pelo mulato Pétion. A Segunda Re- publica tentada por Bolivar trazia, para o seu aprendizado como co- mandante, uma clara nogao da importancia de incorporar outros se- tores sociais na luta pela libertagao das coldnias, grupos estes que até entdo tinham sido manejados com sucesso pelos adversérios. Por outro lado, em Nova Granada a situagao pendente entre Cun- dinamarca ¢ as demais regides tornadas independentes permitira a so- brevivéncia de focos realistas que formariam, em conjunto com Quito, *) um niicleo de resisténcia a partir do qual j4 comegavam a fustigar as tro- pas libertadoras. Com a centralizacao no vice-reinado do Peru, a rea- | So dos realistas ja s¢ estendia do Alta Peru até o sul de Nova Granada, } cuja sorte comegou a mudar com a prisio de Narifio em 1814. Com a ©) Restauracao na Europa e a volta do retréprado Fernando VIL a0 trono,® | a Espanha podia ja organizar-se para a retomada das col6nias perdidas: ainda em 1814 um exército de dez. chegava 4 ilha de Mar- garita, de onde ocupariam Caracas em 1815. Até 0 final de 1816 os es- 106 panhdis seriam vitoriosos em todo o territ6rio de Nova Granada, encer- rando-se o primeiro ciclo das guerras pela Independéncia Capita do Chile: as disputas inter-oligarquicas Q Chile era uma tegido periférica dentro do mundo colonial, subordinadaao-vice-reinado do Peru € mais tarde ao do Rio da Prata, tendo em vista seu papel como abastecedora das minas de prata de Potosi, no Alto Peru. Nio existiam os grupos econdmicos exportado- res, como no México, Bogoté ou Caracas, ¢ tampouco tensées muito extremadas em relagio & burocracia metropolitana, que s6 apareceri- am depois de 1804, nos derradeiros esforgos para aumentar a arreca- dagio feitos pelos espanhéis. Por-outro lado, o isolamento da capita- nia pelas importantes barreiras naturais que constituiam a cordilheira 0s Andes a leste © a deserto de Atacama a norte teria condicionado 08 criollos chilenos a pensar sua regio “como uma espécie de nagio particular, cuja base material encontrava-se numa economia com cer- tas tendéncias autérquicas‘(Mires, p.115). Os problemas com a me-/ Opole iniciariam apenas depois da Revolucio de Maio em Buenos Aires, quando 0 capitéin general do Chile, Garcia Carrasco, resolveu reprimir preventivamente eventuais movimentos autonomistas e apri- sionou alguns dos criollos mais influentes. Isto motivou reagSes-do.cabildo-de Santiago, culminando com a deposigao de Carrasco em favor de uma junta formada por criollos, que autorizou a formagio do cabildo abierto em 18 de setembro. O cabildo abierto convocou um Congresso formado por membros dos diversos centros urbanos chilenos, nao tendo nenhum propésito radi- cakdeTuplura coma Espanha ei tagao do afastado rei Femhando VII. Os criollos mais radicais, favord- eis a uma organizagao republicana com ampliagao da base social e quebra definitiva dos lagos coloniais, eram minoritarios ¢ tinham seus vinculos no sul da capitania, especialmente em Concepcién. Entre estes destacavam-se Juan Martinez de Rozas, um intelectual, e Ber nardo O" Higgins, que em seus estudos feitos na Inglaterra tivera acesso 107 aos autores da Ilustragao e, mais que isto, fora cooptado pelo grupo que rodeava Francisco de Miranda, El Precursor da Venezuela © Congresso chileno sediado em Santiago nao foi alé: didas favoraveis a uma abertura dos portoschilenos ao comércio mun- dial. Inconformado com esta posicao conservadora, Rozas rompeu com o Congresso e estabeleceu uma junta separada em Concepcién, A situagio de Santiago 86 seria modificada no final de 1811 chegada de José Miguel Carrera, um jovem oficial criollo que a carreira das armas na Espanha, Da mesma forma que Rozas e O'Higgins, pertencia a uma famflia muito rica e influente, mas tinha Juma grande capacidade de mobilizagio, conseguindo congregar no 86 outros jovens membros da oligarquia como também dirigir-se as camadas populares: era “um mais eficaz caudilho que chefe militar” (Halperin, 1985, p.134).Aproi é , dissolveu 0 Congreso em.um golpe militar e mais tarde obt air pa a chamada Patria Vieja ficava dividida entre as liderangas de Carrera e de O'Higgins, parecendo este agora bem mais confidvel para 08 criolios de Santiago. Esta divisao entre as principais liderancas propiciou aos espanhdis a retomada da colénia: tropas enviadas desde o Peru, o grande bastiao dos peninsulares na América, avancaram pelo sul do C! tomando Concepcisn e assegurando a cooptagao dos criollos mais con- seivadores. Em seqiiéncia, derrotaram 0 exéicito patriota comandado por Carrera, que por esta razio foi subs tando o cisma e bre as tropas chilenas, os espanhdis recusaram propostas de armisti- ») cio de O'Higgins, que Ihe valefam a ruptura det A crise era to grave que provocou 0 enfrentamento dos dois lideres criallos-em-agosto de 1814, com enfraquecimento das duas facgoes, sem que nenhuma delas se tornasse hegeménica. Em outubro do mes- iva desesperada de reuniao das forcas chilemas~ a iva dos peninsulares em Rancagua. A Carre- ra e O’ Higgins restava 0 exilio em Mendoza, do outro lado dos An- des, de onde s6 retornariam secundando as tropas argentinas do Li- 108 iago, temerosos de seus lideres odiam vencer gracas & divisdo dos cri- (Os espanhiis py (Mires, p.117). A Revolucao de Maio: movimentos radieais no rio da Prata Nas. pela Independéncia no Prata foi fundamental o papel de Buenos Aires, que assumiu a conducio do processo, tentando im- Por um cardter radicalizado a0 movimento no seu inicio e mai entrando em confronto com os projetos de outras regides per do vice-reinado, Sendo 0 porta de Buenos Aires a principal via de es- coamento da produgao pelo Atlantico, cresceu muito a importancia Jos grupos econdmicos locais e tinha havido um contato muito gran- de com.os ingleses..Além do contrabando disseminado, as duas ten- tativas inglesas-de ocupar a regio em 1806-1807 haviam causado a desmoralizagao completa das tropas espanholas ao mesmo tempo em que se afirmavam as criollas que terminaram expulsando os agressores. Importante também seria a presenca, a partir de 1808, da. Corte portuguesa no vizinhio Brasil, fornando mais problemética uma fronteira em que as situacées de conflito eram quase permanentes. ~~ Foi fundamental o papel das forcas-militares para a Revolugao de Maio: os chefes das milicias e dos regimeritos eram criollos enti- quecidos, como Saavedra ¢ Pueyrredén, ou intelectuais de extragdo média, como Moreno, Castelli ¢ Belgrano. As ttopas, por sua vez, ti- ham sido recrutadas entre pedes e escravos, que agora -tinham seu ganho nas forgas armadas ¢ eram facilmente mobilizados pelos co- mandantes. O exército em Buenos Aires-tornara-se “o ponto de en- conird-das Classes acomodadas crioulas com as elites intelectuais da regiao” (Mires, p.87). A disseminagao das idéias ilustradas, as vania- gens mais que explicitas do livre-comércio com os ingleses ¢ a tibie- za das autoridades espanholas apenas esperavam o esto} im, que foi as noticias vindas da Espanha em 1810. 0 primeiro resultado da agi- tagao dos quartéis € das thas foi-a formagio de um cabildo abierto, 109 que designou uma junta presidida pelo proprio vice-rei Cisneros. Esta solugio muito moderada nao acalmou os animos, tendo o comandan- te do | Regimento, Saavedra, liderado 0 movimento que depés 0 vice- rei, Em 25 de maio tormou-se a primera junta, totalmente constitui- da por revoluciondrios, com Saavedra a sua testa. As medidas iniciais da primera junta foram timidas, destacan- do-se a abertura do porto de Buenos Aires ao comércio externo, o que apenas legalizava uma pratica ja antiga. Do ponto de vista de los de abajo, foi estabelecida a igu al dade entre brancos e indios, pouco sig- nificativa na regio portefta, mas a escravidao africana nao foi aboli- da € houve-total omissao em relag&0 aos pardos. Havia, no entanto, uma preocupagdo com o carater continental da Fevolugao, sendo man- dadas expedigoes para regides remotas do vice-reinado do Rio da Prata, cdmo a de Cast A face mais aguda do Programa de Maio seria mostrada pelo secreta- rio da primera junta, Mariano Moreno, através de um documento seu chamado Plan Revolucionario de Operaciones, que pelo seu radica- lismo mereceu 0 pejorativg de “jacobino”, associando seu autor ao famigerado Robespierre. ‘Além de insistir no cardter“americano” que deveria ter a revolu- 40, incluindo ages a serem desenvolvidas.no sul-de colonia portu- guesa (Moreno, p.73-83), 0 plano de Moreno era muito duro.com os peninsulares, fundamentando a organizacao do novo Estado na expro- priago dos bens das espanhdis: dela se originariam os tecursos para ‘manutengio dos exércitos libertadores bem como para o inicio de uma economia diversificada, que incluia atividades agricolas nao voltadas para a exportagao-e fomento do artesanato e das manufaturas. Neste sentido, eram basicos a nacionalizacao das minas de prata doAlto Peru, a proibicio da evasio de metais preciosos ¢ o controle estatal da cu- nhagem de moedas: expropriava-se um setor das Classes dominantes coloniais, garantindo com isto o financiamento do Estado e de novas atividades produtivas. Tudo isto ocorria porque os criollos mais mo- derados perdiam espago com o deslocamento dos regimentos arma- dos para o interior. Este equilibrio inverteu-se quando a junta passou 110 para o Alto Peru ea de Belgrano para 0 Paraguai.— a.aptegar justamente elementos vindos do interior, mais conservado- ese temerasos de que o ataque a propriedade dos peninsulares pu desse vir a atingi-los. A conseqiéncia foi a reniincia de Moreno e uma depuragio dos revolucionarios mais exaltados ~_O radicalismo da Revolugio de Maio teve um momento noté- vel na expedigao de Castelli ao Alto Peru. J4 no caminho, enfrentan- do a resisténcia conservadora do cabildo ¢ da lgreja em Cordoba, ocu- pou a cidade ¢ executou os recalcitrantes, inclusive o francés Liniers, antigo comandante das milicias que haviam expulsado os invasores ingleses de 1806-1807. Em novembro de 1810, com a vitoria de Sui- Pacha, ocupou o Alto Peru, passando a tomar medidas contra a velha ordem colonial baseada na exploracao do trabalho dos indios. Promo- veu a separticéo gratuite dasietras, aboli todos os tributos, permitiu a liberdade de localizacio ¢ agrupamento dos indigenas € 0 exercicio ivre do comércio (pretragativa até entao dos encomenderos). Além cancelou todos os privilégios da Igreja, bastante importantes no Alto Peru. Estas medidas a favor dos indios acabaram sobressaltando os criollos alto-peruanos, que terminaram aptando pela seguranga da velha ordem colonial. Quando foi atacado pelas tropas peruanas, Ca- telli nao recebeu apoio destes setores, sendo amplamente derrotado em junho de 1811. Persistiram as guerrilhas indigenas no Alto Peru, dirigidas por caudilhos locais, as chamadas republiquetas, tornando © territério uma area incontrolével para os peninsulares até o final do processo de Independéncia - A.expedigao de Belgrano ao Paraguai inaugurou uma relagao de descontianga enlre 0s paraguaios ¢ os porfaias que atravessari século. Derrotando militarmente as tropas de Buenos Aires no inicio - de 1811, utilizando foreas irregulares, os proprietérios de terras para- guaios proclamaram sua Independéncia em 17 de maio, recusando ‘tanto as autaridades peninsulares quanto as intromissdes portefias nos Seus_assuntos. Na junta que formaram, além de representantes dos vlatifundidrios, havia um certo José Gaspar Rodriguez de Francia, fi- ho de um aventureiro paulista, ¢ doutor em Direito e Teologia pela Universidade de Cordoba. Em junho do mesma ano Toi eleito o Con- ui _gresso, em sua maioria composto por grandes ferratenientes, mas con- tando com a presenga de chacreras, pequenos proptietarios, em geral produtores de fumo, entre os quais era grande a influéncia do Dowor Francia. Momentaneamente fora dajurita por problemas com os gran- des proprictarios, Francia voltou em outubro de 1811 para.negociar con Belgrano um acordo com Buenos Aires, Suprimiram-se os tr bbutos Com que o porto gravava 0 tabaco € a erva-mate, foi reconheci- da a autonomia de Assungao e permitiu-se a arrecadacao de impostos pela junta paraguala {Em 1gi2 r jo, Buenos Aires voltaria a co- brar impostes-sobre_os produtos paraguaios que passavam pelo seu porto, o que prenunciava uma crise-pare-os-

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